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Calvo do Campari.

Calvo do Campari.

| Sally | | 40 comentários em Calvo do Campari.

O “coach” Thiago Schütz ficou famoso esta semana por ameaçar uma atriz que fez piada com um vídeo dele. O recado foi claro: “Você tem 24 horas para retirar seu conteúdo sobre mim. Depois disso é processo ou bala. Você escolhe”. Que essa atitude é imbecil, ninguém questiona, mas… e a forma como as pessoas reagiram a isso, o que nos diz?

Vamos contextualizar. Thiago Schütz se define como “escritor, palestrante e apresentador”, e cobra cerca de R$ 2.500 por uma “mentoria”, onde orienta a pessoa que o contrata. Ele faz parte de um grupo que alguns chamam de “influenciadores Red Pill” e possuí uma conta no Instagram chamada “Manual Red Pill Brasil”, com mais de 300 mil seguidores.

O nome Red Pill é uma deturpação bizarra da pílula vermelha do filme Matrix. No filme, o personagem principal precisa fazer uma escolha: toma a pílula azul e continua vivendo em um mundo de ilusões ou toma a pílula vermelha e vai para a realidade.

Esses “influenciadores Red Pill” acreditam que o que eles pregam é “a verdade” e quem não os escuta vive em ilusões. Por esse discurso, já dá para ter uma ideia do dano mental e de autoestima que essas pessoas sofrem. Não morrer de vergonha de se dizer detentor da verdade é a maior bandeira de desempoderamento que alguém pode levantar. Ainda assim, tem quem ache necessário apontar que ele é um babaca e tem que faça disso uma prioridade, mesmo quando tem coisa mais grave acontecendo.

Após o caso, ele ficou popularmente conhecido como “Calvo do Campari”, por causa de seu vídeo mais famoso, onde ele relata um caso que parece ser hipotético, de uma mulher que sai com um homem e o pressiona a tomar uma cerveja quando ele pede um Campari. Ele aconselha a não ceder à pressão feminina, se manter autêntico, não mudar para agradar uma mulher. Fiquei chocada com a obviedade, quão rudimentar tem que ser alguém que vê nisso uma grande revelação?

Estou vendo muita gente batendo no discurso dele, que certamente é um tremendo desfavor, por polarizar relacionamentos. Um relacionamento não é um cabo de guerra, uma competição, uma medição de forças. É uma parceria onde ambos convergem para o mesmo lado e tem o mesmo interesse: construir algo bacana e serem felizes juntos.

Mas a “irritância” parece nem ser por isso, e sim pelos pontos controversos específicos sobre mulher: critica mulheres de roupas curtas, sugere que homens não se relacionem com mulheres de mais de 30 anos ou que tenham filhos e muitas outras opiniões pessoais revestidas como verdades que parecem ter doído em muita mulher. Se é isso o que salta aos seus olhos nesse caso, bem, você tem um problema tão grande quanto o dele.

As pessoas têm o sagrado direito de pensarem o que quiserem e de estipularem os critérios que quiserem para procurar parceiros. Esse não é o problema. As pessoas têm o sagrado direito de viver a ilusão de que seus limitados pontos de vista são “a verdade” e quem não compartilha deles escolhe viver em ilusões. Esse não é o problema. O problema é ameaçar meter bala em quem faz humor com um vídeo seu.

Mas, parece que atualmente incomoda mais dizer que mulher com filho perde valor de mercado ou que mulher com certo comportamento vai ter dificuldade para casar do que ameaçar meter bala em quem faz humor com você. E essa inversão de valores, na minha opinião, é o grande problema que esse caso levantou, muito maior do que as falas infelizes do careca.

Por qual motivo incomoda tanto a mulheres que um homem venha a público dizer que mulher que faz x ou mulher que é y é menos valorizada ou atribuir a elas algo pejorativo?

“Mas Sally, é misógino, é machista, é escroto”. Tá bom, meu anjo, as pessoas têm o sagrado direito de serem tudo isso e muito mais. Deixa o cara ter os critérios dele, a escala de valor dele, as convicções dele. A única pessoa que perde é ele, pois o tipo de mulher que ele vai atrair tendo essa visão serão mulheres muito problemáticas. Uma pessoa que “dá liga” com isso é uma tremenda furada, podem ter certeza.

“Mas Sally, essa pessoa forma opinião e influencia”. Aí você vai me desculpar, mas eu discordo. Alguém que segue a pá de bosta que esse Clovis Bornay fala se identifica com isso, seja pelo motivo que for. Ele não “converte” ninguém, a pessoa já tinha isso dentro dela. Parece aquele papo de mãe cega de “meu filho é ótimo o problema são as más companhias”. Dá um tempo, é hora de cada um se responsabilizar por suas escolhas. Esses pensamentos povoam a cabeça de boa parte dos brasileiros.

Quando o Calvo do Campari fala, é nítido que ele não fala sobre o mundo e sim sobre o mundo dele. Quando ele fala das mulheres, é nítido que não fala sobre as mulheres do mundo e sim sobre o tipo de mulher que ele atrai para a realidade dele. Então, quando o Calvo do Campari fala, ele fala sobre sua vida. Quando ele dá “lições” de não ser submisso ou não sei mais o quê, ele está falando sobre ele mesmo, para ele mesmo.

Desculpa, mas eu acho que esse moço já se expôs o bastante (sem perceber) e se humilhou o bastante compartilhando essas coisas, não precisa de mais ninguém ficar chamando ele de feio, inseguro e tantas outras coisas. Se você não percebeu que ele mesmo se encarregou de se humilhar, sugiro que refine um pouco a sua percepção, vai ser muito útil na sua vida.

As pessoas têm o sagrado direito de terem suas convicções, por mais que elas não te agradem. Isso não tem que ser o centro das atenções. Uma pessoa te desagradar não tem que ser o centro das atenções, pois, adivinha, você não é o centro das atenções, pequeno floco de neve especial. Então, que tal focar no fato dele ameaçar uma mulher de morte por causa de humor? É sobre isso. Todo o resto é projeção da vida dele e, se você se irritou, projeção da sua vida.

Mas o povo não quer justiça, o povo quer humilhação. Já foram lá desenterrar coisa da vida do careca. Pegaram um reality show chamado “O crush perfeito” no qual o sujeito participou, anos atrás, onde ele levou um fora bastante humilhante de uma mulher de 50 anos. Não assisti a esta pérola, mas quem viu, diz que ele se apaixonou pela mulher e a disputou com outros homens e, quando foi rejeitado, chorou feito uma criança. Estão sambando na cabeça do coitado com isso.

Nada disso importa. Se as pessoas estivessem com o foco no lugar certo, em vez de apontar o dedo e dizer “foi rejeitado por uma mulher de 50, chorou e agora ficou com raiva e prega que tem que se relacionar com mulher nova” estariam atentos às acusações de golpes financeiros que ele recebeu, entre outros grupos, de jovens escritores.

Parece que o rapaz tinha (ou dizia que tinha) uma editora de livros e não se portou da forma mais correta. Entre outras acusações, escritores afirmam que ele apropriar de seus livros e da renda obtida com eles. As acusações são públicas, estão em redes sociais e não sabemos se são verdadeiras, mas merecem ser investigadas.

Já pararam para pensar que o motivo pelo qual coach, guru e estelionatários em geral sobrevivem no Brasil é justamente esse? As pessoas focam mais nas palavras do que nos atos. Na forma do que no conteúdo. “Se parece bem-sucedido, deve ser bom, vou confiar nele”. As aparências enganam.

Não vale à pena expor e humilhar o rapaz aqui, afinal, como já foi dito, cada um tem o direito às suas crenças e preferências e não deve ser punido por isso, mas gente, bastava pesquisar um pouquinho para vocês verem o que é a vida pessoal desse rapaz. Tá espirrando mais merda do que hipopótamo marcando território. As pessoas pagam 2500 reais sem sequer pesquisar quem vai atendê-las? Basta ter aparência de bem-sucedido?

Vamos olhar para o que corresponde: todos podem fazer ou deixar de fazer o que quiserem, desde que não esteja proibido em lei. No caso, ameaçar de morte não pode. E fica bem complicado dizer que não foi ameaça de morte, estava falando do quê? De dar uma bala de açúcar? Tomar o dinheiro das pessoas não pode. Se apropriar de obras dos outros, comercializá-las e não pagar aos autores também não pode. Assim como não podem outras denúncias sobre ele que virão a público em breve. E é nisso que se deve focar.

Quão neuróticas, mimadas e loucas estão as mulheres que fizeram escândalo pelo resto? Amiga, foda-se se ele só quer mulher nova, sem filho ou com quatro braços, sagrado direito dele ter preferências e defender estas preferências como algo bom. Por qual motivo te dói tanto? Tem que ver isso aí, pois essa dor fala sobre você, não sobre ele.

Não jogue sua dor nele, sua saúde mental é sua responsabilidade. Não tem como pedir para o resto das 8 bilhões de pessoas do mundo não falarem nada que te incomode, tem que aprender a não se incomodar com o que desconhecidos dizem. Tem problema de autoestima grande aí. Se incomodar com o que estranhos falam é sempre red flag de saúde mental. Mas é muito mais fácil colocar a culpa no escroto da vez, não é mesmo? É status bater nesse cara agora, a arrogância deles avalizou todo mundo a despejar tudo nele.

“Mas Sally é um escroto, lê isso aqui que ele postou…”. Meu anjo, eu não estou dizendo que ele é bacana nem que o admiro. Tá tudo bem, é um escroto (ou não, depende dos valores de quem vê). Sagrado direito dele ser um escroto. A lei não te proíbe de ser um escroto. Por qual motivo as pessoas perdem tempo patrulhando escrotos? Você pode criticar, você pode dizer que discorda, mas porra, se deixar abalar, se alterar, brigar, sentir raiva? Francamente, sejam melhores.

“Mas Sally, tem um monte de homem como ele”. Ah, agora chegamos num ponto interessante. Talvez muito da revolta da mulherada seja por isso: quando um idiota ganha voz, ele ganha também o poder de reunir no seu entorno outros idiotas como ele e, quando se juntam, os idiotas ganham força. Eu concordo que dá tristeza ver o tanto de hominho perdido na vida que tem no Brasil, mas essa é uma realidade e não é culpa do Calvo do Campari.

E, vamos colocar a mão na consciência, para cada hominho perdido na vida, tem uma mulezinha igualmente perdida na vida. Para cada comentário ruim sobre mulher, tem outro sobre homem. Não preciso relembrá-los das barbaridades que feministas andaram dizendo sobre homens nos últimos anos, certo? A coisa mais bonita que disseram é que “todo homem é um estuprador em potencial”. Então, menos dessa superioridade moral de taxar homem de idiota e mulher de senhora da sensatez. Na real, quase todo mundo no Brasil tá bem prexeca das ideias.

A conta é bem fácil de fazer: se formos patrulhar, nos chatear, nos alterar pela babaquice alheia, vamos gastar uma parte considerável das nossas vidas falando dos outros, com foco nos outros. Não seria muito melhor usar esse tempo e energia para olharmos para nós mesmos, para nossas vidas, para o que está ao nosso alcance melhorar e mudar?

Não estou dizendo que não se possa criticar, nós criticamos tudo e todos aqui. O que estou dizendo é que quando a fala do outro te afeta, dói ou incomoda, aí o problema deixa de ser o outro e passa a ser seu. E não adianta tentar jogar ele para o outro, a realidade não liga a mínima para a sua narrativa, o problema existe e, enquanto não for resolvido, vai atrapalhar a sua vida.

Curioso… a forma como se fala ou se critica também nos diz muito sobre a pessoa. O tanto de mulher chamando esse sujeito de broxa, pau pequeno, viado e coisas no estilo me surpreende. O que tem a ver?

Sério, o que tem a ver? Pode criticar o careca, ele agiu errado, mas porra, isso é simplesmente bater de volta. Se uma mulher falar besteira e os homens reagirem xingando ela com alguma característica física pejorativa, certamente essas mesmas mulheres que estão esculhambando o Calvo do Campari vão achar ruim. Então, por coerência, não deveriam chamar de “pau pequeno” e outras coisas.

Vou repetir pela milésima vez aqui: a forma como escolhemos agredir os outros diz muito sobre nós mesmos. Nos expõe. Vejo muita gente “xingando muito no Twitter” achando que está causando um dano enorme ao outro e, na verdade, não está irritando o outro e ainda está se expondo, mostrando exatamente onde dói nela e o que tem dentro dela. Se alguém xinga a aparência física do outro, pode ter certeza de que é onde doeria na pessoa. E, além de tudo, deixa a pessoa sem moral para reclamar.

Essa crença de que o erro do outro autoriza o seu é um câncer. Se o sujeito falou algo pejorativo sobre mulheres e uma mulher responde com algo pejorativo sobre homens, ambos são a mesma porcaria. O erro do outro não endossa o seu erro, você se rebaixa ao nível do outro se quiser e, se o fizer, vai se tornar exatamente o mesmo que ele: aquilo que criticou.

O que precisa ser olhado, discutido e cobrado é uma consequência para quem se comporta contra o que diz a lei, pois o cumprimento da lei é de interesse de todos. Então, a grande pergunta é: vai ficar impune um sujeito ameaçar de morte uma mulher por causa de humor?

E isso passa longe de sexo: fosse homem ameaçando homem, mulher ameaçando mulher, hermafrodita ameaçando trans ou a combinação que vocês desejarem, não faria diferença. Não se pode ameaçar ninguém por fazer piada com você, primeiro por ser proibido por lei, segundo, por ser de uma imbecilidade infinita, mostrando para a pessoa que doeu, que pegou em uma insegurança sua.

O que nos leva a outro ponto, este mais sofisticado do que a média das pessoas pode alcançar: independente de concordar ou discordar com o que alguém fala, é de uma burrice galopante pagar mentoria, consulta ou o nome que for para uma pessoa insegura te ensinar algo. O brasileiro parece não saber fazer esse filtro. E, spoiler, inseguros não são apenas os que ameaçam aqueles que riem deles.

Ególatras são inseguros, vitimistas são inseguros, vaidosos são inseguros e tantos outros tipos que rotineiramente vemos vendendo sua mentoria. Tem que ser muito idiota para pagar uma pessoa insegura achando que ela pode te ensinar algo. A única coisa que um inseguro pode fazer é reforçar a sua insegurança, validá-la, endossá-la, te fazendo sentir ok por ser inseguro, estimulando que você se acomode no chiqueiro de merda comportamental no qual está. Sério mesmo: não se paga a inseguro para te ensinar nada.

Então, a mensagem final é: quem quiser fazer algo em busca de um país melhor, fiscalize que essa ameaça (e todos os outros supostos crimes) não caiam no esquecimento e sejam punidos, mas sem piti, sem faniquito, sem sentir raiva ou se afetar com isso. Certamente tem coisa mais importante acontecendo na sua vida.

E, se você não consegue não se afetar quando vê uma coisa dessas, hora de olhar e trabalhar essa questão, pois o problema está em você e provavelmente está te prejudicando em diferentes níveis.

Hora de separar as responsabilidades: quem viola a lei precisa arcar com as consequências disso, mas se alguém te irrita, te aborrece ou te ofende, é sua responsabilidade aprender a lidar com críticas ou pensamentos diferentes. A ofensa está na cabeça do ofendido.

Para dizer que quer responsabilizar os outros por se ofender, para dizer que todos os homens são assim (todos os homens que VOCÊ atrai são assim) ou ainda para dizer que crime ocorre e nada acontece feijoada: sally@desfavor.com


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