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Viagem complicada.

Grandes objetos geram grandes impactos. Um asteroide gigantesco com certeza causaria uma pancada monstruosa, seja num planeta ou numa nave voando livre pelo espaço. Mas existe outra forma de gerar colisões violentas: velocidade. E isso é uma péssima notícia para nossas pretensões de viajar pelo espaço.

Em tese, é impossível passar da velocidade da luz. A matemática e os experimentos gerados pela física demonstram que algo ao redor de um bilhão de quilômetros por hora é o limite. Mas isso só acontece em condições ideais: essa velocidade só é alcançada pela luz (e outras frequências eletromagnéticas) num vácuo perfeito.

Apesar de parecer muita coisa, nas medidas do universo, na verdade é bem lento. Na velocidade da luz, demoraria mais de 4 anos para chegar na estrela mais próxima. Imagina só, o velocímetro da sua nave dizendo que você está passando de um bilhão de quilômetros por hora, e mesmo assim a duração da viagem para a estrela mais próxima é calculada em anos!

Se você quiser chegar na galáxia vizinha de Andrômeda, é bom trazer um livro ou um trilhão deles para passar o tempo: na velocidade da luz, são mais de dois milhões e meio de anos para chegar. Um dos melhores argumentos para explicar por que não vemos aliens por todos os lados é que a maioria das viagens pelo espaço são muito longas, talvez longas demais.

Mas aí, a física tem outro problema para resolver: os tempos que eu mencionei são baseados na velocidade da luz. Nós não somos luz. Nós temos massa. A luz chega na velocidade que chega porque não tem isso. Uma nave espacial e um grão de poeira tem massa demais para chegar nessa velocidade, porque qualquer massa é suficiente para impossibilitar aceleração até a velocidade da luz.

Quanto mais você acelera algo com massa, mais energia é necessária para continuar acelerando. Chega uma hora que para passar da velocidade da luz, você precisaria empurrar um objeto com energia infinita. Salvo alguma solução “mágica” no futuro, nosso limite máximo de velocidade vai estar abaixo da velocidade da luz. Provavelmente muito abaixo.

A NASA já conseguiu acelerar uma sonda espacial a mais de 630 mil quilômetros por hora. Um pouco abaixo do bilhão da velocidade da luz, não? Quanto maior o objeto, mais energia é necessária para acelerar. No espaço existe a vantagem de não ter quase nada para atrapalhar a aceleração, mas o problema de precisar de mais e mais energia para continuar o processo continua valendo.

Estimativas otimistas sobre a tecnologia humana, conhecida e teórica, sugerem que estaremos muito bem se conseguirmos chegar a 10% da velocidade da luz com qualquer uma de nossas naves. O que faria a viagem até a estrela mais próxima (Proxima Centauri) durar pelo menos 40 anos. E esse valor ainda não é realista: você não começa nem termina a viagem com 10% da velocidade da luz, precisa acelerar até ela e depois, caso você queira parar na destinação, precisa desacelerar.

Passaríamos a maior parte do tempo fora dessa velocidade, com o pé no acelerador ou no freio. Com muita boa vontade, pelo menos metade do tempo assim. Os 40 anos se tornariam uns 80. A velocidade média cairia bastante. E novamente, eu estou falando sobre um cenário otimista de 10% da velocidade da luz.

Mesmo se tivéssemos uma fonte praticamente mágica de energia, o limite continua sendo 99,9% da velocidade da luz, porque chegar nela mesmo exige mais energia que a existente no universo. Sim, mesmo que a bateria da sua nave fosse todo o universo, faltaria energia para chegar nos 100%.

E aqui, começamos a nos preocupar muito mais com os resultados de estar numa velocidade relativística, ou seja, uma velocidade tão grande que começam a acontecer coisas que o Einstein previu. A gente está acostumado com uma realidade onde a luz é incomparavelmente mais rápida que qualquer um dos nossos sentidos. Tudo fica diferente quanto mais rápido vamos, afinal, a própria luz começa a se mover numa velocidade diferente em relação a nós.

Além de ver um universo alucinógeno onde as cores e as formas ficam totalmente diferentes (nosso cérebro aprendeu a entender a realidade sem velocidades relativísticas), a energia necessária para te acelerar criaria um potencial de colisões espetaculares. Quem já tomou uma bolada sabe: quanto mais rápido vem o objeto, mais dolorido ele é.

Agora, imagine isso com velocidades nos milhões de quilômetros por hora… nem precisa ser o bilhão da velocidade da luz, qualquer fração considerável dela coloca uma energia de impacto gigantesca até em grãos de poeira. Se sua nave estiver a 10% da velocidade da luz e encostar numa pedrinha que mal consegue se sentir entre os dedos, basicamente tudo o que encostar vai virar energia pura.

Ou seja, é como tomar uma bomba atômica na cara a cada grão de poeira. Esse é um problema muito sério para qualquer tentativa de viajar nessas velocidades relativísticas. Por mais que o espaço seja muito vazio em média, numa viagem de trilhões e trilhões de quilômetros a chance de encontrar qualquer coisinha no caminho é bem grande.

Aliás, só um aparte: aqueles campos de asteroides de filmes espaciais praticamente não existem na realidade. Se você atravessar um deles, vai ter sorte de sequer ver um. É tudo muito grande e espaçado. Se você atravessar com menos de 1% da velocidade da luz, é praticamente impossível bater em qualquer coisa grande o suficiente para causar danos.

O problema é que a velocidade acumula perigos, e acumula rápido: cada 1% de velocidade adicionada vai adicionando potencial de impacto mais e mais terrível. Se fizermos a supernave que acelera até 99,9% da velocidade da luz, ela vai explodir aleatoriamente em basicamente qualquer lugar do universo. Nenhum sistema vai conseguir perceber a tempo, e mesmo se perceber, boa sorte mudando a rota de algo acelerado a quase um bilhão de quilômetros por hora.

Existem ideias de colocar escudos na frente da nave, feitos de algum material teórico que aguente o tranco ou um campo magnético poderoso que desvie esse tipo de detrito sem transferir o impacto para o corpo dela. Eu acredito que uma humanidade capaz de acelerar nessa velocidade vai bolar alguma solução, mas vai depender de tecnologias que ainda não conhecemos.

E seja como for, salvo alguma quebra de paradigma considerável eliminando o limite de velocidade atual, há muito o que se questionar sobre a viabilidade de colonizar o espaço nessa velocidade. Considerando uma vida humana média de uns 100 anos no futuro, ainda sim as pessoas que saírem da Terra para a viagem não vão chegar vivas no destino. E por mais que saibamos o valor de investir em vantagens futuras, será que as pessoas vão fazer planos para 200, 400… 1.000 anos no futuro?

Colonizar o Sistema Solar faz mais sentido: mesmo que com a tecnologia atual demore alguns anos para chegar nos recantos mais distantes da nossa vizinhança, ainda vai ter gente chegando viva no destino. E as pessoas que investirem nisso podem ver algum retorno, nem que seja para os filhos. Muito por isso que eu levanto essa possibilidade de mesmo que aliens existam, a maioria provavelmente não consegue ou não vê vantagem em fazer viagens tão longas assim.

Se você não for uma consciência digital, passa de todos os limites razoáveis de manutenção de vida no vácuo espacial. E mesmo que você já seja um conjunto de zeros e uns, a entropia não desliga só porque você quer: armazenamento de dados e manutenção de sistemas ficam exponencialmente mais complexos com o passar de séculos e milênios. Peças falham, precisam ser substituídas, energia pode variar, memórias podem ser corrompidas por partículas espaciais…

Existe um argumento sólido para estarmos isolados por limites universais de praticidade de colonização espacial. Eu considero ONVIs extraterrestres e aliens na Terra na mesma categoria de fantasmas e deuses atualmente porque é muito improvável que as regras do universo sejam quebradas. Não é impossível, mas é muito mais torcida do que lógica nesse ponto do nosso conhecimento.

E não se enganem, dá para ter um futuro brilhante pelos próximos bilhões de anos mesmo no nosso pedacinho de universo. A pós-vida digital pode não se importar de fazer planos que duram centenas de milhares de anos para ter resultados, mas teríamos que mudar todos os paradigmas humanos, e resolver alguns problemas técnicos consideráveis. O futuro permite tudo, inclusive nada.

Estamos tão no começo da história do universo (previsão de durar incontáveis trilhões de anos), apenas poucos bilhões de anos, que quase toda a história está para frente. Já disse antes, mas repito a analogia: se o universo fosse uma pessoa, nem teria dado o primeiro choro depois de nascer. Todos os limites e problemas descritos aqui podem acabar vencidos dado tempo suficiente, mas honestamente, talvez não tenha dado tempo ainda de vencer a barreira da luz, da energia infinita para acelerar massa até ela, e o que me chamou atenção para escrever este texto: a partir de velocidades contadas em porcentagens da velocidade da luz, você pode tomar uma pancada do tamanho do meteoro que extinguiu os dinossauros com uma pedrinha de gelo minúscula batendo na sua nave.

O universo não é para amadores.

Para dizer que preferia drama do que nerdice, para dizer que eles estão entre nós, ou mesmo para dizer que é uma versão hardcore do mosquito no para-brisa: comente.

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