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Não fode!

Não fode!

| Desfavor | | 20 comentários em Não fode!

O grupo que prega a abstinência sexual de adolescentes, ouvido pelo ministério de Damares Alves na formulação de políticas públicas, já prepara material didático sobre o tema para escolas. O movimento estava paralisado até o ano passado, quando foi reativado com a chegada de Jair Bolsonaro à Presidência da República e a defesa do governo da abstinência como instrumento para prevenção da gravidez na adolescência. LINK


Política pública pregando abstinência? Não fode! Desfavor da semana.

SALLY

Tá cada vez mais difícil escolher o Desfavor da Semana. Sempre os mesmos pensamentos obtusos: falta de preparo, desprezo pela ciência, corrupção descarada, Judiciário de merda. Nos perguntamos o que mais pode ser dito a respeito desses assuntos, que todos vocês estão mais do que cientes do quanto são nocivos e vergonhoso.

Aconteceu esta semana novamente: uma semana onde fomos obrigados a defender Porta dos Fundos e concordar com uma decisão do Toffoli. É insalubre viver no Brasil. Vamos dizer o quê? Que é imbecil censurar piada? Que é duplamente imbecil quando a censura vem de um juiz do Rio de Janeiro, capital mundial da putaria, baixaria e corrupção? Não precisa, né?

Então, estamos bem cientes de que muitas outras coisas graves estão acontecendo, porém todas elas já foram tratadas aqui, exaustivamente, em outros momentos. Vamos falar de uma aberração sobre a qual nunca nos aprofundamos e que, francamente, também é uma obviedade: abstinência sexual como política pública.

Ao que tudo indica, o Governo pretende prevenir doenças sexualmente transmissíveis e gravidez indesejada com a maravilhosa política pública de abstinência. Quem quer evitar doença e gravidez não deve fazer sexo. Bacana, né? Jogar a responsabilidade para uma faixa etária que é conhecida por não ter responsabilidade alguma. Mais bacana ainda se a gente pensar que as pessoas que apoiam isso acreditam que seu messias nasceu de uma mulher que praticava abstinência sexual.

Juro para vocês que não sei bem o que motiva isso. Se é contenção de despesas, se é burrice, se é incompetência, se é bajulação para agradar religiosos ou qualquer outro motivo tosco. Não sei mesmo. Parece que essas pessoas desconhecem o país em que vivem. Um país onde fazer sexo é status, é valorizado, te coloca em um patamar social superior. Um país onde as pessoas acham mérito fazer muito sexo, sobretudo adolescentes. Como protegê-los de doenças e gravidez? Colocando a responsabilidade e uma grande privação nas costas deles: não façam.

Isso não funciona nem em países desenvolvidos, muito menos aqui, onde além dessa promiscuidade recompensada socialmente não há a possibilidade de aborto e um procedimento extremamente burocrático para adoção de bebês indesejados. Não vai funcionar. A questão é: por qual motivo o brasileiro não está revoltado com isso, exigindo uma política pública melhor? E é aí que reside o maior perigo dessa palhaçada toda.

O brasileiro está paralisado, atônito, chocado com o grau de baixaria, sexualização e promiscuidade que aqueles que o pessoal “liberal” está promovendo. Cada vez que um debilóide faz um ato de conotação sexual ostensivo para “chocar a família brasileira” e vai se gabar disso em redes sociais, ele contribuí para que a mente (já pequena) do povo encolha ainda mais, retroceda e tolere esse tipo de solução conservadora e ineficiente. O povo reage recuando, recuando e recuando, a ponto de achar que pedir a seus filhos abstinência sexual é legal, é a favor da moral e dos bons costumes.

Entre o estilo de vida tradicional/hipócrita e o modernoso/agressivo, sabemos de qual é a preferência nacional. Não se muda antagonizando, chocando, enfrentando, esse tipo de postura só causa resistência, medo e atrasa eventuais mudanças. Mas, ao que tudo indica, esses símios no cio continuam precisando esfregar atitudes chocantes na cara dos outros para não se sentirem tão desempoderados e acreditarem que estão combatendo algo, afetando alguém, tendo alguma relevância. Não estão, estão dando mais e mais poder para Bolsonaro e cia.

Damares disse que também vão falar, utilizar e disponibilizar outros métodos contraceptivos, que a abstinência é apenas mais um que foi incluído. Ela trata uma campanha para valorizar a abstinência como algo inofensivo, mas, neste cenário polarizado, não é. O grande problema de fazer campanha “didática” pela abstinência é conquistar os pais desses adolescentes (acho que sabemos que a maioria dos brasileiros votou no Bolsonaro e está alinhada com uma visão mais conservadora), fazendo com que estes pais tratem a abstinência como a solução.

É cômodo para os pais também. Não tem que comprar anticoncepcional para a filha, não tem que ter conversa constrangedora, não tem que levar no ginecologista. Obviamente, estes mesmos pais vão querer que seus filhos homens sejam comedores, como é típico do brasileiro. Façam as contas: meninas tendo que esperar para fazer sexo e meninos pressionando.

Eu sei que quase todo brasileiro é ou já foi promíscuo, mas sei também como são hipócritas. Um pai que comeu meio mundo e ainda tem um caso com a secretária, com a estagiária e canta a garçonete do lugar onde almoça é bem capaz de exigir que sua filha faça abstinência sexual se isso for pintado como uma “coisa de gente correta”. Sim, o medo que a filha apareça de cabelo colorido e peito de fora na marcha das vadias faz o brasileiro médio orientar a filha da forma mais conservadora possível.

A decisão será dos pais, esses hipócritas que de uns tempos para cá vestiram a máscara de conservadores para não serem confundidos com pessoas que fazem Golden Shower no meio da rua. Quando se trata de filha mulher, o brasileiro não é muito moderninho.

E sabemos muito bem que o pai brasileiro tem zero autoridade com seus filhos, até mesmo os que tem uma melhor condição financeira. Por mais que todo adolescente seja difícil, o grau de mentira, desrespeito e falta de consideração do adolescente brasileiro para com os pais é assustador. Vender a ideia da abstinência para os pais (ninguém quer uma “filha piranha”) é empurrar adolescentes para fazer sexo inseguro, escondido e descontrolado, pois não vão deixar de fazer.

O entorno empurra o adolescente para o sexo: publicidade, entretenimento e até mesmo essa crença de que sexo é muito importante e que quem não faz sexo feito um babuíno no cio é errado, é inferior, é ridicularizado. A mulher/menina brasileira tem uma autoestima no chão, vemos até mãe de família fazer atrocidades para não “perder um homem”, imagina se uma adolescente vai ter culhões de bancar isso e ver o namoradinho que ela acha que ama profundamente ir embora. Não vai. Vai mentir pros pais e fazer escondido, da forma mais precária possível.

E essa conta todos nós vamos pagar. Descontrole de natalidade afeta o país todo, sobretudo um país fodido que, hoje, já não tem escola para todos, hospital para todos, que já não consegue atender a todos os brasileiros como deveria. Pois é, vai piorar. Pedir por abstinência sexual para reduzir gravidez na adolescência não é política pública, é negligência.

Não dá para empurrar abstinência como opção na sociedade atual. É preciso realismo, conhecer o povo que se está governando e dizer “não vão fazer abstinência de jeito nenhum, melhor nem levantar essa lebre”, pois vender essa ideia para pais que estão conservadores pelo medo e pela resistência vai funcionar… apenas para os pais, para os filhos não. Além de aumentar o problema, ainda vão criar conflitos familiares sem precedentes.

Como eu disse, uma das coisas que mais me assusta é não entender muito bem de onde essa decisão infeliz veio. Isso indica que há uma série de fatores muito ruins coexistindo: burrice, hipocrisia, interesses, economia porca e tantos outros. A coisa é tão grave, tão tosca, que nem ao menos sabemos o erro que a originou. Isso dificulta bastante traçar um plano para tentar solucionar o problema.

Mas, vamos lá: minha teoria. A culpa não é de Fulano ou Sicrano, na verdade, Fulano chegou ao poder como um sintoma (e não causa) de tudo isso que está acontecendo. Se eu tivesse que apontar um “responsável” seria essa polarização.

É dela, da dualidade, da rivalidade, da polarização, a culpa de quase tudo que está acontecendo: idiotas fazem coisas para chocar e outros idiotas dão importância a eles e reagem no sentido oposto. Daí os idiotas que queriam chocar ficam com raiva dos conservadores, vão lá e fazem algo ainda mais chocante, para afrontá-los. Os conservadores se retraem ainda mais e vão se tornando doentiamente conservadores.

Enquanto essa for a dinâmica vigente, vai dar merda, não importa qual “lado” esteja no poder, pois sempre teremos uma sociedade em embate, mas preocupada em duelas do que em buscar soluções e estar bem. Só vamos alternar o tipo de merda à qual sujeitamos o país. A culpa não é do lado, é da divisão, e quanto antes isso for percebido, menores os danos.

Vai ser percebido? Não. Brigar é muito conveniente para ambos os lados, pois eles se distraem e não são obrigados a olhar para si mesmos e para suas questões, estão sempre olhando e apontando o erro alheio. No Brasil isso não muda tão cedo. Que venha o descontrole de natalidade…

Para dizer que se abstinência funcionasse não existira Jesus, para dizer que quer mais é que o circo pegue fogo ou ainda para dizer que se querem abstinência sexual na adolescência deveriam liberar o casamento aos 12 anos: sally@desfavor.com

SOMIR

O Brasil flertou com o desastre nesta semana. Sim, a censura do especial do Porta dos Fundos tinha tudo para ser o Desfavor da semana, mas parece que ainda tem uma linha que não se cruza nesse país: se a retirada do especial tivesse sido mantida no STF, poderíamos todos nos preparar para ir até o aeroporto, porque o país tinha acabado. Mas, a linha ainda está lá e até o Ministro que mandou a PF bater na porta de quem o criticou na internet achou excessivo. Podemos respirar um pouco… e observar outros absurdos.

O preço de evitar que o Lula voltasse para transformar esse país em escombros com certeza não foi barato: temos uma corja de evangélicos no poder. No pacote de não quebrar totalmente as finanças públicas, veio de presente um presidente que acha que é síndico de prédio, Ministro da Educação analfabeto, Ministro do Meio-Ambiente que acha que o Leonardo DiCaprio queima a Amazônia… e a nossa querida ladra de índias Damares Alves. É dose. Mas era o preço. O que não quer dizer que não podemos criticar. Afinal, não é demais exigir pelo menos alguma moderação nas maluquices sub 80 pontos de Q.I. do ministro médio brasileiro.

E um dos problemas mais comuns de pessoas limitadas é a incapacidade de entender contextos. Contextualizar uma informação significa usar seu cérebro para relacionar suas ideias com os dados apresentados. E isso, como muito o que fazemos com nossos cérebros, é questão de treinamento. Ou você passa um bom tempo da sua vida exercitando a capacidade de contextualizar informações, ou você vai viver num mundo muito confuso, onde coisas que parecem certas dão errado e coisas que parecem absurdas funcionam. E talvez depois de muitos anos sufocado por essa incapacidade de prever os resultados de suas ações e ações de terceiros, a pessoa crie uma espécie de alergia à lógica.

Porque isso explica muito bem a ideia de usar abstinência como política pública para evitar gravidez e doenças sexualmente transmissíveis. É o tipo da coisa que sem contexto parece excelente: sem sexo, sem os riscos relacionados com sexo. Perfeito! E se você encontrar um proponente da ideia e começar a apontar os problemas óbvios, a pessoa vai entrar na defensiva imediatamente. Se tiver que fazer pose, talvez tente falar da santidade do matrimônio, mas se estiver brava com você ou sem testemunhas, pode ter certeza que vai te chamar de depravado para baixo. É a alergia em ação: quando você contextualiza a ideia simplória da pessoa, ela se sente mal, tem alguma coisa dentro da cabeça dela avisando que a ideia é estúpida, mas ela está tão cansada de sofrer pela própria burrice que prefere sufocar esse resquício de racionalidade do cérebro e atacar quem quer que esteja “causando” esse sofrimento.

Sally é uma santa por sequer explicar os motivos pelos quais essa é uma péssima estratégia, pessoas como eu já estão muito cansadas de lidar com esse tipo de burrice. Evidente que adolescentes vão cagar e andar para isso e vão simplesmente fazer sexo sem camisinha ou qualquer outra forma de proteção, hormônios são poderosos assim. Acho impressionante como esse mentalidade religiosa bota a pressão do autocontrole em cima de quem tem menos ferramentas para se defender de necessidades naturais. Se alguém precisa de toda ajuda possível para não sair esfregando a genitália em lugares aleatórios, são os adolescentes. É meio que o cio do ser humano.

Mas a ideia não é ajudar os adolescentes a “sobreviverem” até a vida adulta sem problemas mais sérios que um coração partido, é sobre o bem estar mental de gente que ficou presa nessa mentalidade absolutista por se borrar de medo de lidar com lógica e contextos. A corda estoura do lado mais fraco. Para Damares e os imbecis desse grupo que pregam abstinência, estragar a vida de vários adolescentes é um preço barato pela paz mental de não ter de lidar com sua burrice galopante.

Por isso que não adianta nem chegar com dados de outros países que tentaram essa política pública e tiveram um aumento considerável de adolescentes grávidas. Não é sobre os adolescentes, é sobre o conforto pessoal de acreditar que está certo. E isso se espalha por vários outros temas: aborto, eutanásia… esse tipo de gente aceita estragar a vida de qualquer um que entrar no seu caminho exigindo pensamento mais complexo.

E aqui eu tento ser um pouco mais compreensivo: deve ser terrível mesmo quando seu cérebro não te fornece ferramentas básicas para lidar com a realidade. Deve ser sofrido para os defensores da abstinência sexual de adolescentes manter essa mentalidade mesmo diante dos fracassos constantes da política e das vidas que estragam. Então imagina quão horrível deve ser olhar para um gráfico, ouvir um argumento e não ter nada na cabeça que consiga tratar essas informações… a pessoa deve se sentir um desperdício de oxigênio completo. E pior, é muito provável que depois de uma certa idade, ela não tenha mais como reverter esse processo: o cérebro atrofiou. Eu sei que essa gente faz mal para a sociedade, mas eu sou humano e ainda tenho um pouco de sentimentos. É triste ver uma Damares da vida falando e pensando: é um arremedo de ser humano.

Pode ser que ela tenha a melhor das intenções, que quem a conheça de perto a ache uma pessoa muito boa, mas por causa das suas deficiências no raciocínio crítico, não deveria ter um lugar à mesa nas decisões que impactam outros seres humanos. E pode colocar junto nesse barco toda essa gente que defende abstinência: são seres humanos que falharam numa questão básica do funcionamento da mente. Mas para a sorte deles e o azar de quem tem esse mínimo de desenvolvimento, gente problemática assim parece ser a maioria em países muito pobres como o Brasil. Espero que você viva numa bolha que tenha te impedido de ver isso, mas o brasileiro médio concorda com a ideia de abstinência e… voltando ao primeiro parágrafo deste texto: achou LINDA a censura ao Porta dos Fundos.

É essa gente que nos cerca. E se acontecer (eu aposto que acaba acontecendo eventualmente) deles deixarem de ser maioria, ainda vai demorar várias gerações. Talvez algumas mais se a política do governo virar abstinência mesmo, porque filho de mãe adolescente já nasce com uma desvantagem das grandes…

Para dizer que otimismo sempre vai bem, para dizer que quase sente dó dessa gente, ou mesmo para dizer que a culpa é do funk: somir@desfavor.com


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