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Sentando em cima.

Sentando em cima.

| Somir | | 15 comentários em Sentando em cima.

Muito importante para sua vida: pornografia britânica não pode mais conter cenas de mulheres sentando na cara de homens! Os censores locais baniram uma série de práticas sexuais nos vídeos produzidos localmente sob o argumento de serem perigosos. Mas… perigosos para quem?

Ok, eu sei que não foi um bom começo e que a notícia não te interessou muito, afinal, acho que nem os ingleses assistem pornografia britânica. Eu mesmo sou parcial à japonesa. Mas talvez o texto melhore um pouco se eu listar o que eles baniram:

  • Spanking: bater em alguém com as mãos, mas acredito que o famoso “Aiô Silver!” na bunda dela durante o sexo ainda deva estar valendo;
  • Caning: sentar o pau em alguém, não o pau que você imaginou;
  • Aggressive whipping: uso de chicotes, mas sem aquela viadagem de ficar esfregando, é chicotada mesmo;
  • Penetration by any object “associated with violence”: penetração é a parte fácil de compreender, o objeto associado com violência confunde um pouco mais. Imagino que facas e espadas já sejam banidas por natureza;
  • Physical or verbal abuse (regardless of if consensual): qualquer espécie de abuso, mesmo com palavras, mesmo que a outra pessoa tope. “Está gostando disso, sua… pessoa bacana…?”;
  • Urolagnia (known as “water sports”): esportes aquáticos? Nada mais de pólo durante o sexo. Se bem que eles devem estar falando de urina;
  • Female ejaculation: ha, toma essa mulherada! Até a sua ejaculação foi proibida. Próxima parada, proibir o clitóris. Cá entre nós, eu ainda acho que é mijo;
  • Strangulation: ok, sem estrangular. Achei que já estava banido junto com ‘dedo no olho’ e ‘chute no saco’;
  • Facesitting: sentar na cara de alguém com objetivos sexuais. Pode ter sido lobby da indústria das cadeiras;
  • Fisting: enfiar (pelo menos) o punho vagina ou ânus adentro. Se bem que eu já vi uns vídeos que vai quase até o cotovelo…

Senti falta de coprofilia e zoofilia na lista, mas depois descobrir que essas já estão banidas há algum tempo.

Ganhei sua atenção de volta, né? Sexo vende. Aproveitemos isso para continuar desenvolvendo a ideia: por mais que até entenda que algumas dessas práticas coloquem em risco a integridade do corpo humano, uma lista dessas tem cara de algo compilado por gente querendo eliminar da sociedade fetiches que não lhes apelam.

Sim, existem riscos de se estrangular alguém durante o sexo, mas… espera-se que adultos já estejam equipados para entender os riscos de coisas óbvias como violência física. Em que mundo vivemos onde é arriscado mostrar para alguém uma pessoa xingando a outra? Somos todos crianças incapazes de discernir? Ou pior, consentir? Estamos protegendo as pessoas de riscos que elas querem assumir.

Porque não fica claro o ideal de proteger a sociedade. Proteger do quê? De gente mijando uma na cara da outra? Isso está causando algum dano sério para a coletividade? “O John viu um vídeo desses semana passada e agora está mijando em todo mundo! Socorro!”. Regular a tara alheia é um terreno pra lá de arenoso. Com exceção de casos onde não há consentimento, é praticamente impossível definir a linha que separa gosto de abuso.

Tudo o que pode ser definido como gosto pessoal carece de muitos cuidados na hora de regular. Gostos variam. Imaginem se uma regulação dessas aparece no mercado musical? Se eu fosse escolher o que é proibido, Sally entraria em depressão por nunca mais poder ouvir as músicas que gosta. E do jeito que eu sou chato, não barraria só as dela, barraria boa parte do gosto musical de vocês também. Sem chance de deixar alguém tão fresco para música decidir o que os outros podem escutar.

Agora, quando o assunto é sexo, há uma permissividade maior. As pessoas dificilmente vão se unir para pedir a liberação de uma prática sexual em filmes pornográficos. Imagina o estigma de ficar conhecido como o defensor da ‘penetração por qualquer objeto associado com violência”? A maioria das pessoas prefere aceitar bovinamente as proibições na área do que se exporem. E eu nem estou criticando isso, é irreal pedir para as pessoas se unirem por seus fetiches inconfessáveis.

E é aí que se instalam os censores da liberdade alheia: na certeza de que não sofrerão oposição. Aí, gente fresca com sexo que só aceita uma ou duas modalidades acaba tendo o poder de tratar as pessoas normais como seres indignos dos próprios fetiches. Não aceitaríamos proibições musicais, mas temos de engolir as pornográficas.

“Mas eu não sentiria falta de ver cenas pornográficas com essas coisas!”. Oras, nem eu. A gente sente falta de alimento, água, ar, contato humano… todo o resto é subjetivo. Se a pornografia como um todo fosse banida, aposto que a maior parte do mundo reclamaria um pouco, mas continuaria sua vida. Podemos tirar várias coisas do nosso cotidiano sem destruir a sociedade. O problema não é a falta que coisas do tipo fariam, e sim ter o direito de fazê-las/assisti-las.

E é aqui que encontramos um lugar comum: quando abrimos mão do direito da expressão humana em nome de alguns fanáticos moralistas, o mundo fica menor. Temos menos coisas para fazer, menos interesses para seguir. Cada vez que atacam os gostos menos populares, ganham força para atacar os mais. Podemos ser sapos numa panela cada vez mais quente, mas podemos pular fora dela também.

É difícil sentir simpatia por quem filma uma mulher levando bengaladas para a diversão masturbatória de outros, mas é um erro olhar apenas para um indivíduo nesse conjunto. Não dependemos de gostar ou não do que os outros estão fazendo para defender seu direito de liberdade. Você pode achar um absurdo que alguém se degrade em nome do prazer sexual, mas tem muita gente por aí que só aguenta esse mundo de merda por causa disso.

Ridículo regular normalidade. E assustador como muita gente acha aceitável que isso aconteça. Que alguma figura de autoridade possa descer dos céus com suas leis arbitrárias e forçá-las goela abaixo de todos nós. O ponto central do meu texto é o absurdo de condicionar liberdade de expressão a uma moralidade restrita a poucos. Defendo os pobres coitados (mesmo que sejam uns filhos-da-puta) produtores pornográficos britânicos não porque quero levantar a bandeira do ‘estrangulamento’ ou alguma das outras práticas banidas, mas porque quem defende liberdade de expressão está sempre no mesmo barco dos censurados. Quando todos os defensores da liberdade de expressão se juntam, não há mais nenhuma bandeira vexatória para carregar.

O problema deles é nosso. Mesmo que não se proíba ainda algo que tenhamos vontade de proteger. Quando eu falo da sagrada liberdade de dois adultos se espancarem no sexo, que entendamos a liberdade como a palavra forte. Sem ela, nada é possível. Censura é coisa de criança, adultos deveriam ser livres dela. Que cada um possa escolher o que quer consumir, e que alguém cuja habilidade é expelir líquidos tenha o direito de trabalhar!

E se você está achando que isso é coisa de Primeiro Mundo, não se esqueça que a cada eleição mais e mais fanáticos picaretas são eleitos no Brasil. A censura tende a ficar mais séria em terras tupiniquins. Assim que descobrirem que podem ir para cima da vida privada das pessoas, vão aproveitar a chance.

E o risco é que nós deixemos tudo passar para não levantar uma bandeira. Crime perfeito.

Para dizer que o texto não foi a putaria que você esperava, para dizer que eu só reclamei porque tenho todos esses fetiches (às vezes eu sinto vontade de estrangular pessoas…), ou mesmo para pedir o vídeo ‘que vai até o cotovelo’: somir@desfavor.com


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