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Desfavor explica: Papai Noel.

| Somir | | 27 comentários em Desfavor explica: Papai Noel.

ATENÇÃO: ESTA POSTAGEM PODE ACABAR COM SUAS FANTASIAS.

Eu sei que é estranho falar de Papai Noel em Maio, mas o desfavor não gosta de ser previsível. O bom velhinho é uma personagem pra lá de comum em nossa sociedade, em todos os níveis sociais e culturais. Quem nunca ouviu falar de Papai Noel?

Mas você entende MESMO quem é Papai Noel? Leia o texto a seguir e tire suas próprias conclusões.

UM POUCO DE HISTÓRIA.

A história de Papai Noel remete ao longínquo quarto século d.C., personificada pela figura de São Nicolau de Mira. Muito antes de alcançar o status de Santo, Nicolau (supostamente, já que faltam registros confiáveis daquela época) foi um homem de personalidade forte, que enfrentou o poder político vigente com sua fé cristã inabalável.

Nicolau teria nascido na Turquia e vivido sua vida debaixo da mão de ferro do Império Romano. Império que durante uma parte de sua vida esteve sob controle de Diocleciano. Diocleciano, por sua vez, não gostava nem um pouco da religião de Nicolau. Durante seu império, os cristãos foram perseguidos cruelmente, o que fez Nicolau ser preso por se recusar a negar sua crença em Jesus Cristo.

Com a ascensão de Constantino ao poder, Nicolau teve finalmente a chance de praticar sua fé em paz. Sua tenacidade e devoção o colocam como um dos líderes da Igreja Cristã da época. Posto que perderia em pouco tempo devido ao seu comportamento contestador e irrequieto.

Nada disso impede, contanto, que Nicolau continue suas obras em prol dos necessitados. Dentre várias outras caridades, uma se torna essencial na criação da imagem do Papai Noel: Nicolau aparentemente jogava sacolas com moedas de ouro pelas chaminés de pessoas em dificuldades. Tudo isso de forma anônima. (Não me perguntem como souberam que era ele…)

Nicolau tem como data provável de sua morte dia 6 de dezembro de 332. Mesmo após seu falecimento, relata-se vários outros momentos onde Nicolau ajudou os fracos e oprimidos. Sendo apontado como realizador de vários milagres, Nicolau vira São Nicolau de Mira e a quantidade de histórias e mitos sobre seu poder aumentam exponencialmente.

Resumo: Há muito tempo atrás, muito mesmo, um homem sobre o qual não se tem muitos registros históricos confiáveis enfrentou com coragem a sociedade por sua fé. Além disso, sua vontade de ajudar as pessoas que realmente precisavam acabava criando atritos até entre aqueles que dividam a mesma religião com ele. Após sua morte, tornou-se ainda mais poderoso e relevante na sociedade, tendo inúmeros milagres creditados a si.

Esse homem, Nicolau, foi a base para a criação de uma personagem que habita a imaginação de crianças e adultos pelo mundo todo…

A CRIAÇÃO DO PAPAI-NOEL.

Foram os europeus que fizeram a ligação entre a figura de São Nicolau e o Natal. São Nicolau se tornou muito famoso em virtude dos abundantes milagres relacionados à sua intervenção. Inúmeras igrejas construídas em seu nome, vários devotos fiéis e muita exposição. Porém, veio a Reforma Protestante e a Europa se tornou um local inóspito para a proliferação desenfreada do seu culto.

A exceção foi a Holanda, onde São Nicolau continuou com relativa fama sob a alcunha de Sinterklaas. A história de Sinterklaas foi então misturada com uma lenda nórdica sobre um mago misterioso que andava num trenó puxado por renas que presenteava crianças boas e punia as más. São Nicolau, que nunca deve ter visto uma rena em sua vida, agora pilotava trenós e julgava crianças por base no seu comportamento.

Claro que a história de São Nicolau não estava restrita só à Holanda, outros países ajudaram a divulgar e moldar o mito durantes os séculos (foram os alemães que o ligaram com o Natal), mas os holandeses são importantíssimos por um motivo: Foram imigrantes holandeses que trouxeram a lenda de São Nicolau para os Estados Unidos da América.

Lá, na terra do ainda não criado Tio Sam, a história foi tomando corpo, e principalmente, rosto. Alguns detalhes da história só foram adicionados por lá, mais precisamente num poema “Uma visita de São Nicolau”, 1822, pelo professor de literatura grega Clement Clark Moore (defensor ferrenho da escravidão, primor de pessoa). O poema era destinado a seus filhos, e para deixar a lenda mais agradável, Clement mexeu em alguns detalhes. As renas voavam, a idéia de deixar presentes na chaminé foi retomada, crianças ruins apenas deixavam de ganhar presentes ao invés de serem punidas, e ao invés de um Santo do século IV (ou um mago nórdico), um bom velhinho bonachão.

Com essa boa dose de imaginação, a lenda estava quase perfeita para virar o fenômeno que é hoje em dia. Faltava uma imagem para Santa Claus. (Santaklaas)

Imagem criada pelo cartunista Thomas Nast, para a edição de Natal de uma revista americana. A roupa vermelha com detalhes em branco e o cinto preto cobrindo a figura rechonchuda de um velhinho de cabelos brancos e bochechas rosadas caiu como uma luva no imaginário popular. Era o que as pessoas queriam ver ao se falar de Santa Claus. (Conhecido na Europa como Pai Natal.)

Resumo: Os europeus adicionaram incontáveis detalhes à lenda do São Nicolau, que se tornava cada vez mais palatável para o grande público. Conceitos como recompensar bons atos e punir os maus na época do Natal foram dando mais personalidade para o Santo milagreiro que gostava de ajudar os mais pobres a qualquer custo. Quando a lenda de São Nicolau chega a um país onde a maior indústria cultural do mundo tomaria lugar nas décadas posteriores, alguns ajustes finais são feitos. (Inclusive por pessoas desprezíveis.) Ajustes que transformam o São Nicolau em Santa Claus (ou Pai Natal, ou Papai Noel) de vez.

E uma personagem excelente do ponto de vista comercial como essa não passaria despercebida, principalmente nos Estados Unidos…

SEMPRE, PAPAI-NOEL!

Uma lenda urbana famosa é a de que a Coca-Cola teria criado o Papai Noel moderno. Não chega a ser o caso, como explicado nos parágrafos anteriores, mas não se pode negar o papel decisivo da gigante da publicidade do século passado na divulgação da marca Papai Noel.

Até 1931, não havia um padrão muito definido sobre a imagem de Papai Noel. As informações não se difundiam com velocidade naquela época. A imagem criada por Nast tinha muito potencial, mas pouca exposição. Papai Noel normalmente era verde ou marrom.

Mas uma grande campanha publicitária usando Papai Noel com as roupas idealizadas por Nast por parte da Coca-Cola consolidou a imagem do bom velhinho definitivamente. Percebendo o “hit” que tinha em mãos, a empresa manteve a personagem em todas as campanhas de Natal a partir dali. Depois, com o crescimento incrível da marca Coca-Cola pelo mundo (principalmente depois da II Guerra Mundial), nenhum país ficou livre de ver o Papai Noel alvi-rubro moderno.

São Nicolau era passado. Papai Noel era indiscutivelmente mais eficiente, quaisquer sejam as motivações de quem o divulgava. Um símbolo unificado de Natal, que estimulava o consumo e ainda criava mais visibilidade para a religião cristã? Um presentão!

Com o tempo, mais alguns ajustes finais na lenda: Papai Noel mora no Pólo Norte e tem uma enorme fábrica de brinquedos tocada por duendes incansáveis. Talvez para calar algumas crianças espertinhas que ficavam questionando porque nunca viram o bom velhinho em pessoa.

Não que isso tenha sido realmente um problema, com o incrível apelo comercial, os papais-noel se espalharam por todos os lugares, mais notavelmente em shopping centers e filmes de baixo-orçamento. Todos podiam ver Papai Noel. Papai Noel estava em todos os lugares, mas só te presentearia caso você fosse uma boa criança.

Resumo: Todos os elementos da lenda estavam lá, prontos para serem usados pelo primeiro com a visão comercial necessária para explorar a marca. Um homem que quis ajudar aqueles que mais precisavam durante a vida tornou-se uma personagem de feitos e poderes incríveis depois de sua morte, um ser que recompensa boas ações com presentes.

O que nos leva à parte conspiratória desse Desfavor Explica…

VOCÊ FOI UM BOM MENINO?

Em tese a idéia do Papai Noel é linda. Seja uma boa criança e no “aniversário” de Jesus Cristo, quem ganha o presente é você! (Parece propaganda.)

Mas Papai Noel parece recompensar mais crianças que já gozam de uma boa situação financeira. O filho de uma família miserável tende a não ser recompensado pelo bom velhinho, por mais boas ações que faça. Teria Papai Noel preconceito contra os pobres?

São Nicolau não teria. Alguma coisa saiu errada no caminho… Talvez o excesso de adendos na lenda do Papai Noel tenha causado esse problema. São Nicolau nunca disse que presentearia crianças caso elas se comportassem bem. Foi um suposto mago nórdico, fruto de outra lenda.

Além disso, ainda bem que as renas voadoras foram adicionadas. Seria complicadíssimo percorrer uma estrada asfaltada a bordo de um trenó. Mas mesmo assim, crianças que vivem em lugares muito afastados e carentes tendem a não receber presentes no Natal. Seria Papai Noel um preguiçoso?

As crianças da China, por exemplo, só começaram a ganhar presentes de Natal recentemente. Difícil acreditar que com aquele monte de gente, UMA criança pelo menos não tenha alcançado o grau de bom comportamento necessário para ganhar uma bola, que seja, nos últimos séculos. Só posso creditar esse problema ao fato dessas crianças nem saberem quem era o Papai Noel, o que o deixaria com medo de ser recebido a tiros caso entrasse no espaço aéreo nacional…

E se não bastasse, como Papai Noel consegue manter relatórios sobre as ações de todas as crianças do mundo? E ele julga bons e maus comportamentos com que base? Algo aceito no Oriente Médio pode parecer ofensivo na América do Norte. E quando a boa ação de uma criança força outra criança a cometer uma má ação? Isso é levado em consideração? Muitas dúvidas pairam sobre o senso de justiça do bom velhinho.

Seria Papai Noel tendencioso às crianças ricas e brancas que vivem em países capitalistas? Mesmo tendo sido criado com base numa personalidade que enxergava que os necessitados mereciam prioridade, ele ainda parece que só beneficia mesmo aqueles que nem precisariam de sua ajuda em primeiro lugar.

Curioso.

Resumo: É como se Papai Noel só desse bons presentes para crianças de famílias que podem comprar bons presentes. E ainda por cima ele só parece existir para aqueles que acreditam nele.

Opa! Eu acho que já sei o que isso quer dizer…

PAPAI NOEL NÃO EXISTE!

Estava na minha cara o tempo todo e eu não percebi. Apesar de ter uma rica história e uma personalidade famosa por trás, o Papai Noel atual não passa de uma amálgama de crenças, desejos e imaginação daqueles que “aumentaram um ponto”. São Nicolau deve ter sido uma ótima pessoa, devotado aos pobres e corajoso em sua fé, mas parecia cada vez melhor a medida que se distorcia sua história com elementos mágicos e teatrais.

O que é perfeitamente compreensível. Uma pessoa tem uma quantidade limitada de tempo para deixar sua marca no mundo. Um mito é atemporal. Um mito cresce e passa sua mensagem para muitas outras pessoas. Um mito pode ser explorado por aqueles que sabem se relacionar diretamente com a imagem passada por ele.

O mito do Papai Noel prega a recompensa pelas boas ações. A idéia aconchegante de que tem alguém observando o que você faz e reconhecendo o que você faz de certo na vida. Nada é à toa assim. O sofrimento, a abnegação, a coragem de manter suas virtudes sob pressão… Essa coisa de a boa ação ser a recompensa em si é linda em teoria, mas na prática é muito difícil de visualizar. Um presente resolve esse problema.

Oras, vale muito a pena passar por cima de algumas inconsistências para manter Papai Noel vivo no coração das pessoas. Principalmente no das crianças. É uma mentirinha que não faz mal a ninguém. Quer dizer, desconsiderando aquela criança pobre que não ganhou o presente que queria. Para ela nós dizemos que Papai Noel não pôde dar o presente neste Natal, mas que no próximo tudo vai dar certo.

Desde que ela continue sendo boazinha e não cobice o brinquedo do vizinho mais abastado.

Resumo: Papai Noel é coisa para crianças, que precisam de alguma “ajudinha” para continuar no bom caminho sempre que possível, para não sentirem falta de propósito em suas ações. Talvez seja nossa natureza. Mas uma coisa é certa…

Nenhum adulto em suas faculdades mentais razoáveis acredita mais em Papai Noel.

Certo?

Para me dizer que percebeu logo no título, para dizer que eu devo ter traumas por não ganhar o videogame que queria no Natal ou mesmo para falar que eu deveria esperar Dezembro para postar isso: somir@desfavor.com

FALTAM 4 POSTAGENS PARA A 200ª

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