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Sobrevivendo ataques de cachorros.

Sobrevivendo ataques de cachorros.

| Sally | | 28 comentários em Sobrevivendo ataques de cachorros.

Antes de mais nada, permitam-me chover no molhado: cachorro é bicho, não é gente. Apesar de uma maioria neurótica insistir em humanizar o coitado do animal, ele não pensa como um ser humano. Portanto, se você está em qualquer situação de tensão envolvendo um cachorro, não se paute por comportamentos humanos. Não adianta ficar dizendo ao cachorro que você é amigo, não adianta gritar, não adianta chorar.

Dito isto, outra obviedade: todo cão pode atacar. TODO CÃO PODE ATACAR. “Ain Sally, mas o Fulaninho é um cachorro carinhoso, jamais atacaria”. Todo cachorro pode atacar por uma série de fatores que vão desde se sentir em perigo até um simples engano, muitas vezes gerado por uma doença que o prive de percepções básicas, como seu olfato. Assim como todo ser humano pode atacar quando acha que está lutando pela sua vida, todo cachorro pode atacar, por isso, não deixe crianças ou irresponsáveis sozinhos com cachorro sem supervisão, pode acabar mal.

“Ain Sally, mas o Fulaninho é super medroso, duvido que ele ataque alguém”. A maior parte dos ataques é feita justamente por cães medrosos, dentro de casa, envolvendo conhecidos. O cão de guarda é responsável por poucos ataques a humanos, pois ele sabe muito bem quando alguém oferece perigo ou não. O cão medroso, justamente por ser medroso, acredita estar em perigo frequentemente e, se um dia isso se exacerba, ele vai lutar por sua vida sendo agressivo se julgar necessário.

Os campeões de mordidas não são Pitbulls ou Rottweillers, os cães que mais mordem são poodles e Dachshund (hoje conhecido como Teckel, e, no Brasil como “salsicha”). Ou seja, a maioria dos ataques vem de bichos que pesam menos que a minha bolsa, geralmente relacionados a medo. Como são ataques sem maiores repercussões (já vi poodle quebrar o dente ao tentar morder uma pessoa forte), acabam não repercutindo tanto quanto um ataque de cães maiores.

“Ain Sally, o Fulaninho me respeita, não vai me atacar”. 50% dos ataques são cometidos dentro de casa contra os próprios donos. Conviver é difícil, sai briga até entre humanos, que podem dialogar, é compreensível que duas ou três vezes na vida a chapa realmente esquente entre você e seu cão e ele possa ter um comportamento agressivo. Pouquíssimas pessoas neste mundo colocam o devido limite nos seus animais, seja por pena, preguiça ou por medo do cachorro ficar magoado (cães não ficam magoados, tenham santa paciência), então, sim, pode acontecer, mesmo que em 99% do tempo seu cachorro te respeite. Todo mundo tem um dia de ovo virado.

Há situações de risco que costumam alavancar os índices de ataques, que merecem sua atenção: quando há fêmeas no cio por perto, quando o cão está se alimentando, quando o cão sente dor/medo ou quando ele acredita que estão invadindo seu território. Não custa ter um respeito maior nestes momentos. Sou da ideia que dono tem que poder fazer tudo, inclusive remover a tigela de alimento enquanto o cão estiver se alimentando (é meu termômetro para saber se alguém tem voz de comando com seu cachorro), mas, como a maioria das pessoas não tem, melhor evitar acidentes.

Se for um cachorro estranho, os cuidados devem ser redobrados. Não sorria para um cachorro estressado, alguns entendem o ato de mostrar os dentes como ameaça. Não se aproxime de cães que estejam amarrados, o animal fica especialmente estressado nessa situação. Não chegue perto de filhotes muito pequenos, fêmeas podem interpretar essa aproximação como uma ameaça e te atacar para defender os filhotes.

Vamos supor que tudo mais deu errado e o cachorro está virado no samurai. Dificilmente um cachorro ataca sem dar algum sinal antes. O mais comum é um rosnado de aviso. Se o cachorro rosnou, considere um aviso. Se mostrou os dentes, considere um aviso mais enfático. Há dois caminhos: brigar ou recuar. Sendo seu cachorro, acho que é o caso de brigar. EU pego um cabo de vassoura e me imponho se for meu cachorro a rosnar para mim, cachorro simplesmente não pode rosnar para o dono. Mas, poucas pessoas fazem isso. Se o seu cachorro rosna para você e você recua, bem, o dono é ele. Se não for seu cachorro, é hora de recuar.

Pode não ser perceptível, pois muitas vezes a pessoa não está próxima o suficiente, mas cães com intenções agressivas ficam com a parte branca do olho mais aparente. As orelhas para trás, deitadas contra a cabeça são outro sinal de ataque iminente, é um mecanismo de defesa do cachorro para não perder a orelha quando briga com outro cachorro. Se a orelha estiver levantada ou, no caso de cães com orelhas caídas, se elas estiverem relaxadas e não repuxadas para trás, é sinal que o cão está de boa.

O dorso (costas) do animal também diz muito sobre a sua intenção: costas relaxadas, um pouco curvadas, mostram um cachorro que não pretende atacar. Quando ele tem a intenção de ataque, o corpo fica duro, tenso, reto, com cabeça ombro e quadris alinhados, na intenção de se “compactar e endurecer” para se proteger da mordida de outros cães.

Até a forma de andar do cachorro dá sinais. Um trote tranquilo, onde ele levanta as patas do chão de forma mais lenta, indica um cão curioso. Uma corrida mais rápida, rente ao chão, com o corpo projetado para frente, indica ataque.

O rabo, que costuma ser o primeiro lugar para onde as pessoas olham, não é o melhor indicador. “Se o cachorro não está abanando o rabo quando se aproxima, ele vai te morder”. Errado. Alguns cães abanam o rabo quando estão nervosos, outros cães podem não abanar o rabo quando estão felizes, como o Akita, que só o faz quando chega até a pessoa. Observe o conjunto.

Então, por enquanto, vamos trabalhar apenas com prevenção. Se o cão deu sinais de agressividade você tem dois caminhos: 1) se você consegue entender o que está emputecendo o cão, pare de fazer imediatamente 2) se você não sabe o que chateou o animal, fique imóvel, parado, braços junto do corpo, como uma árvore. Não corra. Não grite.

Em qualquer dos casos, não olhe nos olhos do cachorro, isso vai ser encarado como um desafio/ameaça. Olhe para baixo ou para outro lado. Mostre submissão se mantendo de lado (e não de frente) para o cachorro, olhando apenas com sua visão periférica. Não fique de costas, o cão pode entender isso como uma oportunidade perfeita para o ataque. Sempre de lado. Não movimente os braços ou pernas de forma brusca, mantenha os punhos fechados, assim, se você for atacado, o cachorro não leva um dedo. Se o cão se aproximar, continue seguindo essas orientações, pode ser que ele apenas te cheire e vá embora.

Se você percebe que o cachorro está se aproximando de você com uma intenção agressiva, a primeira coisa que você tem que saber é: não corra. O cachorro corre mais do que você, a menos que exista algo muito próximo no caminho para te salvar, ele vai te alcançar. Além disso, correr desperta um instinto nele, se ele não queria, agora ele vai querer te atacar. Spoiler: mesmo se você estiver de bicicleta o cachorro vai te alcançar.

Só corra se tiver muita certeza que consegue sair do alcance do cachorro, como por exemplo, subindo em um muro. E pense bem, cães sobre, em árvores e muros, se você pode subir, é provável que ele também possa. Algumas raças odeiam água. Se houver um lago, uma piscina ou qualquer coisa do tipo por perto, pode se jogar. Mesmo que o cão se jogue atrás, você tem mais chances dentro d’água, pois ele perde agilidade.

Pode acontecer do cachorro ficar “guardando” você. Não ataca, mas não permite que você se mova. Geralmente eles sentam ou deitam e ficam te olhando. Nesse caso, tenha paciência e espere. Em algum momento o cachorro cansa, algo o distrai ou alguém chega para te ajudar. Espere.

Sei que é difícil colocar isso em prática, tem que ter nervos de aço, mas estas medidas podem fazer a diferença. Não raro, cães não tinham qualquer intenção de morder, mas sua aproximação assusta tanto que a própria vítima acaba causando uma reação agressiva do animal com sua histeria, correndo, gritando ou chorando. Segura a onda que é melhor pra você. Tente se manter seguro, confiante, cães sentem a energia humana, sabem muito bem a diferença entre covardia e coragem, dominantes e dominados.

Você vai saber que o animal está se preparando para o ataque porque geralmente ele começa a te rodear, a te estudar, com toda a linguagem corporal tensa sobre a qual já falamos. Quando o cão te “guarda” ele apenas observa e protesta se você se mexer. Quando ele vai atacar, ele circula a vítima para encontrar o melhor ângulo para avançar, geralmente, pelas costas.

Se, por uma sorte, você tiver qualquer coisa comestível com você, pode oferecer ao cachorro. Mexa-se muito lentamente, sem olhar para o cachorro e sem encará-lo de frente, pegue o que quer que seja (biscoito, salgado, chiclete) e mostre ao cão. Se ele se interessar e vier pegar de boa, ofereça a ele com as duas mãos em concha. Se ele estiver desconfiado ou se aproximando de forma agressiva jogue para bem longe de você, com o mínimo de amplitude de movimento que conseguir. Se tudo der certo, isso o distrai e ele tira o foco de você.

Alguns cães pegam objetos ou correm atrás, mesmo que não seja alimento. Já vi gente se salvar de ataque jogando garrafa dágua. Muitas vezes o cão está estressado e mastigar algo o acalma, então, que não seja você. Um cinto, um sapato, qualquer coisa que possa ser mastigada pode ser oferecida. Vale tudo para evitar o confronto.

Espero que nunca aconteça, mas se nesta situação você tiver uma criança ou outro cão com você, abaixe lentamente, pegue-o no colo e tente fazer com que ele fique quieto e não olhe para o cachorro. Tente se afastar lentamente, com movimentos discretos.

Se nada mais deu certo e você sentir que vai ser atacado, é hora de partir para o tudo ou nada. Tenha em mente que cães metem medo, mas no fundo, são apenas uma mandíbula. A mordida é o único recurso do cão, em tese, você é uma máquina muito mais bem equipada para matar. A partir de agora, seu objetivo é: neutralizar a mandíbula ou espantar o cão.

Como última tentativa você pode virar de frente para o cão (mas sem fazer contato visual) e dar um comando para ele ir embora, com tom de voz firme. Quando os cães se estressam entre si, eles se avisam antes com um rosnado grave, que significa um “sai daqui”, para que o outro pense bem se quer brigar. Tente o seu “sai daqui” o mais confiante que puder, pode ser que funcione. Ao ver que você vai reagir, o cão pode repensar.

Não é sempre que funciona, mas existem aplicativos de celular que provocam ruídos que repelem cachorros, se estiver com seu celular no bolso, você pode tentar pegar discretamente e fazer o cachorro correr com o barulho ou ao menos confundi-lo, fazendo com que ele saia para procurar de onde vem o ruído.

Supondo que não deu, o cão está em posição e vai pular em você. O que fazer? Se você tiver qualquer objeto com você (uma mochila, uma bicicleta, qualquer coisa), segure mais à frente do seu corpo, para que seja a primeira coisa que o cão ataque. Se ele morder, puxe de volta, de leve, para que ele sinta resistência, mas não para que saia da boca dele. O animal tem que continuar atacando aquele objeto até se cansar, se não, vai atacar você. Ofereça resistência para que continue sendo interessante para ele atacar esse objeto, até ele cansar.

Se você não tiver nada para te ajudar, a menos que você seja muito forte ou o cão seja muito fraco, o ideal é não reagir. A maioria dos cães dão uma mordida de aviso e param. Se você lutar, o cão vai se sentir ameaçado e morder até te matar. Existem dois tipos de cachorro: o cachorro normal, que ataca direto no pescoço (geralmente as pessoas colocam o braço na frente por instinto, e ele acaba mordendo o braço) e o cachorro de merda, um perdedor que ataca mordendo tornozelo. Se você tiver a sorte de ser atacado por um cachorro de merda, é provável que ele mastigue um pouco sua calça e vá embora.

O plano agora é minimizar os danos: se puder, encoste em uma parede e proteja cabeça, pescoço e barriga, os pontos fracos do ser humano. Dependendo do tamanho e força do cachorro, você pode sentar com as pernas paralelas e dobradas (para proteger a barriga), levando o joelho ao rosto, encolhendo os ombros e escondendo o rosto com o braço e antebraço. Alguns cães, ao ver a pessoa “menor”, encolhida, percebem que ela não é ameaça e se afastam. O tentam morder e sentem partes muito duras e também se afastam.

Terrível ter que entrar neste grau de detalhe mas… se o cachorro pegar sua perna ou seu braço, sua melhor chance é não puxar de volta o membro que o cão está mordendo, pois ele vai ser dilacerado. Se você “permitir” que o cão morda sem puxar, a tendência é que ele morda e solte, deixando “apenas” furos. Se você puxa de volta, o cão vai sacudir a cabeça de um lado para o outro como resposta e rasgar tudo. Desesperador deixar um cachorro ficar com sua perna dentro da boca, eu sei, porém necessário.

Agora vamos para um Plano B. Se você achar que dá para lutar com o cão (isso só você vai poder avaliar), seguem algumas dicas.

Paus e pedras são seus amigos. Qualquer objeto contundente é melhor que um objeto perfurante, ou seja, o gênero porrete é melhor que o gênero faca. Foca no focinho, na garganta, na boca ou na parte traseira da cabeça (“nuca” do cachorro). Uma porrada bem dada nessas regiões vai fazer com que o cão recue. Evite bater no topo da cabeça do cachorro, é a parte mais dura do seu corpo, é provável que você não consiga causar um dano e ainda deixe o cachorro mais irritado. Também não é recomendável gritar, mesmo com a pancadaria instaurada, pois gritos deixarão o cachorro ainda mais agressivo.

Se você não tiver nenhum objeto duro suficiente para bater no cachorro, use suas pernas, que tem muito mais força que os braços. Tente chutar a boca de cima para baixo ou o focinho de frente. Tudo que o cão tem é sua boca, eles não sabem e não conseguem lutar com o corpo. Se você neutraliza o focinho, quebra a mandíbula, vence a luta.

Por isso, se você conseguiu acertar ele no focinho e ele caiu, corre e prensa o corpo dele com seus joelhos contra o chão, jogando todo o peso do seu corpo na parte abdominal dele, para quebrar o máximo de costelas que conseguir e perfurar seus órgãos. Se conseguir pegar no pescoço do cão, aperte. Ele não vai ter força para se soltar e a boca dele não vai te alcançar nessa posição. E, se matar o cachorro, corra, pois o dono do cachorro vai querer matar você.

Como sempre tem um mongoloide, não custa lembrar que estamos falando de uma situação de estado de necessidade (não existe legítima defesa contra animais), onde a pessoa está lutando pela sua vida, e não de crueldade animal. Há um cão atacando (percebam que antes do ataque sugerimos que nada seja feito) uma pessoa, com potencial para causar sua morte.

Se você, como dono de cão, quer reduzir as chances de que seu animal ataque você, estranhos ou outro animal, seguem algumas regras básicas: socialize muito o cão, principalmente quando é pequeno. Muita gente, muitos lugares diferentes, muitos barulhos. Exercite o animal, cães tem que correr por horas, não dar uma volta no quarteirão. Não deixe o animal confinando, amarrado ou preso em um cômodo da casa, isso faz muito mal a ele. Mantenha uma rotina de alimentação regrada (com hora marcada) e suficiente em nutrientes (eu não arriscaria outra ração que não fosse Pro Plan, Eukanuba, Science Diet ou Royal Canin, são caras, mas o que você não gasta com ração, acaba gastando em veterinário).

Não mime o animal, não superproteja, não recompense o medo. Barulho de fogos? O cachorro chorou, tremeu, correu? Não pegue no colo e conforte, você está reforçando o medo, dizendo que ele tem motivos para estar assim. Cães não pensam como humanos, não sentem como humanos, não espelhe o que você sentiria no seu cão. A percepção de mundo dele é completamente diferente.

E, acima de tudo, seja um líder. Toda matilha tem um líder, se você não for, seu cão vai chamar essa responsabilidade para ele e, acredite, ele não gosta disso. É uma responsabilidade muito grande e ele vai viver estressado. Exerça seu papel alfa e seja você quem manda. Não é ele quem puxa a coleira, é você que o leva para passear. Não é você que desvia dele quando vai passar, é ele quem sai do seu caminho. Não é maldade nem desamor, as regras do jogo entre cães são outras. Ser um líder aos olhos do seu cão vai trazer tranquilidade e segurança para o animal. Dificilmente um animal equilibrado ataca.

Para dizer que agradece as dicas mas não há qualquer condição de não gritar e correr durante um ataque, para dizer que valeu, obrigada, agora está com medo de cachorro ou ainda para dizer que este texto é sim crueldade animal: sally@desfavor.com


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