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Concorrência desleal?

Concorrência desleal?

| Somir | | 14 comentários em Concorrência desleal?

Estamos vendo avanços consideráveis no desenvolvimento de bonecas sexuais no mercado. Recentemente, tivemos até uma polêmica sobre uma que simulava não estar gostando dos avanços de seu dono… uma espécie de boneca do estupro. Acredito que nem precisamos entrar no mérito do que está errado aqui, na verdade, meu ponto hoje é outro: é provável que esse tipo de boneca sexual torne as mulheres obsoletas num futuro nem tão distante.

Sim, foi uma frase isca. Obsoleta em alguns aspectos, e provavelmente até com pontos positivos lá na frente. Primeiro, vamos pensar sobre o que se torna obsoleto com bonecas sexuais popularizadas; e por popularizadas eu quero dizer eficientes no que se propõem a fazer e com produção massificada para reduzir seu preço e permitir uma distribuição eficiente. Via de regra, assim que um produto pode ser comprado por puro impulso por uma parcela considerável da população, está popularizado.

Dito isso, considerando que as bonecas não precisam ser tão avançadas assim ao ponto de fazer algo além de reagir com sons e movimentos rudimentares na hora do (pretenso) sexo, já temos um cenário onde uma geração de “herbívoros sexuais” pode se desenvolver plenamente. Importante entender que homens e mulheres são bem diferentes nessa hora, homens precisando de muito menos estímulos complexos para satisfazer suas vontades. Estamos pensando num grupo de cidadãos que normalmente não precisariam de muito mais do que um buraco suficientemente lubrificado para achar graça na situação tendo justamente isso com apenas uma fração do esforço necessário para conseguir uma mulher real.

E o argumento que mulher está fácil no “mercado” de hoje é um tanto quanto falacioso: mulheres estão fáceis para quem já conseguia antes. Diminuiu o grau de dificuldade, mas a barreira de entrada continua a mesma. Não é sobre a mulher, é sobre o cidadão que deseja a gratificação sexual. Se esse cidadão não vai levantar o dedo para sequer começar um contato ou se colocar numa situação onde pode conseguir isso. Não importa o quão fáceis tornem-se as mulheres, ainda não muda a barreira de entrada. Quem quer apenas o ato sexual sem nada ao redor pode muito bem se satisfazer com a boneca.

E se você discorda disso, parabéns por não ser doente da cabeça; mas se anos de trabalho em publicidade me ensinaram uma coisa, é nunca subestimar a babaquice alheia. Entrando na cabeça do público-alvo de uma boneca sexual que reage rudimentarmente ao toque, parece ser basicamente o mesmo que imagina interações com o sexo oposto através de personagens imaginários. Para quem o outro é irrelevante – e com geração após geração enxergando o mundo atrás de uma tela isso é cada vez mais comum – o próprio ser humano torna-se artificial.

Então, que diferença faz? Talvez para você faça, mas… e para quem realmente compra um produto desses? Eu tenho a teoria de que a linha entre o comportamento supostamente natural e o considerado totalmente maluco é muito mais tênue do que se imagina. A pessoa que parece bem ajeitada na vida precisa apenas de um pequeno empurrão e aceitação para tornar-se um tipinho dos mais… alternativos. E quanto mais a sociedade caminha para a separação dos núcleos familiares e inclusive a cada vez mais comum decisão de não formar uma família no sentido tradicional da palavra, maior a liberdade do cidadão para variar da norma.

Eu mesmo escrevi um texto dizendo que esse negócio de família tradicional era uma bobagem, mas eu reviso isso num ponto: algumas pessoas podem não estar preparadas para viver sem supervisão social constante. E com a oferta de companhia sexual, ainda mais objetificada dessa forma, fica muito mais fácil cruzar a linha entre o que hoje considera-se patético e o que é fácil demais para não ser explorado. Quem mora sozinho e não tem vida social presencial pode ter uma boneca sexual facilmente, sem nenhum julgamento alheio. E quanto mais isso acontece, mais o mercado adapta-se aos novos clientes.

Mas nada temam, não parece ser o fim da civilização como conhecemos. A mulher que se torna obsoleta com as bonecas sexuais já era uma boneca sexual para começo de conversa. E nem é uma crítica a comportamentos promíscuos de algumas mulheres, é que na cabeça desse público masculino propenso a consumir o produto, elas nem eram uma coisa real mesmo. Quem fica obsoleto é um conceito de mulher “virtual” no mundo real. Bonecas são tão reais quanto o necessário para quem as quer.

Até por isso eu não entendo a preocupação prévia de feministas com o desenvolvimento do mercado de bonecas sexuais. Nem as bonecas nem as visões sobre mulheres de seus compradores são reais. O futuro de boa parte da humanidade está sim nesse tipo de parceria “irreal”, a diferença entre a boneca e o relacionamento virtual é basicamente nenhuma. As mulheres não vão ser mais ou menos respeitadas, porque bonecas sexuais não são sobre mulheres reais!

A ilusão é uma grande tendência, e o mercado vai responder diretamente para essa tendência, azar de quem não gostar. As bonecas sexuais vão vender muito justamente por serem uma demanda reprimida, que já existe, mas que as de carne e osso não conseguem suprir fisicamente. E já vou dizer agora: as mulheres vão seguir esse caminho também, mas um pouco depois dos homens. Quando os bonecos forem capazes de suprir carência e demanda reprimida por relacionamento sem esforço, os homens tornam-se obsoletos também.

A humanidade é um produto em final de linha. Por sorte ou azar, somos uma das últimas versões dessa iteração do projeto.

Para dizer que a punheta venceu, para dizer que seres humanos são uma moda passageira, ou mesmo para dizer que é a favor dessas coisas saírem do mercado (os homens): somir@desfavor.com


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