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Meta neles!

Meta neles!

| Somir | | 11 comentários em Meta neles!

Agora vai! Agora vai? A Comissão Especial da Câmara analisou e aprovou o pedido de impeachment contra a presidente Dilma, e agora o processo segue para um circo ainda maior: a votação na Câmara, com todos os deputados. Como o Brasil não cansa de nos surpreender negativamente, desconfio que o assunto ainda pode voltar como Desfavor da Semana. Por isso, vamos falar um pouco menos do processo e um pouco mais dos envolvidos nessa votação: eles e nós.

Impeachment não é pouca coisa, é demitir o funcionário mais alto da democracia brasileira. E é uma boa coisa que ele exista, com certeza, a capacidade de demitir o chefe por justa causa seria bem vinda em virtualmente todas as áreas da sociedade. E antes que você comece a pensar por que estranhou eu usar a palavra “funcionário” e analogias com chefes e demissões… bom, não deveria. É isso que todos eles são por lá: funcionários… nossos, por sinal.

Mas é claro que o conceito fica muito turvo num país assolado pelo fisiologismo. Com raríssimas exceções, estão todos lá em benefício próprio, seja acumulando poder para fazer dinheiro, ou mesmo cortando intermediários e acumulando patrimônio na cara dura. Só que… turvo em termos: porque a ideia de carreira política faz muito sentido para todos nós. Normalmente quem se elege uma vez tenta continuar pulando de cargo em cargo pelo tempo que aguentar. É uma forma de ganhar a vida e garantir o sucesso da própria família e amigos.

É uma carreira, mas não os vemos como funcionários. Pessoas com mais estudo e conhecimento não enxergam assim por desencanto, e pessoas menos capacitadas tendem a nem entender direito o que se espera dessa profissão. Até começo a rever a ideia de que brasileiro enche a boca pra falar que se estivesse lá roubava igual só por ser um povo desonesto, talvez nem tenham outra resposta pra dar. “Ajudar as pessoas” tem cara de resposta de miss, idealismo de fachada por completa falta de outras ideias.

Pudera, num país tão carente, bastou distribuir uma renda pra lá de mínima pra conseguir se segurar no poder por mais de uma década sendo aclamados pelo povão. Fácil agradar quem não esperava nada. Dizem que o brasileiro precisa cobrar mais de seus governantes… mas, será que eles sabem o que cobrar? Tudo bem reclamar de um buraco na rua de casa, mas… apontar erros no desenvolvimento da política econômica? Eu mesmo, que tenho bastante educação comparado com a média, posso no máximo chutar sobre o assunto… e ficaria bem perdido se enfrentasse a palavra de um especialista.

O cenário que estou querendo pintar aqui é o seguinte: nossos líderes desempenham uma função muito lucrativa sob a fiscalização de chefes que quando não estão ausentes, não tem a capacidade de sequer entender o que deveriam fiscalizar. O que estamos vendo agora são funcionários de diferentes setores da nossa empresa brigando entre si para escolher o destino de outra. Tudo isso num processo burocrático, enrolado e francamente, inalcançável para a maioria de nós.

E agora eu coloco um pé dentro da coluna Dés Potas, mas mais para exemplificar o que realmente me incomoda nesse caso todo: a democracia. Democracia a qual já defini como uma merda, mas a menos fedida que temos. Não estou mudando de time e começando a defender um golpe autoritário, mas é muito complicado melhorar alguma coisa se ficamos cegos para seus defeitos. A democracia é um sistema péssimo que só existe nos moldes atuais para mitigar os riscos da incompetência e do egoísmo humanos. É o último ponto de equilíbrio possível antes de tudo ficar ainda pior.

Mas ela não é boa. Principalmente em países como o Brasil. E ela não é boa porque nos faz esquecer que deputados, prefeitos, senadores e presidentes são meros funcionários cujo objetivo é fazer o Estado funcionar minimamente bem. Funcionário não tem que passar 10 sessões discutindo opiniões pessoais aos berros em comissões burocráticas, funcionário que não bate meta ou que adultera balanços pra esconder prejuízos tem que ser demitido. Nada pessoal, são apenas negócios.

Só que depois de alguns milhões de votos, esses funcionários ganham uma aura de poder quase que mística. Imagina só se você tivesse uma empresa e a cada processo seletivo todos os seus clientes indicassem alguém pra trabalhar lá dentro? Como é que você demite essa pessoa se ela fizer besteira? É como se esse poder a fizesse se sentir maior que a empresa. Pode fazer o que bem entender, e quando algo der errado, insistir para mudar a regras para se beneficiar.

O melhor sistema para um país seria um muito próximo ao de uma empresa, onde popularidade não conta. Onde gente formada nas áreas que pretende desenvolver disputasse a tapa as vagas, sendo escolhidas por especialistas que podem não só enxergar forças e fraquezas nos candidatos, como analisar os planos que pretendem colocar em prática. Simplesmente não faz sentido que uma pessoa que mal sabe entender o que lê (quando sabe ler) possa escolher em igualdade de condições quem quer que mande no país por quatro anos!

Nada contra essa pessoa, na verdade, é para o bem dela. Eu sei que estou trafegando por uma avenida de pensamento perigosa agora, todo maluco autoritário deve acreditar que quaisquer crimes que cometa sejam para o bem de todos. Mas é uma questão de organização de um Estado que vai continuar tendo leis e limites para suas figuras de autoridade. Essa empresa chamada Brasil pode ter um presidente, mas ele ou ela não é seu dono. Os cidadãos daqui que são. O presidente deveria apenas cuidar do gerenciamento. Assim como os outros funcionários dos mais diversos Poderes e níveis.

E quem cuida de gerenciamento não pode ficar sem ter metas. Não metas que o próprio presidente ou seus aliados tirem da cartola, mas metas definidas por gente capacitada e com conhecimento aprofundado da situação do país. Sim, fingimos que temos tudo isso atualmente, mas sem o elemento principal para que elas deixem de ser mentira: a consequência. Não fosse essa maravilhosa e terrível democracia, Dilma poderia ser demitida por justa causa apenas por não estar fazendo seu trabalho direito. Mas sem uma meta real (diferentemente das imaginárias como as de inflação e crescimento do PIB) para comparar com os resultados alcançados, como definir se a funcionária presta para o cargo?

No mínimo poderíamos ter um sistema de “promessas oficiais”. Cada candidato preenche um documento dizendo os resultados que pretende alcançar em cada uma das áreas que vai gerenciar, e caso não bata a meta em um ano, estaria sumariamente demitido, sem choro nem vela. Povão pode amar a pessoa, mas ela prometeu algo que não foi capaz de cumprir. Azar se caiu um meteoro no país nesse ano. Não bateu meta, rua. Pode até se candidatar de novo, o que não pode acontecer é não ter repercussão.

Isso pelo menos faria o povo ter que se responsabilizar frequentemente pelo o que está escolhendo. Dilma já teria caído, por exemplo. E se o Aécio merdasse, como era meio previsível, já teria caído também. Bateu a meta? Vai pra próxima (que tem que ser mais ousada ainda) e tenta bater de novo. Se continuar mandando bem, fica no cargo. É claro que não seria realista pelos custos astronômicos de uma eleição, mas quem disse que não daria pra deixar o processo mais simples se fosse todo ano? E, se não fosse obrigatório ainda, mais fácil. Vota por um aplicativo no celular, vota num terminal eletrônico em pontos de grande circulação que serviria para outras coisas depois… nem é meu ponto tentar desatar esse nó aqui, é mais sobre tentar entender que esse processo complicado da democracia no Brasil existe também para perpetuar o descaso dos funcionários eleitos.

E essa nem é a única ideia, é só uma forma de manter a ilusão da escolha no povo. Ganha eleição quem gasta mais e melhor, pouca gente sabe quem merece ser eleito ou não. Se fôssemos profissionalizar essa coisa toda, teria que abolir o voto livre. Só poderia participar quem comprovasse a capacidade e o interesse de fazer essa escolha. Carisma não resolve crise, trabalho e capacidade técnica sim. Foda-se se o povo gosta ou não de alguém, o que importa é se bateu a meta ou não.

Mas é claro que isso é utópico. O triste é perceber que somos tão incapazes como país que só nos resta a democracia como escapatória minimamente aceitável. Meritocracia deveria ser o sistema geral, mas… ela anda em falta. Enquanto isso, os funcionários continuam mandando nos chefes deles.

Para dizer que realmente não esperava esse caminho no texto, para dizer que só topa se cair a lei seca no dia da votação, ou mesmo para dizer que a meta é ganhar dinheiro e essa eles sempre batem: somir@desfavor.com


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