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Irritação futura.

Irritação futura.

| Desfavor | | 32 comentários em Irritação futura.

Sally e Somir não gostavam do Bolsonaro, mas não estão felizes com a troca dele pelo Lula. Junto com o novo presidente, novas formas de encher nossa paciência… mas qual a pior? Os impopulares fazem suas previsões.

Tema de hoje: O que vai ser mais irritante no governo Lula?

SOMIR

Os bolsonaristas fingindo que são perseguidos… se tinha algum alento no governo que se despede em 2023, era a presunção de poder que a turma da conspiração tinha. Fica meio complicado se fazer de perseguido político quando o governo está do seu lado, não? Por mais que eu não veja muita complexidade mental na turma que pede intervenção militar alienígena, isso pelo menos baixava um pouco a bola deles.

O bolsonarismo é o nome brasileiro da ideologia conservadora-conspiratória que se formou nos EUA nas últimas décadas. Não, os americanos não inventaram o conceito de doutorado em ignorância, mas como sempre, souberam transformar isso num grande negócio. A rejeição à intelectualidade e à ciência é um padrão comum na história humana, mas nunca teve tanto suporte tecnológico para angariar e manter uma base ativa de simpatizantes.

E da mesma forma como vimos nos Estados Unidos, durante o período que estiveram no poder, o problema fundamental dessa ideologia de rejeição à modernidade e ao consenso sobre o que é a realidade gera um governo fraco e incompetente que acaba ridicularizando seus defensores. Bolsonaro passou quase quatro anos no poder e saiu com uma imagem pior que entrou. Não estou dizendo que tudo feito no seu governo tenha sido ruim, estou dizendo que quando ele errou, errou de forma tão retumbante que perdeu a batalha pela narrativa na mente das pessoas.

O que eu quero dizer é que o Bolsonaro era um dos piores inimigos do bolsonarismo: toda vez que teimava contra a realidade e seguia a ideologia maluca copiada e colada dos americanos, acabava com situações vexatórias na melhor das hipóteses e algo muito próximo de genocídio na pior. Estar no poder não era a melhor das situações para o movimento. Afinal, quem está no poder acaba responsabilizado pelos erros.

Tanto que só quando o seu gado acreditou em uma conspiração para tirá-lo do poder que vimos a extensão do suporte que ainda tinha Brasil afora. Durante a pandemia, os bolsonaristas latiram bastante, mas não chegaram a morder. E não fosse o colapso psicológico do Neymar do Executivo ao perceber a derrota nas urnas, talvez seus defensores tivessem sido ainda mais agressivos.

Não foi o caso, ainda bem. Pior que a democracia da estupidez que domina o Brasil agora, só uma autocracia da estupidez. O brasileiro médio correu para o que considerava o lado oposto e elegeu Lula. Isso tirou os poderes do líder do bolsonarismo, mas ao mesmo tempo deu uma grande oportunidade do movimento se sentir em casa: permite que o gado verde e amarelo se sinta perseguido pelo gado vermelho. E melhor ainda, os erros a partir de agora podem ser atribuídos ao PT sem a desconfortável resposta de que eram eles que estavam no poder.

O tema de hoje é o que vai ser mais irritante, e eu aposto minhas fichas nos bolsonaristas ficando mais animados e eficientes na captação de novos adeptos com a posição mais confortável de estarem fora do poder. Para quem precisa da ideia de estar sendo oprimido pelas elites satânicas pedófilas para fazer senso do mundo, não estar no poder é um lugar feliz. As conspirações podem correr soltas, afinal, não tem mais como dizer que eles estão no controle.

Eu não gosto do prospecto de uma narrativa de perseguição animando a base bolsonarista nos próximos anos. Ainda mais considerando que o Lula pegou um país bagunçado pela incompetência de muitos ministros malucos, militares inúteis e presidente frouxo com o poder que ele entregou para o Legislativo e o Judiciário nesse meio tempo. O governo petista tem tudo para ser complicado mesmo se Lula fizesse tudo direito. Já dá para notar que nem isso vamos ter… Haddad de ministro da Fazenda já é um sinal de que o sapo barbudo vai querer controlar tudo sozinho. Deu super certo quando a Dilma fez, né?

Quanto mais Lula errar, mais munição para radicalizar o brasileiro médio que mal sabe diferenciar o braço esquerdo do direito, quanto mais entender política. Nesse combo nefasto de conservadorismo, religião e rejeição à realidade com conspirações, vejo muito espaço para o movimento crescer e contaminar ainda mais gente.

População com interesse em política é uma boa coisa, população com interesse em campeonato de opressão é o total oposto disso. Os lacradores vão continuar com a chatice de sempre, mas ainda tem um pouco de controle por causa dos intelectuais que ainda fazem parte do movimento; os bolsonaristas basicamente só tinham o Olavo de Carvalho. Que era uma besta, mas pelo menos tinha um pouco mais de assunto que Ursal e rituais satânicos (não muito mais, mas tinha).

O bolsonarismo está numa fase que permite o crescimento de novos líderes, e pela forma como se desenvolveu nos últimos anos, esses líderes provavelmente vão ser influencers de teorias conspiratórias que sabem se comunicar em vídeos curtos e nada mais. A parte política do movimento começa a debandar para o lado do poder vigente, peneirando os mais malucos/midiáticos como suas cabeças.

A tentação de ir 100% para o lado conspiratório vai ser grande, e eu duvido muito que quem ganha a vida com isso vai se controlar. Vai ser de terraplanismo para baixo na luta por audiência nos próximos anos, tudo com o bônus de “não ter culpa” por nenhum dos problemas brasileiros. Talvez Bolsonaro faça como Trump e tente retomar a cabeça do movimento nos próximos anos, mas a versão americana me pareceu mais resiliente, sem ficar de chororô pelos cantos. Veremos.

E antes que reclamem: eu sei que se você é de direita não é necessariamente bolsonarista, e eu sei que não é todo mundo que votou nele que fica com esse culto de personalidade bizarro; só que não dá pra tirar o seu da reta de vez, afinal, você no mínimo está tolerando esses malucos por conveniência. Eu sou o “chato dos direitos humanos” em quase todas as conversas que tenho, mas não defendo ideologia anticientífica e lacração com fins lucrativos.

Lembre-se do Capitão Nascimento estapeando o maconheiro: não financie isso. Eu tento me lembrar sempre que vejo os progressistas perdendo a linha.

Seja como for, prevejo muita irritação no futuro.

Para dizer que já desistiu faz tempo, para dizer que prefere qualquer coisa aos lacradores, ou mesmo para dizer que o pior vai ser quem vem depois do Lula: somir@desfavor.com

SALLY

O que vai ser mais irritante no governo Lula?

A turma do lacre detonando quem não reza pela sua cartilha. Já vimos esse filme antes, não é achismo meu ou especulação. Por sinal, já estão começando a fazer esse movimento.

Eu costumo brincar que o Desfavor é um microcosmos, uma pequena e limitada amostra do país. Não que a gente tenha relevância nacional, felizmente nossos esforços para manter o Desfavor o mais desconhecido possível continuam um sucesso, mas, como escrevemos sobre tudo, o Google sempre acaba jogando todo tipo de gente aqui.

Isso nos permite ver quem é o grupo mais “ativo” no momento. Seja pelos comentários, seja pelas buscas que fizeram a pessoa chegar até aqui, fica bem claro quem é o grupo alfa da vez e qual é o seu discurso.

Nos últimos anos foi um misto de negacionista, terraplanista, armamentista e malucos conspiracionistas no geral. Desagradáveis? Com certeza. Porém, acreditem, foram anos tranquilos.

São pessoas que desfilam uma superioridade intelectual que não tem, mas que pouco e nada atacam. Eventualmente dizem sentir pena de você, de como você é manipulado por acreditar em vacinas ou na Terra redonda e se exaltam como detentores da verdade. Raramente vão além disso.

Em novembro a coisa começou a mudar de figura. Aqueles que se sentem oprimidos e cujo sonho é oprimir de volta, aquela gente com ranço se branco hetero, aquela turma do lacre violento voltou. E com eles as ameaças de agressão física, de estupro, ameaças à minha família, pedidos de minha demissão no meu trabalho e outras coisinhas mais, típicas desse grupinho “paz & amor para os meus”. E está só começando.

Vou citar um exemplo, para que vocês visualizem exatamente sobre o que estou falando: eventualmente, conseguimos a proeza de irritar ambos os lados em um único texto, e quando isso acontece, fica clara a diferença entre eles. Vamos usar como exemplo o texto sobre limpeza e higiene, que escrevi faz pouco tempo, falando sobre a periodicidade na qual devem ser lavadas as roupas e outros hábitos de higiene.

Teve gado do direitisticamente correto reclamando e até deixando uns desaforos: me chamam de neurótica, falam que eu não sei o que estou falando e que preciso procurar terapia pois tenho mania de limpeza. É o clássico modus operandi: te desvaloriza, quer fazer você pensar que é maluca e desacredita tudo que você fala sem qualquer argumento técnico para isso.

Mas o gado do esquerdísticamente correto… ah, esse não falha! Não importa o que você diga, é tudo sobre eles e sobre como você os ataca! Coisas como “a branca não suporta ver a senzala subir na vida que já fica chamando a gente de sujo”. Em momento algum do meu texto eu vinculei higiene (ou a falta dela) a qualquer atributo específico (cor de pele, classe social, religião ou o que mais quiserem). Mas a carapuça serve. Mais de 50 comentários (obviamente, não aprovados) me chamando de racista. Curioso como os próprios negros se percebem sujos, não? Que vida triste essas pessoas devem ter.

Isso é chato. Isso enche o saco. É um disco arranhado, que repete sempre as mesmas frases, não importa o contexto. E é um disco arranhado que eu fiquei escutando (contra a minha vontade) por 20 anos. Sempre vítimas, sempre colocando o outro no papel de agressor, sempre virtuosos, mas, curiosamente, sempre ameaçando fisicamente e te desmerecendo também usando atributos físicos (mesmo sem me conhecer).

O gado patriota é chato, porém, existe um mínimo de limites, principalmente no trato com uma mulher. Mas o gado piolhento, esses vêm com ódio legítimo, um rancor sem precedentes, um recalque monstruoso. Que pessoas amargas… Que inferno deve ser viver dentro da cabeça delas. Não tem força motriz mais tóxica do que um ódio cultivado, acumulado e alimentado.

O gado verde e amarelo é patético, mas ao menos ele é aquilo ali, mostra exatamente o que é. O gado Projac não, é uma coletividade travestida de virtuosos, tolerantes e humanitários, mas na real é uma turba enfurecida violenta, agressiva e discriminadora, que busca apenas favorecimento pessoal, aplausos e desfilar virtude quando seus atos são abomináveis.

Eu prefiro pessoa lixo, porém coerente do que um falso virtuoso que, por debaixo dos panos, faz tudo que diz condenar. Para muitos o esquerdisticamente correto é mais palatável pois, ao menos no discurso, eles são agradáveis. Para mim é justamente o contrário: prefiro um discurso bosta mas sincero e coerente com os atos da pessoa do que um discursinho hipócrita de quem, na prática, faz tudo ao contrário.

Os próximos quatro anos serão assim: tudo será racismo, machismo ou qualquer “ismo” que possa de alguma forma fazer essas rinocerontas de cabelo rosa, esses homenzinhos horríveis magrelos maquiados, essa gentalha que grita para idosa com câncer para tirar o turbante pois é apropriação cultural lacrarem de forma alta, pública e notória, em busca do reconhecimento e aceitação que o papai nunca deu. Certo está o pai, se eu tivesse um filho assim, também saía para comprar cigarro e nunca mais voltava – e olha que eu nem fumo.

Do limão, como sempre, faremos uma limonada. Esperem pela provável volta da coluna Processa Eu, esperem por textos que ultrapassem em muito a linha do bom-gosto e do bom-senso e por qualquer outra forma nova que eu consiga pensar para ser um contraponto a essas sarnas ambulantes da Federal. Minha paciência com essa gente e seu discurso vitimista-agressivo acabou em 2018, daqui pra frente é tijolada na boca.

Eu tenho essa possibilidade: vir aqui e falar o que quero. Mas vocês, que moram no Brasil, não terão. Essa gente adora um processo, um barraco intimidatório no meio da rua, uma cena. E por isso eu lamento muito: vocês terão que aturar calados um monte dessa baboseira. E isso é muito mais irritante do que um fulano vestido de amarelo pendurado em um caminhão. Acreditem, vocês vão sentir falta dos patriotas, eles ao menos têm um lado divertido.

Para me chamar de racista (espera só pelos meus textos de 2023), para dizer que o pior lado vai ser Haddad na Fazenda ou ainda para dizer que Desfavor vai melhorar 200% ano que vem: sally@desfavor.com


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