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A Relação.

A Relação.

| Sally | | 66 comentários em A Relação.

Você já viu um homem se preocupar com um relacionamento? Não, né? Não. Pra que? As mulheres se preocupam, eles não precisam fazer mais nada além de estar ali. Homens basicamente estão. Eles tendem à inércia. Eles são uma samambaia na relação. Tudo sobra para a mulher.

Manda mais que tá pouco. Ter que trabalhar, ter que parir, ter que amamentar, ter que menstruar, ter que ser/parecer jovem, ter que ser magra, ter que ser culta, ter que estar atualizada, ter que ser inteligente, ter que saber cozinhar, ter que ser bem resolvida… manda mais obrigação que tá pouco! Faz isso, deixa a porra do relacionamento todo nas nossas costas. E ainda chama de histérica se um dia a gente cansar e se aborrecer.

Tem aquela velha piada que diz que mulheres fingem orgasmos para preservar o relacionamento e homens fingem relacionamento para preservar os orgasmos. Realmente, homens fingem relacionamentos, eles não tem a menor ideia do que estão fazendo ali. É mais ou menos como festa de casamento: é o sonho da mulher, o homem não entende porra nenhuma a ponto de nem conseguir opinar e faz a sua parte apenas comparecendo.

A mulher trata A Relação como se fosse um bebê. Se preocupa se A Relação está crescendo, se A Relação está saudável, se está cuidando bem da Relação. “A Relação” vira uma entidade separada, mais importante que o homem em si. O homem é um adereço para tornar possível a grande alegria da vida feminina: A Relação. Vai ter feminista chiando, vai ter mulher reclamando, mas a verdade é que a maioria das mulheres tem sim essa tara pela Relação, se apaixona pela Relação e não pelo homem. O problema é: homens não tem a menor ideia disso. Homens sequer parecem mensurar o que é A Relação. Homens apenas estão ali, torcendo para não falar nenhuma merda para não ter aborrecimento.

Só que infelizmente a analogia da plantinha é verdade: se não regar constantemente morre, morre e não adianta regar depois de morta. E homem nunca acha que vai morrer até que morre. É isso que não parece entrar no pequeno cérebro de caroço de uva da maioria dos homens: a preocupação em cultivar hábitos e vínculos que fortaleçam e mantenham vivo um relacionamento. Não. O homem está ali, ele entra com a parte dele (um pênis, matar barata e, em casos de boa vontade, um cineminha no final de semana) e está ótimo. Não peça mais, eles se indignam, eles não entendem o conceito. Fora o fato de que qualquer pedido para homem soa como cobrança e os estressa ao extremo.

Mesmo que já tenham passado por isso várias vezes, eles não entendem por qual razão, depois de um certo tempo, as coisas começam a desandar. Eles são espectadores passivos de todo nosso investimento ruindo como se fosse mera fatalidade e não apatia deles. Cuidem da Relação, caralho! Só um pouquinho, só de vez em quando. É mesmo tão sacrificante?

Deve ser. Para começo de conversa, nem entendem o que é A Relação. Enquanto jogavam bola e sonhavam em ser astronautas, uma sociedade escrota nos ensinava a sonha com o “felizes para sempre”, e para isso o homem era peça fundamental. É algo que muita mulher é programada desde cedo, desde a infância: ser feliz para sempre na Relação. Péssimo, quem conseguir romper com isso, que rompa. Tomara que todas rompam. Mas, enquanto isso, como será que os homens se sentiriam se, quando estivessem prestes a decolar em uma nave espacial, depois de décadas acalentando o sonho de serem astronautas, tudo explodisse e eles saíssem machucados e sem conseguir voar? E se uma mulher estivesse olhando, pudesse evitar e não o fizesse? E se ela ainda falasse “Não sei porque você está assim, pega outro foguete e tenta novamente”?

Para que um relacionamento dure de forma saudável, alguns cuidados são necessários. E esses cuidados variam de pessoas para pessoa. Daí surge a grande dificuldade, que é olhar para a mulher que o homem tem ao lado e percebê-la. Homem não percebe, homem não entende, homem soluciona pensando no mundo de forma a usar a si mesmo como parâmetro. Eles sempre solucionam tudo errado por se usar como referência, são os McGyver retardados do Relacionamento. Mulher não quer solução, mulher quer ser ouvida, compreendida.

Conhecer a pessoa que se tem ao lado não parece ser uma opção para os homens, talvez eles nem saibam como. Amizade de homem, a coisa mais estranha do mundo. Não sabem porra nenhuma uns dos outros em matéria de sentimentos. Podem saber a cerveja favorita, o esporte favorito, mas sentimentos? No máximo especulam. Pergunta para uma mulher como a amiga dela se sente em tal situação que ela narra os detalhes na hora. Nós sabemos ler emoções de outros seres humanos e conversamos sobre elas. Homem não sabe e não acha necessário aprender.

Daí sobra para nós, mulheres, compreender tudo. Se está nervoso por causa do trabalho, se está puto porque o time perdeu, se está estressado por estar sem dinheiro. Se está calado é por estar chateado, se precisa de um tempo sozinho é por estar cansado, se… se… se… É viver olhando para o outro esperando que um dia isso retorne, mas não, não vai. O outro está olhando para o carro, para o trabalho, para qualquer outra prioridade. E lide com isso, pois se você se frustrar e arrumar briga sem um motivo que ele compreenda, você é uma histérica, é maluca.

O pior é que às vezes, para manter uma relação nem sequer precisa tanta observação. Nem o básico fazem. Algumas coisas são universais em matéria de cultivar relacionamento, como, por exemplo, cultivar interesses em comum. Foco na palavra CULTIVAR, ou seja, uma boa vontade de ambas as partes para sempre manter viva alguma atividade praticada por ambos. Não é fazer quando dá, é cultivar, é separar tempo para isso, deixar de fazer outras coisas para fazer isso. São coisas que fortalecem o vínculo e ajudam A Relação a se fortalecer. Não. Não vão fazer. Acham que não precisa ou nunca sequer pensaram nisso. Escaralham todas as relações onde se metem, mas não acham que nada precise mudar. Tá lindo, tá joinha.

A verdade é que em matéria de Relacionamento tudo indefere para esses putos. Tanto faz. Tanto faz é vírgula, é ponto parágrafo, é ponto final. Disfarçam, mas a gente vê no fundo da retina deles escrito “tanto faz”. O carro que vão comprar, o celular que vão comprar, o computador que vão comprar “não tanto faz”, muito pelo contrário, quando encasquetam com algum brinquedo novo, Deus nos livre de não consegui-lo. TEM QUE ser aquilo pelos motivo menos justificáveis do mundo, com aqueles detalhes. Mas na hora da relação, tanto faz, é desimportante o suficiente para não se envolverem com isso. Vai levando aí, mulher, que qualquer coisa tá bom. E a mulher vai levando.

Mas uma hora cansa. Uma hora você quer tirar o peso das costas ou ao menos dividi-lo com a pessoa que está ao lado. Mas, como você carregou muito peso por muito tempo, afinal, vai acumulando, sua musculatura está forte pra caralho. O Zé Ruela, nem tanto. Daí você passa um puta peso pesado para a costas dele e… tudo desaba, porque ele não tem força para carregar aquilo, pois nunca o fez. Anos de trabalho da mulher cuidando da Relação desabam por incompetência de um idiota que não teve a capacidade de, por um curto período de tempo, cuidar de algo que a mulher cuidou a vida toda.

Imagina que você compra um cachorrinho em conjunto e de comum acordo com seu parceiro. Cuida dele desde filhote enquanto seu parceiro o ignora. Você estimula seu parceiro a fazer atividades com o cachorrinho: passear, treiná-lo, brincar. Ele ignora. O cachorrinho vai crescendo. Você sabe o que ele come, que carinho ele gosta, quando ele está doente. Seu parceiro continua ignorando. Você cuida do cachorro sozinha, full time, por cinco, dez anos. Daí um dia, algo grande acontece na sua vida. Qualquer coisa: você adoece, você precisa se ausentar, qualquer coisa que te impeça de cuidar do cachorro. Você pede ao seu parceiro que segure essa para você por um curto período de tempo e ele diz que sim. E quando você volta, A PORRA DO CACHORRO ESTÁ MORTO. PARA QUE MERDAS ACEITOU COMPRAR UM CACHORRO COM ALGUÉM SE NÃO IA CUIDAR?

Quão difícil era, nesses anos todos, parar uma porra de um segundo de vez em quando para prestar atenção no que o cachorro comia, no que o cachorro precisava? Porque né, era tarefa dos dois. Mas não. Não. Nããããão, se tem um fazendo, deixa fazer. Dá para levar assim? Não está dando uma merda IMEDIATA? Vai levando então. Se um dia precisar, eles pensam, aprendo como fazer. Só que não. Quando precisa, não dá tempo de aprender nada, tem que entrar já sabendo fazer. Spoiler para a vida: improviso não salva Relacionamento.

Mas para eles, foda-se que tudo vai desabar lá na frente, é só uma relação. Se gerasse a perda do emprego, garanto que tomariam o maior cuidado. Homens apenas estão na relação, não cuidam dela, não a cultivam, não acrescentam. Eles apenas a viabilizam. No dia que não tem uma palhaça para fazer a manutenção necessária, desaba tudo. O cachorro morre. E eles nem ao menos se dão conta de que a culpa da porra do cachorro morrer foi sua. “Morreu, o que eu podia fazer?”. CUIDAR, CARALHO. Se interessar, observar o que o cachorro precisava, se dedicar antes de chegar nesse ponto da parceira não aguentar mais carregar tudo sozinha.

É assim desde sempre e não creio que mude. Homens são o eterno tanto faz, a eterna inércia, o eterno estar. Eles estão ali, e com isso já acham que estão fazendo demais, afinal, eles poderiam estar bebendo com os amigos! Eles tem um ganho secundário enorme se mantendo às margens da Relação: se poupam de muito trabalho, pois relacionamento é trabalho. Não quer arregaçar as mangas e ter trabalho? Não entre em um relacionamento. A convivência é difícil, o ser humano é uma coisa chata, meio porca, meio filha da puta, muitos ajustes são necessários… vai dar trabalho. Se vai ficar de preguiça, de mediocridade fazendo apenas o necessário, se vai ficar de espectador em vez de ser parceiro, não entre, porque se para vocês A Relação não é nada, para a maioria das mulheres é algo muito importante, então, vão a merda e nem comecem. Deixem a gente investir onde tem futuro.

Começam. Começam mesmo assim, são meros espectadores e ainda reclamam quando a mulher se irrita “sem motivo nenhum”. Anota aí: NINGUÉM, animal, vegetal ou fungo, se irrita sem motivo algum. Talvez você não entenda o motivo, mas engole o “sem motivo algum”, pois o motivo está lá e se você não fosse tão inerte e desinteressado, saberia. A mulher vai se irritando por carregar A Relação nas costas sozinha, por ver que não pode contar com o homem para algo que é tão importante para ela, por perceber que se ela um dia não puder mais cuidar do cachorro ele morre e tenta conseguir uma reação do Mr. Inércia de qualquer jeito. Brigando é o último recurso. Sorria quando uma mulher brigar com você, ela ainda está tentando. Quando ela parar de brigar é que vai ser o problema.

É quase que um ato de desespero, daqueles de estapear uma pessoa para trazê-la de volta à realidade. Se briga para ver se a pessoa acorda. Mas nem na hora da briga o homem participa. Escuta o esporro, escuta tudo que ele fez de errado e se chateia. Mas não sabe nem dizer por que está chateado. Ele escuta as reclamações da mulher e se sente injustiçado, porque ela também fez ou faz coisas que o chateiam. Eles sabe quais são? Não, ele não sabe quais são. Ele sabe que a mulher fez aí uns negócios meio escrotos, mas não lembra, ele nem sabe dizer o que merda foi. Daí não pode reclamar, cala a boca porque não prestou atenção nem nisso, e fica levando esporro em silêncio, se sentindo O Injustiçado. E cresce a mágoa, e cresce o rancor. E A Relação vai morrendo.

Só que as mulheres não tem culpa dos homens serem tão relapsos afetivamente, tão descansados, tão desinteressados a ponto de não se darem ao trabalho de conversar quando algo os incomoda. Esqueceu? Fala NA HORA que acontecer. Não, não falam, querem “evitar problemas” e com isso criam problemas ainda maiores, os gênios. Se está dando para levar, se está dando para aturar, vão levando sem conversar, porque são uns descansados de merda que não querem ter trabalho e uns arrogantes de merda que acham que vão conseguir empurrar a situação assim sem maiores consequências e, quando o caldo entornar, eles lidam com isso e dão um jeito. Não dão.

É como se você comprasse uma casa mas não quisesse limpá-la por ser uma preguiçosa do caralho e a sujeira fosse acumulando. Quando a casa estivesse bem imunda, a ponto de ficar difícil de viver nela, você limpa? VOCÊ LIMPA? Não, se você for homem você vai e muda de casa, se muda. Não faz o menor sentido, mas é isso que os homens fazem, deixam A Relação, nosso sonho de infância, apodrecer diante deles porque “está dando para levar”, até que não dá mais. Não sabem calcular quando a corda vai arrebentar, acham que sabem mas não sabem. Quando percebem, já arrebentou. E foda-se, eles vão e compram outra casa. Homem não sofre como mulher quando um relacionamento acaba.

Observem que eu disse “quando o relacionamento acaba”, quando ele se exaure. Quando a mulher cansa e mete um pé na bunda antes de exaurir ele sofre feito um cão, mas quando o relacionamento acaba, por ter apodrecido, homem não está nem aí. Levanta os ombros, se convence que não havia nada que pudesse ser feito e segue a vida. Mulher chora, mulher não come, mulher sonha com o ex nos primeiros seis meses depois do término todas as noites. Homem faz o que ele faz de melhor: se manter raso, se manter sem profundidade na questão, alheio. Ele apenas está, ele continua espectador, seja na Relação ou no fim dela. Coadjuvante eterno, desconhece até o último minuto a grandeza da merda que fez e o tamanho da dor e estrago que causou.

Tanto é que depois de uma mulher remar sozinha por anos, quando finalmente ela não tem mais força e tudo acaba, o homem responde que não sabe a razão pela qual acabou. Quando perguntado, o imbecilóide diz: “desgaste”. Vai desculpar, mas o que acaba por desgaste são as peças de um automóvel, não A Relação. Confortável colocar a culpa em um ente externo genérico. Desgaste. Desgaste é consequência do motivo real: a incompetência masculina em ajudar a mulher a manter uma relação. Alguns nem mesmo se atrevem a chutar um motivo genérico estilo desgaste. Eles realmente não sabem a razão pela qual acabou: “sei lá, acabou”. Spoiler: a menos que alguém morra ou se mude, acaba porque não souberam cuidar, cultivar, ok?

Não estou dizendo que homem tem que ajudar a escolher a cor das cortinas ou ver Grey’s Anatomy com a mulher se não acaba a relação. Tem um mundo de diferença entre se aviadar e estar presente no relacionamento. Acho que em tese, os homens até sabem disso. Mas, no estresse do dia a dia, no passar dos anos, quando vem aquela sensação de que a pessoa está garantida, no meio de tantos estímulos externos, A Relação acaba sendo a primeira que sucumbe, a primeira que é preterida por eles, talvez por achar que não vai acabar, que se um dia as coisas escaralharem, ele lida com isso e dá um jeito. Homens tem dificuldade com placas de PARE. Eles acham que sempre podem dar um jeito em tudo. Mas em relacionamento, se nunca participou, não vai conseguir. É como querer ganhar uma medalha sem treinar.

Em resumo, homens não sabem cultivar um relacionamento, cultivar interesses e atividades em comum, manter vivo o elo, o vínculo. Homens não acham necessário ou sequer percebem que isso existe. TUDO sobra para a mulher em matéria de relacionamento. TUDO. Isso exaure uma pessoa emocionalmente. Isso é injusto, acomodado e cuzão. Crie vergonha na cara HOJE e se pergunte o que você pode fazer para melhorar A Relação, pois esse cachorro também é seu.

Para tentar explicar este dia de fúria e errar, para imaginar o Somir chorando em posição fetal debaixo da cama ao ler isto ou ainda para ficar bem quietinho para não sobrar para você: sally@desfavor.com


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