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Ele disse, ela disse: Vencendo o prazo.

Ele disse, ela disse: Vencendo o prazo.

| Desfavor | | 77 comentários em Ele disse, ela disse: Vencendo o prazo.

Da série títulos enganadores. Quem nunca se deparou com algum alimento fora do prazo de validade em sua casa? Seja por ter comprado demais ou mesmo por termos esquecido completamente dele, a situação é muito comum. Sally e Somir discutem sobre o que fazer com eles. Os impopulares tentam estragar o argumento contrário…

Tema de hoje: É aceitável consumir alimentos fora do prazo de validade?

SOMIR

Claro que não vem sem uma certa dose de riscos, mas normalmente não maiores do que os que você encara normalmente no seu dia-a-dia. Comer alimentos fora do prazo de validade é aceitável sim. Entre a passagem de uma data impressa numa embalagem e um alimento estragado há uma considerável diferença.

Não estou advogando aqui que você escolha consumir alimentos vencidos, mas não nos deixemos vencer pela irracionalidade: É – ou pelo menos deveria ser – senso comum que as empresas que produzem e comercializam os alimentos não estão lá muito interessadas em assumir riscos com a saúde de seus consumidores. Nem precisa ser questão de ética, é algo básico para ter uma empresa do setor funcionando.

Se fosse só pelo lucro a curto prazo, imagino que a imensa maioria das data de validade nos alimentos por aí seria empurrada bem para a frente. Se o risco não fosse alguém ficar doente e acabar processando o fabricante e/ou o distribuidor, valeria a pena. Mas é. Então trate de trabalhar com uma confortável margem de segurança se quiser se eximir de responsabilidades excessivas!

E é sobre essa margem de segurança que eu monto meu argumento hoje. Os alimentos que consumimos diariamente tendem a estar bons na hora que a validade chega. Faz sentido: Se você disser com todas as letras que só assume a culpa enquanto o alimento está tranquilamente consumível, quase impossível ser pego de surpresa.

Prazos de validade são mais uma dessas linhas arbitrárias tão comuns em nossa sociedade. Pense neles como uma classificação etária. Não é da véspera para o aniversário de 18 anos que alguém passa a ser capaz de lidar com todas as responsabilidades e riscos da vida adulta, não? Todos sabemos que não é mágica, mas precisa de uma linha, senão teria que analisar tudo caso a caso… e não faríamos mais nada além disso.

A lata de molho de tomate não vai se transformar em veneno de um dia para o outro, mas acabamos aceitando o conceito de validade para facilitar a nossa vida. Todo mundo sabe que não estragou. Pelo menos não mais do que o iria naturalmente desde o vencimento. Assim como o resto da humanidade, aceito a linha arbitrária pela sua praticidade. Mas não vamos ignorar o óbvio ululante: estragado não está.

Até porque se estiver, é relativamente simples de se notar. O corpo humano tem suas armas na hora dessa análise. Os cheiros que indicam alimentos perigosos vem “tatuados” no nosso cérebro como coisas indesejáveis. O paladar tende a enviar sinais bem urgentes quando encara comida estragada. Fungos, bactérias (estranhas) e afins não são conhecidos pela sua habilidade de nos tapear. Quando atacam, é por força bruta mesmo.

Se a discussão fosse se era aceitável comer comida estragada, claro que não estaria discordando de Sally; mas estamos falando de comida cujo único crime é um número ultrapassado na embalagem. Quando a validade chega, o que acontece de verdade é que o fabricante passa a responsabilidade para você, e não que a comida passou a fazer mal.

E como sempre, bom senso dirime as questões mais complexas. Cada tipo de alimento exige atenção específica. Alguns são naturalmente mais perecíveis como frutas e vegetais, outros apresentam riscos específicos de contaminação como a maionese… Se você sabe quanto tempo um alimento dura, não precisa de diploma em matemática para calcular a margem de segurança real dele. Tem alimento que é feito para durar horas, dias ou meses (alguns especiais até anos).

Desde que você não ache que um ovo pode ser consumido semanas depois da compra, grandes chances de não se arriscar mais do que se arriscaria normalmente. Comer é perigoso. Tem quem fique doente com alimento na validade… a vantagem é a chance de ter tudo pago pelo fabricante ou distribuidor. E olhe lá, às vezes tem que ganhar na justiça antes. Justiça brasileira, só para deixar mais claro.

Sem contar que a forma como você armazena e usa o alimento influi também na duração dele. Uma lata guardada num lugar seco e fresco vai durar MUITO. Uma panela aberta em cima do fogão no verão vai estragar sua comida mais rápido do que ela estragaria normalmente. Não estou falando nenhuma novidade aqui: sabemos onde é um risco e onde é só um número.

E enfiando mais o pé na jaca: mesmo que você seja maluco e coma algo obviamente estragado, não é tudo que vai te causar problemas. Só os fortes sobrevivem no caminho pelo sistema digestivo humano. Alguns microorganismos conseguem vencê-lo, mas a grande maioria estava mais adaptada mesmo à comida do que ao consumidor. E mesmo quando um desses mais fortes passam, temos outras linhas de defesa além dos ácidos estomacais. Se não deveria ter entrado, o corpo manda sair. Por cima ou por baixo.

Repetindo: não estou dizendo que é desejável consumir alimentos fora do prazo de validade, mas o discurso de Sally é exagerado. Eu mesmo evito, mas não entro em parafuso se o queijo na geladeira venceu há algumas horas atrás! É um risco baixo demais para a média da vida. Tem que estar vencido há muito tempo (relativo à duração média daquele alimento) para ser tão roleta russa assim.

E só para arrematar: Você come fora de casa? Frenquenta restaurantes, lanchonetes, fast foods ou bares? Então você come comida vencida. Pouca gente se importa com esses preciosismos de horas e minutos de validade, não sem razão.

Vencido não é estragado.

Para dizer que eu sou nojento, para dizer que faz bem comer alimentos vencidos por causa dos anticorpos, ou mesmo para falar que o dinheiro está tão curto que comida só vence depois depois que você come: somir@desfavor.com


SALLY

É aceitável comer alimentos fora do prazo de validade? Não. Se o prazo de validade está ali, é por algum motivo. Colocar sua saúde em risco só para não jogar fora um alimento é de uma mediocridade inaceitável.

Depois que o prazo de validade expirou se trabalha com o RISCO. Dali para frente o alimento pode ou não estar apto para o consumo. Você quer arriscar seu bem estar? Você gosta de vomitar? Você acha legal ter diarréia? Eu não acho, eu não me arrisco, até porque geralmente o valor desses alimentos é irrisório. Vale a pena arriscar passar mal por causa de um iogurte de menos de cinco reais? Vale a pena se arriscar a ter que comprar um antibiótio cujo valor é mais de dez vezes o valor do alimento? Quem faz isso ou é um tremendo pão duro ou um baita de um arrogante que acha ser possível identificar em 100% das vezes quando um alimento está estragado.

Pois adivinha só… nem sempre um alimento impróprio para o consumo está azedo, com cor estranha ou com qualquer outro sinal gritante que torne seu consumo desagradável. Quem aqui nunca comeu algo estragado que lhe fez mal sem perceber? Quem aqui nunca comeu algo que parecia bacana e só descobriu horas depois que não estava bom, quando a hecatombe intestinal chegou? Por favor, sejamos menos arrogantes, pode acontecer de você não perceber e a comida estar de fato imprópria para o consumo. Vai arriscar?

Quando eu me deparo com um alimento fora da validade e me dá uma tentação arrogante de comer achando que o alimento está bom, eu me pergunto quanto custa aquele alimento e depois me pergunto se esse valor vale alguns dias de vômitos e diarreia. Nunca vale. Um queijo, um iogurte, uma fatia de pão… Por favor, não ousem usar a questão financeira como desculpa, porque quem não está podendo gastar dinheiro é quem mais deve cuidar da sua saúde. Remédio é muito mais caro do que comida.

Não existe um teste definitivo que você possa fazer para saber se um alimento está estragado ou não. Se existisse, não seria necessário prazo de validade, a embalagem diria “consumir até ficar verde”. Não adianta cheirar, sacudir, olhar, aquela porcaria pode estar estragada, por te fazer um mal tremendo e ainda assim ter uma aparência normal. Desculpa mas comer alimentos fora da validade é falta de consideração não só com você mesmo como com todos aqueles que convivem com você, porque se der errado, alguém vai ter que cuidar do doente.

Queria chamar a atenção de vocês para o fato de hoje, ser proibido no Brasil a venda de antibiótico sem receita médica. Isso agrava ainda mais o risco. Porque se fosse há alguns anos atrás a pessoa poderia se arriscar e, ao primeiro sinal, entrar no antibiótico tentando abortar uma gastroenterite. Hoje não, se passar mal vai ter que ir a uma consulta com um médico e só depois vai poder começar a tomar o remédio. Boa sorte tentando marcar uma consulta rápida com médicos de plano de saúde e mais boa sorte ainda se depender de um pronto-socorro. Não é mais fácil jogar fora aquele suco e pagar três reais por um novo?

Para muita gente custa. Gente que acha que tem o controle de tudo, que sabe tudo, que vai identificar um alimento estragado semopre, sem falhas. Ou pior, gente “Aicate” que acha que validade é invenção. Apesar do fabricante estar te mandando não comer, tem gente que acha que sabe mais do que o fabricante e que nunca nada vai dar errado. É uma modalidade de irresponsabilidade arrogante que eu repudio. O pior é que a pessoa que o faz não admite o risco de forma alguma, muito pelo contrário, se come e não passa mal, acha que isso valida sua conduta: “Viu? Eu estava CERTO, comi e não aconteceu nada”. Não, o erro persiste, mesmo que não aconteça nada, porque se colocar em risco é o erro, independente de dar certo ou errado.

Daí tem também os negadores que citam riscos diários que todos nós corremos para justificar esse tipo de erro: “Risco a gente corre todo dia, eu posso escorregar no banho, bater com a cabeça e morrer”. Bela falácia. O detalhe é que você não pode ficar sem tomar banho, portanto, é um risco NECESSÁRIO. Mas pode muito bem deixar de comer um alimento fora da validade, o que torna esse risco DESNECESSÁRIO. Infelizmente poucas pessoas tem a clareza mental de ver isso, os riscos se embaralham na cabecinha da pessoa e o fato de existirem riscos necessários acaba avalizando correr qualquer risco.

Qualquer risco que se deseje correr na vida deve ser ponderado. Para valer a pena é preciso que o ganho seja bem maior do que uma eventual consequência negativa. O maravilhoso ganho de tomar um Yakult compensa três dias de vômito, diarreia, mal estar e até febre? Se você respondeu “sim”, recomendo terapia. Anda alguns quarteirões e compra um novo, porque o bem estar e a saúde não tem preço. Você daria um produto com a validade vencida para o seu filho? Então porque você vai comer?

Se as pessoas fossem menos arrogantes e tivessem consciência do RISCO, não comeriam produtos fora da validade. Mas em geral o povo se acha muito esperto, infalível. Malandro é quem burla a orientação do fabricante e faz o que quer, esse é o esperto e não quem respeita as orientações do criador do produto. O bacana é ser malandro, esperto. Ser obediente e cuidadoso é para os otários. É o jeitinho brasileiro à mesa.

Para criar uma teoria conspiratória de fabricantes para vender mais que desmerece a validade dos produtos, para preferir acreditar que você nunca vai passar mal e desconsiderar meus argumentos racionais ou aina para revestir meus argumentos de alarmismo e histeria para minar minha credibilidade: sally@desfavor.com


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