
Então você quer empreender?
| Somir | Somir Surtado | 13 comentários em Então você quer empreender?
Então você quer empreender?
Aqui no desfavor falamos do que muitas outras pessoas falam, mas com uma dose de honestidade toda especial. Se você pensa em abrir um negócio próprio, existem milhares de guias sobre o que e como fazer, mas até hoje eu não vi um que explicasse de verdade a merdalheira que é. Sua motivação arrasada ou seu dinheiro de volta!
Em primeiro lugar, vamos entender a mentalidade de abrir uma empresa: você está numa guerra enorme e sua divisão é aquele que está na linha de frente. Por pura probabilidade, a maioria daqueles que abrirem uma empresa levarão tiros logo no começo da batalha, morrendo pelo caminho. Porque o mercado tem muitas e muitas balas para atirar na direção daqueles que resolvem desembarcar no seu território. Parta do princípio que você vai falir, porque adivinhem só? A maioria das pessoas fale em até dois anos.
E não é à toa, é difícil mesmo. Difícil porque o mercado é uma guerra e difícil porque assim como a maioria das pessoas, somos incompetentes. Você pode até ser bom no que faz, mas existe uma diferença gritante entre produzir ou prestar um serviço e ter uma empresa que faz isso. E pode apostar, a não ser que você passe anos se preparando em administração de empresas (não só a teoria, mas a prática), você vai ser uma merda nisso. E o pior? Você só vai descobrir o quão merda é na hora de gerenciar uma empresa quando estiver pagando o preço por isso.
Muitas coisas ruins podem acontecer, mas que impostos, regulamentos e burocracia em geral vão te deixar maluco, todo mundo deveria saber. Por desencargo de consciência, fica o aviso: seu contador é mais importante que qualquer outro funcionário. Escolha como se estivesse escolhendo alguém pra casar e trate muito bem. Se sua empresa precisar de departamento jurídico, ame eles também, apesar de serem advogados… quando esses dois setores fazem besteira, você se fode de uma forma espetacularmente pior que o resto do funcionamento da sua empresa.
Mas como eu disse, isso outros guias podem te dizer. Eu vou me concentrar no fator humano. Porque isso o SEBRAE não pode te dizer: pessoas são uma merda, e elas são o seu problema mais comum quando se tem uma empresa. Dos clientes aos funcionários, a dor de cabeça é constante. É fácil empinar o nariz e dizer que todo mundo é imbecil no Brasil (embora sejam mais do que a média), mas isso não resolve seu problema.
Pessoas em média são ruins no que fazem, pensando no quadro geral. Cidadão pode ser bom na parte técnica, mas ser ruim no relacionamento com os outros, pode ser muito bem apresentável e encantar os clientes, mas fazer tudo errado na organização interna e enlouquecer sua estrutura, pode ser um gênio capaz de aprender funções novas em questão de dias, mas viver cheio de encanações. A verdade é que cada ser humano que aparecer para trabalhar com você, seja fornecendo, vendendo, comprando… todos vem num pacote complexo de vantagens e desvantagens que vão consumir a maior parte do seu tempo.
Quando eu comecei no meu trabalho, achava que passaria a maior parte do tempo com a bunda numa cadeira, trabalhando diante de um computador. Na vida real, passo mais tempo em reunião do que qualquer outra coisa. Claro que em cada tipo de negócio temos uma mecânica diferente, mas é essencial já enfiar na cabeça que a partir do momento que você não é mais empregado, vai passar muito, muito tempo mesmo preocupado com as personalidades alheias, inclusive procurando formas de desarmar as mais diversas bombas que fatalmente vão aparecer no caminho.
E vamos pensar em algo aqui: você provavelmente não vai ter capacidade de pagar para seus funcionários nada nem próximo do justo. E às vezes vai ser culpa sua: muitas empresas falem porque o animal do dono não consegue fazer um cálculo básico de custos e receitas, ou é arrogante ao ponto de não delegar pelo menos essa parte. Tudo o que você gasta numa empresa, tudo, tudo mesmo… faz parte do preço que você cobra. O tempo que você demora pra fazer faz parte do preço. E é complicado calcular isso, ainda se você estiver no ramo de serviços. Ou você paga – e paga bem – pra alguém botar todos seus números em ordem e OBEDECE a porra do planejamento que recebeu, ou vai ter que ser bom em matemática financeira além de ser bom no seu trabalho.
Mas vamos voltar um passo: começar um negócio. Gezuiz, como eu odeio a mentalidade das pessoas nisso, eu incluído. Não é um mercado de grandes ideias, é um mercado de fazer dinheiro com uma ideia. Grandes coisas ter um produto que ninguém vende se ninguém vai comprar, ou se você não vai ter dinheiro pra enfiar na cabeça das pessoas que elas tem que mudar um hábito. As grandes empresas inovadoras que você conhece não foram as primeiras a fazer aquilo, foram as primeiras a ganhar dinheiro com aquilo. Pode ter certeza que por pura estatística alguém já teve a mesma ideia que você teve, a primeira coisa a fazer quando você “descobre a roda” e decide que vai investir num mercado novo é justamente pensar por que diabos não tem alguém ganhando dinheiro com isso ainda. Porque alguém já deveria estar se fosse bom mesmo.
Se tem alguém bem no mercado, é um excelente sinal pra você, quer dizer que aquilo funciona e algum sofredor já passou por todo o processo de abri-lo. Não tem nada fácil nessa vida, nada é de graça. Você tem uma chance de ir pra frente se trabalhar muito, de forma quase doentia (quase sempre doentia de vez), fizer a parte administrativa muito bem e dar sorte. Ou, você pode fazer tudo errado e dar MUITA sorte. Tem gente que ficou rica assim, é meio que uma loteria. Mas como toda loteria, a chance de efetivamente o premio cair no seu colo é minúsculo.
E voltemos ao fato de você ter pouco dinheiro para pagar seus funcionários. Mesmo fazendo tudo direito e não afundando as finanças da sua empresa achando que gastar dez horas de trabalho para entregar algo pelo qual vai receber cinco, ainda temos o elefante na sala: você provavelmente vai ter que explorar outras pessoas para se dar bem. Todo mundo quer ganhar bem e trabalhar pouco, mesmo que não diga isso na cara dura… e quando você não entrega a parte do ganhar bem, as pessoas tendem a ir para a segunda melhor opção. Sorria: se você tiver funcionários, vai ficar puto com eles na maior parte do tempo por não fazerem nada direito. Sempre falta alguma coisa, sempre tem algum problema…
E é muito por isso que qualquer empresa de sucesso tem uma coisa em comum: uma ou mais pessoas que perderam completamente a vida para cuidar desse bebê chorão. É basicamente impossível ter mão de obra eficiente na maioria do tempo, ainda mais quando tem que tomar decisões. Eu já fui funcionário merda e sei muito bem o que é isso. Eu sou da categoria de quem aprende super rápido mas está sempre com problemas, por sinal. Tem que ser bem esperto para gerenciar esse tipo de funcionário.
Para corrigir a maioria de pessoas ruins no que fazem, uma ou duas pessoas a cada ambiente de trabalho tem que dar conta de todos os trabalhos que ficam mal-feitos. A tendência é que o dono da empresa assuma esse papel de limpar bundas eternamente, mas algumas vezes você dá sorte e acha alguém que tem esse tipo de mentalidade sem ser obrigada a tal por ser dono (Sally é um ótimo exemplo disso). O problema é que isso custa tão caro para a vida dessas pessoas que ou as coisas começam a dar certo logo, ou começam a cair na falácia do investimento: quanto mais a pessoa trabalha num negócio ruim, mais se sente mal de jogar tudo fora.
Ter uma empresa é uma merda que consome sua vida, e a não ser que você saiba fazer as coisas muito bem, ainda te deixa com menos dinheiro do que entrou. Dica: evite trabalhar muito barato por oportunidades futuras, é mentira na maioria das vezes. Empresas grandes sacaneiam empresas pequenas como método de trabalho, não seja bonzinho com nenhuma corporação que você não fala direto com o dono de tudo, e mesmo assim, empresas vivem tirando dinheiro umas das outras com promessas vazias.
Seus clientes provavelmente vão te enlouquecer, seja com produtos ou serviços. As pessoas tendem a não entender quase nada do que você diz para elas através de textos, e dificilmente se importam o suficiente com você para avisar qualquer problema antes de ser tarde demais. Seu cliente é sua fonte de renda, tem que ser bem tratado, mas considere-o uma fonte constante de risco. Você tem que ter planos para lidar com clientes ruins e saber tomar a decisão de cortá-los caso eles custem caro demais. Um cliente ruim contamina dez bons.
Do fundo do meu coração, a dica é para não abrir um negócio a não ser que você esteja com muita certeza que vai agüentar esse inferno. Tem coisas muito melhores do que a vida de empregado, liberdade e criatividade numa escala muito maior, é divertido mandar nos outros, quando as coisas dão muito certo é você que ganha o dinheiro… mas vai custar caro. Vai custar muito caro lidar com tudo o que vem no pacote. Tem que compensar. Seu plano está considerando isso?
Se não estiver, que esteja. Burocracia e imposto é chato, mas meu sonho seria que só isso atrapalhasse. Em qualquer negócio o pior e o melhor são as pessoas. E quando elas dão de ser o pior… é dose.
Para reclamar do atraso, para reclamar do atraso, ou mesmo para reclamar do atraso: somir@desfavor.com
Meu lema atualmente é: “O canal agora é manter um negocio proprio.” Note que eu nao digo “ter”, mas “manter”.
Mas depois de ler este texto, verifiquei que ha algo mais do que taxas abusivas pra pagar.
Tambem me enganei quando achava que a estimativa de lucro era de tres meses. Dois anos esta mais proximo da realidade.
Um texto pra pendurar na porta da geladeira e ler todos os dias.
Somir, valeu mesmo!
Somir, só uma coisinha: verbo falir é irregular e não existe a forma “fale”. (Segundo parágrafo, última linha) Mas isso você já sabia, né? Foi somente um momento de desatenção.
Eu e meu marido temos uma empresa super pequena, com apenas um funcionário, a empresa tem 5 anos e até o momento deu pra sobreviver. Até um ano atrás eu trabalhava fora e ajudava bastante no orçamento, mas fui demitida e com a crise do momento as coisas ficaram mais difíceis.
Mas na verdade nosso medo sempre foi de dar o passo maior do que as pernas, fazer a empresa crescer sem afundar de vez, assim como estamos sobrevivemos mas não crescemos! Acho que precisamos de um pouquinho de sorte!!
Oi Somir,
Parei meu trabalho para ler, e vou reclamar do atraso sim – mas não do texto.
Tem várias coisas que eu gostaria de comentar (e compartilhar) sobre este assunto, mas meu tempo anda terrivelmente escasso…
Bem vindo ao time. Sempre um prazer ouvir essas reclamações. Quando puder responda ou mande um desfavor convidado.
” As pessoas tendem a não entender quase nada do que você diz para elas através de textos”
PQP! É a pura verdade. São analfabetos funcionais ou têm o mesmo nível de concentração de um peixinho dourado. Ou, geralmente, ambos.
A minha teoria é que tem gente com tanta dificuldade de entender as coisas que nenhum salário compensa…
Somir, eu até ia reclamar mesmo do atraso – Desfavor vicia, viu? – , mas depois de ler o texto, nem quis mais. Verdades duras, mas que tem que ser ditas. Posso dizer que a espera, neste caso, até que valeu a pena…
Um fator externo sem filtros causou problemas. Mas se serviu para desmotivar, valeu!
Já tentei, odiei. Vou trabalhar autônoma na minha linda profissão mesmo, ou comércio que sempre me deu grana, com uma canseira até tolerável.
O lance é ganhar o dinheiro compatível com seu esforço e habilidade. Se achar isso empreendendo, bacana. Mas se não achar, autonomo ou empregado funcionam também.
Totalmente identificada com seu texto, sendo filha e neta de empreendedores. Foram experiências em familia tão boas que optei pela estabilidade.
Faltou apenas tratar do quanto um sócio ou sócios podem atrapalhar sua vida, tanto quanto um mau contador ou péssimo advogado. Sobretudo quando se entra apenas com o capital, e o conhecimento do negócio (técnico, financeiro, de networking, etc) está com os outros.
Até por isso eu falei tanto do fator humano. Sócios são pessoas, estou esperando a era das máquinas ansiosamente…