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Nulidade.

Nulidade.

| Desfavor | | 23 comentários em Nulidade.

+O primeiro turno das eleições de 2014 revelou um dado alarmante para os partidos políticos. O alto número de abstenções e de votos brancos e nulos, que superaram a votação do candidato Aécio Neves (PSDB), que ficou em segundo lugar na corrida presidencial.

BMs confirmam: Em primeiro Dilma, em segundo Foda-se! Quando o resultado das eleições sai assim, fica fácil descobrir por que este país não vai para a frente. Desfavor da semana.

SOMIR

Primeiro, vamos tirar isso do caminho: ainda acho bisonho que o voto seja obrigatório. Mas nem por isso me furto de criticar quem não o faz. Sei também que nessa massa de ausentes tem muita gente que até queria, mas não conseguiu por uma série de motivos. Só que com quase 40 milhões de votos jogados fora as desculpas reais esgotam rapidamente.

O brasileiro mostra mais uma vez que quer mudança desde que ele não precise se envolver. O povo que saiu às ruas no ano passado resolveu curtir o domingão ao invés de votar. Ou, se foi votar, invalidou sua própria voz na democracia por teimosia, desinformação ou preguiça. Quem sabe até um misto das três coisas!

Escolher o “Foda-se” como seu representante é direito de cada um, mas é uma via de mão dupla. O mesmo desdém com o qual se trata o processo político reaparece como resposta para suas reclamações posteriores. Você diz foda-se para a política, ela te responde da mesma forma.

Em países onde o sistema funciona melhor do que o tupiniquim, o povo se importa muito mais com os rumos da sociedade. Há senso de comunidade e articulação para buscar interesses comuns. Em países como o Brasil, mobilização mesmo só para o Carnaval (mesmo o fora de hora como nas manifestações de 2013). O distanciamento do brasileiro da vida política gera o sistema todo cagado que temos.

Tem um quê de protesto nessas abstenções todas, mas tem muito mais de preguiça. Tudo bem que na época de eleições temos um desfile de salafrários pedindo votos em tudo o que se vê, mas o brasileiro parece não perceber que existem sim candidatos que prestam nesse bolo. O problema é que é difícil de separar o joio do trigo. Encontrar alguém de confiança é e sempre será um trabalho complicado em nossas vidas.

Até para cortar o cabelo precisa achar alguém que preste, precisa procurar referências, fazer testes, conhecer um pouco sobre o assunto para saber se a pessoa escolhida sabe o que está fazendo… Fazemos esse processo de seleção naturalmente. Claro que seria melhor simplesmente escolher na sorte e acabar com um profissional qualificado e confiável, mas sabemos que não funciona assim. Pouca gente vai deixar os cabelos na mão de qualquer um.
Mas o país inteiro? Opa! Aí o Foda-se vai para o segundo turno! Pode ser qualquer um. Com certeza os rumos de uma nação podem ser decididos por pessoas que você tem uma vaga noção da índole e capacidade e só vai votar porque lembra o número. Enquanto política for menos importante que escolher um encanador, por exemplo, o país vai continuar largado aos chacais.

Não estou dizendo que é fácil navegar pelo mar de merda que é a política nacional, estou dizendo que só vamos sair dele se encararmos esse cheiro pelo tempo necessário. Votar faz parte do processo de correção de curso numa democracia direta, não tem protesto que compense um voto em branco. Nem vou entrar no mérito de quem votou em excrescências como Tiririca e Bolsonaro, seja como for, essa gente pelo menos colocou quem queria no poder.

A via do distanciamento político causa dois resultados igualmente problemáticos: dá a sensação de impunidade para os bandidos já eleitos (se ninguém se importa com eles…) e também permite que qualquer grupo escroto como os conservadores religiosos consiga se organizar no vácuo deixado pela falta de interesse da população.

Direito da pessoa de sair às ruas por muito mais do que vinte centavos, mas é um desfavor voltarem para casa só com eles. Como é que um governo que perdeu quase toda sua aprovação em um mês conseguiu terminar o primeiro turno em primeiro lugar? Não é nem o anti-petismo falando: é estranho que depois de tanta merda jogada no ventilador o governo não tenha sido expulso nas urnas.

Podiam ter votado até na Marina e continuado o processo de eleger gente despreparada, mas um povo mais politizado teria no mínimo colocado o PT de castigo por alguns anos depois de Mensalão e Cia. Não é só o dedo podre do brasileiro para escolher representantes aqui, é uma ‘ausência’ assustadora de todo o processo. É como se tudo recomeçasse a cada período eleitoral.

Exemplos: Dilma em primeiro, Alckmin reeleito, sucessor de Sérgio Cabral no segundo turno… justamente quem estava levando mais pedrada nos protestos recentes! Exigir mudança sem se dar ao trabalho de procurar substitutos é fazer barulho por nada. Um país de mulheres de malandro.

E esses são os que votam exercendo o direito de perdoar quem abusou deles. Pior é quem apanha e não se mexe nem assim. Quem deixa o Foda-se ganhar mais votos que o segundo colocado. Não quer participar do processo? Não deveria precisar (embora precise pelas leis brasileiras). Mas pelo menos tenha a decência de admitir que quando sua abstenção volta para te morder a bunda, você fez por onde.

Sem participação maciça do povo na política não temos sequer a chance de viver num Estado mais justo e organizado. Se nem você vai tirar a bunda do sofá para limpar a casa, não estranhe as baratas correndo pelas paredes.

Para dizer que já cansou de eleição (azar), para dizer que entre Dilma e Aécio prefere as baratas, ou mesmo para dizer que um voto não faz diferença (40 milhões de pessoas dizendo isso fazem): somir@desfavor.com

SALLY

VERGONHA. Vergonha é o que estou sentindo. Teria sido menos vergonhoso se Dilma ganhasse no primeiro turno com 80% dos votos, e olha que eu abomino a Dilma de coração! Mas, pior do que fazer merda é tirar o corpo fora, se abster, não fazer a sua parte. Pior ainda: não fazer a sua parte, não contribuir para que as coisas mudem, e ficar reclamando da bosta que o país está. Na boa, quem não gastou dez minutos do seu dia dando um voto válido não tem moral para reclamar de NADA nos próximo quatro anos.

Se você tem um jardim, mas não o rega, não cuida dele, não o monitora, vai ficar reclamando que as plantas não vingaram? Se você tem um cachorro, não o educa, não cuida dele, não o alimenta, vai ficar reclamando que ele destrói a casa e morde os outros? O mesmo vale para o seu país. Essa coletivização do sentimento de “foda-se” mostra o quanto o brasileiro é burro, idiota e incompetente. Vamos não votar em ninguém, foda-se todo mundo. Inclusive você e eu. Spoiler: o foda-se não funciona, só quem se fode é você e ainda fode com mais gente que não tem nada a ver com isso junto.

Se você não votou porque acha que está tudo uma merda, que não tem jeito, que tanto faz, então, francamente, não sei do que você reclama, pois esboçou um conformismo e um sentimento de indiferença. Chego a me perguntar se o brasileiro não gosta de estar na merda. Por mais que tenha suas mazelas, o ganho colateral é tentador: ser vítima. Não tem coisa que brasileiro goste mais na atualidade do que ser vítima. Vamos deixar os outros decidirem. Não vamos ter o trabalho de ir até uma zona eleitoral. Votar é para os fracos, os fortes ligam o foda-se, e fodem com todo mundo.

Escutem com atenção o que eu vou falar: eu não gosto de votar. Eu não gosto de pagar impostos. Eu não gosto de não poder matar dos filhos da puta que atrasam a minha vida. Mas diariamente faço dezenas de coisas que eu não gosto, porque são as regras da nossa sociedade. É LEI, CARALHO. Qual é a dificuldade de entender e se sujeitar às normas do lugar onde você vive? Ou então, de ser coerente, de não se sujeitar às normas que você não gosta mas permitir que outros também não se sujeitem a normas que eles também não gostam.

Não. O Brasileiro Médio só obedece as normas que ELE quer, que fazem sentido para ELE, mas se outra pessoa desrespeita uma norma que ele preza, aflora toda uma indignação cidadã. Isso é o mais alto grau de falta de vergonha na cara que um ser humano pode ter. Ou todo mundo respeita tudo, ou ninguém respeita nada. Você não respeita a lei? Então cala a porra da tua boca quando o assunto for esse. Não foi votar? Então, foi mal, aguenta a trolha calado, já que você contribuiu para que a pessoa que vai chegar ao poder se eleja.

Estou INDIGNADA. Um caso emblemático que ilustra bem meu ponto: Não faz muito tempo presenciei uma conversa que versava sobre pagar por TV a cabo. Pessoas com uma renda boa (inclusive melhor do que a minha) se diziam indignadas e que faziam uso de “gato” porque era um absurdo o preço da TV a cabo (“eu não vou pagar esse negócio, é muito caro! Um absurdo”). Pessoas que tem carro, pessoas que viajam para o exterior, pessoas que tem diploma. E eu sentindo aquela coceira na alma para refutar (acha caro? NÃO TENHA), mas me calei. Daí o assunto mudou a começaram a falar de “criminosos” e do quanto tinham que ser punidos, e que não era nada de mais matar “bandido”.

Minhas tripas foram parar no céu da boca. 1) como pode uma pessoa ser tão BURRA de não perceber a contradição do que está dizendo e 2) como pode uma pessoa ser tão canalha de perceber a contradição mas se auto-perdoar e não ter vergonha na cara de falar uma porra dessas! VERGONHA é a palavra de ordem hoje. E foi este mesmo esquema de auto-perdão e foda-se que reinou nas urnas, o único momento da atual democracia onde o povo supostamente é ouvido.

As pessoas, dia após dia, apresentam comportamento malandro, vergonhoso, para se dar bem, espertinho e criticam políticos que o fazem! Rezam um pouquinho, penduram algum badulaque brega religioso na sala ou no retrovisor do carro, se dizem católicos e tá tudo lindo: eles são as boas pessoas e eu, ateia, que sigo a lei à risca, que penso na coletividade, que tenho preocupação social, sou a escrota. Tá combinado assim.

O que o brasileiro fez nessas eleições foi exatamente isso: a massa subornada por bolsa-whatever pagou sua contrapartida e votou na Dilma. O resto ligou o foda-se e deu mais votos para o “nada” do que para o segundo colocado. Cambada de omissos! Eu acho omissão um atestado de covardia, em qualquer esfera. Desde quando um filho da puta te sacaneia e um amigo seu fala que não tem nada contra ele “porque comigo ele nunca fez nada” e fica vaselinando e tratando o filha da puta bem até questões maiores, como se omitir na hora de eleger o Chefe de Estado, a pessoa que vai dar rumo ao país pelos próximos quatro anos.

Não venham me dizer que é uma forma de protesto. Vou começar a protestar fodendo com as outras pessoas para ver se vão gostar. Ou melhor, vou protestar sacaneando animais, que hoje estão valendo muito mais do que gente e causando mais comoção. Vou tirar um balde com filhotinhos de gato de dentro do carro e começar a pisar suas cabeças dizendo que é a minha forma de protestar. Em meio centésimo de segundo vem o PETA, dez vovozinhas, a polícia, três ONGs e a Luiza Mell chorando e me xingando. Mas quando alguém pisa no país inteiro, não abrem a boca.

Quer protestar? Proteste, mas não me foda. Proteste mas exerça sua cidadania, porque quando tem convém, você bem que se comporta como um cidadão e reclama dos seus direitos. Pois, adivinha só, é uma vida de mão dupla! Para ter direitos, você também tem deveres. Mas os deveres ninguém quer, não é mesmo? O legal é ser espertão, evocar dos direitos sem precisar fazer o sacrifício dos deveres!

Quando você diz “tanto faz” e deixa a porra do Brasileiro Médio escolher o Presidente da República você está fodendo a todos nós. Tanto descaso, tanto menosprezo, tanta arrogância estão fodendo com o Brasil. Insisto na teoria de que somos um grande organismo: se um órgão vai mal, não adianta que todos os outros funcionem muito bem. Você é a célula de um órgão, tem que fazer a sua parte ou prejudica o organismo como um todo.

OMISSÃO é recurso dos covardes. Omissão, em qualquer situação que seja, é algo pequeno, cagão, frouxo. Omissão é pior do que qualquer escolha errada. VERGONHA. O Gigante acordou, pegou 20 centavos e voltou a dormir. Por favor, vocês tem o discernimento para saber que NADA nessa vida é pior do que delegar uma decisão importante a um Brasileiro Médio. Parem com isso AGORA!

Para perguntar porque a gente ainda se dá ao trabalho, para se omitir ou ainda para questionar o resultado nas urnas: sally@desfavor.com


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