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Chuva de críticas.

Chuva de críticas.

| Desfavor | | 42 comentários em Chuva de críticas.

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) publicou nesta terça-feira (5) em sua conta oficial no Twitter um vídeo de uma cena que causou polêmica no Carnaval paulistano. Um homem aparece dançando sobre um ponto de táxi após introduzir o dedo no próprio ânus. Na sequência, surge outro rapaz que urina na cabeça do que dançava. LINK


Já tínhamos decidido que era o tema ANTES do Bolsonaro compartilhar. Mas a participação presidencial só torna isso ainda mais desfavor da semana.

SALLY

Este vídeo lamentável é apenas um, entre muitos nesse estilo, amplamente divulgados em redes sociais durante o carnaval. Divulgados com orgulho, por pessoas que parecem ter como propósito de vida agredir a sociedade. Não estamos falando de pessoas exercendo direitos ou cidadania, e sim fazendo coisas totalmente desnecessárias, como enfiar o dedo no próprio cu no meio da rua ou urinar no couro cabeludo do colega ao lado.

Quem faz esse tipo de coisa sabe que vai chocar, que vai afrontar, que vai causar mal estar em uma boa parcela dos que assistem. Até mesmo pela postura você vê que a intenção é afrontar, agredir, desafiar. Chego a sentir um pouco de pena… Pensa, quão desempoderado você tem que ser para precisar buscar poder em atitudes como urinar na cabeça do seu coleguinha, de modo a ter uma falsa sensação de que conquistou algo.

São coisas que a sociedade convencionou que não se fazem em público, não é nada pessoal. Sejam brancos, negros, gays, heteros ou qualquer outra classificação que se queira dar ao ser humano, foge do pacto social que temos enfiar o dedo no cu no meio da rua ou urinar em outra pessoa. Não é sobre preconceito, não é sobre homofobia, não é sobre ser de direita ou de esquerda, é a convenção na qual todos vivemos.

Não quero com isso dizer que todos devemos ser escravos de convenções sócias. Esses pactos devem e precisam ser revistos de tempos em tempos, para acompanhar as mudanças sociais. É bom para todos que sejam debatidos, questionados, sugeridos novos caminhos. Mas pelas vias da civilidade, do diálogo, da informação. Pela via da agressão nunca, porque causa efeitos ainda mais nocivos. Empurra automaticamente a sociedade para o lado oposto: qualquer pessoa com bom senso vê esse vídeo e pensa “ok, fato, eu sou de direita”. Não queremos empurrar a sociedade para esse lado, certo?

Agressão não é apenas dar um tapa na cara de alguém, é qualquer tipo de ataque deliberado ciente do dano que vai causar no outro. Sim, este tipo de conduta que pipocou em vários carnavais pelo Brasil é uma agressão, perpetrada por pessoas que dizem defender liberdade de expressão e minorias. Curiosamente, se portar desta forma causa justamente o efeito contrário. Só estão fechando um cerco contra si mesmas e jogando o nome das supostas minorias na lama.

A imagem é tão marcante, tão chocante, tão agressiva, que é isso que fica na cabeça do brasileiro médio. Quando um filho conta a um pai que é gay, boas chances do cidadão imaginar que ser gay é sinônimo desse tipo de comportamento. São anos de ativismo sério lutando pelo fim do preconceito e estereótipos ofensivos jogados no lixo, em troca de sentirem um pouquinho de poder, de cinco minutos de fama, da sensação malandrona de ser um transgressor. Essas pessoas não percebem, mas estão causando um mal social imenso.

Para sentirem algum resquício de poder os desempoderados estão indo cada vez mais longe, “afrontando” a sociedade de forma cada vez mais agressiva, acentuando uma polaridade que já estava maior do que o desejado. Até onde isso vai? Cada vez que alguém faz uma coisa dessas, se empurra a linha um pouco mais para frente e o próximo que queira chocar, afrontar ou agredir, terá que fazer algo pior. Percebem para onde caminhamos?

Enquanto isso, no meio desta mudança de paradigma (se é que podemos chamar assim), a sociedade ainda assiste calada a este tipo de espetáculo, um pouco pelos 15 anos de espiral de silêncio, onde estas pessoas não podiam ser questionadas sem que você automaticamente virasse um preconceituoso, outro pouco porque esta divisão de “lados” permite que a pessoa se enquadre em um grupinho contra isso, sinta pertinência e se sinta amparada. Ou seja, quem deveria estar combatendo isso, os predadores naturais deste tipo de imbecilidade, estão calados.

Muitos dos que estão do “lado” destes lacradores conseguem ver o excesso e o desfavor que isso causa, é Bolsonaro 2022 com certeza. Mas calam a boca também, porque se convencionou tratar política como religião: ninguém questiona seu Deus. Fosse o filho do Bolsonaro urinando em alguém, ou enfiando o dedo no próprio cu, choveriam críticas e comentários pejorativos. Mas é proibido questionar, criticar ou discorda de alguém que está do seu “lado”. E assim, neste pacto tácito de silêncio, essas pessoas que acham que são “resistência” continuam testando os limites.

Nesta grande cegueira social, todos se calam e observam a involução humana que toma conta da sociedade, em troca de uma micro sensação de poder (falsa e momentânea). E, sinceramente, é um desfavor com os próprios protagonistas dessa palhaçada, que claramente não estão com a mente em um bom lugar. Se eu vejo uma amiga minha fazendo uma coisa dessas, chamo na hora e tenho uma conversa séria, apontando os danos que ela está causando para a sociedade e para si mesma.

Não se enganem, em última instância, esses protagonistas desses vídeos serão os maiores prejudicados. A internet não esquece. Cada relacionamento novo, cada entrevista de emprego, cada pio que essas pessoas derem em redes sociais… sempre serão lembrados por estes vídeos, mesmo que já tenham caído na real e que sua postura tenha mudado. É uma tatuagem virtual que acompanhará a imagem deles para sempre.

Amigo de verdade não apoia tudo, amigo de verdade te adverte quando você está fazendo mal a você mesmo. Estas pessoas não têm amigos, ou, se tem, estão tão ruins de cabeça quanto eles. Quem assiste calado uma pessoa querida se maltratar dessa forma, cega pelo equívoco de que isso é contestação, revolução ou resistência, não é amigo. Não é resistência, é autolesão, autoflagelo, autodestruição.

Atitudes infantis e desnecessárias que mostram falta de amadurecimento, falta de preparo emocional para lidar com frustrações da vida e incapacidade de adaptação, que hoje, é um dos maiores problemas que a pessoa pode ter. Em um mundo em constante mudança, quem não tem a maleabilidade de aprender, desaprender e reaprender, quem não consegue se adaptar (e para isso não precisa virar gado), está muito, mas muito ferrado e vai sofrer demais.

Os poucos que não se calam, falam para antagonizar com essas pessoas, esculhambá-las, ridicularizá-las. Outro desfavor, isso é apenas jogar o jogo. Estão dando a elas o que elas buscam, a sensação de “resistência”. Pessoas que protagonizam vídeos como este são pessoas dignas de pena. Uma pessoa que urina na cabeça do coleguinha não precisa de ninguém detonando, ela está se detonando sozinha. Hora de não jogar esse jogo e não dedicar seu dia a jogar pedra nessas pessoas. Se nós cortarmos esse ciclo, se não tiver plateia, não vai mais ter show.

Não seja uma pecinha nesta engrenagem. A tentação de apontar, rir, ridicularizar e detonar é enorme. Mas só alimenta esse tipo de comportamento. O que não quer dizer que não possam ser criticados. Podem e devem, mas com maturidade, com equilíbrio e de forma construtiva. Se você jogar merda em quem se alimenta de bosta, a pessoa só vai crescer.

Para dizer que achou o texto muito bonitinho mas vai dar pedrada sim, para dizer que é hora de sair do país ou ainda para dizer que a família Bolsonaro vai ficar no poder por décadas graças a essa gente: sally@desfavor.com

SOMIR

Sally e eu já tínhamos certeza que esse seria o desfavor da semana quando recebemos o vídeo pela primeira vez. Por isso, ela fez a análise “limpa” como teríamos feito originalmente, e eu vou ficar com as consequências pós replicação pelo Bolsonaro. Porque a Indústria do Lacre, que estava quietinha após a cena dos coleguinhas se exibindo em público, entrou em furor após ver a manifestação do presidente.

E como era de se esperar, defendendo 100% o ato realizado pelos dois rapazes e atacando 100% o Bolsonaro. Não tem meio termo no cenário político atual: se Bolsonaro criticou é porque os dois estavam certíssimos. O modo de contenção de danos começou imediatamente: uns batendo no Bolsonaro por postar isso na conta oficial do presidente, outros dizendo que era repressão contra a sexualidade alheia, e muitos dizendo que heteros também fazem putaria no carnaval.

Foi macaquice do Bolsonaro (ou seu filho) postar um vídeo claramente pornográfico no mesmo lugar que usa para se comunicar oficialmente como presidente do Brasil? Foi. Zero decoro, irresponsável e de mau gosto. Mas tem todo esse fator Trump nele: foi eleito por ser um sem noção que bate nas coisas que a maioria dos brasileiros quer bater. Gostem ou não, esse é o presidente que a maioria escolheu, presidente que NÃO teria a maioria se o PT não tivesse sabotado toda a esquerda forçando a candidatura do Lula. Não adianta fazer pose de inocente nessa história: os dois lados da briga são responsáveis pelos Bolsonaro no poder, agora vamos ter que aguentar.

Esse é o tamanho do cérebro do nosso presidente: não viu nada de errado em postar esse vídeo na sua conta. Mas, vejam só, esse é o tamanho do cérebro do brasileiro médio de direita e de esquerda. Pouca gente realmente bateu na tecla do decoro. Basicamente a imprensa um pouco mais intelectualizada. O resto dos críticos bateu nele por achar que ele estava oprimindo gays e/ou pessoas que gostam de atos sexuais com urinação. Oras… contexto vale muito aqui. Bolsonaro não postou um vídeo de duas pessoas fazendo isso em sua privacidade, ele postou o vídeo de duas pessoas fazendo isso em via pública, em cima de um ponto de táxi para visibilidade total dos transeuntes (adultos e crianças).

“Tudo na vida é sobre sexo, menos sexo; sexo é sobre poder.” – Essa frase, de Oscar Wilde, traduz bem o que entendo sobre o ato filmado no carnaval paulistano. Me parece óbvio que aquela cena existe muito mais como uma manifestação cultural do que um ato sexual qualquer. Milhões de pessoas no mundo tem esse tipo de fetiche (uma pesquisa do PornHub que saiu recentemente diz que é um dos campeões de pesquisas de pornografia em vários países do mundo, inclusive entre mulheres), e não existe nenhum movimento real tentando reprimir o “Golden Shower” – adoro como Globo e Folha fizeram matérias sobre isso após o Tweet do Bolsonaro.

Mas na sanha de lacrar e ser da resistência, o exército das marquinhas azuis no Twitter e boa parte da mídia quiserem tratar o tema assim. Não acho que está acima do Bolsonaro implicar com o fetiche alheio, mas nesse caso, claramente não era o tema. A maioria das pessoas costuma concordar que o que dois adultos fazem de forma consentida entre quatro paredes é problema exclusivo deles, mesmo num país com tanta repressão cristã como o Brasil. É ridículo achar que é uma guerra contra o fetiche de algumas pessoas, é sobre ter feito isso EM CIMA DE UM PONTO DE TÁXI NO MEIO DE UMA RUA LOTADA.

Aí deixa de ser fetiche e passa a ser uma declaração política. Vamos parar de tapar o sol com a peneira: sabiam que estavam em público, tinham orgulho de estar “enfrentando a sociedade”. Quando os lacradores começaram a postar vídeos de casais fazendo putaria em público, normalmente eram cenas de pessoas muito bêbadas esquecendo que estavam em plena vista. Não é muito mais digno, mas com certeza não tinha nenhuma sugestão de ser uma performance com conotações políticas.

Quer mijar no coleguinha? Poxa, a vida é curta, realize suas fantasias! Mas não venha fingir que não sabia onde estava e não estava fazendo aquilo justamente para chocar e emputecer aqueles que votaram no candidato que você não gostava. Se fosse um vídeo de um flagra de dois caras fazendo isso na rua mas no mínimo tentando ter um pouco de privacidade num beco ou atrás de um carro que seja, poderíamos tratar só como bêbados sem noção. CERTEZA que não seria republicado pelo Bolsonaro. Foi um ato tão político que o Bolsonaro usou para empurrar sua agenda política. Só naquele vídeo, foram mais uns 500.000 votos garantidos na reeleição.

E se eu fosse um ativista dos direitos dos gays, eu estaria PUTO com esses dois rapazes. Porque isso desfaz muito do árduo trabalho de fazer o povo parar de ver gays como selvagens sexuais sem pudor ou respeito pelas outras pessoas. Ou você quer ser visto como só mais uma pessoa que sente atraído pelo mesmo sexo, ou você quer ser o lacrador que enfia o dedo no cu e mija nos outros em público. Se você quer ser o primeiro caso, demora, mas o povão acaba te aceitando. Se você quer ser o segundo, vai ser esmagado pela maioria na hora. Se os heteros não podem agir feito animais na rua, ninguém mais pode, oras. E pelo o que eu conheço dos gays, a imensa maioria não tem nada a ver com essa baixaria toda. São como quase todos nós, deixando a putaria para os locais e públicos que querem participar disso.

Bolsonaro nem deve saber direito no que está batendo, mas está acertando num alvo razoável: não vai ser com essa criancice de ficar pintando parede e quebrando vaso que a turma do lacre vai receber atenção positiva. Não tem como aquela cena não ser um ato deliberado de confrontamento, e se todo mundo esquecer o bom senso para fazer pose de politicamente correto, os malucos do movimento pelos direitos dos gays vão chamar mais atenção do que as pessoas com um mínimo de cérebro e jogar no lixo o trabalho de integração social. Gente descompensada tem que ser reprimida, é o que faz a sociedade continuar minimamente funcional.

A regra é clara: se forem adultos e consentirem, façam o que quiserem dentro de quatro paredes. Mas assim que você vai pra rua, pode e deve ser criticado pela sua escolha de esfregar isso na cara dos outros. Se fosse um casal heterossexual no mesmo lugar, pode ter certeza que seria político também, não tem como não ser da forma teatral que foi realizado. Bolsonaro tem dois neurônios por ter usado a conta presidencial para divulgar o vídeo, mas deveria sim prestar atenção em todo e qualquer ato político realizado no país para o qual foi eleito como presidente.

Golden Shower é fetiche, a cena do vídeo é política.

Para dizer que só se diverte com a insanidade da política moderna, para dizer que os estagiários do jornal devem ter visto muita coisa traumatizante nas pesquisas que fizeram, ou mesmo para dizer que nós somos reprimidos por criticar: somir@desfavor.com


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