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Siago Tomir: Aquela da Julieta…

| Sally | | 97 comentários em Siago Tomir: Aquela da Julieta…

siago-julieta

Era um dia tranquilo, até que o dejeto humano entrou em contato com Siago Tomir dizendo que tinha uma surpresa que queria mostrar para ele. Qualquer pessoa de bom senso que leu metade das histórias da coluna “Siago Tomir” sabe que seria impossível vir alguma coisa boa do Alicate. Mas Siago Tomir não via e não vê problema em continuar andando com uma pessoa que caga seu carro, leva a cachorra da avó para ser estuprada e limpa a bunda com paninho bordado que a filha da dona da casa fez para ela. Siago Tomir é desses que perdoa tudo de amigo mas é supercrítico com a parceira, conhecem o tipo?

Sally: Não quero saber
Tomir: Mas eu ainda não sei o que é, ele só disse que tem uma surpresa para me mos…
Sally: NÃO QUERO SABER!
Tomir: Sally, essa sua agressividade precisa ser tratada
Sally: Seja lá o que for não entra nessa casa, não encosta em mim e não quero saber
Tomir: Pode deixar, Sra. Boa Vontade, não vou te meter nisso não
Sally: *gargalhando
Tomir: Posso saber qual é a graça?
Sally: Estou rindo para não chorar, porque você sempre dá um jeito de me meter!
Tomir: *olhar de indignação

Ouvimos uma buzina que mais parecia uma buzina de navio na porta da casa de Siago Tomir. Mais por medo do que por curiosidade fomos ver o que estava acontecendo. Um ônibus gigantesco estava parado na porta e de dentro dele o imbecilóide do Alicate acenava e descia para a calçada pela porta da frente, meio alterado

Sally: Estou sentindo o cheiro de álcool daqui
Tomir: Não começa, Sally
Alicate: Meu novo investimento!
Sally: Investimento? Que retorno isso vai te dar?
Alicate: Já economizei uma fortuna de motel
Sally: Mas você não paga motel, você leva as mulheres para esse mato aqui do lado
Alicate: O Matel é só para as vadias, se a mulher for direita eu pago motelzinho
Sally: Dentro desse conceito machista inaceitável, se a mulher for direita ela não dá para você
Tomir: O que tem aí dentro?
Alicate: Cama, cozinha, banheiro, mesa de jantar, geladeira…
Sally: Tudo com gonorreia
Alicate: VOCÊ CONTOU PARA ELA?
Sally: Era só uma piada, mas fico feliz em saber que realmente aconteceu
Tomir: Deixa eu ver! *indo em direção ao ônibus
Sally: Não encosta em nada para não pegar gonorreia…
Alicate: Sequelas de guerra, sequelas de guerra

Voltei para dentro de casa com o firme propósito de não participar disso. Siago Tomir com sua megalomania adorou aquele troço enorme e logo quis sair para dar uma volta com o Alicate. Voltou para dentro de casa apenas para pegar a carteira, já na intenção de sair.

Sally: Vai onde, Madame?
Tomir: Agora eu preciso de autorização sua para sair?
Sally: Quando implica em perigo de vida sim, porque isso me afeta
Tomir: Lá vem você com os seus exageros…
Sally: Você acha que nesse exato momento o Alicate está sóbrio?
Tomir: Sally, o Alicate nunca está sóbrio
Sally: E você acha bacana uma pessoa bêbada dirigir um troço desse tamanho?
Tomir: Ele já aprendeu a funcionar bêbado, ele dirige até com mais cuidado…
Sally: Ele tem habilitação para dirigir esse tipo de veículo?
Tomir: Sally, você é polícia rodoviária e eu não sabia?
Sally: Eu sou a pessoa responsável por você estar vivo até hoje
Tomir: Eu vou só dar uma volta, Sally. Nada de trágico vai acontecer
Sally: Quem te garante?
Tomir: Se for pensar assim, eu posso tropeçar no banho, bater com a cabeça e morrer
Sally: Porque as chances são praticamente as mesmas do Alicate porrar essa nave espacial completamente bêbado e sem habilitação!
Tomir: Se isso te tranquiliza, eu dirijo
Sally: Não, isso não me tranquiliza
Tomir: Você por acaso está insinuando que eu dirijo mal?
Sally: Não, eu dirijo mal. Você dirige de forma imprudente e agressiva e não tem habilitação para esse tipo de veículo
Tomir: É tudo igual, acelerador e freio, não tem mistério!
Sally: Se fosse tudo igual, a lei não exigiria um tipo de habilitação diferente
Tomir: Chega, Sally. Você não é a minha mãe, não preciso da sua permissão para sair
Sally: Veja bem…
Tomir: Estou vendo
Sally: VEJA BEM…
Tomir: ESTOU VENDO
Sally: Quer fazer a merda… vai
Tomir: *andando em direção à porta
Sally: Mas, se der problema, não me meta nisso, não me ligue, não me peça ajuda
Tomir: Bom saber que não dá para contar com você! *batendo a porta

Como vocês podem depreender das outras dezenas de histórias que eu já contei, deu merda. Deu uma merda enorme. E eu fui cientificada por um telefonema de um número residencial desconhecido

Sally: Alô?
Siago: Eu não estou te metendo no meio, só estou pedindo para ligar para um táxi e mandar ele vir me buscar no endereço que eu vou te passar
Sally: Oi?
Siago: Só preciso que você faça isso, liga para um táxi e manda vir para esse endereço, o resto eu resolvo *voz masculina ao fundo chorando
Sally: “o resto”?
Siago: PARECE QUE VOCÊ FICA FELIZ QUANDO ALGO RUIM ACONTECE COMIGO, SALLY!
Sally: Endereço para o táxi, por favor?

Siago Tomir me deu um endereço estranho. Anotei e liguei para um táxi. Curiosamente, o taxista não conhecia o endereço e me pediu referências. Liguei para o celular de Siago Tomir, que estava desligado, bem como o do Alicate. Nada. Eu sabia que Siago Tomir estava a pé em algum lugar desconhecido do qual não poderia sair sozinho e comecei a ficar preocupada, porque eu sou frouxa, eu me preocupava em vez de deixar ele se foder todo. Como tinha poucas informações do que estava acontecendo, decidi ligar para amigos dele que talvez pudessem saber onde ficava aquele endereço.

Sally: Jão, desculpa te incomodar, é a Sally, namorada do Somir
Jão: Viu a meeeeeerrrrda que deu?
Sally: Merda?
Jão: Hã?
Sally: Que merda?
Jão: Que merda?
Sally: Você disse que deu uma merda!
Jão: Eu? Eu não!
Sally: Olha só, Jão, Somir precisa que busquem ele no endereço X e eu não sei onde fica, tem como você me dar uma referência para eu mandar um táxi lá?
Jão: Tem sim. Sabe o meio do mato? Fica lá
Sally: Hein?
Jão: Isso fica no meio do mato!
Sally: Não tem nenhum comércio perto? Nenhum ponto de referência?
Jão: Mato
Sally: Mas você sabe onde fica?
Jão: Eu sei chegar lá, mas só olhando o caminho, assim de cor não sei não

Xingando até a milésima geração, peguei o carro de Siago Tomir e fui buscar o Jão, para ele me levar até o lugar onde supostamente deu merda. Quando Jão me viu ficou branco

Jão: Mano, Siago vai ficar nervoso quando descobrir que você está dirigindo o carro dele…
Sally: Paciência, eu pedi para ele não me meter se desse confusão!
Jão: Deixa esse carro na sua casa, vamos pegar um táxi
Sally: Se é no meio do mato, como é que a gente vai voltar se for de táxi?
Jão: Ainda mais depois dessa meeeerrrrda…
Sally: QUE MERDA?
Jão: *olhando para os lados
Sally: Não vai falar?
Jão: Se ele não te contou, eu prefiro que ele te conte
Sally: Eu vou chegar lá sem saber o que está acontecendo?
Jão: Assim que chegar você vai ver

Pegamos uma estradinha rudimentar e começamos a entrar no meio do mato. Não sei porque alguém se enfiaria por aqueles lados. Andamos bastante no meio do mato, quando chegamos em uma fazenda enorme com uma entrada imponente

Jão: É aqui
Sally: AQUI?
Jão: É
Sally: O que eles vieram fazer aqui? Um rodeio?
Jão: A fazenda é do pai da ex do Alicate
Sally: Tomara que ele tenha dado um tiro de espingarda no Alicate!
Jão: Espingarda?
Sally: Vocês não usam espingarda?
Jão: Você está vendo muito Pernalonga, Sally

Jão desceu do carro, abriu o portão e entramos na Fazenda. Andamos bastante até chegar à casa principal. No caminho vi uma cena que me apavorou: o ônibus, estatelado, de cabeça para baixo, soltando fumaça. A fazendo era imensa, o ônibus estava bem distante, mas era possível reconhecê-lo. Só não surtei porque havia falado com Siago ao telefone, então ao menos eu sabia que ele estava vivo.

Sally: Aquilo é a merda?
Jão: Parte dela
Sally: Ahhh… tem coisa pior?
Jão: Tem
Sally: Jão, eu estou ficando nervosa, acho bom você começar a falar
Jão: Não quero
Sally: JÃO, FALA! * soltando as mãos do volante e agarrando a camisa de Jão
Jão: O volante, Sally!
Sally: Pergunta…
Jão: Sim?
Sally: Ainda resta alguma dúvida de que eu sou maluca?
Jão: Depois de todos esses meses… não, nenhuma
Sally: Você sabe o que acontece quando se irrita uma pessoa maluca?
Jão: Já ouvi falar
Sally: Você tem cinco segundos para me falar o que aconteceu! Não entendo porque está fazendo tanta questão de me esconder! Um… Dois… Três…
* parando o carro
Sally: Quatro…
Jão: A JULIETA!

Ouvir um nome feminino me congelou. Quem caralhos era a Julieta? Porque Siago Tomir tinha ido a um lugar ermo e havia uma Julieta no meio? Porque Jão não queria falar? Dali em diante preferi não saber mais nada e ouvir o resto da boca de Siago Tomir. Fui dirigindo em silêncio e com cara de poucos amigos até chegar à casa principal, uma enormidade rusticamente decorada. Parei o carro na porta fui recebida por um rapazinho com cara de tristeza. Nos identificamos e ele nos levou até Siago Tomir, que estava no escritório do fazendeiro.

Entramos na casa e já na entrada havia várias medalhas, troféus e prêmios de todos os tipos espalhados. Achei estranho. Um grande saguão imponente com um que outro troféu na entrada e um amontoado deles no final. Tinha mais troféu ali do que na sede do Flamengo. Continuamos andando. O rapazinho bateu na porta do escritório e nos colocou para dentro. A cena era constrangedora.

Siago Tomir olhava para baixo, Alicate olhava para baixo e um senhor de uns dois metros de altura chorava copiosamente. Entrei, me apresentei e o sujeito mal olhou para a minha cara, continuou chorando. Não tinha clima para gritar o “Qual foi a merda que você fez?” que estava entalado na minha garganta. Esperei um pouco para vez se o fazendeiro parava de chorar, mas nada. Estava tão puta que fiz um sinal de degola para Siago Tomir, que em resposta fez outro sinal de degola para Jão. Quando eu vi que a choradeira se prolongava no tempo, puxei Siago Tomir para fora da sala e fui conversar com ele no saguão de entrada.

Tomir: EU SÓ PEDI UM TÁXI, VOCÊ VEIO PORQUE QUIS!
Sally: Qual foi a merda que você fez dessa vez?
Tomir: Eu não fiz nada!
Sally: Acho que você não entendeu… eu vou repetir mais alto para ver se você entende: QUAL FOI A MERDA QUE VOCÊ FEZ DESSA VEZ?
Tomir: O que aconteceu foi o seguinte…
Sally: *batendo palmas
Tomir: A gente parou o ônibus na porta da fazenda porque o Alicate queria mostrar para a ex dele
Sally: Porque alguém quer mostrar um ônibus para a ex?
Tomir: Você sabe como ele é, para ostentar, queria mostrar para ela que estava bem de vida
Sally: Prossiga
Tomir: Alicate desceu para abrir o portão e entrar, mas como ele estava muito bêbado eu desci para ajudar porque achei que sozinho ele não ia conseguir
Sally: Compreendo… muito bêbado para abrir um portão mas ok para dirigir…
Tomir: Ele dirige no piloto automático. Só que…
Sally: Só que?
Tomir: O Alicate esqueceu de puxar o freio de mão
Sally: Prossiga
Tomir: Quando a gente saiu do ônibus ele me perguntou se tinha puxado o freio de mão…
Sally: Prossiga
Tomir: E eu disse que achava que sim, então ele desencanou e foi
Sally: Você viu ele puxando o freio de mão?
Tomir: Não
Sally: Porque você disse que achava que sim?
Tomir: Porque na hora eu achei que sim
Sally: Você afirmou ou você disse que achava que sim?
Tomir: Eu acho que eu achei
Sally: É típico de você afirmar com certeza
Tomir: Só sei que o freio de mão não estava puxado e o ônibus começou a andar, porque tinha um declive onde ele estava estacionado
Sally: PUTA QUE PARIU, SOMIR! VOCÊS JOGARAM O ÔNIBUS BARRANCO ABAIXO?
Tomir: É… foi assim que tudo começou
Sally: Ahhh… TEM MAIS? TAVA POUCO?
Tomir: Infelizmente tem mais
Sally: Siago… não me diga que vocês mataram a filha do Fazendeiro!
Tomir: Pior
Sally: PIOR?
Tomir: Pior
Sally: Mas teve morte?
Tomir: Infelizmente sim

Fez-se um longo silêncio. Siago Tomir era conhecido por contar as coisas a prestação. Dificilmente ele conseguia sintetizar em uma frase quando fazia merda, acho que ele tinha medo de apanhar. O problema é que comigo essa coisa de “o gato subiu no telhado” não funciona, só me deixa mais desesperada. Fui ficando nervosa, muito nervosa. O climão era tal que eu estava me perguntando mentalmente QUEM eles tinham matado. Comecei a imaginar o pior quadro possível, pensando se eles tinham matado a esposa ou a neta do fazendeiro. Foi quando lembrei do que o Jão disse…

Sally: Siago, quem é Julieta
Tomir: Então você já sabe…?
Sally: Julieta morreu?
Tomir: *fazendo que sim com a cabeça e olhando para baixo

Sem coragem de pressionar um namorado que havia acabado de cometer um homicídio, esperei um tempo até ele se acalmar. Siago olhava para baixo, visivelmente transtornado. Dificilmente se via Siago Tomir assim, mas eu compreendi, pois o peso de matar uma pessoa deve ser sofrido. Esperei uns longos dez minutos em silêncio pensando na melhor forma de abordar o assunto. Quando se está em silêncio e sem nada para fazer, passamos o tempo literalmente olhando para as paredes.

Comecei a olhar as paredes e vi que havia fotos de vacas, do tamanho de telas de televisão, por toda a parte. Abaixo das fotos, troféus e prêmios que essas vacas ganharam. Ao final do corredor, uma foto absurdamente maior do que as outras estava em destaque. Parecia uma tela de cinema. Abaixo, dezenas de prêmios e troféus compunham uma galeria de dar inveja a qualquer time de futebol. Quando já havia explorado a sala toda, me vi sem ter o que fazer e resolvi que era hora de confrontar Siago Tomir. Algo me dizia que ele tinha matado uma criança, pois estava muito transtornado. A essa altura, pela reação de todos, eu já tinha quase certeza que Julieta era a netinha do Fazendeiro.

Sally: Eu preciso que você me conte os detalhes para poder te ajudar
Tomir: O que mais você quer saber, Sally?
Sally: Quem era exatamente Julieta?
Tomir: *apontando para a foto da vaca principal

Foi em uma fração de segundo que me subiu uma putez sem precedentes. Eu ali preocupada achando que ele ia a Júri por homicídio de uma criança, com a história toda montada na cabeça e o filho da puta estava todo amuado por causa de um animal de quatro patas que a gente come diariamente no almoço. Fiquei tão puta que a reação foi quase que instantânea e alta:

Sally: UMA PORRA DUMA VACA, CARALHO? TUDO ISSO POR UMA PORRA DUMA VACA?

O que eu não vi é que nesse minuto o Fazendeiro estava entrando no corredor. Minha falta de tato agravou sua crise de choro. Me afastei discretamente para um canto da sala e fique sussurrando com Siago Tomir.

Sally: Tudo isso por uma vaca!
Tomir: Sally…
Sally: Você é maluco?
Tomir: Você sabe quanto valia essa vaca?
Sally: Não
Tomir: *fazendo sinal com os dedos
Sally: Tantos mil?
Tomir: Não, Sally. São milhões
Sally: *branca
Tomir: Porque você acha que eu estou apavorado? Pela perda de uma vida? Você me conhece tão pouco? Vai doer no meu bolso, Sally!
Sally: Porra, vocês tinham que matar logo ESSA vaca?
Tomir: Pois é
Sally: Um pasto gigantesco e tinha que cair em cima da vaca mais premiada de todas?
Tomir: Lei de Murphy
Sally: Não podia ter caído em cima de uma vaca qualquer?
Tomir: Aparentemente não
Sally: Espera, espera, talvez ainda existam esperanças…
Tomir: Não Sally…
Sally: Deixa comigo
Tomir: NÃO, SALLY!

Ignorei Siago Tomir e fui falar com o Fazendeiro. Me meti no meio da conversa que ele estava tendo, contando para Jão dezenas de histórias sobre as peripécias de Julieta:

Sally: Talvez seja apenas um mal-entendido, sabe como é, as vacas são parecidas entre si
Fazendeiro: Era hora de recolher os animais, estavam colocando o gado para dentro. Ai a Julieta não aparecia… não aparecia… saímos para procurar por ela
Sally: Meu Senhor, vaquinhas são muito parecidas! Quem garante que a Julieta não está no curral com o resto e que essa fatalidade não foi com outra vaca?

O Fazendeiro chorava copiosamente, enquanto Siago Tomir e Alicate gesticulavam freneticamente para que eu cale a boca. O rapazinho que escoltava o Fazendeiro me chamou e me levou até o lugar do acidente. Ele tinha nas mãos um troço que não sei o nome mas parecia um Contador Geiser, aqueles aparelhos para medir radioatividade que apitam cada vez mais quando se chega perto de algo radioativo. O rapazinho começou a andar para perto do ônibus e o contador começou a apitar com mais frequência, cada vez com mais frequência, e quando chegou bem perto do ônibus, o troço apitava loucamente sem intervalo.

Sally: Desculpa a ignorância, mas isso mede exatamente o que?
Rapazinho: É um localizador, a Julieta usava um chip e a gente localizava ela assim

Minha cara de bunda foi indescritível. Ok, era realmente a Julieta debaixo daquele ônibus. Alicate e Siago Tomir haviam feio o hambúrguer mais caro da história da humanidade. A essa altura, só de pensar no prejuízo que eles iriam pagar, eu quase que achei pior terem matado a Julieta do que a neta do Fazendeiro. Voltamos para o saguão principal.

O Fazendeiro continuava chorando copiosamente e se referia à vaca como se fosse um membro da família. Siago Tomir me puxou para um canto:

Tomir: Se não quer ajudar, não ajuda, mas vê se não piora a situação!
Sally: Vocês vão ter que pagar o valor da vaca…
Tomir: Valor da vaca?
Sally: Sim, o valor da vaca
Tomir: Sally, você nunca esteve em uma fazenda, né?
Sally: Eu fui uma criança de apartamento…
Tomir: A vaca é parte do valor. Tem ainda os óvulos dela que estavam vendidos…
Sally: Quem compra óvulo de vaca?
Tomir: Gente que quer ter uma cria de vaca campeã
Sally: Desculpa a ignorância, mas não dá para levantar o ônibus e pegar os óvulos da Julieta mesmo depois de morta?
Tomir: Não sei e não tenho coragem de perguntar
Sally: Ok, veja pelo lado bom, você não matou uma pessoa
Tomir: Antes fosse
Sally: SIAGO!
Tomir: Sally, vamos ser sinceros aqui, se eu tivesse matado uma pessoa, o Judiciário me obrigaria a pagar uma indenização NESSE VALOR?
Sally: Não, jamais
Tomir: Então era menos pior uma pessoa!
Sally: Mas se fosse uma pessoa, sua consciência estaria ainda mais pesada…
Tomir: Consciência? Você acha que eu me importo com a vaca? Aquilo é um bife com pernas! Estou é com medo da indenização que vou ter que pagar!
Sally: Quem esqueceu de puxar o freio de mão foi o Alicate!
Tomir: Mas ele me perguntou e eu disse que achava que ele tinha puxado e por causa disso ele não voltou para conferir!
Sally: Ainda assim, quem tinha que ter puxado o freio de mão era ele!
Tomir: Mas eu vou precisar que um Juiz ache isso. E se o juiz achar diferente? E se o juiz achar que eu tenho parte de culpa?
Sally: Volte no tempo e me escute

No meio da conversa uma mocinha entra no salão aos berros

Moça: SEU FILHO DA PUTAAAA! * correndo na direção do Alicate
Sally: Gostei dela, quem é?
Tomir: A ex do Alicate
Moça: NÃO BASTAVA TER MATADO MEU CACHORRO, MATOU A JULIETA TAMBÉM?
Sally: Alicate matou o cachorro dela?
Tomir: Foi sem querer. Longa história…
Alicate: *fazendo sinal de quem pede calam com as mãos
Moça: FILHO DA PUTAAAAA!
Sally: Vamos sair daqui que a coisa vai ficar violenta
Tomir: Você acha que vão deixar a gente sair?
Sally: Ela sabe onde vocês moram, certo?
Tomir: Sim, já foi lá em casa várias vezes
Sally: Então, se quiserem te processar, sabem onde encontrar
Tomir: Mas você quer sair… saindo?
Sally: Sim, antes que essa mulher fique furiosa com você também
Tomir: E o Alicate?
Sally: *olhando com cara de fúria
Tomir: *andando em direção à porta

A moça gritava e tentava bater no Alicate enquanto o pai a segurava. No meio da confusão fomos até a porta, pegamos o carro e saímos levando o Jão conosco. O rapazinho que me levou até a vaca me olhou torto mas acabou nos liberando depois de ouvir meu argumento:

Sally: Desculpa mas é uma questão de família que está sendo resolvida lá dentro, não nos cabe participar

Fomos para a casa de Siago Tomir, que passou a noite em claro pensando que ia ter que vender até as calças se fosse parcialmente responsabilizado pelo que aconteceu. No dia seguinte, como se nada, Alicate passa (como sempre, sem avisar) na casa de Tomir:
Sally: Você está vivo? Que pena…
Alicate: Alicate é Highlander! Alicate é indestrutível!
Sally: E Sally não suporta quem fala de si mesmo na terceira pessoa
Tomir: Mano, não tem clima para brincadeira não, eu não tenho esse dinheiro!
Alicate: Não vai ter dinheiro nenhum!
Tomir: Como assim? A vaca ressuscitou?
Sally: Taí uma coisa que eu queria ver, Jesus Cristo voltando em uma vaca…
Alicate: Alicate resolveu
Sally: Pagou sozinho o prejuízo?
Alicate: Paguei…
Sally: *respirando aliviada
Alicate: … com a minha joia mais preciosa! *apalpando as partes íntimas
Sally: Aff…
Tomir: Você voltou com a mulher?
Alicate: *mostrando uma aliança na mão direita
Sally: Você ficou noivo só para não te cobrarem uma vaca?
Tomir: Sally, você se lembra do valor da vaca? Eu ficaria noivo do Fazendeiro para não ter que pagar essa vaca!
Alicate: Não foi só por isso não…
Sally: Bom, se você ainda gosta dela…
Alicate: Gostar eu não gosto não, mas ela libera anal…
Sally: *saindo da sala e batendo a porta do quarto

Para sentir pena de Julieta, para sentir pena da noiva do Alicate ou para sentir pena retroativa de mim: sally@desfavor.com


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