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Desfavor da semana: Virada de lata.

| Desfavor | | 63 comentários em Desfavor da semana: Virada de lata.

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“Pelo menos doze pessoas ficaram feridas em um tiroteio em Copacabana, minutos antes da chegada do Ano Novo. Os disparos ocorreram próximo à esquina da Avenida Nossa Senhora de Copacabana com a Rua República do Peru, bem perto do palco principal montado na praia para o Réveillon.” FONTE

Sem contar todo o resto dos desfavores. E esse é o país que vai organizar os dois próximos maiores eventos esportivos do planeta. Desfavor da semana.

SALLY

Em um primeiro momento, eu não queria falar sobre essa notícia, pois achei que seria regional demais. Provavelmente o resto do país nem soube o que aconteceu direito. Mas daí pensei melhor e, justamente por isso, achei necessário tocar no assunto. O que aconteceu na virada do ano em Copacabana este ano foi um vexame. O réveillon que antecede uma sequência de grandes eventos sediados pela cidade deveria ter sido exemplar, uma prova de fogo para mostrar ao mundo como o Rio está preparado para receber bem. Só que não.

Para começo de conversa, a quantidade de voos cancelados foi alta, impedindo muita gente de sair e muita gente de chegar. Em uma época do ano onde a diária em um hotel pode passar de cinco mil reais, um ou dois dias a mais ou a menos representam um tremendo prejuízo. Como se não bastasse, o principal aeroporto da cidade (internacional!) ficou sem ar condicionado e abarrotado por filas, obrigando as pessoas a ficarem horas de pé com suas malas em um calor de mais de 40°. Ninguém comentou, a imprensa deu uma abafada, mas quem estava lá sabe que aconteceu. E quem lê o Desfavor também.

Falemos agora do show na praia de Copacabana, que é conhecido por sempre trazer ao menos um grande artista. Nomes mundialmente famosos passam por esse palco, mas este ano… Aquele Fulano líder da banda Black Eyed Peas, Will. I. Am, que já nem é tão famoso para começo de conversa, teria sido supostamente contratado. Caído, mas ao menos era algo. Porém, faltando 48h para a virada do ano, a assessoria de imprensa dele avisou que ele não vinha. Muita gente se indignou, o acusou de falta de profissionalismo. Mas basta um olhar mais atento para entender o que aconteceu.

A verdade é que nunca houve um contrato assinado com ele, foi feito um convite e ele pediu algumas modificações no palco, já que o show seria filmado, de modo a que ficasse tudo dentro do padrão de qualidade dele. NÃO OBTEVE RESPOSTA. Ele esperou até dois ou três dias antes da data e informou que como não responderam nada, ele não viria. Ou seja, não foi o Fulano que deixou o Rio na mão, foi o Rio que não teve a decência de responder e acabou perdendo a contratação do artista. Pede para mostrarem um contrato assinado… não tem. Divulgaram a atração sem ter nada assinado. Resultado final: o show da virada foi “estrelado” por um cosplay de The Voice, com Lulu Não Lanço Uma Música Faz Séculos Santos e Carlinhos Maldição Brown. Como vocês acham que pode ser o ano de uma cidade que rompeu o dia 31 “abençoada” pela Maldição de Brown? O mínimo que eu espero é uma Tsunami.

Vergonhoso que uma cidade que se propôs a fazer uma festa exemplar para mostrar ao resto do mundo como sabe receber bem tenha protagonizado tamanho vexame. Tudo foi fruto de incompetência, simplesmente não responderam a um questionamento do contratado. É assim que pretendem sediar Copa do Mundo e Olimpíadas? Tomara que sim, quanto mais vexame o Rio der, mais eu me divirto. Quem sabe assim esse povo bunda se manca do que está realmente acontecendo e começa a votar em pessoas menos incompetentes (porque menos corruptas eu já desisti de pleitear, que sejam ao menos competentes em alguns aspectos).

Mas ainda tem uma cerejinha nesse sundae. A segurança pública foi o calcanhar de Aquiles de 2013 no Rio de Janeiro, seja pela costumeira violência urbana, seja pelas manifestações. Logo, havia uma ordem de cima frisando o quanto nada poderia dar errado na noite do dia 31. Para isso selecionaram cuidadosamente quem atuaria na praia de Copacabana, cartão postal do réveillon carioca para o mundo, e colocaram só os mais capacitados. Quem foi considerado menos capacitado foi jogado para outros bairros de menos destaque. Adiantou? Não adiantou, mesmo os mais capacitados são uma bela bosta, do policial ao delegado, um puta vexame.

Para quem não sabe o que aconteceu, aqui vai uma narrativa mastigadinha, nua, crua e sangrando. Um popular alcoolizado teve uma crise de ciúmes e decidiu estrangular sua esposa. Estava lá o popular esganando sua mulher de boa, quando ela começou a gritar e pedir ajuda. Vários policiais se aproximaram e um deles tomou a frente para intervir. Quão difícil é conter um único homem bêbado? Eu mesma, com um metro e meio de altura e sem nenhum treinamento específico já o fiz diversas vezes. Mas para a polícia carioca tudo é muito difícil, pois quando se é burro e sem cérebro as coisas tendem a dar errado. O popular bêbado simplesmente conseguiu pegar a arma do coldre do policial e sair dando tiro. É, é isso mesmo que vocês leram. Mas calma que piora. No Rio de Janeiro, sempre piora.

Vamos colocar alguns pingos nos “is” para vocês terem uma noção do quão escroto foi o acontecimento. O saldo final foi de 12 pessoas feridas. Um bêbado cercado por oito policiais além de tomar suas armas ainda conseguiu ferir 12 pessoas. Vamos lá, vamos piorar ainda mais! O imbecilóide que teve a arma tomada não era um PM qualquer, ele era simplesmente o Comandante do 19ª Batalhão de Polícia Militar, cuja patente é de Coronel, Coronel Ronald Santana. Parabéns, viu Ronald? Pelo visto não é só o seu nome que é de palhaço! Cuidado para da próxima vez uma criança de cinco anos não roubar sua arma. Ah sim, falando em crianças, no meio da confusão havia duas crianças, se não me engano, filhos do enforcador e da enforcada.

Quer que piore ainda mais? No Rio isso sempre é uma opção! A própria infeliz que estava sendo enforcada, em vez de agradecer a intervenção (ainda que desastrosa) da polícia, deu um monte de depoimento dizendo que a polícia agiu mal, que foi muito truculenta. É isso mesmo que você está lendo, a própria enforcada disse que a polícia poderia ter agido de forma melhor, vejam vocês o grau de despreparo da polícia carioca: a vítima prefere o criminoso lhe fazendo mal do que uma intervenção desses anencéfalos!

Vamos deixar essa história ainda mais feia? No meio dos feridos tinha senhora de 60 anos, criança de sete, enfim, foi bem democrática a distribuição de balas. Aliás, quem quiser ver fotos dos baleados, pode dar uma olhada no site da Veja, que fez o desfavor de estampar a matéria com o autor da gracinha, o bêbado enforcador, baleado e caído no chão. Dá para ver o furo da bala no sujeito. Parabéns, Veja. Muito bom gosto. Cheia de moral para criticar as piadas de humoristas consideradas de mau gosto, viu? Rafinha Bastos e Danilo Gentili podem não ser uma ode à delicadeza, mas eles nunca exploraram gente baleada para ter audiência.

Como sempre, o caso vai ser apurado pela própria polícia e, COMO SEMPRE, os oito policiais envolvidos sentaram e combinara qual seria o depoimento que dariam, por sinal, bastante mentiroso. E como sempre, não vai dar em nada, porque eles contam uma versão que os inocenta. E só para constar, o atendimento na delegacia responsável por Copacabana foi tão ruim, mas tão ruim, que eu delegado acabou exonerado no dia seguinte. Ou seja, em grandes eventos não dá para contar com segurança pública e ainda tem uma grande chance de, além de não ajudar, os agentes do Poder Público ainda prejudicarem fazendo merda.

É ASSIM que a bosta do Rio de Janeiro quer sediar eventos importantes. E o Prefeito joga carta aberta dizendo “Babem de inveja”. Paes, nem a Síria tem inveja do Rio de Janeiro. A Globo não citou esse incidente nem no dia 31, nem no dia 1°, mas outros jornais sim, porque sempre tem um elemento com um celular filmando. No que começaram a pipocar vídeos do ocorrido, a notícia apareceu do nada. Não sei se vocês estão percebendo, mas a Globo vem fazendo isso: se há uma notícia que prejudica o Prefeito Eduardo Paes (que libera mais de 30 milhões de reais do orçamento da educação para a Fundação Roberto Marinho) a Globo omite e só divulga, brevemente, se a coisa acabar escancarada por outras emissoras.

E para fechar com chave de merda esse começo de ano no Rio de Janeiro, informo aos senhores que esse foi apenas UM incidente. Muitos outros ocorreram, mas infelizmente não foram tão bem documentados e não ganharam exposição na mídia. Uma rápida pesquisa pelos prontuários dos hospitais nas redondezas basta para ver que o saldo final foi digno de nota. Ponto fora da curva meu ovo inexistente, Paes. Esse réveillon no Rio por um desastre, um fracasso, uma prova de incompetência que estão tentando mascarar a qualquer custo.

É isso, por mais que seja um assunto regional, achei que vocês tinham que saber.

Para desistir de vir ao Rio de Janeiro para todo o sempre, para contar o vexame de réveillon da sua cidade ou ainda para perguntar porque o carioca continua votando no Paes: sally@desfavor.com

SOMIR

Vira e mexe tem assuntos aqui que estão muito mais na alçada da Sally do que na minha. Não deixamos de cobrir, mas o texto dela tem que vir primeiro e o meu acaba se enveredando por outras paragens para evitar repetição. Este é mais um desses casos. Sinto-me livre então para falar um pouco do brasileiro médio em eventos do tipo.

Pode-se argumentar que violência e baixaria passam longe de ser exclusividade de grande eventos públicos brasileiros, e realmente ele tem fundamento. A questão aqui é como a reação popular e a mentalidade do povo evita que façamos o mínimo de pelo menos aprender com nossos erros.

Um maluco com uma arma de fogo no meio de uma multidão não é algo que só aconteça aqui… Na verdade até gera uma imagem mental mais ianque do que tupiniquim. Ei, maluco atirando a esmo acontece até na Noruega! Acontece nas melhores e mais ricas famílias. O problema é o que se tira disso.

Ano que vem o esquema de segurança da virada de Copacabana periga de ser basicamente o mesmo. Não que policiamento evite que malucos sejam malucos, mas reagir de alguma forma pelo menos aumenta a sensação de segurança e ordem num lugar. E não duvidem do poder dessa sensação no bem estar da população: Comportamento humano básico, a tendência de alguém cagar num terreno baldio é bem maior do que num ocupado. Vemos ordem, temos tendência a querer mantê-la.

Quando a reação a um evento desses é um misto de dizer que “pelo menos ninguém morreu” e “não tinha como prever”, estamos mais preocupados em se eximir da culpa do que realmente resolver um problema. Mesmo que pela já citada insanidade momentânea não seja exatamente algo que se resolva. Você não pode evitar que o maluco seja maluco, mas você pode evitar que o inconsequente seja inconsequente.

Se tudo gira ao redor de ter alguém para culpar, impunidade vira motivação. Oras, quando você define o problema errado não adianta esperar uma resposta certa! Se organização e previsibilidade não estão no topo das prioridades de nossos governantes, não faz sentido esperar que o povo tome as rédeas da situação.

Ainda mais quando toma conta a sensação de que a festa não está sendo feita para o povo. Em outros países vemos pessoas invadindo a “festa” dos outros para aprontar. Por aqui passa muito mais por alienação do que qualquer outra coisa. De quem é esse réveillon carioca? Estão comemorando exatamente o quê? Não passa de um evento turístico onde a população local não faz nada além de figuração.

Exatamente o que vai ocorrer com Copa e Olimpíadas. Percebe-se claramente que é isso que vendem: Uma evento de grande porte no Brasil, co-estrelando essa gente bronzeada e exótica que os gringos tanto gostam. Não as pessoas, mas a imagem delas. Que se torre bilhões enfeitando o país, a figuração não precisa viver bem, só tem que sorrir a acenar do fundo da cena.

Pode-se tentar reprimir do jeito que quiser, pode até fazer manobra Eco-92 e mandar o exército invadir a cidade… O cerne da questão continua sem resolução: Quando é que o povo vai ser convidado para a própria festa? Enquanto isso não acontecer, os absurdos de organização precária e falta de segurança vão se repetir sem receberem o peso que merecem. Vão botar na conta “espírito brasileiro” e seguir em frente, nem que tenham que escoltar as seleções e delegações internacionais com tanques e fuzis.

Tudo menos chamar o povo para a festa. Sabem como é, as pessoas tendem a não dar muita atenção para um evento do qual não tomam parte. Menos fiscalização resulta em mais liberdade para corruptos e incompetentes. Não tem ponto sem nó nessa realidade escrota de exclusão social: Povo interessado corta as asinhas desses safados em pouco tempo.

O caso de Copacabana pode até ser explorado pela mídia sensacionalista, mas vai ser naquele conceito “útil” de definir mocinhos, bandidos e deixar o planejamento para eventos maiores e mais seguros de lado. Impunidade com certeza é um veneno para a sociedade brasileira, mas não deixemos de apontar a inatividade. Não é só saber quem cagou, é definir como não deixar isso acontecer de novo!

Mas infelizmente manter a atmosfera desses eventos hostil o suficiente é um mecanismo de alienação popular. Melhor uma festa com pessoas baleadas do que uma festa onde o povo se sente parte da sociedade. Espero muito que os protestos voltem com força total durante a Copa. Senão para resolver alguma coisa, que pelo menos para fazer quem criou esse clima sentir alguma das consequências dele.

Se o brasileiro se comportar, não vai estar ganhando nada além de mais papéis figurativos no futuro.

Para agradecer pelo texto inútil, para reclamar que festa com fogos e gente jogando lixo no mar é coisa de pobre sim, ou mesmo para dizer que se fosse um estrangeiro teria matado pelo menos um: somir@desfavor.com


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