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Mentila!

Mentila!

| Desfavor | | 4 comentários em Mentila!

A Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira (28/5), o projeto de lei (PL) nº 914/2024, que institui o Programa de Mobilidade Verde e Inovação (Mover). O relator incluiu no texto a taxação de compras internacionais de até US$ 50 (cerca de R$ 253), como aquelas feitas em plataformas como Shein e Shopee. LINK


Será que isso vai fazer o brasileiro perceber que essa gente mente que nem sente? Desfavor da Semana.

SALLY

Antes de entrar no assunto propriamente dito, vamos aparar algumas arestas rapidamente: 1) a taxação foi aprovada pela Câmara dos Deputados, ou seja, ainda não está em vigor 2) o valor não é de apenas de 20% como muitos dizem, pois tem outros impostos anteriormente instituídos e, no sistema tributário brasileiro, incide imposto em outros impostos e até imposto no mesmo imposto. O acréscimo real será de 44,58% e 3) Não é culpa do Bolsonaro, pois é algo que Lula apoiou, os congressistas da esquerda votaram a favor e o Lula tem poder para vetar (e impedir que seja implementado), mas já disse que não vai fazê-lo (cabe a vocês pressionarem para que o faça).

Agora sim podemos falar dos pontos que, na nossa opinião, merecem mais destaque. Na minha opinião, há uma camada de desfavores interdependentes que precisa ser analisada.

Primeiro a incoerência, que ninguém aponta, pois o gado da cerca vermelha é tão gado quanto o gado contra vacina. Quando se cogitou fazer o mesmo no governo Bolsonaro, o pessoal da esquerda deu um faniquito dizendo que era um absurdo e que Bolsonaro queria taxar o pobre. Agora o PT vai e faz exatamente o mesmo que criticou. E ninguém diz nada. Ninguém aponta a contradição. Ninguém se diz enganado. Ninguém critica. Bolsonaro está inelegível, qual é a desculpa para não criticar agora?

Além de criticar, também está faltando uma compreensão sobre as razões disso. Vocês acham mesmo que o Lula, com a popularidade em queda, quer taxar as brusinha da Shein? Óbvio que não. Ele está fazendo pois não tem outra opção, pois assim como Bolsonaro, é uma figura decorativa e não detém poder algum. Lula achou que voltaria fodão, mandando e hoje é uma marionete decrépita da terceira idade. Isso precisa ser dito, pois o enfraquece muito mais do que a ideia de um simples filho da puta. Lula foi obrigado a aceitar isso, Lula não tem poder.

Outra coisa que precisa ser lembrada é como pessoas deste governo se manifestaram publicamente para induzir as pessoas ao erro. Janja falando com a página Choquei que estava tudo bem, que o imposto era para as empresas, Felipe Neto falando que o governo vetaria se isso fosse aprovado e tantos outros que receberam os mais diversos briefings para gerar confusão e desviar atenção. Há um movimento arquitetado para aprovar essa taxação desde o dia 1 e todos aqueles que colocaram sua credibilidade em jogo em nome desse governo saíram queimados.

Por exemplo, o próprio Felipe Neto, que assegurou a seus seguidores que Lula vetaria, pois, segundo ele, o próprio Lula teria dito isso apenas alguns dias atrás. Felipe Neto fez um vídeo injuriado, reclamando de ter sido enganado e do governo ter minado sua credibilidade. Sim, esse é o problema todo, Felipe Neto, a sua credibilidade. Não era como se ele não soubesse que esse governo não tem palavra, né?

Quando Lula prometeu que acabaria com orçamento secreto e não acabou, Felipe Neto não reclamou da falta de palavra. Quando Lula prometeu vacina e não cumpriu, Felipe Neto não reclamou da falta de palavra. Quando Lula prometeu acabar com desmatamento e não cumpriu Felipe Neto não reclamou de falta de palavra. Quando Lula prometeu acabar com os sigilos e não cumpriu, Felipe Neto não reclamou a falta de palavra. Mas quando pegou mal para a imagem dele, Felipe Neto ficou putaço. É pela democracia ou pelo ego, Felipe Neto? Cá entre nós, se eu soubesse que o Lula ia dar essa sacaneada e desmoralizada pública no Felipe Neto, eu mesma tinha cravado 13 na urna.

Outro desfavor é a pseudo-indignação do povo. Ainda dá tempo de reverter isso, ainda dá para forçar um veto do Lula. Mas, para isso, é preciso que vocês se mexam, façam muito barulho, tornem insustentável prosseguir com essa taxação. Não é o caso. Provavelmente pelo fato de brasileiro ser, em sua maioria, incapaz de compreender um mínimo do sistema tributário nacional e pela confusão que a militância digital criou. A Gislaine tá lá, xingando muito no Twitter com base no efeito manada, mas ela ainda não entendeu o que efetivamente vai acontecer.

Quando o imposto for realmente implementado Gislaine vai descobrir que vai pagar muito mais do que 20%, quando ela visualmente perceber que está pagando quase o preço de um produto extra para o Governo (dependendo do valor do frete, isso vai acontecer), aí sim será uma gritaria infinita. Mas aí será tarde demais. A falta de compreensão e cognição do brasileiro protege os políticos ladrões. E estes mesmos políticos se encarregam de deixar tudo bem mais confuso do que é em redes sociais, para que ninguém entenda nada. Ou seja, provavelmente o brasileiro não vai reagir a tempo para impedir essa taxação.

Mais um desfavor é a contradição da ideologia em si. Lula está taxando as comprinhas da Gislaine para “proteger a indústria nacional”, ou seja, pensando no bem-estar de empresa e empresário. Tirando dos pobres para dar aos ricos. E nem ao menos são os grandes empresários que fazem a economia do país girar, pois no Brasil as pequenas e médias empresas carregam tanto o emprego como a economia nas costas.

E ainda tem ignóbeis que dizem “não estão taxando o pobre, pois o pobre não faz compra internacional”. Faz sim, querido amigo descolado da realidade. O pobre não tem cem reais para gastar em uma blusinha de péssima qualidade da C&A, o pobre só consegue comprar blusinha chinesa.

Parece que para esquerdinha caviar o pobre como lavagem e caga no jornal, pois pobre nunca faz nada além disso. O pobre será taxado na sua brusinha, com um valor que pode até dobrar seu preço, enquanto o rico pode viajar e trazer até mil dólares de mercadoria sem pagar nenhum imposto. A mim parece desproporcional permitir que o rico gaste até mil dólares sem imposto e que comprinha de 10 dólares do pobre seja taxada.

Então, não bastasse o Partido dos Trabalhadores sacanear o trabalhador (deixando suas comprinhas mais caras), também está sacaneando o pequeno e médio empresário, que comprava coisas para revender, gerava emprego e movimentava a economia do país.

O modelo de negócio de muita gente vai quebrar. E tudo isso para beneficiar Velho da Havan, Luiza Trajano e outros empresários. E ninguém parece sequer estar percebendo isso. A bolha vermelha insiste que Lula é perfeito e faz ginástica argumentativa para justificar cada merda, a bolha Talkei insiste que Lula é ex-presidiário e fornece mamadeira de piroca em colégio. Fake são sempre as News dos outros, né?

Para terminar, temos como desfavor a burrice em si de comprar essa briga. Lula está com a popularidade no chão, fazer uma merda dessas é um suicídio político. Quando Gislaine receber a primeira fatura da compra com 45% de imposto vocês imagina o que vai acontecer com o nome do Lula, né?

Ele poderia ter negociado qualquer coisa, menos algo que impacta diretamente no bolso do povo. O brasileiro não é atento, ele deixa político roubar, basta que consiga consumir minimamente o que gosta. Mexer no poder de compra do povo é pedir para dar merda, deveria ter negociado outra coisa e vetado a taxação.

E, não me entendam mal, eu adoro que Lula e o PT sejam burros e odiados, assim não se elegem mais. O que eu classifico como desfavor é uma pessoa com mais de 40 anos de política e 80 anos de idade ser assim tão burra e ainda assim conseguir se eleger. Que boa bosta é o Brasil, não?

Bom, fica a dica: ainda dá para fazer barulho, ainda dá para fazer pressão e fazer o Lula se cagar nas calças de medo e vetar essa taxação. Agora é com vocês.

Para dizer que se chama Gislaine e está ofendida (ofenda-se com seus pais), para dizer que está rindo da cara do Felipe Neto ou ainda para dizer que mesmo se fodendo junto está achando muito bem-feito: comente.

SOMIR

Não é novidade para ninguém que políticos mentem, especialmente quando querem manipular a opinião pública perto das eleições. Saia perguntando por aí e a maioria das pessoas vai te dizer que não acredita neles. É um fato da cultura popular; político mentiroso é figura de expressão, além de pleonasmo.

Existe uma boa discussão sobre essa mentalidade ser saudável ou não para uma nação, afinal, excesso de desconfiança complica qualquer tipo de acordo. Difícil se comprometer com alguma coisa quando você acha que toda estrutura de poder acima de você está mentindo. Ovo e galinha, de uma certa forma: o político mente porque o povo não leva a sério ou o povo não leva a sério porque o político mente?

Mas esse não é o tempo verbal correto: não existe uma boa discussão, existiria uma boa discussão. Porque nem nessa parte chegamos ainda. Não adianta pensar em começar a confiar em políticos se o sistema impede que pessoas confiáveis sequer consigam cargos de poder.

O pior é que ainda começamos a lidar com a profusão de notícias falsas no meio desse processo. Ninguém aprendeu que políticos mentem por causa das Fake News, mas começamos a lidar com a ideia de não são apenas promessas falsas, são informações falsas também. O cidadão médio do passado tinha uma linha de divisão entre fatos e versões, ele acreditava na informação e desconfiava do que o político prometia a partir dela.

Essa linha se desfez. A mídia nunca foi 100% honesta, e sempre misturou interesses de pessoas mais poderosas no meio da informação. Informações falsas não são uma novidade do nosso tempo, só tem mais gente confrontando as que recebe. Então, por um lado é positivo que vivamos em tempos mais desconfiados, mas aí voltamos àquela discussão sobre isso ser saudável ou não para a sociedade.

Quando a ideia de Fake News realmente se assenta na cabeça de uma pessoa, uma fonte de estabilidade desaparece. Nem o jornal serve mais como lugar onde as informações são confiáveis. O problema é que a alternativa é trabalhosa: estudar sobre os temas e selecionar com cuidado seus curadores de conteúdo. Você ainda pode se manter decentemente informado sobre o mundo, mas exige um pouco mais de base e esforço para sentir aquela segurança de novo, a segurança de que não está ficando maluco e perdendo a noção da realidade.

Qual a alternativa mais fácil para retomar essa segurança? Simples: a bolha. A bolha reforça suas crenças e te dá uma sensação de realidade compartilhada com outros seres humanos. Você pode ser a pessoa mais segura de si do mundo, mas seu cérebro foi selecionado evolutivamente para se acalmar só quando mais pessoas estão enxergando a mesma coisa que você. Consenso é segurança, e isso vem de longe na nossa história.

E aqui eu volto para o tema das comprinhas nos sites chineses: vimos como a bolha cria uma ilusão na cabeça das pessoas. Acreditaram que Lula e cia. estavam lutando contra a taxação sobre os mais pobres, mesmo que a realidade não corroborasse com isso. O plano, visível para todo mundo que se desse ao trabalho de acompanhar política, era aumentar arrecadação sem cortar custos. Essa é a mentalidade petista. Longe de mim querer discutir com profundidade se esse tipo de planejamento econômico é melhor ou pior neste texto, mas era previsível que aumento de impostos estava na mira do governo.

Mas a bolha buscou segurança repetindo o que queria ouvir. Políticos, influencers e até a primeira-dama falaram sem parar sobre como isso não ia acontecer, como o pobre não seria taxado porque, é claro, um governo de esquerda jamais faria isso com o povo!

Esse é o dano secundário da era da Fake News: a confiança nas notícias desaba e precisa ser recuperada de alguma forma. A forma mais fácil é criar mais Fake News, mas do outro lado. A pessoa quer acreditar em alguma coisa, só mentir algo que ela esteja mais disposta a ouvir que ela topa feliz da vida. É mais do que desinformação, é uma escolha cada vez mais polarizada entre qual a mentira que você quer ouvir.

A verdade é chata e cheia de nuances. Eu já escrevi um texto chato e cheio de nuances sobre a taxação dessas compras. O resumo é que o imposto sempre existiu, não foi criado à toa, mas por muito tempo o governo não quis correr atrás desse dinheiro. Meio como o diretor de presídio que faz vistas grossas para os celulares dos presos para não causar uma rebelião. O custo-benefício de fingir que não tinha imposto de produtos comprados de empresas era suficiente. Chegou um governo que queria esse dinheiro.

Eu ainda acho que é um imposto errado, porque taxa desproporcionalmente pessoas mais pobres e ainda por cima não muda nada na indústria nacional, que não pode/quer/tenta competir com os chineses. Mas percebem como a conversa fica rapidamente mais chata e difícil de lidar quando você fura as bolhas? É mais eficiente mentir quando você tem as bolhas. Seus defensores vão acreditar em tudo, e vão engolir qualquer desculpa quando você for provado como mentiroso. Lula não mente nem demonstra características ruins de personalidade, apenas se engana, sempre cheio das melhores intenções. Bolsonaro também.

Santos dentro da sua bolha. E fora dela, Fake News perigosas! Esse caso do governo mentindo na cara dura e tentando passar o imposto como um jabuti num acordo com o Legislativo só demonstra como eles acreditam que vale o risco. Concordo com a Sally que é um tiro no pé, mas depois de um tempo o povo esquece, e aí talvez o PT tenha o dinheiro extra tirado dos bolsos dos pobres sem uma rejeição enorme durante a próxima eleição presidencial.

E é a bolha que garante isso. Pessoas escolhendo qual mentira vão aceitar para não ter que lidar com o fato de que mentiras surgem sem parar dos dois lados. Pelo menos se você acreditar nas mentiras de uma bolha, você pode se convencer que está tudo bem e não está ficando maluco.

Eles mentem porque funciona. Uma ou outra podem dar errado, mas a estratégia do milênio continua sendo mentir muito para diluir o risco de cada mentira individual. E um sistema alimenta o outro: mentir deixa as pessoas com medo de acreditar nas informações que recebem e as incentiva a buscar uma bolha o mais rápido possível para não viver para sempre nesse estado de ansiedade e estresse.

E nesse processo, a conversa sobre quando começar a confiar para ter os benefícios de dar uma chance aos políticos de fazer coisas impopulares que precisamos fica em segundo plano. A confiança não vai ser merecida, vai ser criada por medo do outro lado, e esse tipo de confiança “me engana que eu gosto” nunca vai gerar bons resultados, vide história.

Para dizer que não sabe mais no que acreditar, para dizer que o House estava certo, ou mesmo para dizer que tem uma conversa muito séria sobre o que a China faz com seus produtos baratos para destruir a concorrência (um dia eu escrevo sobre isso): comente.


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