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Mentes lacradas.

Mentes lacradas.

| Desfavor | | 17 comentários em Mentes lacradas.

Um vídeo se tornou viral durante a madruga desta quarta-feira(22) nas redes sociais. A filmagem mostra um menino de 12 anos supostamente beijando seu namorado de 14 durante o ”parabéns” da festa de aniversário. LINK


Quando “lacrar” é mais importante do que qualquer tipo de coerência e bom senso. Desfavor da semana.

SALLY

Para você que não acompanhou a notícia, um breve resumo: circulou pelas redes sociais esta semana um vídeo onde um menino de 12 anos comemora seu aniversário de 12 anos em uma festa temática decorada com Pabllo Vittar. No vídeo ele aparece beijando seu namorado e cantando uma versão diferente do “Parabéns para você”, onde ao final todo dizem: “é pica, é pica, é pica é pica é pica, é rola, é rola, é rola é rola é rola, no seu cu”.

São muitos desfavores. Começa por criança de 12 anos se agarrando com outra criança na frente de uma câmera. Pouco me importa se gay ou hetero, não acho que uma criança de 12 anos deva ser exposta desta forma em uma filmagem. Francamente, acharia de péssimo gosto se qualquer pessoa, mesmo que adulta, ficasse se agarrando com alguém desta forma, neste contexto. Ao contrário do que a militância do lacre tenta massificar, não se trata de preconceito contra gay e sim de conceito de inadequação.

Como se não fosse um desfavor esta erotização precoce documentada, a família do garoto estava presente e aplaudindo. Fica claro que é uma família que encoraja esse tipo de ostentação sexual precoce, que hoje em dia é lacração, é cool, é moderno. Se fosse algo socialmente condenável, mal visto, certamente a família não permitiria ou ao menos não deixaria ser filmado, de onde concluímos que hoje, o que os pais permitem/incentivam na criação de seus filhos não está relacionado com os valores daquela família e sim com o que a sociedade aplaude. Pois é, depois de uma geração de pais relapsos que tiveram filhos criados pela televisão, agora temos uma geração de pais relapsos com filhos criados pela internet.

Os amiguinhos, contrariando o discurso de mundo opressor preconceituoso, parecem estar muito de boa com o menino chupando a boca do colega e cantam animados uma versão baixaria do Parabéns. Talvez seja hora de rever esse discurso de que o mundo oprime os gays. Oprimia, hoje parece que está polarizado: um lado oprime, o outro aplaude como mérito. Quanto tempo teremos que esperar para que finalmente se admita que, ao menos para uma parcela da sociedade homossexualidade deixou de ser tabu e agora está na moda? Algo que deveria ser tratado com normalidade vem sendo tratado como mérito, motivo de aplauso.

Quem nos acompanha sabe que achamos homossexualidade algo natural, que deve ser respeitado como qualquer orientação sexual. Porém, quando a coisa descamba para o outro lado, quando a pessoa começa a definir sua orientação sexual para ser lacrador, para ser moderninho, para estar na moda, ficamos no mínimo preocupados. É cool ser gay, é descolado ser gay. Em cabecinhas em formação, como a de um menino de 12 anos, há uma tendência grande a fazer o que está na moda. É por isso que não se permite que crianças façam tatuagens e outros procedimentos irreversíveis. Será que uma criança nessa idade não merece ser protegida de uma escolha precoce que, graças à internet, será irreversível?

Não quero com isso dizer que quem é gay passa vergonha e tem que se esconder. Quero dizer que ostentar uma sexualidade (qualquer que seja) aos 12 anos de idade e ter isso documentado para sempre pode sim afetar a vida de uma pessoa. Acho curioso quem fala que “se fosse um beijo com uma namoradinha ninguém estaria falando nada”. Eu estaria. Mas, apenas pelo amor ao debate, por mais injusto que seja, ninguém perde emprego por beijar uma namoradinha, ninguém apanha na rua por beijar uma namoradinha, ninguém é expulso dos lugares por beijar uma namoradinha. Apesar de boa parte da sociedade aplaudir homossexuais hoje, não é 100% das pessoas que o faz. Então, vivemos em sociedade e é inteligente se preservar se você faz algo que pode te prejudicar, por mais no seu direito que você esteja.

Esse menino de 12 anos não tem noção total das potenciais consequências dos seus atos. Por isso, ele deveria estar protegido pelos pais. E antes que alguém venha com um argumento lamentável como “Quer dizer que então gay tem que se esconder?”, quero esclarecer que existe um mundo de diferença entre se esconder e não ostentar. Não, não tem que se esconder. Mas será que precisa filmar e disponibilizar para todo o Brasil ver? Pensemos em qualquer outra situação de cunho sexual: se um casal gosta de sadomasoquismo, é adequado se filmarem algemados, levando choque, e mostrar ao mundo sua prática? Todo mundo acharia over, certo?

Eu me considero um exemplo de pessoa que tem direitos e não os exerce para se preservar: vivo em um país que preza pela liberdade de expressão, seria meu direito falar o que quiser mostrando a cara, no entanto, não o faço para me preservar. Apesar de ter esse direito, apesar disso ser a coisa certa a se fazer, eu sei que custa caro e prefiro me poupar.

Obviamente esse vídeo chocou muita gente, pelos mais diferentes motivos. E obviamente esse menino virou mais um cabo eleitoral do Bolsonaro. Transições sociais devem ser conversadas, discutidas, permeadas por informação e debate. Fazer o que essa turma do lacre faz, de esfregar algo no nariz dos outros com a clara intenção/satisfação de agredir é pedir para dar merda e ter um efeito rebote muito, muito ruim, neste caso, chamado Bolsonaro.

Não sei de onde este povo bunda, ofendido e complexado tirou que se combate intolerância com raiva, agressividade e esfregando na cara aquilo que a sociedade tem dificuldades em lidar. Intolerância se combate com informação, não com revanchismo, sob pena de se tornar tão intolerante quanto. Em breve vão descobrir isso da pior forma: quando você puxa um cabo de guerra com força para um lado, a reação normal do outro lado é puxar ainda mais forte e, spoiler, o outro lado ainda é maioria. O que estão fazendo é de uma falta de inteligência sem precedentes.

Típico. Minoria que nunca teve poder quando ganha algum poderzinho pequeno, um mínimo de representatividade, surta. Se acham fodas, invencíveis. Querem vingança, querem esfregar na cara da sociedade. Infelizmente o sonho de todo oprimido costuma ser se tornar opressor. E essa conta, todos nós vamos pagar.

Lamentável crianças de 12 anos sendo expostas a erotização precoce, ao lacre social. Lamentável esse equívoco de achar que chocando a sociedade se abre alguma porta. Lamentável a turma do lacre estabelecendo que quem criticou este caso é homofóbico e preconceituoso. Lamentável Bolsonaro 2018.

Para dizer que quem apoia a causa gay tem que apoiar este vídeo, para dizer que se Bolsonaro fosse presidente isso não aconteceria ou ainda para dizer que isso sempre aconteceu e que a novidade não é o ato em si e sim a câmera e o youtube: sally@desfavor.com

SOMIR

Reforço o que a Sally disse, mais porque alguém que não nos acompanha regularmente pode estar lendo isso: o problema não é a orientação sexual desses meninos. Pelo menos não no sentido tradicional das críticas que surgem por aí. Homossexualidade por si só não deveria incomodar pessoas minimamente inteligentes. Infelizmente esse mínimo de racionalidade ainda está distante demais do brasileiro médio, mas não muda o fato de que na prática policiar a orientação sexual alheia é um atraso enorme na sociedade.

Dito isso, apesar de não ser o problema em si, o fato dos garotos serem gays faz diferença sim no que estamos analisando aqui: na guerra contra o preconceito e a intolerância, sobram algumas balas perdidas para um dos maiores aliados de uma sociedade saudável e inclusiva, o bom senso. Não nego que exista um prazer em imaginar um reacionário religioso se contorcendo ao ver o beijo dos dois meninos, mas não é só de provocações que uma evolução social é feita.

Na verdade, a provocação nem é um mecanismo funcional de mudança. Porque quem é provocado costuma solidificar sua opinião anterior, como sabemos bem, bem complicado mudar a mentalidade de alguém na grosseria e no deboche. A provocação serve mais para chacoalhar quem está em cima do muro e permitir que mais pessoas venham para o seu lado da causa. A fase de ficar provocando gera resultados pífios, mas logo depois dela a sociedade começa a se acertar. Não com as pessoas mais putas da vida de ambos os lados de um tema, mas com a imensa maioria que lentamente se alinha com um deles.

Estamos vivendo uma fase onde boa parte das provocações das ditas minorias “pegaram” na sociedade. Não no sentido de termos alcançado igualdade e tolerância, mas pelo menos no interesse do cidadão médio por essa disputa ideológica entre progressistas e conservadores. Vemos ainda a parte feia, mas podem ter certeza que tem gente se importando com a discussão sobre feminismo, racismo e homofobia que seria impensável há algumas décadas. Pode parecer a hora mais assustadora atualmente, mas de alguma forma, estão saindo do muro.

E é aqui que precisamos ficar espertos: o cidadão médio pode pular para qualquer lado desse muro. O lado que parecer mais seguro historicamente é o escolhido, então não ajuda nenhuma causa gerar confusão demais para onde estão chamando as pessoas. E exemplos como o que trazemos hoje nos preocupam justamente por criar um ambiente perigoso do lado progressista do muro. Na sanha de lacrar, esquecem que a sociedade humana passou séculos subindo no muro da sexualização precoce. Mudamos muitos hábitos para proteger mais nossas crianças e pré-adolescentes de serem jogados precocemente nesse aspecto adulto da vida.

Eu ainda aposto que o cidadão médio tem que fazer um esforço para achar muito estranho um menino ou menina de 12 ou 13 anos de idade muito novo para uma vida sexual (a maior parte da população é pobre, e sexualização precoce é uma constante nesse grupo socioeconômico). Sem contar que nem muito tempo atrás, era comum a menina casar nessa idade… mas de alguma forma, estamos vivendo num mundo onde é cada vez mais comum queremos proteger essas faixas etárias. Isso tem funções muito práticas para a sociedade: aumenta o tempo de desenvolvimento intelectual dos jovens para uma vida adulta menos problemática, além de reduzir o número de mães e pais adolescentes (que tendem a criar mal crianças num ciclo sem fim).

Então, quando olhamos para essa notícia e vemos um problema, ainda estamos preocupados com quem está em cima do muro da sexualização precoce. Por mais que o problema da gravidez seja praticamente anulado com casais homossexuais jovens, ainda tem uma preocupação com a continuidade do desenvolvimento dessas pessoas se expostas muito cedo a um ambiente adulto. Se os meninos e meninas heterossexuais devem ser protegidos dessa vida cedo demais, por que não os homossexuais?

Eu sou adulto o suficiente para ser exposto a um ambiente de baixaria e promiscuidade sem me sentir obrigado a seguir essa mentalidade, mas um garoto de 12 anos? Existem motivos para proteger menores, e eles se baseiam quase que exclusivamente em sua baixa capacidade de resistir a estímulos externos e mimetizar comportamentos alheios sem noção de responsabilidade pessoal. Sem contar que todo o aspecto sexual traz a pressão da seleção de parceiros e do valor fútil e imediatista da imagem. Precisa de estrutura para lidar com isso. Não importa quão aberta seja a criação, falta desenvolvimento cerebral nessa idade.

Sim, muito bacana dar um tapa na cara dos reacionários, mas precisa jogar uma criança embaixo do trem para conseguir esse resultado? Se for pra fazer isso, faz com o Pablo Vittar mesmo, que ele/ela está nessa de livre e espontânea vontade (presumo), não com dois moleques que ainda não entendem porra nenhuma do mundo, e como a Sally bem disse, ainda nem sonham direito com o custo que essa exposição pode ter para suas vidas. No final das contas, expõem os moleques e só deixam os reacionários mais certeiros de suas opiniões. O cidadão médio não tem uma indicação muito clara para qual lado do muro descer. E com o argumento que gays “distorcem” as mentes de crianças ao dispor do adversário, que vantagem se leva aqui?

Quer ser gay? Seja. Quer promover baixaria na sua vida pessoal? Você é livre. Mas pelo menos não vamos fingir que isso avança alguma coisa na discussão pela segurança e liberdade de quem se sente oprimido, porque uma coisa não tem nada a ver com a outra.

Para me chamar de intolerante, para dizer que somos homofóbicos, ou mesmo para dizer que dá muito trabalho entender tudo isso: somir@desfavor.com


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