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Calor!

Calor!

| Somir | | 16 comentários em Calor!

O Brasil está vivendo uma onda de calor terrível. Em cidades famosas pela temperatura elevada como o Rio de Janeiro, chegaram a registrar sensação térmica de mais de 58º! Mas dessa vez o exagero está chegando em basicamente todos os lugares do país. Eu vivi meus primeiros 40º há pouco tempo. Se este fosse um texto da Sally, ela te ensinaria a se cuidar no calor. Mas é um texto meu… então vamos falar sobre o que é o calor.

O universo nunca fica parado, das maiores às menores escalas da matéria. A energia liberada pelo Big Bang ainda está presente hoje em dia, e uma grande parte dela se manifesta através da energia térmica: a vibração das partículas que formam a matéria é o que dá a temperatura aos objetos. Quanto mais energia de movimento nessas partículas, maior o calor.

Se esse movimento parasse, chegaríamos no que se chama de zero absoluto: a menor temperatura possível, e totalmente teórica. Todas as partículas fundamentais estariam paradas de vez num local que chegou ao zero absoluto. Não temos nenhuma medição desse mínimo até hoje, e mesmo nos laboratórios mais modernos da humanidade, chegamos muito perto, mas nunca exatamente nesse mínimo.

Em tese, o zero absoluto é impossível, porque sempre sobra alguma coisa movimentando as partículas de um sistema, mesmo que seja de forma praticamente imperceptível. Coisas da física quântica e das incertezas que aparecem nessa escala da matéria.

Indo para o outro lado da escala, quando a energia desse movimento das partículas aumenta, a temperatura aumenta, e até onde sabemos, não existe limite de quão quente alguma coisa pode ser. A superfície do Sol alcança alguns milhares de graus Celsius, já o seu interior chega aos milhões. Energia suficiente para desmontar e remontar átomos, que por sua vez liberam mais energia no processo e mantém o calor incrível dentro da estrela.

E o Sol é fichinha perto das maiores temperaturas já medidas: dentro de um quasar (um buraco negro enorme girando em alta velocidade) bateu mais de 10 trilhões de graus! E nem faz diferença a escala que você usa, Celsius, Fahrenheit e Kelvin dão basicamente no mesmo quando você começa a sair de perto da temperatura normal das coisas na Terra.

E falando nisso, as escalas: a escala mais científica de todas é a Kelvin, que coloca o zero no zero absoluto e vai subindo a partir daí. Faz sentido, tem limite de quanto pode descer, mas não de quanto pode subir. Celsius é a mais comum de usar em países que adotam o sistema métrico. Vai de 0 a 100 de acordo com estado da matéria da água. 0 sólida, 100 gasosa.

Especialmente nos EUA, usa-se a escala Fahrenheit, que é baseada em sensação térmica das pessoas em condições “seguras”. Ou seja: 0 é muito frio, mas possível de sobreviver, 100 é muito quente, mas possível de sobreviver. Quando americanos falam sobre temperatura, é mais ou menos nessa lógica: 0 Fahrenheit é -17 em Celsius, 100 Fahrenheit é 37 em Celsius. É bem menos maluca quando você entende por que fizeram isso.

E falando em sensação térmica, durante um tempo o universo todo foi bem agradável para a maioria de nós: depois do Big Bang, a temperatura geral do universo era altíssima, com números que nem fazem sentido para a física. Quanto mais se expandia, mais esfriava. Hoje o espaço tem uma temperatura média de 2 graus Kelvin, ou algo próximo de 270 negativos em Celsius. Volte vários bilhões de anos, para os primórdios da existência, e você provavelmente conseguiria ficar confortável mesmo fora de um planeta. Durante um tempo, o espaço “vazio” esteve na sua temperatura favorita. Claro, com doses instantaneamente letais de radiação e nenhum oxigênio, mas temperatura? Tranquilo, tranquilo.

Tanto que pode-se estimar que a vida começou naquela época, porque em todos os lugares havia condições de água líquida e seres unicelulares costumam gostar de uma água morna. É toda uma viagem imaginar se dava para evoluir muito naquelas condições, mas impossível não era. A vida pode ter se criado lá no comecinho do universo e ter viajado por diversos lugares até cair aqui na Terra.

Com o passar dos bilhões de anos, o espaço se expandiu tanto que o movimento das partículas ficou mais difícil de ser transmitido para as outras. O vácuo é o melhor isolador de temperatura: calor precisa de “coisas encostando” para ser transmitido. É por isso que existem aqueles copos de isolamento térmico com um vazio entre o líquido e o exterior: o calor não entra nem sai se não tiver por onde ser transmitido.

O universo maior cria mais espaço entre as coisas, complicando a transmissão de calor. Até por isso um dos grandes desafios de conquistar o espaço é o que fazer com o calor: a gente precisa de muita energia para fazer as coisas funcionarem como esperamos, mas no espaço não tem para onde jogar o calor que essa energia gera. Um motor de uma nave espacial tem muitas dificuldades de não sobreaquecer, porque mandar calor para o vácuo não é uma opção.

O que não quer dizer que seja trivial eliminar calor aqui na Terra: o ar é capaz de transmitir calor, mas não é muito eficiente. Como já vimos, quanto menos densidade, menos a capacidade de passar calor de um lado para o outro. Por isso muitos computadores modernos usam água para refrigerar as peças: a água é bem mais eficiente por ser bem mais densa que o ar.

Melhor do que isso, só um metal muito denso e com muita área exposta para transmitir o calor. Panelas são feitas de metal por causa disso: o calor da chama passa de um lado para o outro com facilidade. Somando essas duas ideias, chegamos ao ar-condicionado: ele funciona porque transfere o calor do ambiente para outro com muita eficiência. Tem um líquido especial dentro dos seus tubos metálicos que coleta calor e o empurra para outro lugar (por isso todo ar-condicionado tem uma parte apontada para fora do ambiente, que é onde o calor vai ser jogado). Tem todo um lance de pressão no líquido para acelerar o processo, mas isso já foge ao escopo deste texto.

Que eu nem sei qual é… o calor está mexendo com o meu cérebro. Talvez seja o momento de vir para o corpo humano: nossos corpos têm uma temperatura ideal de funcionamento, perto dos 36º. E isso independe da temperatura externa: somos animais de sangue quente cujo metabolismo não gosta de variações. Por sorte, só de estarmos vivos já produzimos muito calor. O processo constante de gerar energia através de processos químicos dentro das células e até mesmo a fricção entre células já garante que estamos sempre criando nosso próprio calor.

Mas como tudo na vida, precisamos de moderação. Quando seu corpo esfria muito, começa a falhar primeiro por um desespero do cérebro para manter quentes as partes essenciais, e depois pela simples realidade mecânica de que objetos perdendo calor para o ambiente deixam de estar no estado líquido. Somos 75% água, e água congelada não vive.

O que nos importa hoje é o lado do calor: quando a temperatura média do seu corpo começa a subir, ele começa a falhar também. Moleza e dificuldade de pensar são comuns (o que explica o Brasil) porque as reações químicas das quais dependemos não funcionam mais do jeito esperado, e no desespero de esfriar o corpo, seu cérebro manda a sua água para a pele, para ser evaporada e ligar o seu ar-condicionado natural.

Por isso é essencial se hidratar nessas ondas de calor: água é um dos recursos mais úteis que seu organismo tem para trocar calor com o ambiente, e ele vai querer usar o máximo possível. Calor é uma praga para acumular, e quanto mais ele se acumula num sistema, mais complicado é tirar ele de lá. Esse movimento das partículas é basicamente a última etapa da transformação da energia: depois dele não tem mais no que transformar, então ela fica lá até ter outro lugar para jogar ela fora.

Calor é o lixo da natureza. O Sol é uma metrópole mandando trilhões de caminhões de lixo para nós todos os dias, conseguimos reciclar uma parte (plantas e a vida em geral dependem desse lixo), conseguimos repassar outra para o espaço, mas a verdade é que o Sol vai jogar mais e mais lixo aqui até o planeta ser inabitável. E não estou falando da expansão física do Sol até a Terra em 5 bilhões de anos, o calor que a nossa estrela emite vai ficar forte demais para termos água em forma líquida em no máximo 500 milhões de anos. Já vi estimativas que a vida como conhecemos na Terra não dura mais que 100 milhões de anos com o aumento da emissão de calor da nossa estrela.

“Somir, tecnicamente não é calor, é…”

Eu sei, mas tecnicamente não explica as coisas. Quer saber a parte científica aprofundada? Pesquisa a parte científica aprofundada.

E eu já estou ficando bravo com um leitor imaginário, acho que é hora de terminar este texto altamente influenciado por calor que eu nunca senti na vida antes. Acho que o resumo de tudo é que calor é um lixo. Sim, é uma conclusão que faz sentido para mim agora.

Agora licença que eu vou dormir dentro da geladeira.

Para dizer que foi meu pior texto, para dizer que foi meu melhor texto, ou mesmo para dizer que não tem capacidade de decidir o que aconteceu por estar morrendo de calor também: somir@desfavor.com


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