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Desfavor Explica: O Centro da Terra (Parte 1).

| Somir | | 22 comentários em Desfavor Explica: O Centro da Terra (Parte 1).

Não que o assunto não seja interessante por si só, mas este Desfavor Explica também serve para desmistificar algumas das teorias cretinas sobre o fim do mundo que eu aposto que você já deve ter ouvido por aí. Hoje falamos sobre o centro da Terra e suas implicações muito mais do que superficiais… Ha. (Infame…)

Entre você e o centro do planeta, são uns seis mil quilômetros. Um pouco mais ou um pouco menos dependendo de onde você está, já que a Terra é um pouco achatada nos polos. Com o perdão do trocadilho… é chão! Como você deve ter aprendido em algum ponto da sua vida, vivemos numa fina camada sólida “boiando” sobre rochas e metais derretidos. Mas como você talvez não tenha aprendido ainda, sem essa composição e o que ela gera a cada segundo de nossas breves existências (dramático, não?), a Terra poderia ter acabado feito Marte.

Vamos por partes, fazendo o caminho rumo ao centro:

CROSTA

Me recuso a fazer analogias para fazer alguém lendo este texto entender o que é a Crosta. A camada da Terra onde pisamos e vivemos varia entre 5 e 70 quilômetros de espessura. É mais grossa nos continentes e mais fina no leito dos oceanos. Tão fina que acaba sofrendo a maior parte da influência da camada inferior. Por isso os terremotos e vulcões submarinos são tão poderosos.

Na verdade, a forma mais culta de se referir à camada superior do “chão” é usando o termo Litosfera. Litosfera é o conjunto da Crosta com a camada superior do Manto, e isso não é só frescura, na verdade essas duas camadas acabam sendo a mesma coisa: Quando está sólido, é Crosta, quando está “mole”, é Manto (superior). A Crosta fica caindo no Manto e sendo reformada por erupções vulcânicas o tempo todo. Principalmente nos oceanos.

Inclusive, há uma área logo acima do Nordeste brasileiro onde nem Crosta há. Nesse lugar, o oceano Atlântico repousa sobre Manto, como se fosse uma ferida aberta no solo. Vários cientistas se empolgaram com a chance de bisbilhotar o Manto, mas essa área fica embaixo de três quilômetros de água e já dá para imaginar que não é exatamente um lugar convidativo para fazer uma pesquisa.

E já que estamos no assunto de pesquisa, durante vinte anos o buraco mais fundo que a humanidade produziu, com mais de doze quilômetros de profundidade, foi justamente para descobrir o que diabos (ha) estava lá embaixo, por cientistas russos. Gerou mais lendas urbanas que efetivamente resultados científicos, para ser honesto. Atualmente, já existem mais dois novos buracos mais fundos (mas só por alguns metros) feitos por empresas caçando petróleo e gás.

O “chão” dos oceanos tem em média 100 milhões de anos de “estado sólido”, com no máximo 200 em algumas áreas. O “chão” dos continentes pode passar muito mais tempo sem ser renovado, algumas partes da Crosta, como a parte norte do Canadá, estão lá há mais de quatro bilhões de anos.

As famigeradas Placas Tectônicas não são apenas rocha boiando, são um ciclo antiquíssimo de renovação do solo da Terra. Tudo bem que você já deveria saber, mas a mídia solta tanta merda quando acontece terremoto e erupção que é capaz até da pessoa desaprender sobre o assunto.

Nas áreas onde as Placas Tectônicas se encontram, o Manto costuma sair para brincar. E muitas das formações naturais mais impressionantes do nosso planeta estão ao redor desses choques entre pedaços da Crosta. O Monte Everest, com seus mais de oito quilômetros de elevação, é resultado de duas placas em rota de colisão. E olha que ele nem é o ponto de maior elevação entre base da crosta e topo do planeta, existem montanhas que começam no fundo do oceano e chegam a dez quilômetros de altura.

Além, é claro, dos vulcões, que via de regra estão localizados nessas falhas. Como as placas fazem movimentos diferentes, algumas entram debaixo de outras, algumas batem de frente e outras apenas deslizam lado a lado, toda a dinâmica da relação entre a camada sólida e a “viscosa” inferior basicamente se resume a preencher espaços. Quando a Crosta sai de cima, o que está embaixo sobe e endurece (pornografia geológica).

Boa parte de nosso planeta fica derretendo e se solidificando, isso está acontecendo agora mesmo enquanto você lê o texto. E nessa relação, só os fortes sobrevivem. Mesmo dentro das placas tectônicas, existem pontos onde o Manto consegue subir muito próximo da superfície, e até mesmo pela concentração em pontos menores, com um potencial destrutivo absurdo.

Já é carne de vaca falar como a Indonésia está sempre no epicentro de desastres sísmicos, mas não faz mal mencionar que por lá está o maior vulcão do mundo: O Lago Toba (hahaha… eu sei, eu sei… infantil…). Não, não é uma montanha com fumaça saindo do topo, é um lago de mil quilômetros quadrados com uma fina camada de solo agindo como uma rolha para segurar o… centro da Terra. Estima-se que a última erupção “de verdade” do Lago Toba tenha colocado no da humanidade ancestral e dizimado a maioria dos humanos vivos há 80 mil anos atrás.

Mas não se assustem muito. Em termos de idade geológica, a erupção foi… “ontem”. É possível, mas não é muito provável que exploda de novo tão cedo. O segredo dos supervulcões é ir comendo pelas beiradas e enfraquecendo a camada superior. A erupção acontece porque o magma não tem por onde escapar e acaba formando uma mega bolha que faz o solo do local “desabar”.

Ah sim, vamos resolver isso logo: Magma é quando ainda não passou pela Crosta, Lava é quando consegue escapar. É a mesma coisa, mas a posição muda o nome.

Um outro supervulcão está nos EUA, no parque de Yellowstone. Mas os anti-americanos que não se animem: Medições recentes apontam que as únicas bolhas estourando por lá num futuro próximo serão as do mercado mesmo. De qualquer forma, podemos considerar que todos esses supervulcões existentes hoje já explodiram várias vezes no passado, alguns até durante a existência da humanidade, e mesmo tocando o terror em escala global, não conseguiram extinguir a vida no planeta.

Essa coisa de acabar com tudo numa explosão só é sensacionalismo de Discovery Channel e cia. Não estou dizendo que não seria uma desgraça sem precedentes na história registrada: O mundo ficaria no escuro por muito tempo, as áreas próximas virariam um quase literal inferno, mas… Se os Uga-Bugas seguraram o tranco…

Puxo para o lado dos vulcões porque tem gente dizendo que a atividade vulcânica está aumentando para tocar o terror sobre o fim do mundo. Em primeiro lugar, a nossa história registrada é um peido no ciclone da história deste planeta. E com equipamentos que efetivamente registram algo mais do que achismo, seriam poucas décadas de informações confiáveis para definir um padrão baseado em ciclos de transformação da litosfera que costumam se definir em centenas de milhões de anos.

É a mesma coisa da turma que diz que o mundo está ficando mais violento e maluco: Confundir aumento de registros com aumento de ocorrências é uma cagada das grandes. Hoje registra-se atividade sísmica com precisão de dezenas de casas decimais, antigamente só se registrava se o prédio desabou ou não. Sem contar que agora o mundo tem gente em tudo quanto é canto, com muita facilidade de comunicação. Um terremoto ou erupção efetivamente afeta mais gente atualmente. Tem gente para escutar a árvore caindo na floresta…

Mas chega de casca, está na hora do recheio!

MANTO

Abaixo da fina Litosfera, a maior parte de nosso planeta! O Manto tem quase três mil quilômetros de espessura e responde por quase 85% do volume da Terra. Os outros 15% estão no centro propriamente dito. Nós somos nada até mesmo em nosso planeta.

O Manto não é propriamente uma área homogênea. Tanto que a parte superior dele entra para o time da superfície na hora de catalogar o quê é o quê. Como a temperatura vai subindo com a proximidade do centro da Terra, os materiais e os estados deles variam de acordo com a distância.

Perto da superfície, a temperatura média do Manto é de agradáveis 500 a 900 graus. Mais perto do centro, já começa a ficar um pouco desconfortável com mais de 4000 graus. Até mesmo por essa temperatura e a pressão cada vez mais absurda do peso do mundo nas costas, o Manto vai ficando cada vez mais líquido nas proximidades do centro. Não chega a virar “água”, porque quanto mais pressão mais calor é necessário para derreter de vez, mas tem uma característica bem mais maleável que as rochas da superfície.

E até por essa maleabilidade, materiais menos densos acabam subindo, o que unido ao óbvio movimento contrário dos materiais mais densos, formam um movimento constante de vai-e-vem (pornografia geológica 2: o retorno) que influencia bastante o que acontece aqui na Crosta. O que esquenta quando chega perto do Núcleo acaba subindo, o que esfria perto da Crosta acaba caindo.

Não tem essa de materiais completamente isolados, a troca é constante entre o que está no Manto e o que está na superfície. Constante em escalas de tempo bem mais extensas que nossa história registrada, é claro.

Diferentemente de boa parte da Crosta, o Manto não pode ser estudado diretamente. Ou espera subir, ou simula as condições. Mas os cientistas tem outro jeito interessante de acumular informações sobre essas partes do planeta: Terremotos. Quando acontece um dos grandes, as ondas de impacto atravessam essa camada molenga, e calculando a forma como essas ondas andam, pode-se estimar composição, solidez e movimentos dessa área. Dê um peteleco num pedaço de borracha e um de metal para entender como os materiais reagem de forma diferente.

E só para passar um número bacana: A pressão em determinado ponto na parte de baixo do Manto é de um milhão e quatrocentas mil vezes a da atmosfera. Tem que ser coisa do naipe de “diamante de ferro” para aguentar isso sem virar líquido.

Diamante de ferro é um termo horrível cientificamente, mas ficou bacana. Sobre eles eu vou falar melhor na próxima parte do texto. O quão mais baixo podemos ir?

NO PRÓXIMO CAPÍTULO

Se te ensinaram que o núcleo do planeta é líquido, você está velho. E também: Como o centro da Terra nos protege do Sol.

Para dizer que eu fui muito superficial (piada repetida, que vergonha), para reclamar que essas informações nunca vão te ajudar a comer alguém, ou mesmo para me dizer que não precisa ter pressa de continuar: somir@desfavor.com


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