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Putaria com fins lucrativos.

Putaria com fins lucrativos.

| Somir | | 11 comentários em Putaria com fins lucrativos.

Já perceberam que os filmes mais populares dos últimos tempos quase não tem mais cenas de sexo ou nudez? Aliás, mal tem cenas de romance. Isso, segundo os grandes estúdios, tem relação direta com os gostos da geração Z, que parece não gostar de ver esse tipo de material em seus filmes. Estaríamos diante de uma geração mais conservadora?

Se você acompanha a mesma internet que os jovens, vai perceber que não é o caso. O ser humano continua muito interessado em sacanagem. Ainda mais numa geração que tem muito menos preconceitos sobre papeis e orientações sexuais. Tem putaria hetero, homo, bi e todos as combinações possíveis. Então como é que ao mesmo tempo partem do princípio de que o público jovem vai reagir mal a ver nudez e sexualidade nos seus filmes?

A minha teoria é que estão colocando na conta dessa geração um outro processo muito mais pervasivo: a profissionalização da sacanagem. O carnaval provou que houve uma mudança no tipo de safadeza disponível para a população, pelo menos na grande mídia. Décadas atrás, eram comuns as transmissões proibidonas de bailes de carnaval, que aconteciam nas madrugadas borrando a linha entre jornalismo e conteúdo erótico. Até mesmo os desfiles de escolas de samba eram mais explícitos.

Ao mesmo tempo que vivemos numa era de estímulo sexual constante, o paradigma da mídia se tornou muito mais puritano. Tinha peito de fora em propaganda do Jornal Nacional nem tanto tempo atrás… e posso ir até mais longe: no tempo que eu cresci, nem imagem de criança pelada era considerado algo errado. Era algo engraçado. E não é juízo de valor, o mundo muda e pronto, mas enquanto você analisa as mudanças, percebe também o que vem no pacote dessa mudança.

O que eu enxergo de nefasto nesse processo é como nudez e sexualidade estão se tornando negócios puros. Lembra da figura da vadia do carnaval? Aquela mulher que aparecia pelada porque queria aparecer e pronto? Agora quando você vê alguma dessas baixarias, sabe que ela está só fazendo propaganda do Onlyfans (ou similares) dela. A putaria não vem mais do coração, é marketing.

Estamos vendo uma compartimentalização da sexualidade humana: existe a vida normal e existe a vida sexual. Não é mais a mesma coisa, é o seu perfil do Linkedin e o seu perfil do Tinder. O zoomer que já nasceu nesse ambiente provavelmente acha muito estranho ver as coisas misturadas. Se ele está vendo um filme, é porque escolheu não ver os infinitos conteúdos de safadeza que estão sempre disponíveis para ele pela internet.

E as novas gerações são sempre a fronte da guerra cultural, eles que estão diante das mudanças sentindo os maiores impactos. Quando começamos a separar as coisas, eles aprenderam que o mundo funciona assim. E chegando à vida adulta, eles vão estabelecer as regras dessa forma. A mídia percebeu isso e está mantendo as coisas bem mais separadas. Já perceberam que se o filme ou a série não é explicitamente sobre sexo ou romance, não tem quase mais cena representando essa parte da vida?

É como se tivéssemos que ser avisados com antecedência sobre o conteúdo para levar a personalidade certa para o evento. E nem estou dizendo que o certo era ter cena de chuveiro em todo filme só para cumprir a cota de mulher pelada, muita gente foi explorada nessa era da mídia e não é exatamente esse o problema.

O problema é que esses compartimentos mercantilizam demais o sexo. Não pode mais ser uma coisa que “vem de graça” no pacote normal da vida, tem que ser algo a parte, um tipo de serviço extra. É nesse espaço mental que vemos uma explosão de criadores de conteúdo erótico/pornográfico, reforçando a ideia de que não é normal, que não é parte da vida e que precisa ser consumido à parte.

Profissionalização transforma o normal em serviço, e serviço quase sempre vem com um custo extra. E como não existe isso de separar perfeitamente sexo de sentimento, adivinha o que começa a ser cobrado à parte também? Não é à toa que estamos vendo as gerações que menos fazem sexo. Por um lado, fico feliz que a população tende a diminuir; mas por outro isso deve estar criando uma neurose nas pessoas que ainda nem deve ter se manifestado totalmente.

Não sei quão vantajosa é essa liberação sexual moderna de orientações e papeis sexuais se as pessoas vão começar a achar que precisam pagar para ter esse tipo de afeto. Você acha que é uma boa ideia que a pessoa se coloque no papel de cliente ou fornecedor em algo tão carregado de emoções como sexualidade? Mulher independente assexuada no filme e mil mulheres se vendendo como prostitutas virtuais na rede social?

Eu não sei como os mais jovens se sentem a esse respeito, mas eu acho uma desconexão muito estranha. É de graça e uma parte da vida. O que é emocional se paga de forma emocional, não financeira. O perfil do Linkedin e do Tinder são da mesma pessoa, presume-se noção ao lidar com cada uma das redes, mas não que você seja duas pessoas diferentes. Não que você tenha que trocar de personalidade ao lidar com uma das diversas partes da sua vida.

E é aí que eu sinto falta genuína da putaria amadora do carnaval ou da safadeza descarada de tempos antigos, pelo menos na grande mídia. Não pelo apelo, porque em 2024 nenhum ser humano consegue sequer arranhar a quantidade de putaria disponível para o consumo, mas pela mensagem de que era algo dentro da vida cotidiana. Cada vez que um jovem aprende que existe uma barreira entre sexualidade e normalidade, é mais uma pessoa que pode começar a ficar ansiosa e neurótica com a parte mais instintiva da vida.

Se o problema é não conseguir sexo ou não saber mais o que fazer com tanto sexo não importa, o que importa é que vira um bicho de sete cabeças quando não era para ser nada mais complicado do que “eu gosto de peitos”. Porque é só isso, só um pedaço normal da vida de todo mundo. A mulher que mostrava os peitos no carnaval pelo simples prazer de mostrar os peitos passava uma mensagem muito mais saudável para o mundo do que a que está tentando vender assinaturas do seu serviço de pornografia pessoal. As coisas não ficavam separadas, não tinha custo extra.

E aí, o mundo parece que só oferece duas opções: puritanismo ou prostituição. Não precisa pensar muito para perceber que a felicidade não vai estar em nenhuma dessas áreas. Rejeitar sexualidade é rejeitar um impulso natural, comercializar sexualidade é subverter o sentimento. A maioria das pessoas não assexual ou viciada em sexo, não faz o menor sentido querer se colocar nesses papeis o tempo todo e ficar trocando de acordo com o momento. Somos muito tarados para fingir assexualidade e muito românticos para fingir que só queremos sexo.

Não surpreende que tanta gente comece a perder as estribeiras e ir para caminhos bizarros como “achar” que é transexual (quem é sabe e sabe com força) ou se perder em ideologias machistas ou feministas como se fossem sua personalidade. Sem contar as hordas de homens e mulheres traumatizados com incapacidade de formar relações amorosas. Tem algo aí nessa divisão desnecessária entre personalidade cotidiana e personalidade sexual.

E a forma como sexo se torna um negócio muito especializado tem relação com isso. Nenhum sexo na mídia de massa e sexo demais na mídia especializada causam confusão. Os zoomers são o canário da mina, sufocando com o excesso de comercialização do sexo e ficando mais e mais confusos sobre os sentimentos que sempre acompanham essa parte da nossa vida.

É muito menos complicado do que uma questão insolúvel de poder como se faz parecer, não é sobre ser empoderada pensando como prostituta ou sobre se arrepender pelos pecados dos seus ancestrais sendo um frouxo, é sobre um equilíbrio que nossa saúde mental pede desde que somos… gente.

O mundo onde mulher usa adesivo para cobrir mamilo no carnaval é um mundo doente. Porque ainda existe carnaval e porque nem isso fazem de coração.

Para dizer que eu sou um tarado (sim e não), para dizer que eu sou um puritano (sim e não), ou mesmo para dizer que eu só estou ficando velho (sim e não): comente.


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