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Armário amigo.

Armário amigo.

| Desfavor | | 13 comentários em Armário amigo.

Poucas coisas complicam mais uma amizade do que namorados e namoradas dando em cima de amigos. Mas Sally e Somir conseguiram achar uma situação que concordam ser ainda mais complicada, mas discordam sobre o rumo a se tomar à partir disso. Os impopulares ficam à vontade para trocar de time.

Tema de hoje: Avisar para amigo(a) que seu(sua) parceiro(a) passou uma cantada gay em você?

SOMIR

Mas nem fodendo! Aliás, sem foder de forma alguma. Vamos compreender a situação: Você tem uma amizade do sexo oposto, essa amizade começa um relacionamento heterossexual. Depois de um certo tempo, essa nova pessoa dá em cima de você, caracterizando não somente infidelidade como orientação sexual diferente da imaginada.

Ou, do meu lado de ver as coisas: o namorado de uma amiga minha dá em cima de mim. Ou pelo menos é isso que eu presumo… porque isso é importante: a não ser que seja agarrar inequivocadamente, ‘dar em cima’ é sempre dado a interpretações. Vamos trabalhar aqui com a hipótese mais realista que foi algo mais sutil, já que se esse namorado saísse agarrando homens por aí não precisaria de mim para contar, certo?

Talvez no dia em que se declarar gay ou bissexual seja encarado como algo banal e sem consequências sérias eu até concorde com a Sally, mas ainda é algo significativo cravar que alguém não é heterossexual. Há todo um estigma em cima disso (infelizmente, é claro) e muita gente não está disposta a lidar com a situação. Pelo menos não de frente (ha!).

Imagino que sair do armário seja uma experiência traumática, e algo que não se faça sem pagar um preço caro. Homossexuais (e bissexuais – que muita gente nem considera, colocando no mesmo pacote) sofrem com preconceito, oportunidades reduzidas, afastamento e tudo o mais que a humanidade adora fazer com quem não se conforma.

Justamente por isso eu não me coloco na posição de tirar alguém desse armário. Não só por não me sentir no direito de tomar uma decisão dessas por outra pessoa, mas também pela imensa probabilidade de ser enrolado na teia de mentiras que uma pessoa assim provavelmente mantém em sua vida. Não adianta dar murro em ponta de faca.

Parto do seguinte princípio: se eu contar, minha amiga não vai querer acreditar (afinal, mulher namora o namoro e não a pessoa), o safado (não por ser gay ou bi, mas por ser infiel) tem 99% de chances de desmentir. O que sobra? Eu pagando de viado! Tudo o que eu ganho nisso é a chance de ser tratado como o maluco que viu coisa onde não tinha e provavelmente está projetando a própria inadequação com o papel sexual.

O poder da negação é imenso. As pessoas racionalizam as teorias mais malucas só para não lidar com a verdade. Se o namorado da minha amiga só a está usando para fazer cena e ela NÃO percebeu, certeza que ela está em modo de negação avançado, achando só que ele é um homem mais delicado e atencioso que a média (e que ‘não tem pressa’ – hahahaha!). Mulheres tem seus planos de vida e homens são peças num jogo que elas jogam entre elas. Ter um namorado é algo maior do que encontrar uma pessoa. É um projeto que não permite erros.

Se você se mete nesse projeto para apontar um defeito, é expulso na hora. E ela ainda vai encontrar um meio de fazer sua caveira por ousar interferir. Do outro lado, temos o namorado que provavelmente se preocupa demais em manter as aparências, já que tem até uma namorada! Vocês acham que esse cidadão vai assumir alguma coisa? Vai fazer de tudo para empurrar a presunção de viadagem para quem o acusou, e vai encontrar uma aliada poderosa na mulher se enganando.

Vou estremecer minha amizade e ainda ficar conhecido como o cara que acha que todo mundo é viado e quer me pegar? Sem chance! Acho que nem se eu tivesse o vídeo da cantada conseguiria convencer ambos a caírem na real. Ninguém larga o osso.

Considerando a possibilidade do tal namorado ser bissexual, a coisa complica de tal forma que é melhor se fingir de tonto. Ele pode ser bi e ela não saber (criando algo muito parecido com a situação do homossexual em negação), ele pode ser bi e ela saber. Daí começam as probabilidades de como eles lidam com fidelidade: pode ser fidelidade para ambos os sexos ou só para um. Se for para ambos eu caio novamente no problema da minha amiga não acreditar. Se for do tipo só para um dos sexos, vai gerar uma situação estranha… ao denunciar poderia passar a impressão que eu estava querendo pedir permissão. E ela poderia dar essa permissão para ele.

E aí o cara ia continuar dando em cima de mim. O que não seria bacana. Se eu fosse educado demais poderia passar a impressão de que eu estava consentindo me fazendo de difícil, se eu fosse escroto demais no corte, poderia influenciar negativamente na amizade com ela. Percebem que quanto mais eu desenrolo a situação, mais e mais possibilidades das coisas darem errado aparecem?

Normalmente as pessoas não pensam nas coisas dessa forma, analisando possibilidade e cenários. Preferem tocar o foda-se, atirar primeiro e perguntar depois… Sei até que muita gente até tem orgulho nessa visão ERRADA das coisas (impulsividade é tratada como algo positivo porque é a resposta mais fácil para qualquer situação, e sabemos como a humanidade se amarra na via do menor esforço, não?). Se você parar para pensar, acha a melhor solução.

E às vezes a melhor solução é uma merda. Acho ruim não poder contar para minha amiga que ela é uma corna potencial, mas não vou criar uma confusão dessas sem nenhuma previsão de sucesso. Esse armário não é meu.

Para dizer que eu sou um amigo de merda, para dizer que o olho roxo dele contaria por você, ou mesmo para dizer que pensar é coisa de viado: somir@desfavor.com

SALLY

Avisar ao amigo(a) que seu parceiro é gay e está dando em cima de você? Sim, eu aviso.

Se um amigo do meu parceiro der em cima de mim, eu NÃO aviso. Quer andar com babacas, com gente errada, que se foda e sofra a humilhação de levar facada pelas costas repetidas vezes. Não conto. Se o namorado de uma amiga der em cima de mim, eu NÃO aviso. Quer escolher um babaca infiel sem um pingo de consideração? Se fode aí. Porque até aqui, estamos falando de escolha, de algo mutável, de opções. ESCOLHEM trair. ESCOLHEM agir pelas costas.

Mas, nesse caso específico, onde um amigo meu está com uma parceira que dá em cima de mim, eu conto. Conto porque não é apenas a infidelidade que está em jogo, é também um erro essencial sobre a pessoa. Considero que esse plus é suficiente para me tornar cúmplice de uma baita sacanagem caso não abra a boca. E não é uma escolha, é uma característica imutável da pessoa.

Imagina a seguinte cena: você tem um amigo que está apaixonado pela nova namorada. Ele te apresenta a essa namorada. A namorada espera uma ocasião oportuna e dá em cima de você. Você vai compactuar com isso? Nas outras situações eu apenas daria um fora na pessoa e esperaria que o corno em questão descubra por si só que está ao lado de uma pessoa caradepaumente infiel. Mas nesse caso, além de dar o fora, eu chamo e conto. Porque o infiel pode mudar, já a sexualidade, na minha opinião, não pode mudar.

Um chifre é questão de caráter, sexualidade não. Sexualidade não é um “erro” ou uma “falha” da pessoa. Faz parte do que ela é, e eu não acredito que possa ser mudada. Além disso, se você contar que alguém deu em cima de você, essa pessoa pode negar, fica a palavra de um contra a palavra de outro. Já sexualidade pode até ser temporariamente camuflada, mas não vai demorar para que algum indício venha à tona. É o tipo de coisa que, se levantada a lebre, a pessoa cedo ou tarde vai pescar, nem que seja nos detalhes. Basta prestar atenção.

E se nesse exato momento você está me achando cretina por dedurar uma pessoa com base na sua sexualidade, pense comigo no inverso: VOCÊ, amiga, tem um namorado e descobre que seu namorado deu em cima de um amigo seu. Você iria gostar? Desculpa, sei que são tempos politicamente corretos, mas eu tenho o sagrado direito de não querer me relacionar com um homem que seja bissexual. Só não tenho o direito de falar isso, porque é fato, vou ser execrada. É fácil: deu o brioco, eu não quero. Joguem pedras, joguem paralelepípedos, eu não me importo.

Ainda existe a chance da pessoa ser homossexual e estar com um parceiro do sexo oposto apenas para prestar contas à sociedade. Como é que eu vou saber? Não tenho como saber. Na dúvida, eu falo, porque é algo que vai muito além de uma pulada de cerca, a sexualidade é para sempre. E, ao contrário de uma mera infidelidade, que se a pessoa for boa, esconde por uma vida, a sexualidade mais cedo ou mais tarde se mostra. Então, mesmo que a pessoa não acredite em mim num primeiro momento, mais cedo ou mais tarde vai ver que eu estava falando a verdade.

Não se trata de dedurar algo de errado que a pessoa fez. A questão é sobre algo que a pessoa É, que está ou pode estar em discordância com aquilo que o parceiro espera dela. O erro não é a sexualidade e sim omitor a sexualidade. Desculpa, mais uma vez, joguem pedras, mas eu não namoraria com um homem que deu a bunda para outro homem. Chamem de preconceituosa, de antiquada, de moralista, chamem como quiserem, eu tenho o sagrado direito de colocar isso como critério de exclusão para um relacionamento amoroso. E, por coerência, se fizerem isso com uma amiga, eu alerto.

A pessoa é ruim porque ela dá a bunda? Não. Podemos ser grandes amigos. Mas, dá licença, para namorado não serve. Pode ser? Não, não pode ser. Mas eu vou continuar falando mesmo assim. E se você pensa que para homem é diferente, pois homem acha bacana mulher com mulher, pense novamente, pois é legal na rua, na putaria, com uma peguete. Poucos são os homens que bancam uma mulher bissexual como parceira oficial. E, quer saber? Cada um estipula os critérios que quiser.

Quer enganar um amigo meu a respeito de algo essencial? Faça-o longe de mim, porque se me envolver, eu vou contar. Assim como esperaria que um amigo meu viesse falar comigo caso um namorado meu desse em cima dele. Picuinha, fofoquinha, intriguinha eu não faço, mas deixar alguém que eu gosto ser enganado sobre algo essencial eu não consigo. E se você pensa que sexualidade não é algo essencial, pense novamente.

Se tudo mais der errado e meu amigo não acreditar em mim, cedo ou tarde a verdade vem à tona. Ainda mais em tempos de internet. Ao menos vou abrir os olhos para que ele comece a ficar ligado e preste atenção, pesquise, investigue. Isso, é claro, se essa sexualidade o incomodar. Se não, que sejam felizes! Meu papel é apenas alertar, jamais pressionar a nada. Repasso a informação e, de posse dela, a pessoa faz o que quer.

É algo que eu considero que a pessoa tem o direito de saber. Passado sexual em detalhes é sadismo de quem conta e um baita masoquismo de quem escuta, mas declarar uma bissexualidade é o mínimo de lealdade que se espera de um parceiro. Coisa que hoje em dia não anda muito em alta. Se você deu a bunda, perdão, mas seu passado sexual me interessa sim e ele é excludente de qualquer relacionamento amoroso comigo.

Tenham vergonha na cara! A pessoa veio dar em cima de uma amiga do seu parceiro, vocês fariam o que? Ser conivente com galinhagem é uma coisa, ser conivente com um erro essencial sobre a pessoa é outra um pouco mais grave. Falo mesmo, quem mandou me meter no meio de onde eu não queria?

Para dizer que infidelidade também representa um erro essencial sobre a pessoa e me ouvir dizendo mais uma vez que todo homem trai, para entender este texto como um ataque a bissexuais e me xingar ou ainda para se achar fora de moda porque isso nunca aconteceu com você: sally@desfavor.com


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