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Para quem precisa…

Para quem precisa…

| Desfavor | | 19 comentários em Para quem precisa…

+A manifestação convocada pelo Movimento Passe Livre (MPL) contra o aumento das tarifas de trens, ônibus e Metrô para R$ 3,80 terminou em tumulto na noite desta terça-feira (12) na região da Avenida Paulista e no Centro. Muitas bombas foram lançadas para dispersar os manifestantes.
+A Polícia Militar lançou uma bomba de efeito moral a cada sete segundos para dispersar o ato do Movimento Passe Livre, nesta terça-feira (12), na avenida Paulista, região central de São Paulo.
+Um vídeo divulgado neste sábado (9) mostra um policial militar colocando objetos supostamente encontrados em um poste na Praça Roosevelt, no Centro de São Paulo, dentro da mochila de um manifestante detido na noite desta sexta-feira (8) no ato contra o aumento da tarifa do transporte público.

Tá bom já? Para a polícia brasileira nunca está ruim o suficiente. Desfavor da semana.

SALLY

Este texto poderia ser datado de 2013 ou 2014, mas está acontecendo em 2016. Triste, muito triste que nada tenha mudado.

Manifestantes sendo sacaneados, espezinhados, incriminados por uma polícia nojenta, violenta e corrupta. Vídeos e mais vídeos de policiais colocando explosivos na mochila de manifestantes e prendendo-os em flagrante. Violência. Policial chutando a barriga de uma mulher GRÁVIDA. E tem gente que ainda defende a polícia, dizendo que tem que “bater nesses arruaceiros”. Quem foi que te disse que são arruaceiros? Essa mesma polícia mentirosa? E você acreditou?

Sinceramente, eu perdi as esperanças. No meu dia a dia não me dou mais ao trabalho de falar, não há diálogo possível com quem compactua com uma violência que nem eu, a rainha da ode à violência, acho necessária. Curioso que eu vejo esse discurso vindo de muitas bocas que em outros momentos criticam minha vertente mais violenta. Tem gente, pelo visto, muita gente, a favor de que se bata em estudantes, de que se incrimine com provas falsas, que se chute barriga de mulher grávida. Tá na hora de mudar o nome do país de Brasil para Merdil. Também aceito Bostil.

Para dispersar uma das manifestações, em diversos momentos, a PM lançou tantas bombas que chegou à marca de uma bomba a cada sete segundos. Não fazem isso com traficantes, não fazem isso com assassinos, não fazem isso com criminosos de alta periculosidade. Seu arsenal todo é usado em cima de estudantes. Claro, jovens desarmados, fica fácil ser valente.

Usaram granadas que soltam estilhaços que machucam bastante em um raio considerável, utilizadas em guerras. Ou seja, que se machuque quem supostamente está fazendo algo errado e todos à sua volta! Bateram com cassetetes de forma indiscriminada. Quando foi mesmo que eu vi isso acontecer no Brasil pela última vez? Estou dizendo, Dilma é Ditadura pós-moderna, com nova roupagem, mas o mesmo autoritarismo, violência e covardia.

Vamos, apenas por um exercício mental, presumir que todos os manifestantes estavam agindo de forma criminosa (o que não é verdade, se fosse, tinham destruído todo o entorno, pois eram muitos). Ainda assim, queridões, alguém acha justificável jogar granadas de guerra que machucam indiscriminadamente? Ou forjar provas para prender um inocente? Ou chutar a barriga de uma mulher grávida? Se acha, faz um favorzinho: nunca mais pise aqui no Desfavor nem deixe nenhum comentário. Não queremos nenhum contato com uma pessoa como você.

E, atenção, não são informações boca a boca ou de rede social. Existem vídeos. Não são atos que dependam de interpretação ou de contexto. É claro, é nítido que o policial está escondendo um explosivo na mochila de um manifestante. É evidente que ele está chutando a barriga de uma mulher grávida (que fraturou costelas). E não são vídeos que circulam no submundo da internet. Estão em grandes portais de comunicação como globo.com. Estão no Youtube. Estão ao alcance da sua mão. Procure e veja por você mesmo.

Eu não sei qual é a disritmia mental do brasileiro, mas esse povo peculiar ou não consegue ver problema com os atos da polícia, ou não consegue fazer a conexão desses atos com a Presidente da República. Em um país democrático de verdade, que respeita seu povo, o Presidente toma atitudes drásticas depois de uma barbárie dessas. Dilma não. Dilma vem consentindo faz tempo, e até mesmo incentivando. Não tem como dizer que a Presidente da República não tem nada a ver com isso. Ela tem obrigação de tomar providências. Ela é a comandante deste navio, ela é a única que tem poder para fazer isso parar com uma canetada. Mas, parece que tortura e violência só a incomoda quando é com ela.

É imoral, é indecente, é inconcebível que se tolere polícia chutando barriga de mulher grávida, incriminando quem só tinha cadernos dentro da sua mochila e jogando granadas de guerra em estudantes. Mas o mais inconcebível ainda é que essa mesma polícia que faz tudo isso ainda mantenha sua credibilidade! A burrice do brasileiro não tem fim?

Uma polícia que mente, que abre a mochila de um estudante, tira os cadernos de dentro e se encarrega de fazer parecer que havia uma bomba vai ter credibilidade para que? Mas tem! Diz que estavam quebrando, usando de violência e povo bunda acredita: “tem que bater nesses vândalos”. PAREM E PENSEM DE ONDE VEM A INFORMAÇÃO. Da instituição mais desacreditada, mentirosa, sádica e psicopata da sociedade atual: a polícia. Porque caralhos o brasileiro ainda acredita no que a PM divulga? Nunca saberemos.

E, se me permitem, nem com bandido isso deve ser feito. Chutar mulher grávida? Desculpa, em nenhuma situação isso é tolerável. Mas, vejam vocês que contraditório, muitas daquelas mamães eternamente indignadas com meu texto sobre o lado negro da gravidez, que me xingaram de tudo por eu ter desrespeitado a sagrada instituição da maternidade, estão de acordo com a PM, proclamando que tem que tratar “bandido”, “vândalo”, “arruaceiro” assim. Quem respeita mais a instituição da maternidade?

O que está acontecendo no Brasil, e em toda a América Latrina, é grave, Senhores. Muito grave. Estamos retomando a violência, a censura, a repressão. Mas, novos tempos usam novas roupagens. Só por não ser exatamente idêntico ao que era em 1969 não quer dizer que não seja uma forma de ditadura. Talvez seja verdade o que dizem, todo torturado vira torturador quando tem poder.

Parabéns, Dilma. Espero que seu nome entre para a história como a omissa que permitiu todo tipo de barbárie contra estudantes e que deu as mãos para governos como o da Venezuela, que sequestra, tortura e mata opositores. Se você conhece pessoas que moram na Venezuela sabe que isso está acontecendo sistematicamente por lá. Se você já viu uma pessoa querida sumir na Venezuela, sabe do que eu estou falando. Porém se você vive de fontes secundárias e julga pelo que terceiros te dizem, bem, paciência. Acredite em quem quiser.

Meu consolo é que no meio de um mar de merda nasceu uma flor: Macri, segura a democracia em Mi Buenos Aires querida, assim eu tenho algum lugar perto para correr. Se esquerda chuta barriga de grávida, incriminar inocente, sequestrar, torturar e matar opositor, eu sou direita até morrer, obrigada. Não compactuo com isso em que a esquerda se transformou.

Para insistir em acreditar em uma polícia que sabe ser mentirosa e psicopata, para insistir em culpar governos locais aliviando a responsabilidade da Dilma ou ainda para aproveitar o local seguro e desabafar toda sua revolta: sally@desfavor.com

SOMIR

No desfavor da semana eu sempre gosto de procurar um ângulo um pouco diferente para tratar da notícia, até para isso aqui não ficar muito repetitivo. Dessa vez ficou difícil, não só porque dá vontade de escrever de novo tudo o que a Sally disse, mas também porque eu aposto que já escrevi o que estou pensando agora quando esses abusos policiais aconteceram em anos anteriores. Comentar o Brasil não deixa de ser uma repetição.

Talvez esse seja o ângulo: o que acontece para não terem tirado lição alguma do que aconteceu da última vez que o MPL botou gente na rua? Aquilo foi grandioso, quase uma revolução popular. Bom, não dizem que os sintomas voltam se não tratar a doença? Deve ser isso. Mas, que doença é essa? O que seria tratável nessa truculência suja da ação policial contra manifestantes no Brasil?

Como eu sou o rei das teorias, vamos com mais uma: isso é causado por inexperiência. Não só no sentido de treinamento capenga para lidar com as situações, mas uma inexperiência generalizada com o próprio conceito democrático. É como se o brasileiro nem soubesse direito o que significa liberdade de ter uma voz e de ir e vir. Não há nem mesmo o hábito de confiar um no outro.

Comportamentos de risco num país sob nenhuma direção. A própria ideia de sair na rua significa ser um alvo para a maior parte da nossa população, chamar atenção então… é quase uma sentença de problemas, senão morte. Quem se acostuma a viver nesse estado de tensão fica muito distante do estado mental necessário para agir de forma livre e democrática. Viver sob a lei do mais forte constantemente não valoriza o diálogo. O brasileiro parece se contentar quando alcança o estágio de “paz sem voz”, mas mantendo a citação “rappeana”: paz sem voz não é paz, é medo.

E não podemos isolar nossos policiais dessa realidade. São pessoas, falíveis como qualquer outra, mas responsáveis pela manutenção da paz. E é aqui que as coisas se misturam: se quem vive aqui está disposto a aceitar esse menor denominador comum da paz, o medo, o que vai acontecer com o cidadão que estiver com a farda ao ser despachado para manter a ordem durante uma manifestação popular? Isso vai fundo, é um estado mental desse povo: na falta de algo melhor, use o medo. E medo é o que mais temos para mostrar.

A polícia vai usar a intimidação porque essa é a língua que aprenderam a falar, e infelizmente, infelizmente mesmo, é a língua que o brasileiro acha que tem que se comunicar. Num país menos brutalizado, os defensores da truculência policial seriam muito mais previsíveis, não haveria sequer a discussão sobre a necessidade dessas ações. Quem não tem medo não defende agentes do medo. É por isso que esses absurdos acontecem muito mais em sociedades baseadas nessa ideia. Manifestação no Brasil, na Venezuela, no Oriente Médio, na China… todas respondidas de forma mais ou menos parecida.

Fica evidente que os policiais não estão à vontade diante de uma multidão tentando se fazer ouvida, a verdade é que o brasileiro em geral não está. Mas, existe uma diferença de poder considerável em favor dos agentes do Estado, a máquina financiada por nós e um sistema previsto para gerar impunidade. Pudera, se assumimos que nosso país só pode ser controlado por medo e colocamos pessoas para resolver nossos problemas dessa forma, eventualmente as peças se encaixariam para evitar que os crimes cometidos em “nosso nome” fossem varridos para debaixo do tapete.

E é curioso (escrotamente curioso) que até esse subproduto da sociedade baseada em medo distorça a cabeça da polícia. O que plantou uma bomba na mochila de um inocente provavelmente estava tão absorvido pela ideia de que tudo o que fazia era justificável que sequer entendeu a gravidade da traição de seu propósito na sociedade. Não se enganem, o ser humano raramente apronta sem uma justificativa mental poderosa, e sabemos bem que policiais racionalizam seus abusos como a necessidade de manter sua instituição viva, e por consequência a sociedade como um todo.

Não há vilão pior do que o que acredita estar fazendo o bem. E muito infelizmente: é difícil criticá-los se você corrobora com o modelo de sociedade baseada em medo. É do ser humano simpatizar com seus captores. Se medo é o que tem para hoje, palmas para seus agentes! E nesse processo, o policial começa a perder a noção de pertencimento à sociedade. Se o medo está nas suas mãos e é ele que define nossas vidas nesse país, como gerar identificação com o cidadão? Um sistema baseado em igualdade e justiça poderia aproximar, mas o que temos gera um abismo.

Nem adiantaria treinar melhor a força policial, porque nada te prepara para esse distanciamento intolerante que o cargo fornece. A farda é uma nova pele que te coloca em outra espécie, uma que tem uma relação muito complicada com a humanidade, principalmente em locais onde as pessoas são frequentemente deixadas à própria sorte, como o Brasil. Não duvido que muitos dos policiais queiram mesmo fazer a diferença e deixar esse país mais seguro para nós, mas tem algo fundamentalmente errado nesse processo. Algo que corrói a confiança entre as partes: o medo.

E é por isso que não aprendeu-se nada nesse meio tempo. A inexperiência não é com manifestações, é com humanos em geral. A distância é grande demais para as partes se ouvirem, e ela é mantida por um estado aparentemente perpétuo de desconfiança entre as partes. Talvez ambos os lados com seus motivos sólidos, mas só com um com a presunção de controle. Não acredito que a polícia sozinha consiga eliminar o estado de medo que corrói a democracia e a liberdade nesse país, mas com certeza ela pode reduzir consideravelmente essa percepção.

Vamos voltar a pensar nesse tema mais mil vezes caso tenhamos mais mil manifestações populares do tipo. Precisamos olhar para a doença, porque francamente, já deveríamos estar cansados dos sintomas.

Para dizer que tem medo de concordar comigo, para dizer que vagabundo tem que apanhar mesmo (defina vagabundo), ou mesmo para dizer que era mais fácil só pagar a merda da passagem: somir@desfavor.com


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