Matador de CEO
| Somir | Flertando com o desastre | 16 comentários em Matador de CEO
Luigi Mangione é acusado de matar o CEO de um plano de saúde nos EUA. Assassinato planejado e executado de forma fria nas ruas de Nova Iorque. Não temos confirmação, mas presume-se que seria uma vingança contra planos de saúde (esse específico ou em geral) por negarem cobertura para pessoas necessitadas. Virou meme e especialmente no povo alinhado à esquerda, herói. Teriam os esquerdistas finalmente perdido a cabeça?
Não. Não mais do que se espera. O proletariado matando a burguesia é uma fantasia de poder recorrente no movimento revolucionário comunista ou socialista. E talvez alguns de vocês fiquem chocados com essa análise, mas… dessa vez eu até acho que é uma melhoria na mentalidade do povo alinhado à esquerda.
Claro que não é razoável querer matar as pessoas que você não gosta, claro que não é uma boa ideia enxergar revolução pela lente da violência. Mas depois de tanto tempo com o corpo afundado na lama da ideologia identitária, faz bem ver o povo com raiva de rico de novo.
Num mundo onde bilionários são vistos como deuses e que a fuckin’ direita briga mais com as grandes corporações que a esquerda, eu sentia falta desse tipo de putez com a desigualdade. Porque no mínimo estão com a atenção virada para o problema. Eu adoraria que o problema fosse representatividade em filmes de Hollywood, mas é pobreza. Pobreza que convive com acumuladores cada vez mais eficientes de dinheiro.
Gente que vive nos mais diversos países vendo a produtividade do trabalho humano aumentar dez vezes mais que os salários. Miseráveis e classe média sendo apertados na mão de psicopatas metidos a gurus que receitam esforço desumano e veneração à empresa como remédios para o sofrimento. Passamos várias décadas com essa mentalidade, e a recompensa não chegou.
Está faltando mesmo raiva contra a máquina. Trocadilho intencional, perceberam que nem mesmo na mídia aparecem mais provocadores e rebeldes? Chocar a sociedade? Só se for mostrando a bunda. Eu sinto uma redução considerável de adolescentes irritados com o sistema, encurralados em discussões sobre gênero e patriarcado, cegos sobre a desigualdade e os ricos abusando das pessoas.
Então, por mais que seja errado glorificar um assassino, talvez seja uma esperança para a esquerda acordar. A direita até tentou carregar a tocha, mas eles querem brigar contra a Nasa e as vacinas. O foco se desfaz muito rápido daquele lado, até porque está meio que na alma da coisa conservar o poder vigente. A esquerda é um anticorpo mais eficiente contra os ricos.
Ricos que eu sei que são só pessoas, não um grupo de demônios altamente coordenado. É que é natural que grupos com mais recursos empilhem vantagens. O governo precisa cortar gastos e só consegue cortar o que gasta com pobres, porque os ricos têm gente infiltrada para defender seus interesses. O pobre só equilibra a batalha com números. Os ricos sempre precisaram ceder alguma coisa quando o povão ficou muito bravo, eles não vivem sozinhos nesse mundo.
E aí que entram símbolos de enfrentamento ao sistema como o assassino americano. Vai explicar teoria socialista para o cidadão que trabalha carregando saca de cimento e passa quatro horas por dia num ônibus? Vai depender da direita para chacoalhar o funcionamento da sociedade? Temos que ter atalhos para a mente do povão, para ele pelo menos exibir um grau de putez com aqueles acima dele na pirâmide social.
E achar alguma graça em enfrentar a burguesia. O maior sucesso do “sonho americano” foi incutir na cabeça do cidadão moderno que riqueza era só mérito. Quando a promessa começou a se esvair, a esquerda estava enfraquecida demais, e foi infectada com um vírus que transformou a ideia de exploração do rico contra o pobre em exploração por raça, gênero e orientação sexual.
Que existe, é claro, mas não é o cerne da questão. Por mais que muitos possam dizer que beatificar Luigi Mangione seja o momento baixo da esquerda, eu acho que é um erro pontual no caminho certo. Não é possível que tanta gente que vive na miséria e passando aperto aceite tão bem uma pequena elite controlando sua vida!
Tem que lutar contra a burguesia. Mesmo se você se considerar de direita, porque os donos do mundo podem defender coisas que você acha aberrantes se não tiverem nenhum predador. Não estou dizendo que é para fazer como Luigi e atirar nos CEOs, mas estou dizendo que a elite foi perdendo o medo de ser impopular.
Gostem ou não do comunismo, depois da revolução bolchevique cus piscaram por décadas. Muito da cultura ocidental da qual bebemos parte do princípio que é perigoso unir os pobres contra os ricos. É perigoso sim, mas para os ricos. O mundo deveria poder resolver tudo na conversa e na racionalidade, mas para isso quem já tem vantagens tem que querer escutar e ceder.
Não querem. Não precisam. Coloca a bandeira do arco-íris no perfil da rede social e pronto. O adversário dos pobres na questão de recursos está numa fase de conforto, fazendo rinha de lacrador com seu dinheiro, brincando de separar os pobres em mil grupos diferentes para que as armas que caírem em suas mãos sejam utilizadas em brigas internas, e nunca que acabem apontadas para suas cabeças.
Luigi não é meu herói. Ele é um assassino. Mas se o povão quiser ter um herói, que seja alguém que faz o rico suar frio, não alguém que esteja comendo em sua mão e “mudando o mundo um post por vez”. Pelo menos a esquerda volta a ser esquerda, e quem sabe isso faz a direita parar de cobrir o vácuo de confronto ao poder constituído, porque a direita não sabe fazer isso! Tem que ter amor por pobreza, aquela coisa piolhenta e descamisada que quer acabar com o rico.
Essa coisa revolucionária irresponsável que chacoalha o barco e deixa todo mundo assustado. Não quero minha esquerda educando com o cu e falindo economias por burrice, quero ela puta da vida com a foice na mão. O rico precisa ser incomodado. Melhor Luigi que os molengas identitários atuais.
Eu quero a esquerda com dentes de novo.
Para me chamar de comunista, para dizer que concorda até ganhar na Mega-Sena da Virada, ou mesmo para dizer que eu defendo bandido: comente.
Mesmo considerando que pegaram o cara certo, que não foi trabalho interno (o congoomerado queria eliminar o cara), que ele foi realmente identificado pela vovó do McDonald’s… Sério mesmo que ele estava com a ID dele, ID falsa e a arma na bolsa? Sério isso?
Se depender do seu elitismo antidemocrático em relação ao direito de sufrágio, o pobre sequer pode “equilibrar a batalha com números”.
Eu sou mais esquerda que você, e eu sou de centro. Mais útil do que jogar contra. Pauta identitária é uma cria das elites para fazer a esquerda comer o próprio rabo, na analogia culta e chula da frase.
Nada. A pauta identitária surgiu na esquerda americana, mas se tornou um meio mais de divisão do que de coesão, sendo que o ambiente atual onde há uma acirrada disputa pelos holofotes levanta o moral de narcisistas que encamparam tais causas em benefício próprio.
É sobre grana, fama e poder e não… A conversa não é sobre você.
O senhor leu a minha mensagem? Em algum lugar discuti quem é mais de esquerda ou elogiei “pauta identitária”? A propósito, limitar o direito de sufrágio é antidemocrático e típico de quem é de direita, e obviamente inviabiliza a prevalência das opções da maioria. Qual é a dificuldade de assumir as suas evidentes incoerências?
Quer dizer que você não gosta de ver alguém descaracterizando o que você escreveu e pulando em conclusões baseadas nisso?
Mamma mia, Somir!
A esquerda há muito tempo deixou de ser sobre ajudar pobres. Agora é sobre pessoas endinheiradas que conseguem se safar de repreensão popular alegando que “não é dona dos meios de produção, então não é burguesa”, para que então possa continuar enriquecendo sem que ninguém possa questioná-las.
Colocar um cara como o Liago Tiefert no mesmo balaio que Seu Zé que trabalha de servente de pedreiro só porque ambos não “detêm os meios de produção” é apelativo. Claramente há uma diferença entre eles. Claramente um vai morrer na fila do SUS e pagando 20 janjas no kg do fígado bovino, enquanto o outro terá privilégios.
A esquerda agora apoia enriquecimento das pessoas, desde que elas não tenham “os meios de produção”. Apoia teocracias, como as muçulmanas que matam gays e oprimem mulheres, só porque odeiam Israel.
Querem chorar pelos brasileirinhos que não podem mais estudar medicina em país vizinho enquanto aqui tem cidadão de periferia morrendo em UPA e é esquecido em dois dias.
Querem dar cotas para travestis e trans em universidades públicas quando nem emprego tem, porque né, não tem industrialização e empreendedorismo é sabotado de todas as formas nesse país, restando à maioria das pessoas se formar em qualquer uniesquina via EaD, desesperadas pra não cair em subemprego.
Pedofilia é do bem desde que seja de um cantor que gostem e tenha se casado depois com a criança. Machismo é do bem desde que seja contra uma mulher que discordem ideologicamente e possam chamar de fascista.
Esquerda antigamente era sinônimo de poder e conhecimento aos pobres e às pessoas marginalizadas. Acho que estou ficando velha. As coisas estão mudando muito rápido e não consigo acompanhar mais.
Em algum momento, deu um problema de tradução entre o conceito da luta contra o capital e o de luta contra os americanos.A ideia não avançou, apodreceu no colapso do “segundo mundo” e foi substituída por uma versão bem da falsificada que se contenta em discutir papéis de gênero.
Lula é o típico caso de comunista das antigas que não soube o que fazer com a ideologia quando caiu a União Soviética. Sem alguém para apontar ele em alguma direção, a parte corrupta tomou conta.
Esquerda não era sobre lacração. Era sobre guilhotinas.
As piores coisas que a esquerda fez foram sequestrar as questões sobre direitos das minorias e adotar pautas identitárias. A gente dificilmente teria de ter discussões sobre violência doméstica ser algo errado hoje em dia se a pauta não fosse tão ligada à esquerda.
O CEO em que Luigi atirou era responsável pelo uso de uma IA que rejeitava pedidos de cobertura do plano automaticamente. Nos EUA, se seu médico indica um tratamento ou medicação e o plano se recusa a cobrir, pode chorar que você vai dever milhões ou ficar sem. Mesmo se isso signifique sua morte. Estima-se que mais de 60.000 pessoas morreram por causa dessa IA utilizada pela United Healthcare, se as notícias que tenho lido a respeito forem verdadeiras. Para mim, Luigi matou um serial killer. Ele tem sim de ser julgado, nós não queremos abrir precedentes perigosos. Mas não por terrorismo, como estão tentando fazer. Ninguém além de meia dúzia de CEOs está aterrorizado. Inclusive, outro plano de saúde de lá voltou atrás na decisão de deixar de cobrir anestesias após um período arbitrário de tempo de cirurgia, mesmo com o paciente precisando de mais tempo. Imagine o abuso que é dizer que anestesia pela duração completa de um procedimento é luxo?
Também não sou a favor de matar pessoas a torto e a direito só porque elas têm dinheiro e privilégios, mas acho muito saudável que bilionários tenham medo de ser mortos assim. Se escutassem a insatisfação das pessoas que trabalham para eles, que dependem dos negócios deles, ou que são prejudicadas porque eles não conseguem ver a hora de parar de pedir vantagens, a situação não chegaria ao ponto da violência.
Esse seu comentário (novamente) brilhante me fez lembrar de um acontecimento no sentido contrário, sobre um empresário americano que teria passado a dar bônus maiores para seus empregados, como reconhecimento pelo comprometimento e pelo aumento de produtividade, “no strings attached, e, depois, um levantamento realizado na empresa mostrara que cerca de dezenas de seus empregados haviam se sentido seguros para ter filhos. E com os lucros sem deixar de subir (não consegui localizar a notícia no google para apurar como teria sido exatamente, uma pena)!.
Ou seja, sem perder a essência capitalista, aqui foi um indicativo do quão bem (ou quão mal) podemos fazer sem precisar estar tão acima na cadeia alimentar.
De resto, novamente recomendo assistirem o documentário Sicko, de Michael Moore. De início, mostra uma família que era classe média alta em que, após uns enfartos do patriarca, os pais prósperos faliram por conta dos custos de saúde e passaram a morar de favor na casa dos filhos (que se revezavam para abrigá-los). E tinha uma mãe solteira que casara com um canadense amigo solidário para ter direito ao SUS canadense.
No mínimo é uma lembrança que a pessoa não é uma ilha. Se o sistema está viciado em uma direção, como é que o marginalizado vai ser ouvido? Não deveria ser pelo medo, mas tem algum ganho secundário em bilionários mantendo as coisas como estão. No final das contas, eles mesmo escolheram um mundo onde é crime ir contra eles.
Ainda que tivesse uma posição relevante na corporação, ele é apenas um dos responsáveis por essa “Inteligência Artificial”, que nada mais é que a implementação de algoritmos que usam das informações do big data para uma finalidade específica, sendo que nesse caso a finalidade era a de automatizar o processo de concessão ou denegação de procedimentos hospitalares, com a mitigação dos efeitos do fator humano no processo, seja na forma de força de trabalho (reduzindo a demanda por quadro funcional), seja na forma de concessão de procedimentos que na prática afetassem o caixa da empresa (reduzindo as despesas com tais procedimentos).
A política dos planos de saúde é podre e já sentimos por aqui. Lá nos EUA, o que se tem é a versão hardcore disso.
“Eu adoraria que o problema fosse representatividade em filmes de Hollywood, mas é pobreza”.
Em se tratando de Netflix, caso não esteja enganada, lembro que a motivação (inicial, pelo menos) de Walter White tornar-se Heisenberg foi não querer arruinar financeiramente sua família para tratar seu câncer, por conta do seu plano de saúde não aceitar cobrir o médico que ele queria com um tratamento experimental. Houve alguns comentários nessa linha lá fora, invocando a série nesse sentido.
Me faz pensar como não parece existir uma forma de explicar problemas que não separam pessoas por sexo ou cor. Os americanos deveriam estar imensamente unidos contra o sistema médico, mas qualquer outra coisa parece entrar na frente e fazê-los discutir incessantemente.
Desisti de tentar entendê-los depois do massacre de Sandy Hooks em que um Obama chorando pediu para o Congresso aprovar leis mais rigorosas para liberar armas (e proibir o publico de ter acesso a rifles de assalto e armas automaticas mais pesadas), depois de um ex-aluno de uma escola primária com diagnóstico de problemas mentais ter matado 21 crianças e 6 professoras (tentando proteger as crianças atingidas). Isso depois de ter matado a mãe com 4 tiros na cabeça.
No fim, lembro ouvir nas notícias da época o que deixou o pessoal lá realmente revoltado: o fato do atirador ter utilizado um dispositivo que transformava um rifle semi-automático em automático e não (ou nem tanto) o fato do menino doente ter tido acesso fácil a armas pesadas , sem qualquer checagem por parte das lojas de armamentos.
No fim, proibiram o dispositivo, houve uma pequena melhoria nas exigências para alguém solicitar uma arma, mas as proibiçoes que o Obama queria mesmo não foram aprovadas. Uma pesquisa mostrara que 51% era contra proibir rifles.
Aí joguei a toalha. Se bobear, por lá ainda acham que um sistema universal de saúde seja coisa de comunista ainda por cima.
(Vou fazer como Lex Luthor no Super-homem 2 e pedir se posso escolher a Austrália para morar…)