Nada importa.

E isso não é tão importante assim.

Pensar é perigoso. É extremamente útil para a nossa vida, mas quanto mais você presta atenção no mundo ao seu redor e começa a fazer juízos de valor sobre o que realmente te impacta ou não, sempre existe o risco de entrar numa espécie de desilusão de propósito: você percebe como muita coisa na vida nem faz sentido e vai dando um desânimo…

Meu último surto foi vendo um jornalista na TV usando terno e gravata. Por algum motivo, a mente foi para a pergunta: por que diabos as pessoas usam gravatas? É um pedaço de pano pendurado no pescoço! A pessoa tem que pegar aquela fita, amarrar de um jeito certo e colocar sobre a camisa. Tudo porque se convencionou que usar aquela fita te faz parecer mais sério.

Aí, imaginei quantas pessoas podem ter perdido oportunidades de trabalho, relacionamentos, respeito… tudo por causa de não estar usando esse adereço. Um fuckin’ pedaço de pano definindo o futuro de uma pessoa? Às vezes esse mundo parece tão imbecil que nem vale a pena se esforçar. E não, não adianta banir gravatas, porque dez segundos depois aparece um novo consenso sobre que penduricalho sem função prática moderna vai simbolizar status.

Dependendo do tipo de ambiente que você frequenta, tirar um cartão de crédito de qualquer cor que não preta da sua carteira já faz gente torcer o nariz. Olha o grau de babaquice! Primeiro tiveram que inventar que o cartão preto que era o “melhor”, e depois pessoas tiveram que acreditar nisso ao ponto de julgar outras. Dá trabalho ser tão mesquinho.

Pode parecer eu sendo um caipira irritado com a alta sociedade da cidade grande, mas não é nada que me afetou diretamente. Não estou reclamando dos preconceitos que sofri, porque eu trabalho com área criativa e perto dos meus pares, sou super tradicional e “coxinha”. Mas a simples ideia de que uma gravata ou a cor de um cartão de crédito podem criar julgamentos negativos em outros seres humanos continua sendo maluca.

Até porque eu tenho certeza de que eu tenho os meus julgamentos fúteis realizados de forma inconsciente. É fácil ver a inutilidade das ideias alheias, mas quando é com a gente… a vida em sociedade é cheia dessas regrinhas, e eu não acredito que proibi-las gere algum resultado prático. As pessoas simplesmente acham outras coisas para cismar.

E é aí que dá o surto de irrelevância e inutilidade: sempre vai ter mais e mais coisas no mundo que não fazem o menor sentido para você, e algumas delas vão te irritar profundamente. São bilhões de pessoas preocupadas com coisas que você nem entende por que geram preocupação. Se deixar, isso vira um estresse daqueles e pode estragar seu dia.

Aí surge a defesa mental: foda-se. O foda-se é uma coisa linda, porque ele destrói suas preocupações com uma informação muito real, a de que na prática não faz diferença você ficar estressado ou não. Muita coisa nessa vida pode ser colocada na categoria do foda-se sem nenhuma consequência grave. É até importante lembrar como as pessoas tendem a ser hipócritas e inconsistentes, não é como se os outros estivesse fazendo tudo direito e só você passando sufoco. Todo mundo está passando algum perrengue, não importa quanto projetem imagem de sucesso.

Mas na posição de pessoa que pensa demais, sei que existe uma próxima camada depois do alívio do foda-se: a consequência do foda-se. Se você colocar uma lupa no que você e outros pensam e fazem todos os dias, vai perceber muita energia desperdiçada com bobagem. E quanto mais você se aprofunda no que configura bobagem, mais vai percebendo como… é basicamente tudo.

Macacos dançando para outros macacos, por motivações inventadas e resultados difíceis de mensurar. O que você faz todos os dias realmente tem alguma função? Estamos indo para algum lugar? Vai valer a pena? Não seria melhor simplesmente parar? Essas perguntas viram um veneno na cabeça de quem está com propensão a se deprimir ou ter pensamentos suicidas.

Porque por definição, a resposta delas é inconclusiva. O cérebro reage bem a algumas funções físicas predeterminadas como alimentação, reprodução e socialização, mas começa a adicionar variáveis da vida moderna e você se percebe sem uma linha guia bem definida sobre o porquê de estar fazendo as coisas. O foda-se do bem vira foda-se do mal quando te faz concluir que tudo é inútil.

O que não é verdade. Tudo pode ser desimportante, podemos ser agrupados de átomos minúsculos na escala universal, mas esse tipo de derrotismo cósmico não é condizente com a realidade. Até segunda ordem, a gente não chegou aqui com um documento de metas de produtividade. Nascemos tão livres quanto os outros bichos, e tão sem obrigações quanto eles. O que pode incomodar na ideia de que basicamente tudo na vida moderna é inventado também pode ser liberador: é tudo inventado.

Utilidade é uma coisa que decidimos na nossa cabeça. Talvez venha direto da sua, talvez venha sugerida ou imposta por terceiros, mas por si só não existe. Você precisa se importar para algo ser importante. É inventado na hora. O que muita gente usar para de desmotivar é só uma visão das coisas, a de que havia uma motivação cósmica maior que você não está encontrando.

Para mim, isso é um bug mental. Um erro de cálculo que trava o sistema todo. A ideia de que nada importa de verdade é só metade da frase, o que faz mais sentido é que nada importa de verdade a não ser que você queira. Muita gente resolve parar nessa parte supostamente depressiva sem perceber que um passo à frente está uma enorme liberdade. O desânimo nesse caso é artificial. Você pode literalmente inventar um propósito de vida agora, e daqui a 5 minutos inventar outro. É bom que nada importe. É bom não ter meta de eficiência na vida além das que você quiser ter. E por quanto tempo você quiser ter.

Especialmente se você perceber que nada importar não é esse problema todo, muito pelo contrário, é uma solução para vários momentos ruins da nossa existência. Entra em parafuso quem pensa nisso de forma contraditória, não dá para achar ao mesmo tempo que nada importa e se abalar por essa ideia. O “monstro” que ocupa a mente em momentos de desânimo não é um que te fala como as coisas são desimportantes, é o oposto disso. Você começa a acreditar que é grandes coisas não estar motivado, quando salvo desequilíbrios hormonais que podem ser tratados, não é nada mais do que a mente no seu estado natural de enxergar o mundo como ele é.

Átomos amontoados em macacos de gravata. Nada importa, nem a ideia de que nada importa.

Para dizer que vai comprar meu curso, para dizer que este texto não importa, ou mesmo para dizer que gostou da ideia porque os impostos estão nas alturas: comente.

Se você encontrou algum erro na postagem, selecione o pedaço e digite Ctrl+Enter para nos avisar.

Etiquetas: , ,

Comments (6)

  • É complicado as vezes quando a gente chega nesse nível de percepção de que nada importa, mas ao mesmo tempo, necessário. Em termos específicos de estereótipos sociais, “ah porque todo mundo fez, realizou, eu tenho que realizar também”, realmente, nada importa.

    Agora, quando isso chega a atrapalhar te enxergar teu propósito de vida, mesmo sabendo que ele pode mudar em 5 minutos, e te deixando apático e sem reação, daí talvez acho que isso pode atrapalhar. Tem que ver também se tudo isso não é apenas uma forma de enxergar a vida, uma perspectiva dentre tantas, ou se talvez a gente não esteja flertando com a depressão ou qualquer problema psiquiátrico que mereça atenção.

  • Quando nada importa, fica mais fácil você decidir o que importa – é uma sensação poderosa de autonomia. A energia mental que é poupada depois pode ser investida em outra coisa.

    A vida “não importar” pode tirar um peso inacreditável das suas costas. Você continua sendo uma cidadã comum que paga boletos. Qual o problema? Isso não deveria importar. E não importa. “Isso não deveria ser desesperador?” Não. Porque você não precisa se pressionar exaustivamente. Porque uma gafe ou engano seu, não será relevante.

    “Mas fulano viaja”, “beltrano casou”, “ciclana tem emprego que paga mais” e isso não importa. “Isso é conformismo ” não, isso é não se importar. É como se você viesse de outra galáxia com outra noção de como uma sociedade funciona. No que o que acontece na vida alheia, ajuda? Ou muda? No que… Importa?

    • Sou da mesma opinião, Ana. Quando você percebe que não há um significado intrínseco que traz uma importância especial à vida, pode escolher o que de fato vale a pena pra você. Acho libertador

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Relatório de erros de ortografia

O texto a seguir será enviado para nossos editores: