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Amor imperfeito.

Amor imperfeito.

| Desfavor | | 7 comentários em Amor imperfeito.

Sejam bem-vindos à Semana da Exclusão Social! Agora, fora daqui! Dia de 12 de Junho, nossa data comemorativa da exclusão e da ridicularização do ser humano, por total coincidência, também é o Dia dos Namorados no Brasil. E só aqui no Desfavor você vai ver as duas coisas se unindo. Uma semana sobre o amor, e todas as merdas que ele faz para nos desunir.

E para começar bem essa celebração ao amor, Sally e Somir já começam a discordar! Os dois concordam que pessoas fazem muitas besteiras amando, mas se separam quando se culpa o próprio sentimento por elas. Os impopulares excluem a opinião que julgarem errada.

Tema de hoje: o amor é capaz de fazer uma pessoa merdar?

SOMIR

Não. Dizer que alguém faz besteira enquanto está amando é diferente de dizer que a pessoa faz besteira porque está amando. O amor é um outro grau de subjetividade, o mais abstrato dos sentimentos. Se a pergunta fosse se raiva, tristeza ou mesmo tesão fossem capazes de fazer uma pessoa merdar, aí eu até concordaria, pois são sensações bem mais diretas. Mas amor não funciona nessa mesma vibração.

Aliás, o grande lance do amor é como ele não é tão reativo assim com outros sentimentos. Muita coisa vem e vai na cabeça de quem ama e o amor continua lá. Não é à toa que é o sentimento mais idealizado de todos, é como se fosse o único que não pode ser detectado diretamente. Qual a expressão facial do amor? No meu conceito, você sabe que tem amor ali justamente quando percebe que ele não reagiu com tudo mais que se passou com você. O mundo explodiu, o caos é generalizado, mas ele sobreviveu. E nem é romantismo de achar que todo amor é para sempre, é a constatação que o único sentimento capaz de permanecer vivo no antes e depois de crises enormes na vida é o amor. Ás vezes não acontece, mas se aconteceu, só podia ser ele mesmo.

E toda essa filosofada vem pra estabelecer o meu ponto: quem merda, merda por inúmeros motivos, mas não por estar amando. Se a pessoa não tem nela o que é necessário para fazer uma coisa, vai me perdoar, mas não é um sentimento abstrato que vai gerar a capacidade. Quem vence obstáculos por amor não usa o amor para vencê-los, por assim dizer. Se a pessoa conseguiu a coragem, a resistência ou a motivação para agir, foram essas coisas que geraram o resultado. O amor normalmente só te dá um alvo estável o suficiente.

Não é como se o amor criasse uma capacidade nova na pessoa. Fulana não começa a amar e descobre que pode falar com animais! Não tem mágica aqui… somos nós sendo nós mesmos com um objetivo mais claro. O amor te ajuda a focar coisas que já estão lá. E percebam que eu nem digo potencializar, apenas focar. Também soa excessivamente romântica a ideia que amor tem superpoderes. Não é sobre a intensidade do que acontece, é sobre a estabilidade do foco. A intensidade vem da pessoa. O foco vem do amor.

Pensem comigo, se você fica com raiva de alguém por um dia, o que seria capaz de fazer? E se… você ficasse com raiva dessa pessoa por um ano seguido? Você não acha que seria capaz de fazer algo BEM pior com todo esse tempo cozinhando essa sensação e com mais tempo de agir? É isso que argumento sobre o amor: ele por si só não cria o poder de fazer o bem ou de merdar, ele só te garante um interesse estável e contínuo o suficiente para que o que quer que já estava lá dentro de você vir à tona.

Então, as pessoas merdam por amor? Não, elas merdam porque tem capacidade de merdar. O poder não surgiu do além, uma pessoa só consegue fazer o que tem capacidade e conhecimento necessários para fazer. Mesmo que seja no caso de errar por falta dos dois! Mesmo as decisões mais idiotas que tomamos no calor do sentimento obedecem um sistema interno de regras e limites. Não, nem todo mundo sabe até onde pode ir, nada como a experiência para saber onde fica o fundo do poço da própria estupidez.

Talvez exista essa ilusão porque as situações onde o amor se desenvolve não são comuns a outros tipos de relacionamento que não o romântico/sexual, mas alguém que age de forma irresponsável para ficar com a pessoa amada, por exemplo, evidentemente já tinha nela os elementos necessários para fazê-lo. Seja isso desapego, arrogância, coragem ou falta de capacidade de analisar consequências. A passionalidade exacerba o que já está ali, não cria fatos novos.

Aposto que se todo mundo começar a pensar nas besteiras que já fez por amor, vai começar a perceber padrões com outros tipos de besteiras. O que pode confundir é que a situação exata dificilmente se repete fora do contexto de um relacionamento e/ou paixão, mas a parte da personalidade que permitiu aquela besteira já era uma porteira aberta. O impulsivo já era impulsivo, o retraído já era retraído.

Sei que a Sally não vai defender por esse ângulo, mas também cabe esclarecer: usa-se demais amor como desculpa para qualquer cagada na vida. Gente que age de forma ridícula, se expõe, se rebaixa, faz todo tipo de merda com ela ou com as pessoas ao seu redor, mas quer embrulhar tudo na presunção de amor para acreditar que isso torna o ato nobre ou justificável. E como essa ideia é vantajosa para muita gente, convencionou-se aceitar num pacto implícito que isso é realmente verdade. Que o amor causa as merdas que fazemos.

E por mais que seja tentadora a ideia de que há uma força invisível nos guiando para erros e más decisões, independentemente da nossa vontade, ela não se sustenta. Somos um pacote de experiências, culturas e visões que tanto definem quem amamos como as coisas que fazemos diante dessa realização. Está tudo interligado. Ao invés de ficar procurando um elemento externo para forçar uma explicação que nos exima de responsabilidades, temos que ver as merdas que fazemos e saber como nós colocamos elas no mundo. Não é o amor que fez isso não. Quando ele quer ser bandido, podem ter certeza que precisa de cúmplice.

Palavra de merdeiro. A verdade não está lá fora.

Para dizer que o amor acabou, para dizer que a semana já começou bem, ou mesmo para dizer que merda porque está cagando: somir@desfavor.com

SALLY

Começa a Semana da Exclusão Social, em comemoração ao feriado nacional do próximo dia 12. E, para entrar em sintonia com ambas as datas, exclusão e dia dos namorados, hoje trazemos esta maravilhosa junção de mimimi, faniquito, histeria e sentimentos: o amor é capaz de fazer uma pessoa merdar?

Sim, o amor, por si só, é capaz de fazer uma pessoa perfeitamente equilibrada fazer uma tonelada de bosta e passar vexame. Não é romance, é química. Amor, paixão, apaixonamento ou o nome que se dê, inunda seu cérebro de uma química comparável à recompensa depois de usar drogas. Pessoas nesse estado, mesmo as mais controladas, mesmo as mais racionais, podem sim fazer merda estimuladas por essas substâncias. É viciante, é incontrolável.

Some-se a isso que a sociedade te dá total carta branca para merdar por amor. Não é imbecil, não é reprovável, é lindo. Fazer bosta como se não houvesse amanhã sob efeito da paixão é visto como bravo, valente, corajosos. É a pessoa que vivencia intensamente seus sentimentos, é alguém que se entrega e merece admiração. Então, com o cérebro recoberto de química mais a autorização social, uma pessoa apaixonada é um barril de pólvora, não importa quão racional ela seja em situações normais.

Ok, existem pessoas, talvez a maioria delas, que merdam por serem idiotas. Apenas isso. Apaixonadas ou não, amando ou não, elas sempre tem a merdança como constante em suas vidas. Quando estão apaixonadas, merdam também por amor. Mas existem aqueles raros seres humanos de existência digna, que levam uma vida criteriosa e ponderada, que tem um nome a zelar, e acabam merdando por amor. E estes, meus amigos, quando merdam, são os que mais merdam.

Pensem na seguinte comparação: duas crianças, uma acostumada a ir para a rua, andar de bicicleta, subir em árvore e fazer dezenas de travessuras. A outra sempre levando uma vida de apartamento, muito limpa e segura. Se ambos forem expostos a um cachorro feroz no meio da rua, quem vai se sair melhor, quem já tem experiência ou quem passou a vida em um apartamento?

Quem leva uma vida digna não esta acostumado nem sabe lidar com a indignidade que é o amor. A pancada é maior, por isso a chance de perda de controle também é maior. Soa errado dizer que só faz merda por amor quem já fazia merda na vida por esporte. Muito pelo contrário, é justamente quem estava acostumado a ter as rédeas dos sentimentos que descaceta de vez quando se vê em uma situação de perda de controle.

Esses pobres diabos que não sabem lidar bem com a própria falta de controle viram os mais mimizentos, os mais descompensados, os mais problemáticos na constância do sentimento. Fazem merdas homéricas, que não raro afetam mais pessoas além do casal. Não conseguem antever o desdobramento de seus atos e uma enxurrada de consequências estilo efeito borboleta os soterra sem aviso prévio, justamente por não terem know how merdístico.

O merdeiro profissional, aquele polivalente, cuja merda se encontra em cada recanto da vida, este sim sabe lidar e conter danos, de tanto que já o fez. A prova de que o amor pode transformar uma pessoa em merdeira é justamente essa: como se explica que infelizes surtem quando apaixonados e não saibam nem ao menos antever ou conter as consequências dos seus atos? Simples, estes infelizes não tem prática, pois em sua vida pregressa não tem um histórico de merdas.

Pessoas apaixonadas não pensam. É químico, ninguém escapa disso. Uma descarga de dopamina, que causa um efeito similar ao vício em cocaína deixa a pessoa destemida, achando que pode enfrentar tudo, agitada. Caso seja separada da pessoa amada, o efeito é similar à síndrome de abstinência de drogas. Nada disso vem da minha cabeça, são anos de estudos neurológicos que confirmam estas informações. A pessoa apaixonada apresenta alterações em uma área do cérebro chamada Núcleo Caudado, que ativa dopamina e endorfina, que quando em contato com a pessoa amada disparam uma química de recompensas e bem estar.

Outras substâncias banham o cérebro do infeliz apaixonado, como feniletilamina, noradrenalina, a oxitocina e vasopressina. É uma bomba química sobre a qual não temos controle. Não há escolha nem esforço que impeça o cérebro de produzir esse combo descontrolante. Então, me perdoem por achar que uma pessoa com o cérebro marinado nessas substancias transtornantes e viciantes está condenado a fazer merda, por mais racional que fosse em situações normais.

Nem preciso de tanta explicação química. Olhem para vocês. Olhem à sua volta. Quem aqui nunca fez uma bela merda por amor? E sabemos que o amor é o diferencial da equação, pois vemos pessoas que são perfeitamente funcionais e dignas em outros setores das suas vidas, apenas se transtornando quando o amor entra na equação e voltando ao normal quando ele sai da equação. Querer forçar uma condição preexistente é duvidar da ciência, da química do amor.

Sinto muito decepcionar aqueles que se acham senhores dos seus sentimentos e seus atos, mas em determinados momentos da vida perdemos o controle. Um deles é quando estamos apaixonados. E quando isso acontece, não é bonito. Pessoas fazem merda com convicção, ficam mimizentas, fazem birra, se portam de forma infantil, desafiam o mundo, choram, gritam, esperneiam. Felizmente passa, pois o que é para sempre é herpes, amor acaba.

Não é romantismo, é ciência. Há alterações nervosas, hormonais, químicas que explicam o transtorno mental que nos leva a fazer merda por amor. É que talvez a Madame aqui de cima esteja tão acostumado a fazer merda como constante na vida, que não consiga relacioná-la com amor.

Para dizer que merda por amor não conta como merda, para perguntar se Somir está sempre amando ou ainda para reclamar que não teve a votação que geralmente antecede uma semana temática: sally@desfavor.com


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