Skip to main content

Des Contos: La saga de Melly – Capítulo 2

| Sally | | 40 comentários em Des Contos: La saga de Melly – Capítulo 2

desc-melly01

Você está lendo uma novela argentina, uma história contada propositadamente de forma brega e dramática, um tango moderno, sem qualquer segunda intenção. Uma história que está sendo contada apenas porque a autora achou que merecia ser contada, pelo inusitado e pela importância que teve para sua vida. Usufruam dele como o que ela é: uma história. Nada mais.

Lembrando do nosso combinado: excepcionalmente nesta postagem não responderei a comentários, a menos que vocês consigam a proeza de escrever algo tão bizarro que eu tenha que desmentir para não me prejudicar.

Para melhor entendimento do segundo capítulo da saga de Melly, recomendamos que leia o primeiro.

– CONTINUAÇÃO –

Melly respondeu à pergunta que estava pendente. Agora ela acreditava. No mesmo instante, Melly perdeu 40 pontos de QI pelo nervoso de estar falando com aquela pessoa que ela tanto admirava.Melly fica burra quando fica nervosa. Ainda bem que antes disso ela teve uma oportunidade de fazer um brainstorm com ele, discurindo por horas sobre alguns projetos interessantes. Algo do seu potencial ela havia conseguido mostrar.

Melly teve que sair do Skype e ir trabalhar. Tomou um banho, um café e foi trabalhar virada, morrendo de sono. Pensou nisso o dia todo e, diante dessa pequena fresta de porta que estava se abrindo, o trabalho de Melly pareceu ainda mais insuportável. Se ELE achava que Melly tinha potencial para trabalhar com ele ou ser roteirista, então talvez Melly realmente tivesse potencial para ser roteirista. Uma pena que por questões econômicas da emissora o programa não pudesse fazer contratações naquele momento. Chegou a pensar que talvez ele só tivesse dito isso por educação, que na verdade ele não via potencial, mas, porque perderia tanto tempo com ela, sem nem ao menos saber quem ela era?

Melly se lembrou dele dizendo que SE um dia fosse para outra emissora, a chamaria. Melly suspirou. Parecia uma versão daquele clássico “a gente se vê” ou “vamos marcar alguma coisa”, só que no campo profissional. Certamente ele não lembraria deMelly meses depois. Mas de qualquer forma, valeu o elogio de uma pessoa como ele ter visto potencial em Melly.

A troca de e-mail continuou. Ele parecia bastante curioso sobre Melly, que de fato é uma figura incomum. Ele disse que estava surpreso com o posicionamento político de dela, pois geralmente argentinos demonstram uma idolatria por Lula e pelo PT – e de argentinos ele entendia, sua antiga produtora era argentina. Nada pior nessa vida do que ter um argentino como patrão: te exigem muito e te dão pouco em troca. Talvez a dificuldade de classificar ou compreender a mente estranha de Melly tenha despertado essa curiosidade nele. Por sua vez, Melly também estava curiosa por um outro lado que ele estava revelando: um menino tímido, educado e muito correto se desenhava na frente se seus olhos, através de palavras escritas.

Provavelmente por essa curiosidade recíproca os e-mails tenham continuado por meses. Troca de ideias, troca de informações e algumas piadas povoavam uma correspondência virtual muito divertida que Mellyainda guarda até hojecom o maior carinho. Foi quando Melly teve uma ideia: já que o trabalhar PARA ele não era uma opção no momento, e provavelmente nunca seria, ela queria aproveitar a porta aberta para trabalhar COM ele. Melly pediu sua autorização para escrever uma biografia dele. Supõe-se que se alguém te acha capaz de ser roteirista de um programa, ache que você escreve bem, certo?

Mas a reação dele foi meio estranha. Houve um recuo inicial, um tipo de temor que Melly não soube identificar bem. Claro que esta e qualquer outra constatação feita aqui são mera impressão de Melly, que podem ou não corresponder à realidade. O que Melly sentiu foi uma pontinha de desconfiança, mas nunca saberemos ao certo o que se passou na cabeça dele, a menos que ele decida dizer. O que sabemos, por hora e isso:

“(…)
Quanto a minha biografia…
Eu nao sou tao interessante assim. Naofiz grandes coisas. E sou muito jovem. Ninguem se interessaria por isso.”

Melly não sabia o que fazer diante dessa resposta. Deveria insistir ou deveria aceitar o “não”, para não ser inconveniente? Melly decidiu fazer ambos, em uma versão portenha do Gato de Schrödinger: Melly de Schrödinger disse que tentaria convencê-lo por três vezes, apenas três vezes, argumentando. Passadas essas três tentativas, Melly aceitaria o “não” e não tocaria mais no assunto.Melly estava confusa, pois não conhecia os códigos sociais desse meio, apenas do seu meio, o direito. Começou a escrever um e-mail argumentando porque achava válido fazer uma biografia.

Melly começou argumentando que o fato dele não se achar interessante não significaria que seus fãs não o achem e que mesmo que ele não o fosse, as pessoas compram biografias para saber mais sobre aquele que admiram, sejam estas informações relevantes ou não. As pessoas querem saber um pouco mais sobre a vida do biografado, apenas isso. E a julgar pelo número de seguidores que ele tinha e tem me redes sociais, muita gente se interessa.

Novo e-mail dele. Ele não se convenceu. Melly usou sua segunda tentativa. Disse a ele que de um jeito ou de outro as pessoas procuram saber mais sobre ele e, geralmente, acabam usando a fonte mais fácil, que é a internet. Daí caem em sites como Wikipedia, onde até mesmo O NOME dele estava errado. Já que as pessoas querem saber mais dele, ninguém melhor do que ele para passar estas informações. Não seria uma ode ao ego, mas um carinho com seus fãs. Melly gastou várias dizendo que o formato não precisaria ser uma coisa padrão, certinha, que poderia ser algo inovador. Melly deu várias sugestões. Disse ainda que ele não tinha ideia do alcance e impacto que isso poderia ter na vida de uma pessoa, que muitas vezes alguém que estava triste e desiludido ao se deparar com uma situação ruim poderia se inspirar na vida dele, que já passou por poucas e boas, e perceber que ainda era possível vencer na vida no fim das contas. Melly escreveu como quem estava tentando salvar o pai da forca. Talvez a sinceridade ou o empenho tenham tocado o coração dele. Algo lhe chamou a atenção, porque a resposta veio em outro tom.

Ele disse que queria ver Mellyna webcam, para saber se ela não era um fake, pois até então só tinha visto sua foto no Skype. Agora os papéis estavam invertidos, quem estava desconfiado era ele. Com razão. Certamente existem muitas pessoas que querem prejudica-lo ou tirar proveito de sua fama. Mas a desconfiança parecia boa, afinal, quem vai te dar um “não”, não precisa conhecer sua cara para fazê-lo.Melly estava confiante, preparando mil argumentos para dizer “cara a cara”.

Melly aceitou e marcaram um dia para conversarem pela webcam, um domingo. Mas, independente disso, também se encontrariam pessoalmente quando fosse possível, isto é, se Melly não fosse um traveco usuário de drogas injetáveis. Por sorte, Melly não era. Um último e-mail selou o compromisso virtual: se encontrariam no Skype domingo.

“Vamos domingo :)
De qualquer forma seria legal ver vc, a amizade fica mais real ne?”

Chegou domingo. Melly aguardava ansiosamente na frente do computador. Ele entrou e perguntou se poderia ligar a câmera. Melly respondeu que sim. Em poucos segundos, ele e Melly se olhavam “olhos no olhos” virtualmente. Obviamente Melly se comportou como uma idiota, totalmente deslumbrada e nervosa por aquela pessoa estar ali, “na sua frente”. Vocês podem imaginar Melly, que não teve nem coragem de abordar Rogerio Skylab dentro de um café, frente a frente com a pessoa cujo humor mais admirava, a pessoa que tinha conseguido levar para a TV aberta algo que Melly sempre julgou impossível. A pessoa que abriu portas para o humor evoluir e pessoas como Melly terem alguma esperança de ter voz um dia. Melly tremia mais do que Michael J. Fox.

Como toda conversa entre pessoas que não se conhecem, foi bem constrangedor. Uma conversa rápida, que serviu apenas para ele constatar que Melly não era um traveco viciado em drogas injetáveis nem um militante louco do PT querendo assassiná-lo. Ao final da conversa ele disse que topava o projeto da biografia e que ajudaria Melly no que ela precisasse. Melly dignamente sorriu e agradeceu de forma contida, e quando a câmera desligou, Melly gritou e passou os dez minutos seguintes fazendo a “dancinha da vitória” no meio do seu quarto. A vida estava sendo ingrata com Melly já fazia algum tempo, Melly nem se lembrava de qual tinha sido a última vez que tinha feito a “dancinha da vitória”. Essa noite Melly passou em claro, pensando em projetos, estudando mais sobre ele e hiperventilando sem acreditar que aquilo realmente tinha acontecido.

A pior parte foi não poder contar para ninguém. Porque Melly achou que seria desleal com ele, além de ser perigoso sair falando sobre um projeto que ainda não foi concretizado. Vai que ela contava a alguém, a coisa se espalhava e acabava saindo uma notinha em algum canto dizendo que uma biografia dele seria escrita? Ele nunca mais confiaria em Melly. Segredo só existe entre duas pessoas. Melly teve que aprender a gritar por dentro e guardar a novidade para si.

A troca de e-mail continuava. Melly já se permitia fazer algumas brincadeiras com ele e até o chamava por um apelido. Private Joke é o primeiro sinal de intimidade. Já que não havia a menor chance de Melly se tornar roteirista do seu programa, ao menos agora havia algum projeto concreto entre eles. Não apenas a biografia, mas outros projetos foram pensados, projetos que Melly mantém em segredo até hoje, pois ainda tem esperança de tirar do papel um dia.

Com a troca de e-mails Melly foi aprendendo a conhece-lo melhor. Não que ele falasse “eu sou assim, eu sou assado”, mas pelas frases, pela escolha das palavras, pelas opiniões e pela forma de escrever, a imagem real dele começava a substituir a imagem pública que Melly tinha. E, por incrível que pareça, a imagem “real”, melhor dizendo, a imagem que Melly interpretou a partir dos mais de cem e-mails trocados, era ainda melhor do que a imagem de figura pública. Ele era uma pessoa de inteligência notável, que às vezes se atrapalhava ao falar por pensar rápido demais e que insistia em uma modéstia que, aos olhos de Melly é incabível mas acabava sendo muito útil para que ele não caia em deslumbramento. Ele é o que Melly classifica como gênio, mas não se sente assim a respeito de si mesmo, talvez por isso seja uma pessoa tão interessante.

Tímido, educado e muito respeitoso, demorou muito até para fazer uma singela e inofensiva piada de argentinos com Melly. Um bom menino, daqueles criados por uma mãe presente e preocupada em dar educação para seu filho – essa foi a impressão forte que Melly teve sobre ele. Um menino simples, tranquilo, que argumenta muito bem e que tem muito carisma. Aquele carisma involuntário, que a própria pessoa não entende de onde vem. Desde o primeiro contato ele tratou Melly com todo o respeito do mundo, foi muito correto, ouviu com atenção tudo que Melly tinha a dizer e sempre concordou ou discordou com a maior civilidade. Ele é muito mais sério na “vida real”, mas não sério carrancudo, sério consciente. E, o mais importante: não mudou uma vírgula seu comportamento depois que viu quem Melly realmente era.

Com o passar do tempo, começaram os boatos de que ele poderia estar negociando com outra emissora. Melly se orgulhou da decisão acertada de nunca ter contado isso, que lhe havia sido dito em um dos primeiros e-mails, a absolutamente ninguém. Por onde que que houvesse vazado, era certo que não teria sido pelas mãos de Melly. Os boatos foram aumentando. Melly nunca perguntou a ele se eram verdadeiros, porque Melly não queria saber nenhuma informação privilegiada, para não ser alvo de desconfiança caso algo vazasse para a imprensa. Melly fingiu que nada estava acontecendo e os e-mails continuaram como se nada. Os boatos foram aumentando cada vez mais, até que um dia a imprensa confirmou: ele iria trocar de emissora.

Melly tentava se proibir de ter esperanças. Meses atrás, logo nos primeiros contatos, ele havia dito que não poderia contratar roteiristas porque a emissora onde ele estava sofria com contenção de despesas, mas que se um dia esse quadro mudasse, ele chamaria Melly. Poderia ser apenas uma desculpa… ou ele poderia ter esquecido do interesse de Melly. Melhor não alimentar esperanças diante de uma situação assim. Se Melly acreditasse em Deus, ela certamente teria rezado.

Querer trabalhar com ele não era uma pirraça de fã, uma paixão adolescente ou um deslumbramento idealizado. Melly sabia que ela se encaixava perfeitamente no perfil. Seu blog traçava um paralelo impressionante com o roteiro do programa, pareceria até que Melly o estava copiando se muitas de suas postagens não antecedessem à exibição do programa. Ela tinha total afinidade com o tipo de humor, com a ideologia, com praticamente tudo. Mas, é o que todo mundo diz quando quer um emprego. Dizer isso soaria mentiroso. Então Melly esperou quieta.

Final de ano bombando, dezembro e seu calor insuportável. Melly nunca vai esquecer daquele dia. Era dia 25 de dezembro, natal. As pessoas que cercavam Melly ligavam, desejavam feliz natal e que “o Papai Noel traga tudo que você desejar”. Melly sorria e pensava que o filho da puta do Papai Noel jamais traria o que ela queria: trabalhar com ele. Para alguns Melly até chegava a responder “O que eu quero Papi Noel não pode me dar”.

Foi quando, em pleno dia 25 de dezembro, Papai Noel decidiu dar um tapa na cara de Melly:

“Vai abrir vagas para roteirista.
Voce disse que queria trabalhar nisso.
Algum interesse?”

Melly releu o e-mail e esfregou os olhos tipo desenhos animados fazem quando não acreditam no que estão lendo. Melly, que durante muito tempo desconfiou que seus dutos lacrimais tivessem atrofiado por falta de uso, sentiu lágrimas escorrendo pelo seu rosto. Melly não é das mais sensíveis, mas nesse natal Melly chorou. Não pela paz mundial, não pelas criancinhas que não tinham o que comer, mas porque, aos 35 anos de idade, a porta para seu maior sonho profissional se abria. Quantas pessoas no mundo podiam dizer isso?

E se abria por mérito exclusivo de Melly. Ela não tinha um pai famoso que a indicou, não ofereceu um patrocinador famoso para ser enfiada ali em troca. Foi apenas por sua escrita, por aquilo que ela era, que Melly recebeu esse convite. Melly, que nunca escreveu nada para agradar ninguém, havia conseguido algo por aquilo que ela realmente era. Talvez o mundo não fosse tão injusto como Melly sempre havia pensado.

Depois de cinco anos escrevendo de graça, por amor, de coração, sem fazer gênero em uma linha, escrevendo exclusivamente o que pensava, por pior que fosse, uma recompensa, ou melhor A Recompensa caiu no colo de Melly. Ele lembrou. Ele lembrou dela, meses depois, ao trocar de emissora. Melly foi boa o bastante para que ele lembre dela. Melly se sentia como os meninos do “Caverna do Dragão”, vendo o portal de volta para casa aberto e só de pensar nessa comparação extremamente nerd, Melly teve ainda mais certeza de que seu lugar era ali, ao lado dele.

Melly passou o resto do seu dia chorando e comemorando por dentro, sem poder contar a novidade para ninguém. Quando se acalmou, começou a digitar a resposta para o e-mail dele…

CONTINUA –

Para xingar porque achou que a novela se resolveria no segundo capítulo, para fazer todo tipo de especulação bizarra ou ainda para ameaçar algum tipo de protesto caso o próximo capítulo não vá ao ar ainda esta semana: sally@desfavor.com


Comments (40)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Relatório de erros de ortografia

O texto a seguir será enviado para nossos editores: