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Ele disse, ela disse: Encrença.

| Desfavor | | 62 comentários em Ele disse, ela disse: Encrença.

Definir o tema de hoje é simples: Sally e Somir diferem sobre os benefícios da crença em divindades. Mas como a história nos ensina, chegar em alguma conclusão é que são elas. Vamos nos embrenhar por esse campo espinhoso e convidar os impopulares a versar suas opiniões.

Tema de hoje: Acreditar em deuses é nocivo para uma pessoa?

SOMIR

Sim. Todos os elementos nocivos da fé numa sociedade podem ser traçados de volta para os indivíduos portadores. Mesmo que sejam instituições como Igreja e Estado que se beneficiem diretamente dessa insanidade seletiva da mente humana, são as pessoas que acreditam em divindades e perpetuam a ignorância em forma de misticismo que tornam tudo possível.

Quem acredita em deuses financia ignorância, exploração e preconceito. E a não ser que você esteja em alguma posição de poder conquistada com base na exploração de outros seres humanos neste exato momento, o falso conforto da gnosticismo se volta contra você e as pessoas ao seu redor, com juros e correção. Defender fé é coisa de quem não está pensando ou está mal intencionado.

E como eu parto do princípio que os leitores crentes (sentido amplo) desta coluna não acreditam em um ou mais deuses com o objetivo explícito de conquistar vantagens pessoais explorando outras pessoas, vamos tratar da forma como a simples crença em divindades é nociva para uma pessoa.

Pra começo de conversa: Se você acredita num deus, qualquer um, você está apresentando um sinal inegável de fé. A crença em algo que não pode ser provado. O curioso, e não deveria ser, é que se você tirar a noção de um deus dessa ideia de fé, é exatamente o que definiria insanidade.

Acreditar em um deus é a mesma coisa que acreditar na existência de qualquer outro ser mitológico já concebido. Não é bom sinal sobre a capacidade cognitiva de um ser humano. Você provavelmente perderia uma vaga numa entrevista de emprego em que revelasse acreditar piamente que elfos existem.

Pode até ser que a pessoa que acredite nos elfos não tenha em si nada que vá prejudicar o trabalho ao qual se candidatou, mas mesmo assim, gera uma compreensível preocupação com a capacidade dessa pessoa de discernir realidade e imaginação. Não é inerentemente nocivo, mas é matéria-prima para outras atitudes e opiniões nocivas.

Somos animais racionais e a nossa sociedade depende de um mínimo de compromisso com a realidade perceptível. Não achamos horrível quando uma criança diz ter um amigo imaginário, mas esperamos dela que com o amadurecimento venha também a capacidade de dissociar o que é imaginação e o que não é. Dos incontáveis seres oriundos da imaginação humana, apenas alguns poucos ganham proteção social para continuar existindo na cabeça de adultos: Sim, evidente, os deuses. Seja o judaico-cristão, o islâmico, ou qualquer outro(s) dos panteões das civilizações modernas, temos carta branca para borrar a linha entre sanidade e insanidade desde que seja um dos lucrativos seres imaginários das religiões modernas. Modernas. Te acham maluco se você acreditar nos deuses gregos, por exemplo. Zeus e Jeová compartilham da mesma ausência de evidências, mas só um ainda é economicamente viável.

E mesmo que você acredite num deus pessoal, um que escape das convenções das religiões estabelecidas, ele ainda sim é tão provável quando unicórnios e dragões. E de uma certa forma, as pessoas sabem que é uma bobagem, porque as que não tem dogmas e escrituras para usar como escudo sempre tem rotas de fuga argumentativas para a infantilidade que defendem. Um deus que não interage e não julga não existe.

Na prática, a pessoa é atéia, mas foge do rótulo dizendo que acredita num deus. Favor não confundir uma coisa com a outra. Se seu deus é irrelevante em todas as esferas práticas da existência humana, você é ateu. Não precisa usar o título, mas não me venha dizer que é argumento em prol da utilidade da crença em divindades. Se eu mantiver todas minhas opiniões atuais e disser que acredito em um deus, não posso ser comparado com alguém que acredita em um deus pessoal.

As religiões preferem que as pessoas acreditem nos deuses que eles designaram como verdadeiros (e sobre os quais tem os direitos de colheta de riqueza dos fiéis), mas a pura insanidade (ou fé, chame como quiser) de acreditar em um ser sobre o qual não se tem NENHUMA evidência também tem seus méritos para quem quer se dar bem nesse mercado. Uma pessoa que diz acreditar em deus raramente vai ser incomodada na nossa sociedade atual, pois ela é uma das mais importantes bases da situação extremamente vantajosa dos exploradores da espécie humana.

“Status Quo” é uma expressão do latim que significa “as coisas do jeito que estão”. Manter o status quo é sinônimo de deixar tudo como está. Não preciso argumentar sobre como isso é vantajoso para quem JÁ está em posições privilegiadas na sociedade humana, não? Uma forma menos pedante de dizer a mesma coisa é falar que “em time que está ganhando não se mexe”.

Sem a religião, manter o status quo é muito difícil. Existem muitas outras ferramentas de controle sociais, como a violência, mas é na fé que se encontra a mais arraigada, a mais profunda. A crença numa divindade permite que se trate a IMENSA maioria de explorados na humanidade como se trata. O simples fato de acreditar que está sendo observado funciona como anestésico para as dores de viver como gado. A pessoa média vai viver a maior parte da sua vida trabalhando excessivamente para sustentar luxos e privilégios de poucos… Vamos lembrar que o mundo é um lugar de imensa desigualdade social e que bilhões de pessoas vivem em condições de miséria, ignorância e insegurança.

Bilhões contra no máximo alguns pouco milhões de privilegiados. Como é que esse mundo não explodiu ainda? Como é que o gado ainda não invadiu a casa do dono da fazenda e tomou tudo? A ideia de que existe uma força maior e que essa vida não é a nossa única chance paralisa justamente a parte do nosso cérebro que NÃO ACEITA ESSA VIDA DE MERDA.

Acreditar em seres imaginários como se fossem reais é um passo para trás na evolução intelectual humana. Essa vida de gado da maior parte da população humana não faz sentido. A sociedade fica sem propósito, muita gente acredita que só está aqui para fazer número e esperar o “continue” no final do jogo. Religião só existe por causa de fé, e as benesses da fé podem ser encontradas em inúmeras outras atividades e linhas de pensamento muito mais lógicas e comprováveis. A crença na divindade é a sujeira nessa engrenagem de evolução pessoal.

Propósito, auto-controle, ética, moral… Todas essas coisas existem independentemente de acreditar ou não em uma porra de um amigo imaginário. E se essa crença está no cerne da insanidade anestésica que mantém bilhões de pessoas vivendo de forma injusta nesse mundo, pode me explicar qual a utilidade de manter justamente isso?

Fé faz mal. E quem defende essa sacanagem tem que estar disposto a ser coerente e bater palmas para toda a escrotidão decorrente dela.

Para dizer que eu só tenho enveja da sua capacidade de acreditar numa mentira absurda, para dizer que tem certeza que não podemos ter certeza de nada nessa vida, ou mesmo para me mandar para o inferno: somir@desfavor.com

SALLY

Vamos colocar alguns pingos nos “is”. Durante muito tempo eu pensei como o Somir, por isso não se assuste se achar algum texto antigo meu nesse sentido, não é contradição, eu mudei de ideia mesmo. Hoje, acho que a ideia de um Deus, digamos, uma religiosidade, não é nociva por si só, o que é nocivo é o conjunto de dogmas que o cercam, ou seja, a religião.

O que se convenciona chamar de “Deus” também pode receber outros nomes, como força interior, karma, destino, sorte, inconsciente e tantos outros. Pouco importa o nome que se dê, e sim como a pessoa lida com isso. Se lidar com idolatria, com devoção cega, estará emburrecendo e será nocivo. Entretanto, acredito ser perfeitamente possível que a pessoa lide de uma forma saudável com a ideia de um Deus e apenas se beneficie disso, sem em troca ter que pagar dízimos, seguir regras arbitrárias ou proibições descabidas.

A ideia de Deus dissociada de uma religião pode ser benéfica e sem qualquer prejuízo colateral. Até mesmo um ateu quando passa por um momento difícil busca se fortalecer, não através de Deus, busca forças dentro dele mesmo. A verdade é que no fundo, trata-se da mesma coisa. Quando você quer muito algo e está tentando se superar, pouca diferença faz se busca em você mesmo, em Deus ou Papai Noel. É o ato de buscar forças, de tirar forças do seu cu, de querer vencer, o que realmente conta. Ateus sempre acreditarão que venceram porque conseguiram força dentro de si mesmos e religiosos sempre acreditarão que a força veio de Deus, que, porque não, também pode estar dentro de cada um de nós.

O nome que se dá não faz diferença, pois o que importa é o mecanismo, que é igual para todos. Na verdade, ficar tentando encontrar um nome, classificar, explicar, não deixa de ser uma forma de burrice, tanto de religiosos como de ateus. Você não sabe. Aceite sua insignificância, você não sabe o que existe, o que não existe nem como funciona. Não sabe e no momento não tem como descobrir, então, caralhos, parem todos de tentar explicar. O máximo que pode dizer é “EU acredito” ou “EU não acredito” e ponto.

Tentar desvendar esse processo de superação pelo qual todos passamos ao nos reerguer das porradas da vida é mais ou menos como querer descobrir quem é a Lindamàr: você não vai conseguir. Foda-se quem ela é, o importante é que ela existe, é legal, é divertida e torna nossas vidas melhores. Eu não sei nada sobre a Lindamàr, mas gosto muito dela e ela me faz bem, então, não busco saber mais do que isso, isso me basta. Muita gente passou meses conversando com ela tentando descobrir nas entrelinhas uma pista sobre quem era, onde morava, quantos anos tinha… e por isso deixou de aproveitar um belo papo, uma conversa divertida e inteligente. Te faz bem? É legal? É bacana? FODA-SE se existe, se existe como você imagina, se você pode provar que existe ou se você nunca vai obter nenhuma resposta. Tire proveito do que te faz bem. Manaus, e você?

A ideia de um Deus pode operar melhoras na vida de muita gente. Não através de milagres, mas conferindo mais confiança, mais conforto, mais força, mais determinação. É ilusório? Irrelevante, se beneficia a pessoa sem lhe causar nenhum mal, pouco importa. Sinceramente, mesmo que ficasse provado que não existe um Deus nem nada do tipo, FODA-SE, se faz bem para a pessoa, deixa ela acreditar, não vejo como o simples acreditar em Deus possa prejudicar alguém. Repito: o limitador está na religião e não na religiosidade.

O simples fato de acreditar em Deus não te autoriza a presumir nada sobre a pessoa: isso não faz dela uma ignorante, burra ou incapaz de lidar com a realidade da vida. Existem pessoas inteligentes que acreditam em Deus. O que pessoas inteligentes não fazem é ter uma religião que atrela sua vida a regras e proibições. Pessoas inteligentes sabem se regular, sabem escolher por vontade e critérios próprios o que podem fazem e o que não fazem, não precisam de normas externas para contê-las socialmente de sair dando ou sair matando.

Para falar com o seu suposto Deus você não precisa de intermediários, muito menos de palavras prontas e rezas. Na verdade, você não precisa nem falar, basta um bate-papo mental informal. Essa é a ficha que ainda não caiu na maior parte das pessoas, por isso elas seguem se filiando a organizações bizarras que tomam dinheiro ou praticam pedofilia em larga escala. Que porra de mal pode fazer a uma pessoa conversar mentalmente ou pedir um forcinha para um suposto Deus? Ok, pode ser que ela não esteja oficialmente falando com Deus, pode ser que ela esteja falando com ela mesma, com seu inconsciente ou com FUCKIN’ NINGUÉM, foda-se, se isso lhe faz bem, foda-se muito se Deus existe ou não! Se eu estiver doente e um comprimido me fizer sentir melhor, foda-se se for um placebo!

Conversar com um suposto Deus não é sinal de fraqueza, nem de preguiça nem de nada negativo. É um recurso, mais um recurso, na batalha diária que é a vida. O fato da pessoa usar esse recurso não quer dizer que vá se acomodar e não usar os demais. Tem gente que acredita em Deus mas é super batalhadora, não espera milagres divinos para resolver seus problemas. O problema não é acreditar em um Deus, o problema é se acomodar e deixar sua vida nas mãos dele.

No dia em que eu achar que preciso, que vai me fazer bem, eu vou conversar com Deus. Não sei com quem estarei falando, mas independente disso, pode ser que traga resultados positivos, ainda que frutos da minha mente. Entrando no campo da ciência, sempre tão exaltado pelo Somir, foi comprovado que pessoas com muita fé conseguem operar resultados inesperados em si mesmas: melhoras do sistema imunológico, aumento de confiança, e até mesmo uma melhor/maior utilização cerebral (como no caso da meditação). Então, se você pode obter estes benefícios sem dar nada em troca, porque não? Se te faz bem, foda-se quem é, se é ou como é, se te faz bem, use!

É possível acreditar em Deus, falar com ele e não dar nada em troca. E por nada, entenda-se dinheiro, sacrifícios pessoais, oferendas, rezas e todos esses rituais babacas que só atrasam a vida da gente. Vamos visualizar a equação: você obtém benefícios + você não precisa fazer sacrifícios = win/win. Não entendo como alguém pode encontrar um prejuízo implícito só pelo fato de você acreditar em Deus. É uma presunção equivocada. É perfeitamente possível acreditar em Deus sem ser prejudicado pelo simples fato de acreditar em Deus.

E não estou aqui dizendo que todos devemos acreditar em Deus porque assim seremos pessoas melhores. Estou dizendo que QUEM PUDER TIRAR ALGUM BENEFÍCIO DISSO, tem o sagrado direito de acreditar, sem que por isso paire alguma presunção negativa a respeito da sua pessoa. Se não te ajuda, se não te beneficia, então não fale com Deus (FaleComLinda). Se te ajuda e te beneficia, fale com ele, mas sem intermediários, sem pagar por isso, sem sofrer por isso, sem fazer sacrifícios por isso. E fale no seu próprio tempo, sempre que quiser, onde quiser, quando quiser. Não precisa acordar cedo no domingo para isso, Ele está em todos os lugares.

Os excessos SEMPRE são ruins, sempre são emburrecedores. Eu odeio religiões, mas ateus que se excedem também estão errado, acabam sendo o outro lado da moeda do fanatismo. Ateu que taxa alguém de burro só porque acredita em Deus erra tanto quanto religioso que taxa alguém de mau porque não acredita em Deus. Acreditar não é a questão. O grande problema da humanidade é o que você faz, como você conduz essa crença. Não é vergonha acreditar em Deus, é vergonha ser otário o bastante de achar que um Deus vai querer que você dê 10% do seu salário para alguém ou que ele não quer que você faça sexo antes do casamento…

Em tempo: minha teoria continua. Deus, que na verdade, eu chamo de Gezuiz, existe e está putíssimo com tudo o que esse bando de filhos da puta está fazendo em Seu nome, uma vibe meio Stigmata. Um dia ele vai voltar e vai pisar em todas as igrejas, tipo Godzila. Depois vai levar para o inferno todos aqueles idiotas que ao longo da vida se filiaram a uma religião e que fizeram coisas erradas em nome dela. Se eu estiver certa, vou rir muito da cara de todos vocês. E aposto que Deus tem a cara da Lindamar.

Acreditar em Deus, por si só, não prejudica ninguém. Acreditar no ser humano é que fode com a vida dos outros!

Para me dar um abraço emocionado e dizer que eu amadureci, para dizer que você gostaria de ter Jesus (Luz) dentro de você ou ainda para transformar os comentários em uma guerra santa: sally@desfavor.com


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