
Vem comigo.
| Somir | Des Contos | 3 comentários em Vem comigo.
Vem comigo.
Quem é você?
Isso vai ser bem complicado de explicar agora. Não temos tempo para isso… aliás, eu nem sei se temos tempo para qualquer coisa.
Mas onde nós estamos? Como eu vim parar aqui?
Eu sei a resposta para uma dessas perguntas. Estamos em lugar nenhum. E é por isso que eu tenho que te tirar daqui!
Eu não vejo nada, onde você está?
Estica a mão.
Onde? Eu não vejo nada. Está tudo tão escuro.
Peguei! Sentiu?
Sim.
Então levanta e me acompanha. E tenta não pensar em nada.
Como assim?
Isso já é pensar. Não pense. Segure minha mão e me siga.
Meus pés não estão tocando em nada, como eu posso estar de pé?
Não! Não fale mais nada.
Isso é uma caverna?
O que eu acabei de te dizer?
Estou sentindo o chão sob meus pés. Minha voz! Minha voz está fazendo eco…
Bom, você descobriu, estamos numa caverna. Continua me acompanhando. Logo vamos estar livres.
Estamos presos aqui?
NÃO!
O que foi?
Tem algo barrando nosso caminho.
O quê? Uma pedra?
Não sei e não quero saber. Vamos voltar por onde viemos.
Você não tem uma lanterna para iluminar o caminho?
Tenho… claro que tenho. Estou acendendo, está vendo agora?
Sim, a pedra! A pedra está fechando o caminho da caverna. Onde está você?
No mesmo lugar. Ainda estou segurando sua mão.
Mas eu não estou te vendo. Estou sentindo sua mão, mas não estou te vendo, você é invisível?
Agora eu sou…
Como isso é possível?
Eu vou me abster de responder essa pergunta. Vamos voltar por onde viemos, tudo bem?
Tem outra saída?
Sim! Sim, tem outra saída. É só me seguir que tudo vai ficar bem. Vamos?
Vamos. Fica muito longe?
Argh…
O que foi?
Fica, fica muito longe. Mas não vamos desistir, vamos? É só seguir um passo por vez.
Como você me encontrou aqui?
Eu só sabia. Tenta não falar muito.
Tem mais alguém na caverna com a gente?
Isso vai ser difícil…
Já sei! Isso é um pesadelo!
NÃO!
Eu não tenho a menor ideia de como vim parar aqui, estou sendo guiado por um homem invisível. Tem algo com a gente aqui dentro… isso tem toda a cara de um pesadelo.
Você não sabe o que está…
Não! Chega! Você não me disse nada sobre nada até agora. Eu vou falar o quanto quiser, e você vai ter que responder minhas perguntas!
Como quiser.
Quem está conosco nessa caverna?
O que quer que você imagine.
Então se eu imaginar um… coelhinho… vai ser um coelhinho?
Já é um coelhinho agora. Menos mal, agora é só sair… e torcer para não pisar no bichinho.
Então esse é meu sonho?
Sonho é um jeito de explicar.
Então podemos estar em qualquer lugar que não uma caverna.
Podemos, mas eu sugiro que você não…
Foi mal…
Estamos na mansão da Playboy? Cercados de mulheres nuas.
Não sei porque eu pensei nisso.
Eu sei. Você consegue não pensar em nada até sairmos pelo portão?
Então…
As mulheres nuas estão vindo até você. Claro… óbvio…
Se é um sonho, deixa eu aproveitar. Ei! Eu posso imaginar qualquer mulher e ela vai querer ficar comigo, não?
Sim. É uma possibilidade.
Por que você está tão preocupado? Isso vai ser muito divertido! Ha! É ela!
Você sempre gostou dela, não?
Ela é tudo o que eu imaginei sem roupa.
É… ela é exatamente o que você imaginou.
Eu sempre soube que ela tinha uma tatuagem secreta! Ela tinha cara disso.
Agora ela tem. E, realmente, ela é muito bonita. Boa imaginação, a sua.
Peraí…
Você tinha que ter me dito para não te impedir de falar, né?
Essa não é ela de verdade, essa é ela como eu imagino que ela seja, não?
Sim. Pra ser honesto, eu nem acho que a mansão da Playboy seja assim na vida real.
Isso tira um pouco da graça das coisas…
Por isso que eu acho que devemos sair logo.
Mas… e se eu quiser que ela seja como ela é de verdade?
Você também tinha que pedir para eu responder tudo, não? Bom, se você quiser ver ela como ela é de verdade, você tem que se imaginar dentro da cabeça dela. Mas isso é um perigo.
Por quê?
Porque… ah… não é possível… você já fez.
Onde estamos? Está tudo escuro de novo!
Na mente dela. Agora temos que encontrá-la…
Eu quero que ela esteja na minha frente!
Não funciona mais. Você não controla mais o que acontece aqui.
E o que nós fazemos?
Não fazemos. Até agora eu não sei como te encontrei… eu vaguei por um tempo que não sei nem contar até te achar.
Então você tentou se imaginar dentro da minha mente também?
Sim.
Por quê?
Pelos mesmos motivos que você se imaginou dentro da dela.
Eu te conheço então?
Gostaria de dizer que sim, mas eu sempre fui invisível para você. Só tinha olhos para… para a dona desse lugar.
Quem é você?
Imagino que um vegetal numa cama de hospital.
Julia? Julia da recepção? Então foi isso que aconteceu com você naquele dia? O pessoal do laboratório foi te visitar! Mas… mas… isso foi… há cinco anos atrás. Eu até estava falando disso com meus amigos no bar quando… ah…
Você pensou em mim?
Sim. Foi por isso que você me encontrou?
Não sei. Pode ter sido isso. Mas nem quando eu desmaiei e fui pro hospital você pensou em mim?
Pensei, mas… naquela conversa era diferente, era algo sobre pessoas morrendo cedo, alguém lembrou de você entrevada numa cama… eu… os rapazes estavam dizendo que você era… era bonita e eu pensei… eu pensei em você em outros termos…
Eu já estou cansada dessa escuridão. Mesmo que ainda me doa um pouco, tomara que ela pense em você em… outros termos.
Duvido, eu sempre fui invisível para ela.
Nós nos merecemos então.
Vamos ficar presos aqui?
Engraçado…
O que pode ser engraçado nessa situação?
Eu fantasiei tanto com nós passando o resto das nossas vidas juntos.
…
Bom.
Essa Matrix fanfarrona…
Medo! Nunca fale com estranhos nem aceite o convite platônico deles pra sair da caverna…