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Desgoverno.

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| Desfavor | | 19 comentários em Desgoverno.

Aqui no desfavor gostamos de adiantar problemas. Já pensando nas eleições de 2018 e prevendo decisões difíceis, Sally e Somir pensam num cenário de pesadelo e tentam escolher o que seria menos terrível. Os impopulares não anulam suas opiniões.

Tema de hoje: o que seria pior para presidente, um candidato evangélico ou um candidato petista?

SOMIR

Abomino ambas as possibilidades, mas chegando no ponto de ter que me decidir por um ou por outro, acho que nesse momento eu até acho o evangélico menos perigoso. No final das contas a ideia de um regime teocrático é mais assustadora do que um comunista, mas com as peculiaridades do Brasil e o mundo no qual vivemos hoje, não acho que um presidente consiga escalar as coisas de tal forma.

Sim, petistas e evangélicos nutrem fantasias de poder absoluto, mas em graus de fantasia diferentes. No discurso da semana passada, Lula falava como achou mais fácil até chegar ao poder pela via do voto, dando a entender que não lhe era alienígena a ideia de tomar o poder à força. Como de fato não é na maioria dos ideais de revolução do proletariado comuns à causa da esquerda. E por mais que o PT tenha provado ser corruto e fisiologista em seus mandatos, nunca abandonou o discurso ideológico, adaptando o conceito para o sistema brasileiro. Populismo disfarçado de mobilidade social, estado inchado e insolvente, valorização de coitadismo e do politicamente correto… uma versão bizarra das ideias socialistas, feitas como suborno em troca de votos.

E digo o seguinte: não fosse uma crise internacional das bravas, o plano de perpetuação no poder do PT teria durado ainda mais tempo. Lula e cia. foram muito espertos e muito burros ao mesmo tempo, dependendo demais da sorte pra manter funcionando um plano de dominação que quase colou. Tenho mais medo dos petistas agora porque o que conquistaram foi uma experiência valiosa para uma próxima tentativa: viram o erro no projeto. Como a Sally já disse, eu e ela, por esporte, conseguimos bolar sem muita dificuldade escapatórias para eles. Basicamente, era só terem sido um pouco menos gananciosos no processo todo que não fariam tantos brasileiros notarem o governo. Porque isso matou o PT dessa vez: brasileiro não se importa com política, basta deixa-lo distante do processo e distraído com pequenos ganhos pessoais e ele não vai mexer com o sistema.

Sim, o PT e o lulismo estão desabando em chamas no momento, mas o brasileiro não está nem perto de estar imune a uma propinocracia populista. Nesse ponto, o PT acertou em cheio. Quem conseguir emular o sistema novamente, de forma menos gananciosa e arrogante, tende a conseguir dominar o país por décadas. É justamente a falsa segurança de que o sistema atual foi desarmado que torna petistas mais perigosos até do que evangélicos. Não acredito que formamos anticorpos contra o que aconteceu nos últimos 14 anos, e sim que uma confluência de fatores não necessariamente reprodutíveis causou a queda de Dilma.

Há um método e uma organização mais evidentes no modelo petista. E há o paralelo religioso: eles também acreditam que não importa o mal que façam, o fazem para um bem maior. Se houver reflexão na esquerda “viável” para ser eleita no Brasil, vai ser a de que os métodos foram errados e chamaram atenção demais, justamente o que acredito ser o ponto de quebra do poder de Lula e cia. Com essa informação, e uma “religião” mais racional e menos dogmática do que a cristã, os petistas tem um mix de ideias perigosas e convicção inabalável que eu considero mais perigosa até do que as maluquices dos crentes.

Sim, governantes religiosos são um retrocesso, lembrando que existem governos estúpidos, retrógrados e violentos até com chefes de estado que se dizem budistas… tenho horror da ideia de uma pessoa supersticiosa e irracional com poder de controlar um país, mas novamente, bem vindos ao Brasil. Crentes são perigosos quando tem poder, mas vamos ser realistas, o evangélico brasileiro não tem a menor ideia da religião que segue. A imensa maioria não é mais interessada nos ensinamentos de sua fé do que os famosos católicos não praticantes. No país do carnaval, religião é alegoria.

As igrejas evangélicas são negócios que se provaram lucrativos, e são controladas por gente que só quer ganhar dinheiro “fácil”. O modo de operação dos evangélicos é mais atraente do que o catolicismo, mais flexível e “festeiro”, combinou muito bem com o brasileiro. Mas até parece que esse povo leva a sério! Temos que entender o fenômeno evangélico brasileiro como realmente é: um mercado que dá muito dinheiro. A marca 1 ficou acomodada, não percebeu que seus consumidores estavam querendo algo diferente; a marca 2, suficientemente próxima, investiu em propaganda e conquistou os consumidores. O brasileiro que cagava pra seguir religião, mas queria fazer pose, começou a trocar marca 1 por marca 2.

Sim, com mais dinheiro vem mais poder, mas a influência dos interesses da religião cristã, marca 1 ou marca 2, é uma constante na política brasileira. Antes da bancada evangélica, eram os bispos católicos que ficavam buzinando na orelha dos políticos para impor as restrições de liberdade reprodutiva e sexual com as quais são obcecados. Agora é a marca 2 que faz a mesma palhaçada. Mas não se enganem: é sobre poder e manutenção da renda que conseguem com seus esquemas. O que realmente importava para os católicos e o que realmente importa para os evangélicos é um sistema onde consigam captar muito dinheiro de forma constante.

Essa gente caga e anda para Bíblia, Jesus e tudo mais. Eles sabem que basta continuar empurrando a ideia de repressão sexual para parecerem superiores aos seus seguidores, e mais nada. Humildade, caridade e tudo mais o que deveriam fazer por ideal religioso não fazem diferença alguma para seus fiéis. Quem faz essas coisas faz por vontade própria, não há incentivo real de bispos, padres ou pastores, é apenas sobre acúmulo de riquezas e poder para continuar fazendo. Eu acho absurdo sim que essa gente tenha cargos de poder, mas colocar no poder quem só quer enriquecer e está cagando para o povo é mais do mesmo. Pode ser evangélico ou não.

Não é vantajoso nem para os líderes evangélicos teocratizar demais o país, e por mais que tenhamos candidatos beirando o retardo mental sendo eleitos por serem evangélicos, quem manda neles é esperto. Esperto no sentido de saber que o que faz entrar dinheiro nas igrejas evangélicas é a confusão do cidadão médio, muito atrasado intelectualmente, sobre a relação entre sua vida moderna e as exigências malucas de sua fé, largamente incompatíveis com o mundo no qual vivemos. Não é à toa que as religiões que mais crescem são obcecadas por sexualidade: são regras malucas e virtualmente impossíveis de serem obedecidas. Isso gera culpa, e culpa gera gastos. Indústria da aspiração, até na religião.

Evangélicos não querem mexer no sistema. Muitos dos que são eleitos são retardados funcionais que só querem ganhar dinheiro, guiados por líderes que entendem perfeitamente o seu mercado. Os petistas não, eles tem planos mais complexos e mais estofo intelectual, eles querem ver o sistema derrubado pela ilusão de criar um novo, perfeito. Quem é o mais maluco?

Para dizer que ainda prefere a morte, para dizer que ninguém faz nada no Brasil, ou mesmo para dizer que um crente petista seria a pior coisa possível: somir@desfavor.com

SALLY

Se você tivesse que votar em alguém hoje para Presidência da República, o que preferiria: um candidato evangélico ferrenho ou um candidato petista ferrenho? Não, a morte não é uma opção.

Acho que não preciso dizer que abominamos ambos, a questão basicamente é qual seria menos pior neste momento. Eu sempre serei da ideia que qualquer coisa é melhor que um fanático religioso. O PT é um lixo? Sim, certamente. Mas está enfraquecido, desacreditado, tomando porrada de todos os lados e com o Congresso contra (vide a forma como escorraçaram Dilmão). Então, prefiro quem tenha poder quem também vai ter vigilância e freios para esse poder. Bota essas porras lá mais uma vez, se fizerem muita merda enxota pela porta dos fundos novamente. Fazer o que?

Evangélicos e poder são uma mistura pior do que Gremlins e água. Evangélicos nunca estiveram na Presidência da República até hoje, ao menos não os radicais. Sabemos que o Brasil é um terreno fértil para essa doutrina, um povo carente de tudo, inclusive de líderes para conduzi-lo, vai ser presa fácil. E, ao contrário dos petistas, os evangélicos são sim competentes. Não construíram o império que tem hoje sendo bobos.

Não quero nenhum deles nem para síndico do meu prédio, mas acho que nesse momento a resistência seria muito menor aos evangélicos, o que lhes permitiria pintar e bordar. Já vejo os pastores instituindo ensino evangélico obrigatório em escolas públicas (Brasil não respeita a Constituição desde sempre, não seria novidade), perseguindo outras religiões menos populares e empregando em todos os cargos possíveis crentes da sua igreja. Não, obrigada, prefiro os nefastos petistas que estão com a cara na lama e não poderão fazer muita gracinha.

Felizmente o povo não compra mais o discurso do PT, mais uma vez isso está provado pelo fracasso das manifestações conclamadas para defender Lula. E, também felizmente, os petistas são burros e limitados, não sabem se reinventar e tem essa tara quase sexual de se cercar de pessoas burras, por isso não haveria chance de brotar nenhuma reinvenção que cative o povo. Sem o Congresso ao lado e sem apoio popular, um presidente petista seria mais ou menos o que a Dilma foi nos últimos tempos: um saco de pancadas oficial.

O discurso dos evangélicos ainda não foi devidamente cacetado, não de forma massiva como o do PT. O povo ainda não tem anticorpos contra esse parasita, vai pegar muitos sem defesas. E evangélico investe dinheiro que rouba em manter uma forte máquina de propaganda competente funcionando. É um grupo que vem sendo treinado por décadas para entrar na cabecinha do brasileiro e plantar ao mesmo tempo medo e esperança. Lavagem cerebral total, uma mistura complicada se pensarmos em um povo bobo e burro, pois teriam o aval de Deus para fazê-lo e eu quero ver quem é macho aqui de peitar algo dito em nome de Deus, ainda que seja mentira.

Tanto na Câmara como no Senado aumentam cada vez mais o numero de parlamentares evangélicos. Somem-se a eles aqueles velhos dinossauros asquerosos estilo Bolsonaro que zelam pela “família brasileira”. Sabe o que daria essa mistura? Um Presidente da República cagador de regras moralistas escorado pelo Congresso. Não quero nem pensar no que aconteceria com homossexuais, adeptos de outras religiões e com outros segmentos sociais que não fossem bem vistos por eles. Perseguição, proibição e até criminalização estariam no nosso caminho. Não, obrigada. Prefiro um bando de analfabetos feios e sem educação que berram um discurso antigo. São chatos mas não são mais perigosos, estamos vacinados.

Fora todas as minhas ressalvas com religiosos radicais e toda a intolerância que geram, misturar Estado e religião nunca foi bom em hipótese alguma. Não gostaria de ver na presidência nenhum candidato cuja bandeira principal fosse uma causa religiosa. Isso viola o Estado Laico e claramente privilegia uma parcela da população em detrimento da outra. Petista é burro e filho da puta, mas evangélico, meus amigos, evangélico é maluco. Não se dá poder para maluco. Prefiro poder nas mãos de um filho da puta do que de um maluco.

Fora que evangélico é mais difícil de contestar. Um sindicalista raivoso barbado que berra em um microfone desperta a antipatia de muitos, mas um pastor engomadinho de terno que fala em nome de Deus, bem, taí um inimigo difícil de derrubar. Brasileiro, em sua maioria, tem um medinho oculto de Deus, um “e se?”, fica muito mais difícil lutar contra isso. Os fantasmas dos quais o PT nos fazia ter medo eram a oposição, dava para encarar, mas ter como antagonista Deus putaço com você? Poucos bancam isso.

Nem sei o que aconteceria com os ateus. Talvez nós fossemos jogados em um fogueira ou açoitados em praça pública. Bem, não literalmente, mas de uma forma mas moderna e aceitável. Macumbeiro então, seria deportado para algum país africano. Pessoas seriam perseguidas por seus “pecados” de acordo com a vontade dos líderes do país e sim, eu posso visualizar aqueles eventos de descarrego acontecendo em cadeia nacional. Em vez de pronunciamento do Presidente teríamos Fala Que Eu Te Escuto.

O funcionalismo público (e seus inúmeros cargos de confiança) seria dominado por crentes, por pessoas que acham que podem te provar que o homem não veio do macaco. Nem preciso dizer que o campo científico do país sofreria um revés. No mínimo acabariam as pesquisas com células tronco e, em casos mais extremos, uma cidade ou outra mais descontrolada proibiria transfusão de sangue. O Judiciário, nomeado pelo Presidente da República, aos poucos se tornaria um reduto religioso, dando uma interpretação “divina” à Constituição.

Não dá, gente. Façam o seguinte paralelo comigo: qual era o poder do PT antes de se eleger? Muito pouco. Como ficou depois que tomaram o poder? Enorme, por quase 20 anos. Imagina como ficaria o poder dos evangélicos, que hoje já é enorme, se tivessem as rédeas do país nas mãos? Não há condições. Prefiro um retrocesso político do que civilizatório.

Para dizer que nem votaria, apenas sairia do país, para dizer que pode ser pior e ter um petista evangélico ou ainda para dizer que já parou de se importar com quem quer que seja: sally@desfavor.com


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