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Desfavor da semana: Rio por último?

| Desfavor | | 25 comentários em Desfavor da semana: Rio por último?

100 metros rasos com balas perdidas.

Nesta sexta-feira, dia 2 de Outubro, chegou ao fim a espera sobre o anúncio de quem hospedará as Olimpíadas de 2016: A cidade vencedora foi o Rio de Janeiro, Brasil. A candidatura tupiniquim foi ganhando cada vez mais força no momento exato e acabou derrubando o projeto de grandes cidades mundiais como Tóquio, Madri e Chicago. O Comitê Olímpico Internacional concedeu ao Brasil a oportunidade de sediar a primeira olimpíada em solo sul-americano.

Motivo de orgulho para alguns, revolta para outros e motivo de desfavores anunciados para quem está enxergando os dois lados dessa moeda. Desfavor: O nosso esporte é criticar.

Somir

Temos grande experiência em organizar um tipo de evento aqui no Brasil: Carnaval. E algo me diz que essa experiência vai acabar definindo boa parte da forma como essa futura Olimpíada vai se desenrolar. Vários dias de confete, distração e safadeza patrocinados por dinheiro sujo que vão deixar uma ressaca daquelas depois de tudo terminado.

O Carnaval a gente sabe fazer. Aposto que vai dar tudo muito certo durante os dias de competição. Alguns atrasos, algumas confusões, mas nada que vá ofuscar o brilho da festa. As Olimpíadas são um espetáculo muito bem orquestrado por quem detém os direitos de publicidade e mídia do negócio. Só se acontecer uma catástrofe o Brasil não vai ter capital para bancar tudo isso.

Mas, temos apenas dois problemas nesse caso: O antes e o depois.

Os cariocas estão orgulhosos, mas esse projeto é nacional. O Rio de Janeiro serve como cartão postal do país, que usou seu carisma “todo errado” e relevância como cidade mais conhecida do país no exterior para dar substância à candidatura. Não seria possível convencer o “mundo” a escolher o Brasil com outra cidade no fronte. Méritos para a “Cidade Maravilhosa”, claro, mas somos todos nós que estamos pagando.

A verba (antes da superfaturação obrigatória) pode chegar à quase 26 BILHÕES de reais. Divididos entre governo federal, estadual, municipal e iniciativa privada. Se você chegou ao Brasil hoje, vou te dizer como funcionam as coisas por aqui: Quando ler “federal, estadual, municipal e iniciativa privada”, entenda “federal”. As garantias para essa promessa COLOSSAL de investimentos não estão nos bolsos dos nossos queridos cariocas.

E se você está achando que eu estou preparando o terreno para falar que só uma cidade vai receber os benefícios por pura “enveja” paulista, pense de novo. O buraco é bem mais embaixo.

Embaixo de uma camada chamada pré-sal. As nossas potenciais reservas de petróleo deram um fôlego enorme para um comportamento de país não de segunda, mais de quinta linha: A maldição do ouro negro. Países com grandes reservatórios de petróleo tendem a ser paraísos de populismo, atraso e desigualdade social. Não precisamos nem ir para o Oriente Médio, basta olhar para a Venezuela e ver que esse tipo de garantia de dinheiro no bolso mais complica do que ajuda esses países.

E isso não ocorre à toa. Sem adentrar a parte essencialmente econômica sobre o problema de falta de diversificação de fonte de renda, podemos prestar atenção numa característica mais “humana” dos governantes de países assim: Ser líder de uma nação que tem uma arrecadação estatal monstruosa gera uma vontade quase irresistível de se manter no poder. Muito dinheiro para gastar, muita vontade de agradar o povo.

Um dos maiores problemas enfrentados por um governante (responsável ou não) é que o que faz bem para o povo não é o que o povo pede. Um presidente poderia gastar 26 bilhões de reais com escolas e hospitais e ainda sim não ser reeleito. Resultados lentos e importantes não ganham o coração de uma nação, PRINCIPALMENTE uma onde o nível de ensino e cultura médio da população é tão baixo como, digamos, o do Brasil.

Não precisa ser intelectual para saber que esse dinheiro aplicado em uma política esportiva de verdade faria muito mais pelo país do que as Olimpíadas. Esporte tem impacto em saúde, educação e economia… Olimpíada é carnaval. Esporte não elege o candidato do governo. Carnaval (circo) sim.

Nosso presidente está surfando numa onda de acertos dolorosos para a imagem pública de seus antecessores. (Collor incluído, com mais sorte que juízo.) E com uma perspectiva de dinheiro fluindo pelo fundo do oceano direto para os cofres da nação, está na hora de dar mais um passo: Ser o presidente que trouxe as Olimpíadas para o Brasil. Não digo que foi tudo um plano maligno arquitetado com muita antecedência, digo que o Brasil está mostrando como as coisas vão se desenrolar: Vamos gastar o prêmio da loteria e as economias de anos de trabalho em várias festas.

País de primeira linha O CARALHO. Mentalidade tacanha de republiqueta populista. Anos de cinto apertado para parar de desperdiçar dinheiro resultaram num momento onde finalmente temos caixa para COMEÇAR a resolver alguns problemas sérios. E ao invés disso, vamos organizar a festa de Carnaval mais cara de todos os tempos.

E como em todo Carnaval, após os destaques e os estrangeiros terminarem de gastar seu dinheiro com os ricos daqui, os que realmente se foderam para a festa dar certo vão varrer o confete e voltar para os morros.

Bilhões de reais em obras para continuar lotando só o Maracanã depois dos jogos. Quem vai aproveitar as arenas e centros de treinamento para outros esportes num país que só enxerga um? (curiosamente o que mais “dopa” a população) E só vai continuar enxergando um, porque se não investir pesado e planejar com antecedência, vamos dar mais um vexame internacional com nossos atletas e acabar atrás de países menores que o Estado do Rio. Grande incentivo ao esporte nacional, hein?

E não é crítica pela defesa do esporte, eu acho muito mais válido investir em educação, tecnologia e pesquisa de alto nível. Grandes merdas ser o país com os melhores saltadores triplos, mas se o governo vai pagar de quem se importa com isso, que pelo menos faça direito.

E nem tenho espaço para falar quão ridícula foi a argumentação PEDINTE da campanha brasileira. Eca! Ainda pensamos e agimos feito pobres coitados. País de primeira linha não “implora” por boa vontade dos estrangeiros.

Esse ufanismo cego não me engana. O Carnaval vai ser lindo, e só.

Para dizer que eu tenho Enveja do Rio de Janeiro, para dizer que são pessoas negativas como eu que atrasam o Brasil, ou mesmo para dizer que é filho de empreiteiro corrupto e está adorando tudo: somir@desfavor.com


Sally

Quero deixar uma coisa bem clara: eu GOSTEI do Rio ter sido a cidade escolhida para sediar as Olimpíadas. Acho que vai trazer melhoras permanentes para minha cidade, como despoluição de praias, melhora nos transportes públicos e outros que não vem ao caso. O Desfavor da Semana, em minha opinião tosca, não é a escolha do Rio e sim o carnaval hipócrita que cada interessado está fazendo em torno disso para capitalizar em proveito próprio.

Primeira coisa: ninguém aqui é bobo de achar que uma escolha dessas é feita exclusivamente com critérios técnicos. Não que o Rio não preencha os requisitos, preenche, mas não foi por isso que foi eleito. Rola dinheiro, jogo de poder, troca de favores e interesses muito mais obscuros do que podemos imaginar. O mérito persiste, afinal, fomos melhores que europeus, americanos e orientais em armar um esquema. Mas foi isso: política. Nada de ficar dizendo que o Rio ganhou porque é a cidade mais bela do mundo. O mérito foi dos articuladores, não da cidade nem dos cariocas.

Em segundo lugar, quem não for extremamente inocente sabe que essa decisão não foi tomada hoje. Cartas marcadas. Era certo que o Rio ia ganhar e quem é carioca e está atento sabe que diversas obras para a realização dos Jogos Olímpicos já forma licitadas e algumas já estão até em execução. Então, qualquer cara de surpresa do nosso Presidente ou dos presentes é coreografada. Novamente: o fato de se saber previamente não tira o mérito do Rio, é assim com todas as eleições. Mas porra, não vem me chamar de otária e fazer cara de “Oh! Vencemos?”.

Também tem muita gente achando que os problemas da cidade vão acabar. Não vão. O BOPE vai apaziguar os morros na base da carnificina, vão botar todo o efetivo de policiamento nas ruas e, durante 20 dias, não vai ter um único crime no Rio de Janeiro, como foi com a ECO-92. Depois que tudo acabar, volta a violência urbana de sempre. Ou até pior.

A forma como alguns representantes do Brasil se portaram nesse processo de eleição também foi medonha. Pelé, como sempre, levando para o pessoal e criando climinha de revanchismo, falando dele na terceira pessoa e alfinetando os outros para tentar fazer o Brasil parecer melhor. Não é por aí. Lula dizendo que Deus quis que o Brasil ganhe, quando ele sabe muito bem que de divina a vitória não teve nada, e ainda tentando capitalizar essa vitória para sua atuação.

Muitos cariocas também estão achando que são fodões e que a cidade é melhor do que Chicago, Tóquio e Madi. Menos, gente, menos. Daqui a pouco vai começar a pipocar comunidade no Orkut do tipo “São Paulo não tem Olimpíadas” ou “Argentina não tem Olimpíadas”. Essa idéia errada de que o Rio ganhou porque é “melhor” que outras cidades é equivocada e perigosa. Ganhou por um acordo. Não somos melhores que ninguém.

Além disso, o carioca parece esquecer de tantos problemas graves que tomam conta da cidade. Vão ficar nesse frenesi olímpico enquanto tem coisas absurdamente erradas acontecendo. Fica aquela idéia de “Tá tudo errado, mas foda-se, o que importa é que nós vamos sediar as Olimpíadas!”. É preciso lembrar que se alguém tomar uma bala perdida nos cornos não vai poder assistir as Olimpíadas.

Tem também o fator “roubalheira debaixo do nosso nariz”. Alguém sabe a quantidade de dinheiro que está sendo oficialmente liberada para obras e demais providências visando sediar as Olimpíadas? Existem sites que divulgam as contas do Governo (sem contar o que sai por fora, né?). É assustador. Os dados OFICIAIS são assustadores. Dava para fazer escola, hospital e casa para toda a população carioca. O pior é que dessas verbas, uma boa quantia vai ser desviada através dos clássicos esquemas de superfaturamento.

O carioca conhece o Estádio Olímpico João Havelange, mais conhecido como “Engenhão” (vulgo Canil), que foi construído por um valor astronômico. O valor inicial era de R$60 milhões. No final das contas, gastaram, oficialmente, R$380 milhões. Detalhe: por um estádio menor que o Maracanã, mal localizado e que já está caindo aos pedaços. Não é possível… colaram com cuspe essa merda! O Engenhão custou mais caro do que estádios maiores e muito mais modernos construídos em outras partes do mundo. Conclusão: superfaturaram a obra, construindo o estádio com material de quinta categoria (já começou a despencar no jogo inaugural) e quem paga a conta é o contribuinte. Aliás, quase tudo que foi feito para o Pan está precisando de reforma.

Não se iludam: quem se beneficia mais com estas Olimpíadas são os ricos. Os pobres, tal qual foi na China, serão usados como mão de obra barata para fazer obras e depois mandados de volta para suas casas na puta que pariu, sem direito a ver um único jogo ou apresentação, com preços estimados em R$1.000,00 o ingresso.

Mas mesmo assim, todo mundo acha lindo. Todo mundo se enche de orgulho do Rio de Janeiro. Tem que ter orgulho do Rio de Janeiro o ano todo, independente de ganhar eleição para sediar Olimpíada. Tem que ter orgulho pelos motivos certos, porque é uma cidade linda ou por outras razões, não por ganhar uma eleição onde o último critério é o mérito.

O brasileiro e o carioca tem tanto complexo de vira-lata que só ostentam orgulho e reconhecem o lado bom do país quando ele é endossado por alguma aprovação vinda de fora. Acho isso ridículo, patriotismo cafona. Vencer uma eleição cheia de tramóias, acordos e jogos de poder não é mérito para a cidade. Carioca não precisa disso. É uma cidade linda, viu? Apesar dos defeitos, que são graves, tem muitas coisas para se orgulhar.

Para rir da cara do Somir e dizer que Campinas não tem Olimpíada, para dizer que adorou a promoção da Azul de passagem aérea para o Rio por R$ 16 e vai vir me visitar e para concordar com tudo que eu disser daqui a 2016 na tentativa de ficar meu amigo para ter hospedagem de graça nos Jogos Olímpicos: sally@desfavor.com


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