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Muito desfavor!

Muito desfavor!

| Desfavor | | 14 comentários em Muito desfavor!

A semana foi tão maluca, mas tão maluca, que não conseguimos sequer definir um tema. Então, vamos com todos.

SALLY

Esta semana foi uma tsunami de desfavor que nos soterrou a ponto de não conseguirmos escolher um tema. Quando você gasta duas páginas apenas para enumerar os principais desfavores da semana que poderiam ter recebido um texto próprio, é sinal de que este é o Desfavor da Semana: a quantidade de desfavores relevantes que aconteceram em um curto período de tempo. O final de 2016 está frenético, histérico, traumático. Eu não aguento mais! Eu não consigo mais acompanhar tudo! Não tenho mais forças para 2016!

O que teve essa semana? Renan fugindo de oficial de justiça (orientado por Ministro do STF), se recusando não apenas a receber notificação como também a cumprir decisão judicial, o STF (Supremo Tribunal Facultativo) aceitando e mantendo ele no cargo, para, no dia seguinte, Renan dizer que decisão judicial é para ser cumprida. Acho que a imprensa se enganou, ele deve ter dito que decisão judicial no Brasil é para ser comprida. Teve comoção à exaustão com a Chapecoense em um evento muito do cagado, bem pior do que o organizado pela Colômbia, imprensa monotemática e porradaria no enterro. Teve boate pegando fogo, matando gente, com direito a whatsapp de despedida “mãe eu tô morrendo”. Teve projeto de lei tramitando na Câmara para proibir o Uber em todo o país.

Descobrimos que o Brasil gasta quase 200 milhões por ano pagando aposentadoria de juízes condenados, que deveriam ter sido escorraçados mas foram apenas aposentados. Em compensação, com a reforma da previdência, se você não for militar, fique sabendo que não vai se aposentar, a menos que seja Highlander e consiga trabalhar por 50 anos (e mesmo assim vai receber apenas um percentual do que recebia quando trabalhava). A CLT não te permite trabalhar antes dos 18 e a previdência te exige 50 anos de trabalho. A conta não fecha. Mas a torneira tem que fechar, os cofres estão quebrados de tanto que foram roubados, então, o povo é quem vai sofrer. Na verdade, não vai resolver, pois graças ao alto índice de desemprego essa medida não vai bastar.

A polícia carioca não decepcionou. Deu soco na cara de mulher, aceitou suborno para não prender bandido, foi flagrada sequestrando e cobrando resgate e jogou bomba dentro de igreja. O Judiciário também não. Permitiu que o condutor da lancha que decapitou uma criança responda ao processo em liberdade, peidou para o Renan e se descobriu que tribunais vem fazendo julgamentos simulados, quer dizer, nem ao menos se dão ao trabalho de fingir, decidem sem nem julgar. CPI do futebol não deu em nada, ninguém vai ser indiciado ou punido, gastaram nosso dinheiro para acabar em pizza. Enquanto isso a reforma do ensino médio foi votada e nenhum de nós nem viu, pois estávamos soterrados de desfavor e não conseguimos acompanhar tudo que aconteceu na semana.

Brasil também não decepcionou, como era esperado, tonelada de desfavores. Descobrimos que o aplicativo Google Allo aprendeu gírias como “falsiane” e agora pode ser amplamente usado pelas Nem de todo o país. Também constatamos o resultado vergonhoso do desempenho dos alunos brasileiros no PISA (Programme for International Student Assessment): mais da metade não consegue compreender um texto ou realizar contas básicas. Ficou entre os cinco piores do mundo, apesar da verba para educação ter aumentado. Pois é, o problema não é dinheiro. Só perdeu para República Dominicana, Argélia, Kosovo, Tunísia e a região da antiga Iugoslávia/ Macedônia. De resto, meus amigos, todo mundo é melhor que o Brasil. Para terminar, um turista italiano entrou em uma comunidade pacificada guiado pelo GPS e morreu metralhado.

Dilma vai se candidatar ao Senado. Lula à Presidência. Aliás, estão fazendo mais uma vaquinha para arrecadar dinheiro para o Lula na internet. Dr. Rey vai se candidatar à Presidência. Até o jogador Adriano, o Imperador está cogitando se candidatar à Presidência. Rodrigo Maia quer ser reeleito. Um Ministro do STF pediu o impeachment de outro Ministro do STF. A esposa de Cabral foi presa (por receber uma propina semanal de 300 mil) em um bairro chique do Rio de Janeiro, mas tão chique, que os manifestantes estavam tocando violino quando a polícia a levou. Dos 21 vereadores de Osasco, 10 foram presos. Enquanto isso Temer era eleito o homem do ano pela revista Isto É (que se diz a mais combativa do país) e fez um acordo para perdoar 90% das multas das empresas com dívidas, porque né, tá sobrando dinheiro no país. Dilma foi eleita uma das mulheres do ano pela Financial Times e, para fechar este bloco, Trump foi eleito a personalidade de 2016 pela revista Time. Quem foi que disse que escândalo de abuso sexual abalava reputação de um homem?

Caíram mais aviões, pois o da Chapecoense tava pouco. Caiu avião no Paquistão (48 mortos), caiu um outro avião na Colômbia, caiu avião em Manaus e caiu um avião na Suíça. No Brasil, caiu um helicóptero com uma noiva que ia se casar e uma fotógrafa grávida que ia registrar o momento. Quem foi punido até agora? Bom, sobrou para a coitada da boliviana que tentou alertar que o combustível do avião da Chapecoense era insuficiente e ela fugiu para o Brasil. A natureza também fez das suas. Terremoto na Indonésia é normal, mas também teve na Califórnia e nas Ilhas Salomão, todos de intensidade alta e com alerta de Tsunami.

Refugiado na Alemanha barbariza, estupra e mata alemã, enquanto isso, Roraima decreta estado de emergência por causa de uma invasão de venezuelanos, que graças ao maravilhoso governo de esquerda que tem dinheiro para colocar um holograma de Hugo Chávez pelas ruas, não come. Mulheres vendem seu cabelo, se prostituem por comida, mas é tudo mentira da direita capitalista, Maduro sabe o que é melhor para o povo, e se não souber, o passarinho encarnado conta a ele. Enquanto isso girafas e metade de tubarões e arraias do Mediterrâneo estão ameaçados de extinção. Criança de oito anos é brutalmente estuprada e adolescente de 15 anos decapitou colega na escola. A taxa de juros aumentou no Brasil e na Rússia o jogo FIFA 17 vai ser banido por ser considerado propaganda gay.

O Rio de Janeiro, que neste mesmo ano de 2016 foi classificado como lugar onde o trabalhador demora mais tempo para chegar de casa ao trabalho e do trabalho a casa (mais do que São Paulo), vai ser usado como referência em logística mundial. A logística de transporte do Rio vai virar referencia para o Brasil. Meus pêsames. Petrobrás que negou, negou e negou, vai aumentar o preço da gasolina. A Comic Com realizada no Brasil foi muito cagada, desorganizada e mal falada. Eu comentei que as taxas de juros aumentaram? Bolsonaro foi desmascarado, o vídeo que ele apresentou como prova contra Jean Wyllys era falso, não passava de uma montagem. Atriz americana está sendo processada pelos próprios embriões congelados.

Na parte social, a coisa tá bem bacana também. Mocinha leiloa virgindade por 73 milhões. Moda de criar bonecas como se fossem filhas de verdade aumenta. Nova derivação gay chamada Gouine veio para mostrar que os rótulos vem das próprias minorias. Um homem cortou o próprio pênis porque a mulher se recusou a fazer sexo com ele e outro está dando o que falar por ter um pênis biônico. Uma fazendo no Rio encena escravidão como atração turística enquanto que o programa A Fazenda foi cancelado por causa da crise econômica, não tem dinheiro mais nem para comprar dois avestruzes e uns patos. Um parque temático no Irã (“Parque para crianças revolucionárias”) ensina crianças como matar coleguinhas do Ocidente, com atividades muito saudáveis como atirar em bandeiras e fotos de ocidentais e até manipular granadas e bombas.

Isso, querido leitor, é um resumo do que aconteceu na semana. Me diz se alguém consegue acompanhar tanto desfavor junto? Cada assunto desses daria um belo texto, mas infelizmente tivemos que passar por eles com a profundidade de uma colher de chá. Serão esses os novos tempos de excesso de informação? A coisa vai ficar cada vez mais frenética e vamos ser obrigados a viver na superficialidade? Até onde esse esforço por estar atualizados compensa mais do que estressa? Jacaré no seco anda?

Sério mesmo, 2016 foi um ano louco, frenético e este final de ano está pior ainda. Vocês não tem ideia da quantidade de vezes que já tive que recontar o Bolão Desfavor, toda semana uma novidade que altera o resultado. Desastres, mortes, prisões, polêmicas… Não sei se vocês tem esse mesmo sentimento, mas eu sinceramente preciso de um período de serenidade, estou exausta. E sim, eu acho que com a virada do ano a coisa muda, pois apesar de calendário ser uma mera convenção, sabemos que o brasileiro não faz porra nenhuma após o carnaval, é cultural, vem calmaria por aí até março. Chega, por favor, chega de 2016!

Para citar notícias que esquecemos de colocar, para dizer que também não aguenta mais 2016 ou ainda para dizer que a retrospectiva do ano vai ter que começar dia 15 para dar tempo de mostrar tudo: deixe seu comentário

SOMIR

Se alguém estava com alguma dúvida se era só preguiça de escolher um tema, o texto da Sally deve ter eliminado ela de vez. E se quiser a lista dos links das notícias, daqui a pouco sai a Semana Desfavor com todos eles. E com todos esses desfavores desfilados no texto anterior, eu fico livre para estender a análise sobre o excesso de informação.

Faz tempo que eu escrevo textos sobre essa característica da sociedade pós-internet: lidamos com informação demais do dia a dia. Muito mais do que é humanamente compreensível… mesmo eu que tenho um talento especial para me posicionar em basicamente qualquer tema até com certa eloquência, só consigo fazer isso por dedução de relações entre os fatos, não por conhecimento aprofundado. Porque mesmo sendo viciado em informação, o mundo atual a entrega além de qualquer ponto de saturação.

Uma coluna como essa tem o objetivo de filtrar um assunto que segundo a visão minha e da Sally, merece maior atenção. Ás vezes nem por ser o assunto mais comentado da semana, muitas vezes até pelo motivo oposto. Fazemos o papel de curadores de conteúdo, tentando apontar o foco de um considerável número de pessoas para um mesmo tema, garantindo que ele terá o destaque que necessita, e até dando tempo para as pessoas pensarem naquilo.

Quando a mídia tenta nos afogar em informações na disputa por cliques e compartilhamentos, é cada vez mais essencial o papel da pessoa que filtra esse excesso em algo possível de ser trabalhado. Mas não é o caminho que a maioria parece estar seguindo: quem filtra o conteúdo é um algorítimo de rede social que pensa basicamente em entregar material que a faça gastar dinheiro e sentir-se confortável pelo máximo de tempo possível na frente de uma tela. E essa característica de “câmara de eco publicitária” da rede social, aliada ao declínio do jornalismo tradicional, parece ter disparado uma era de superficialidade sem precedentes na comunicação humana.

E o mundo não para por causa disso: como ficou claro no texto da Sally, a quantidade de absurdos que acontecem em apenas uma semana é de enlouquecer qualquer um. Eu até argumento que o mundo sempre foi essa merda e que agora temos gente noticiando quase tudo, mas mesmo assim estamos seguindo num caminho que piora ainda mais essa situação: se a informação vem aos borbotões e superficial, o conceito de relevância e foco dilui-se de tal forma que vemos reações parecidas em notícias que influenciam a vida de dezenas ou de milhões de pessoas.

E aí sim uma crítica à evolução da sociedade: já é sabido que estamos fazendo uma transição de especialistas para generalistas. Quem sabe um pouco de tudo anda tendo mais oportunidades que quem aprende muito sobre um tema específico. Existem vantagens nessa transição, é claro, mas há um preço: num mundo de generalistas, quem vai ser curador de informação? Quem vai filtrar o que é relevante em cada tema se as pessoas começam a entender que precisam saber um pouco sobre tudo? O generalista paga o preço de perder a capacidade de dar pesos para as informações que agrega, porque faltam parâmetros que só o conhecimento aprofundado provém.

E numa sociedade de generalistas guiada por algorítimos de pulverização de conteúdo, o efeito do excesso de informação é… por incrível que pareça, um povo menos informado. O nosso desfavor da semana não é que aconteceram muitas coisas absurdas nesses últimos dias, porque acontecem todas as semanas, tenha em vista que temos duas colunas semanais só para listar o que não deu tempo de falar com calma durante a semana. O problema que identificamos aqui é que também começamos a sofrer com esse excesso e precisávamos parar tudo para demonstrar isso para vocês.

A partir da semana que vem vamos continuar fazendo o filtro, como sempre fizemos, mas acho saudável que de tempos em tempos paremos um pouco e pensemos nisso. De onde você tira sua informação? Você entende que no mercado atual da mídia, estão entregando tudo de forma cada vez mais superficial por cliques e relevância publicitária? Quais as suas estratégias para não cair nessa vala comum de não ter tempo nem pra se posicionar diante da enxurrada de coisas acontecendo ao seu redor?

O desfavor, falta de modéstia à parte, é uma boa estratégia sim. Sally e eu gostamos de fazer esse filtro e vamos continuar fazendo por muito tempo ainda. Mas, todo mundo deveria exercitar esse pensamento crítico não só para se posicionar diante de cada uma das informações, mas também para saber filtrar o que interessa e tomar partido em algo que possa desenvolver. Numa sociedade de generalistas, tudo vai ser briga em rede social, mas pouca coisa vai ser provada ou desprovada.

O sucesso das notícias falsas, das conspirações e das fabricações em geral não me deixa mentir: nem as fontes mais importam. A notícia vinda de um jornal e o retweet de um conhecido disputam o mesmo espaço, e como vem todas em um volume nunca antes visto, parecem ter a mesma credibilidade. Não estou nem advogando um ou outro, mas dizendo que relevância tem que vir do filtro, e não do volume. Precisamos cada vez mais de especialistas e curadores para tornar a era da informação realmente informativa.

Porque do jeito que vai, ter toda essa informação informa tanto quanto não ter nenhuma.

Para dizer que foi muita coisa pra entender, para dizer que ainda está em choque com o texto da Sally, ou mesmo para dizer que se informa só pelo desfavor e foda-se: somir@desfavor.com


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