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Coulrofobia.

Coulrofobia. Certamente você já ouviu falar, mas provavelmente você não está ligando o nome à pessoa. Coulrofobia é o medo irracional e incontrolável de palhaços. Acomete crianças, adolescentes e muitos adultos. Isso mesmo, existem adultos que levam uma vida normal, funcional, inteligentes e maduros que sentem um pavor incontrolável de palhaços.

Como já dissemos outras vezes, a fobia é um medo irracional, sem nenhuma explicação lógica aparente. Não necessariamente o que desperta fobia em uma pessoa é algo que lhe faria mal ou a colocaria em risco. Pessoas tem fobia de coisas e animais totalmente inofensivos. O que desencadeia a fobia não é o mal que o objeto pode te causar e sim uma série de mecanismos inconscientes complicados demais para que eu ouse começar a falar deles sem antes ter um diploma em psicologia.

O fato é que muitas pessoas tem esse medo irracional e incontrolável (fobia) de palhaço. Não percebemos com muita clareza porque socialmente é inaceitável que uma pessoa adulta se apavore e saia correndo quando se depara com um palhaço, então, essas pobres pessoas encontram mecanismos e fazem das tripas coração para disfarçar um pavor que a sociedade não lhes confere o direito a ter.

Mas ele existe, e é injusto que alguns possam dar um siricotico histérico ao ver uma barata e outros tenham que ter um mini-AVC em silêncio ao ver um palhaço. A situação piora quando se trata de um homem, pois a reprovação social é ainda pior. Ao homem é negado o direito de sentir medo, quem dirá fobia. É considerado “frescura”, “fraqueza”, “viadagem”. Mas não é. E hoje venho aqui te dizer que a fobia a palhaços é muito mais comum do que você imagina, muitos famosos, inclusive, são acometidos por ela.

Os sintomas vão muito além de um mero desconforto, de um simples não gostar. Eu não gosto de palhaços, acho antiestético e degradante um ser humano vestido de palhaço, mas meu sentimento se limita a uma forte vontade de me aproximar e chutá-los. Uma vontade que pode (e deve) ser facilmente controlada. Fobia é algo muito mais forte, que vai muito além do simples desgostar ou sentir vergonha alheia. Mexe com sintomas físicos, gera reações incontroláveis, desde crises de choro até desmaios.

Os “sintomas” não são taxativos. Eles podem variar, seja na forma, seja na intensidade. Em casos mais brandos a pessoa sente um desconforto ao ficar nas proximidades de um palhaço. Em casos mais severos, sintomas que se assemelham a um ataque de pânico podem aparecer: perda de fôlego, arritmia, suor em excesso ou crises de choro emergem. Há pessoas que simplesmente não conseguem ficar no mesmo recinto que um palhaço.

O quanto a pessoa consegue sufocar ou disfarçar varia, mas, depois de uma vida de treinamento escondendo esse sentimento, geralmente são bem sucedidos. O medo de serem tachados de loucos, de perder a credibilidade, os fazem desenvolver formas de mascarar esse acesso de pânico. E se você era um dos que recriminava quem tem uma crise fóbica ao ver um palhaço, eu te peço: pare. Apenas pare. É de uma ignorância ímpar pensar em uma fobia como um demérito.

Não é algo que a pessoa possa controlar com “força de vontade”, ao menos não sozinha, sem ajuda. Existem pessoas que, diante da simples foto de um palhaço já começam a chorar. E também não é algo tão raro: uma estudo realizado por uma universidade inglesa feito com 250 crianças constatou que TODAS tinham medo de palhaço. Isso fez com que a Inglaterra reveja a brilhante ideia de colocar palhaços em hospitais para “alegrar” as crianças. Coitados, eles tem medo de palhaços porque não conhecem o “Chaminha”, mas isso não vem ao caso. O fato é que um estudo que mostra um resultado de 100% é, no mínimo, um sinal.

Você vai encontrar muitos textos na internet dizendo que esse medo se deve a um trauma na infância envolvendo palhaços. Pode imprimir esses textos e limpar a bunda com eles, porque a quantidade de pessoas que tem medo de palhaços por terem sofrido algum mal vindo de um palhaço é pequena. Não é assim que fobia funciona. Por mais que isso torne tudo mais simples e lógico para nossa mente, o buraco é bem mais embaixo. Vamos abandonar esse pensamento linear simplório de causa-resultado, que em matéria de mente humana, não leva a nada.

Não vou entrar em detalhes dos mecanismos, até porque, como disse, nem poderia, pois não tenho formação para isso. Muitos Impopulares tem e podem dar valiosas contribuições nos comentários e inclusive me corrigir se eu estiver errada, mas eu vou me ater à superficialidade do assunto. Sinto que este vai ser um texto onde os comentários serão mais interessantes do que o texto em si…

Dentro de tudo que eu conheço, li e pesquisei, o que faz mais sentido para mim é que a fobia é um medo/trauma canalizado para um objeto, situação ou animal. Algo de horrível, seja um sentimento, seja um evento, seja um fato, acontece com a pessoa e ela não consegue lidar com aquilo de tão forte que é. O inconsciente, por mecanismos complexos que não vou me atrever a explicar, ela “canaliza” esses sentimentos e, novamente, por mecanismos muito complexos, os deposita em outro lugar: um palhaço, uma lagartixa, raios, avião…

Especula-se que alguns filmes de terror tenham gerado medo de palhaços. Talvez um filme possa facilitar esse mecanismo de canalizar o medo, mas dificilmente um filme, por si só, causa um trauma desse porte, para toda a vida. Já havia algo ali. O mesmo sentimento que pode ser canalizado para um palhaço de um filme pode ser canalizado para um tubarão, para um avião ou para qualquer outro símbolo.

Então, saiba que mesmo que nunca nenhum palhaço tenha feito nada com você, é legítimo ter fobia de palhaços. De alguma forma, por algum motivo, algo que foi muito ruim para você foi deslocado para lá. Perceber isso é um primeiro passo para desarmar esse mecanismo. E sim, é possível. Fobias são tratáveis, por mais que sejam alo muito forte e incontrolável, elas são tratáveis. Talvez você nunca abrace, beije e sente no colo de um palhaço, mas certamente pode ficar no mesmo ambiente que ele sem ter uma crise de pânico, apenas um grau digno de desconforto.

Eu sei que para quem sofre da fobia parece que ela é intratável, que de tão forte, nunca vai passar nem melhorar. Mas vai, confie em mim. Uma boa terapia aumenta em muito sua qualidade de vida. Eu brinco que quando a gente faz terapia desenterra tanta merda, descobre tantos defeitos nefastos, visualiza tantos fracassos que aquilo que nos assustava fica até pequeno diante da insatisfação com nós mesmos.

“Mas Sally, eu quero respostas, não perdi meu tempo lendo isso tudo para ouvir tanta abstração. Porque tantas pessoas canalizam um medo justamente para palhaços?”. Há especulações, e são apenas especulações,
que o medo de palhaço está diretamente relacionado com o medo do desconhecido, pois o palhaço representa uma figura indecifrável, camuflada. O desconhecido, o imprevisível e todo o desconforto que ele causa é canalizado para aquela figura, é personificado. Uma pessoa que você não sabe o que é, que não respeita normas sociais (seja no vestir, seja na forma de se portar). Será? O que você acha?

Independente da sua opinião, a fobia de palhaços (ou qualquer outra) tem que ser respeitada, é algo que independe do querer da pessoa. Mas, no Brasil, ter fobia é um convite à incompreensão. Perdi as contas de quantos pais sem noção pegam o objeto da fobia e “esfregam” nos filhos (principalmente se for filho homem) para “deixar de ter medo” ou “aprender a ser homem”. Isso não se faz, isso é uma forma cruel de violência que só piora a situação. O problema não é o objeto da fobia em si, e sim o que ele representa na cabeça da pessoa, dentro desse mecanismo que se criou.

Acho sádico que continuem contratando palhaços para visitar hospitais, animar festas e fazer publicidade de eventos. Após uma pesquisa séria onde se constatou que 100% do público tem medo, colocar um palhaço em uma festa infantil é como fazer um show de baratas e ratos em uma festa de mulheres. Espero honestamente que parem com isso. E espero que depois deste texto ninguém julgue outra pessoa como “maluca” porque saiu correndo e chorando ao ver um palhaço. Os índices de Coulrofobia são altíssimos, a gente só não vê na prática porque a não aceitação social é enorme.

Pelo sagrado direito de não ser desmerecido por suas fobias. Coulrofóbicos, aqui vocês tem um ambiente seguro para trocar experiências, vivências e desabafas.

Para achar erroneamente que eu tenho medo de palhaço porque você é um fdp que só faz coisas em causa própria e canalizou isso para mim, para dividir experiências ou para reclamar que eu estou demorando muito para responder os comentários e não ter a sensibilidade de perceber que eu estou trabalhando mais do que o maquiador da Regina Casé: sally@desfavor.com

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fobia, palhaços

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