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Porém…

Porém…

| Somir | | 26 comentários em Porém…

Não tem como não falar do elefante na sala. No clima político em que nos encontramos, muito se discute sobre a própria insatisfação da população (com jeitão de golpe para desviar a atenção como a Sally relatou muito bem) e sobre grandiosas medidas como um possível impeachment, mas algumas coisas importantes vão passando batido. E é sobre esses ‘poréns’ que eu falo hoje.

O primeiro deles: a verdadeira eficiência do impeachment. Para começo de conversa, há muito chão entre Collor e Dilma/Lula. O ex-presidente não tinha apoio nos outros poderes. Quando o povo pediu por sangue, todo mundo em Brasília se animou para botar um fim em seu mandato. Não é o caso dessa vez: mesmo estrangulado pelo PMDB, o PT tem uma força incrível dentro das instituições que formam o poder público: maioria nas duas casas, Supremos no bolso, governos e mais governos em estados e municípios brasileiros.

Tudo isso aliado a um profundo conhecimento do sistema. Boa sorte para levar o processo à frente. Eles vão barrar e atrasar tudo o que puderem, com anuência de muita gente poderosa e uma considerável massa de manobra de militantes e simpatizantes por toda a nação. A maioria dos países que tenta tirar alguém do poder numa configuração dessas acaba em guerra civil ou golpe militar. É complicado. É muito complicado.

E se no tempo do Collor o exército ainda fungava no cangote da democracia, as nossas forças armadas não tem mais nenhuma capacidade de dar suporte a um movimento golpista. E antes que me entendam mal: ainda bem! Militar no poder NEM para tirar o PT, nada justifica. O que eu quero dizer aqui é que vai ter que jogar o jogo no campo do governo e com as regras deles.

O cenário mais realista é que não vamos chegar nem perto de um impeachment. Mas vamos discutir outros dois, caso o processo comece a funcionar: no primeiro o PT manobra para se segurar até a segunda metade do mandato (e eles conseguem), fazendo que o PMDB assuma em seu lugar. No segundo o PT quebra a cara logo no começo e temos que realizar nova eleição, é o menos provável de todos, mas…

Beleza, tiramos Dilma do poder! E agora? O PT é um partido cheio de elementos sujos, mas nem de longe tem o monopólio da corrupção. Aconteça o que acontecer, vamos trocar de capitão num navio à deriva. Os problemas continuam, e infelizmente a maioria deles é grande demais para ser resolvida só por uma pessoa. Se for o PMDB assumindo alguns anos para frente, bom… o PMDB não tem plano nenhum para nada. Não é o negócio deles. O PMDB é um partido assumidamente fisiológico e usa seus números para ser sempre situação. Eram situação com o FHC, são situação com Lula e Dilma. Vai ser um governo de chacais se matando para conseguir dinheiro e poder até o mandato acabar. E depois disso, assume outro e eles continuam situação.

Mas, e se tivermos uma nova eleição? Aí deve ser a grande chance do Aécio! Se ele entra, o que muda? Bom, ao invés de um modelo de bem-estar social cagado e feito nas coxas, vamos ter um modelo neoliberal cagado e feito nas coxas. E toda a bagunça que estamos enfrentando vai continuar acontecendo. A merda está feita, temos que limpá-la e vai demorar muito mais que um mandato para conseguir.

Não demoraria muito para o PSDB herdar a desaprovação do PT. Não tem quase nada a se fazer no curto prazo de um meio mandato. O barco vai continuar à deriva e vamos ter de contar com a sorte de encontrar mares mais calmos. E aqui, talvez algo que deixe muitos dos nossos leitores desgostosos comigo: se é para fazer isso, deixa o PT mesmo! Para mim o ponto de mudança passou faz algum tempo e perdemos a chance. Por incrível que pareça, desconfio que deixar a oposição entrar ‘pela janela’ desse jeito na verdade só vai dar mais força para o que deve vir por aí em 2018: o Lula.

Não importa quem entre, vai sofrer com um país num momento ruim. Vai perder popularidade. Se o Lula botar a banca de salvador da pátria daqui a alguns anos, existe sim o risco do povo comprar. O que talvez segure um pouco essa força do PT é a esperança (e só isso) de um governo tucano resolver tudo num passe de mágica. Povo gosta de soluções mágicas. Se a população lidar com a quebra da ilusão de eficiência de um Aécio da vida, fica até mais fácil vender o Lula.

E mais uma de advogado do diabo: o que está deixando o povão puto da vida MESMO não é totalmente culpa do PT. Não vou me desdizer: a inflação e a estagnação econômica foram mascaradas até as eleições e isso aumentou sua intensidade, mas essas coisas aconteceriam de qualquer jeito. Essa pica quase foi do Aécio. Existem componentes internacionais e uma catástrofe meteorológica profundamente integradas com nossa situação atual.

Esse momento inicial de governo normalmente tem índices mais baixos de aprovação. É a quebra do encanto da propaganda eleitoral com a dura realidade de um sistema falido. E com preços subindo, os humores da população ficam mais inflamados. Quando as coisas derem uma acalmada (vulgo nos acostumarmos com a trolha), vai cair também a rejeição do governo.

E sim, eu sei que temos provavelmente o maior escândalo de corrupção da história da humanidade (é pouco?) com o Petrolão. Mas isso não enfurece o povão que vota. É o preço da comida e da passagem de ônibus que fazem populações pedirem a cabeça de governantes (pelo menos em países como o Brasil). A quantia exorbitante de dinheiro roubado da Petrobrás evoca sentimentos revolucionários em apenas algumas camadas da população. O brasileiro médio mal consegue conceber os números dos desvios.

E mesmo assim, é só o governo sendo corrupto. O Collor caiu porque mexeu no bolso do povo com seus desastrados planos econômicos, a corrupção foi o que acharam para derrubá-lo. É o preço do tomate que derruba governos! O PT pode sair dessa sinuca de bico se a economia der uma leve estabilizada e a inflação arrefecer um pouco. E analisando a conjuntura de mercado, acho que vai escapar sim. Não espere tanta rejeição assim nos próximos anos. Mesmo que rode metade do Congresso e do Senado no Petrolão, provavelmente nem isso mata o governo de Dilma.

O PT vai apertar o cinto nesse ano, vai começar a soltar um pouco de dinheiro de volta no ano que vem, e provavelmente navega por essa tempestade. Foda-se a rejeição em 2015, a que importa é a de 2018. Por isso temos que ter muito cuidado em achar que esse ‘calor’ que o governo está levando agora é uma pancada com consequências duradouras.

Temos que nos organizar para meter o dedo na cara deles, mas tem que ser um plano de longo prazo. Talvez seja mais importante barrar o Lula em 2018 do que mexer com a Dilma agora. Nem acho que o plano da oposição para o Brasil seja melhor (no fim do governo FHC não estava grandes coisas), mas ainda acredito muito na alternância de poder.

Não é provável que aconteça algo além de mais um sufoco para o governo atual. E de uma certa forma, eu até acho bom: que todas as bombas estourem no colo do PT. Eles fizeram por onde. Mas o mais importante: a Dilma não é o Collor. Para o bem e para o mal. O PT vai ser MUITO mais competente para fazer o jogo técnico de poder, e MUITO mais competente para acalmar o povão. Já falei faz tempo, reafirmo: vocês não imaginam como o PT é organizado e ‘profissional’ nisso de se manter no poder.

O que collou antes não cola mais. Ou a oposição fica boa de verdade nesse jogo (ao invés de jogar na mão do povo a responsabilidade), ou vai continuar sendo um passeio. Se Lula aguentar vivo, não duvide que o PT enfileira 24 anos no poder.

É sobre 2018, não sobre 2015. Mas, ei, discorde à vontade, ainda somos uma democracia. Ainda.

Para dizer que adora esses meus textos animadores, para dizer que está mais puto com a gasolina do que com o petróleo, ou mesmo para dizer que entendeu do texto que temos que matar o Lula: somir@desfavor.com


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