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Ele disse, ela disse: Um amor de escolha.

| Desfavor | | 183 comentários em Ele disse, ela disse: Um amor de escolha.

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É razoável se imaginar nos dias de hoje que uma pessoa realizada no campo afetivo e profissional seja uma pessoa feliz. Mas nem sempre as duas coisas andam juntas, e é aqui que se faz a desavença da vez: Imagine que você receba uma grande oportunidade profissional, mas que ela inviabilize seu relacionamento atual. Sally e Somir discordam sobre qual deve ser a prioridade. Os impopulares também escolhem seu lado, seja por amor ou por obrigação.

Tema de hoje: TENDO QUE escolher, relacionamento ou carreira?

SOMIR

A oportunidade profissional. Embora eu saiba que vá tomar pedradas de qualquer jeito hoje, não custa dizer: A premissa dessa coluna é que PRECISA escolher entre uma coisa e outra. Não é o caso de sempre preferir o trabalho/dinheiro/poder, é uma situação bem específica. Ou fica com uma coisa, ou com a outra.

Mas isso não deve tirar a minha presunção de morto por dentro. Essa coisa de achar o “amor da vida” é uma estratégia de controle das mais antigas que se tem conhecimento, e dificilmente encontramos pessoas livres dessa mentalidade de supervalorização do instinto de procriação. Amor como coisa mágica vende mais produtos e mantém as pessoas mais calmas. Entendo a função.

Não me levem a mal, procriar é bacana (principalmente a modalidade recreativa e infrutífera), encontrar uma parceira de longa data tem seus benefícios, não estou necessariamente dizendo que um relacionamento estável é uma coisa ruim, mas também não é nenhum absurdo do ponto de vista lógico não colocá-lo num pedestal sobre todas suas outras prioridades.

Não existe só UMA pessoa certa para cada um de nós, existem várias. E esse “certa” também varia bastante de acordo com o momento que você vive. Algumas pessoas já foram certas, mas deixaram de ser. Algumas tinham quase tudo, mas não estavam ELAS no momento certo. Por mais que seja bonitinho dizer que depois de um relacionamento de sucesso “eu” se torna “nós”, a verdade é que de qualquer forma ainda depende demais de como você encara o relacionamento.

Apesar de tanta gente se matar depois de término de relacionamento, na média as pessoas entendem que tudo tem seu momento. Que amores vem e vão e não tem dessa de “nunca mais ser feliz”. Tem muito falso drama injetado em todas as discussões entre vida amorosa e profissional. E tem muita gente nessa vida que está muito feliz escolhendo se concentrar em uma ou outra. Parceiros sexuais fixos não tem o monopólio da sensação de realização pessoal, oras!

Agora, eu até entendo que pareça extremamente frio e calculista preferir uma grande oportunidade de trabalho/enriquecimento sobre um relacionamento já estável (onde se presume que a pessoa está feliz). A continuação deste parágrafo poderia ser uma explicação porque na verdade não é algo tão frio e calculista, mas não vai ser. Francamente? As melhores decisões são as extremamente racionais, e é ridículo ter que praticamente se desculpar ao mencionar a preferência pela lógica quando se menciona o assunto em público.

Quer achar que eu sou morto por dentro? Tá bom. Mas acompanhe o meu raciocínio para preferir a oportunidade de trabalho, nem que seja para ter bases para dar chilique depois… Gente tem em tudo quanto é lugar desse mundo, gente até demais. Essa informação é importante por dois motivos: Porque aumenta suas chances de encontrar parceiros sexuais e porque muita gente também significa muita concorrência por recursos.

Quantas pessoas tem relacionamentos estáveis? Quantas pessoas são ricas? Sério que sequer passa pela sua cabeça que é mais difícil encontrar a “pessoa certa” do que subir na pirâmide social? O jogo do enriquecimento é um dos mais viciados que jogaremos em nossas vidas, favorece demais os ganhadores prévios… Oportunidades de fazer essa transição para um dos “andares de cima” são raras, frequentemente dependendo tanto de trabalho e talento como de sorte.

Você não sai para tomar um sorvete e volta com o telefone de uma grande oportunidade profissional, volta? Se é para dar sorte, provavelmente vai ser encontrando uma pessoa bacana com potencial para um relacionamento. Tem muita gente por aí, para todos os gostos. Vários grandes amores começaram com encontros casuais.

Mas é raro achar uma dessas oportunidades de trabalho “do nada”. Elas costumam depender de um maçante processo de colocação profissional para só aí ter qualquer chance da Dona Sorte sorrir para você. E quando isso acontece, não dá para ficar esperando pela próxima: Nada garante que vai ter uma próxima. Essa coisa de que é só “trabalhar duro que vai dar tudo certo” é ferramenta de controle social para você continuar no seu emprego custe o que custar. Não duvide por um momento que milhões de pessoas muito mais pobres que você estão trabalhando MUITO mais duro nesse exato momento. O jogo, como já dito, é bem viciado.

Evidente que existe muito valor num relacionamento amoroso duradouro e bem-sucedido, beira à insanidade largar algo assim sem um motivo muito forte. Só que esses motivos existem. E quando isso acontece, nada melhor do que um pouco de cabeça fria para não fazer a aposta menos vantajosa. Imagine que você escolha o relacionamento: As renúncias feitas em nome do amor pesam sim. Elas ficam guardadas nas memórias das pessoas, e tem o péssimo hábito de ressurgir em momentos tensos do relacionamento.

Existem muitas pessoas certas, e mesmo que você encontre uma, eventualmente essa pessoa vai parecer menos certa… todo mundo briga, todo mundo fica meio de saco cheio de vez em quando. E ter uma renúncia dessas na bagagem pesa… a pessoa vai acabar parecendo ainda menos certa quando o relacionamento passar por uma turbulência. Você corre o risco de perder uma oportunidade profissional única e ainda sim botar uma rachadura no seu relacionamento que nunca mais vai sair de lá… e que ainda por cima tende a aumentar com o passar do tempo.

Pense. Essa coisa de “decidir com o coração” é uma furada, é apostar seu futuro sem considerar as probabilidades.

E só para lembrar: Ter mais dinheiro “sobe o nível” do tipo de pessoa com a qual você PODE se relacionar afetivamente/sexualmente. Poder escolher mais sempre ajuda. Não gostou de ler isso? Troca de mundo, porque você não vai gostar muito desse…

Para usar argumentos emocionais mesmo sabendo que eu vou rir de você, para dizer que existem pessoas “mais” certas só para se convencer que não está desperdiçando sua vida, ou mesmo para dizer que rico não é feliz (HAHAHAHAHAHAHA!): somir@desfavor.com

SALLY

Estamos falando da seguinte situação: as coisas se combinam na sua vida de uma forma onde você se vê obrigado a escolher entre uma oportunidade profissional daquelas absurdamente irresistíveis e o seu relacionamento afetivo. Não qualquer relacionamento afetivo, um relacionamento sério, sólido, duradouro e bem sucedido que te faz pensar que aquela é a pessoa que você quer ter ao seu lado, o que os românticos chamariam de “o amor da sua vida”. Supondo que a proposta de emprego e o relacionamento sejam incompatíveis por razões justas, ou seja, não é mera pirraça do seu parceiro, é incompatibilidade mesmo, qual dos dois você escolhe?

Eu, como qualquer pessoa que não seja morta por dentro, escolho meu relacionamento. Porque emprego, trabalho ou oportunidade profissional aparece com muito mais facilidade do que um parceiro que preste. Dinheiro a gente corre atrás, só depende da gente. Já um relacionamento bem sucedido é uma rara confluência de fatores: achar uma pessoa da qual você goste que também goste de você para a qual seus defeitos sejam toleráveis e os dele te sejam toleráveis também, com valores mais ou menos parecidos, respeito, cumplicidade, companheirismo etc, etc. Isso é raro. Ainda mais raro do que ganhar bem.

Talvez algumas pessoas digam “mulher tem uma em cada esquina” ou “homem é tudo igual, tanto faz”. Faria sentido se estivéssemos falando de um homem qualquer ou de uma mulher qualquer, mas não é o caso. Estamos falando de uma pessoa com a qual você conseguiu construir um relacionamento forte, no qual investiu. Uma pessoa que você demorou para encontrar (geralmente as pessoas comem muita merda antes de se assentar com um parceiro, quem encontra de primeira é um privilegiado), demorou para construir um relacionamento. É basicamente amor x trabalho.

Eu sei, seu sei. Não existe “o amor da sua vida”, existem muitas pessoas que podem ser compatíveis com você e render uma bela história de amor. Mas porra… não é fácil de achar não! Creio que a resposta para essa pergunta deva ser norteada por esse raciocínio: o que é mais fácil de encontrar, um bom trabalho ou um bom parceiro? Para mim seria um bom parceiro, talvez porque eu seja muito mais exigente com quem vai morar comigo, dormir ao meu lado, supostamente envelhecer comigo do que com um lugar onde vou, faço meu trabalho e vou embora.

Daí sempre tem os desfavorecidos cerebrais que partem de premissas erradas e chegam a conclusões falsas: “Mas Sally, de que adianta estar com o amor da sua vida se você está sem dinheiro para viver?”. Eu disse que a opção era essa? Eu disse que a pessoa tinha que passar fome? Recusar uma proposta indecentemente tentadora de trabalho não significa ficar desempregado e nunca mais trabalhar, significa abrir mão de ganhar muito dinheiro trabalhando naquilo que gosta naquela oportunidade específica. Nada impede que outras oportunidades boas (mesmo que não tão boas) se abram.

Joguem pedras: todos o dinheiro do mundo, toda a realização profissional do mundo, não tapam o buraco de uma vida afetiva insatisfatória. Prefiro ter um pouco menos de dinheiro mas ter uma pessoa com a qual eu possa construir um futuro e compartilhar alegrias e tristezas. Não é uma postura romântica, é uma postura racional de quem já passou por ambas as situações. Dinheiro é mais fácil de conseguir do que uma pessoa compatível, que preste, que goste de você e que seja emocionalmente madura para ter um relacionamento saudável. Mas, se você quiser, pode pensar como o Alicate e presumir que dinheiro compra o amor das pessoas e que sendo rico(a) isso vai te ajudar a encontrar alguém legal. Não vai, inclusive talvez até te atrapalhe.

Percebam que ao abrir mão daquela oportunidade profissional você não fica necessariamente desempregado, mas ao abrir mão do seu relacionamento você fica necessariamente solteiro. Percebam que dinheiro pode ser conseguido de diversas formas, ao longo da vida toda e não importa a forma, o dinheiro é sempre o mesmo, mas aquela pessoa com a qual você “deu certo” não pode ser conseguida novamente. Parece clichê, mas é verdadeiro: é muito mais fácil conseguir dinheiro do que amor de verdade acompanhado de compatibilidade, logo, o bom senso manda que você se apegue a aquilo que não sabe se vai conseguir novamente do que a aquilo que tem diversas formas de conseguir ao longo da vida.

Talvez quem não está em um relacionamento não consiga fazer essa comparação, afinal, quando não temos nada a perder, a proposta de emprego parece irrecusável. Mas aqueles que já tiveram um relacionamento bacana, duradouro, com respeito e cumplicidade sabem que dói muito mais ficar sem ele depois que você já o teve. Fica a pergunta: o que te realiza mais, trabalho ou amor? O que te é mais fácil de encontrar, trabalho ou amor? O que você prefere sacrificar, trabalho ou amor?

Por mais que digam que dinheiro está difícil de ganhar (concordo plenamente), uma pessoa que preste consegue ser ainda mais difícil. Principalmente se você vive no Brasil, afinal, o brasileiro médio é essa merda que vota no Tiririca, lê “Cinquenta Tons de Cinza” e pendura uma escultura de um homem torturado na parede. Em um país onde a maior parte da população é medíocre e feia, tem que agarrar com unhas e dentes quando aparece uma pessoa que atende às suas exigências mínimas. Ganhar dinheiro depende basicamente de você, conhecer uma pessoa legal, solteira, mentalmente saudável e que também se interesse por você depende muito mais do acaso ou da sorte.

Se surgiu uma proposta profissional maravilhosa, é provável que outras venham, mesmo que não tão grandiosas. Ninguém faz uma proposta desse porte para uma pessoa que é uma bosta de profissional. Já em matéria de relacionamentos, não se pode partir desta premissa: o fato de uma pessoa se interessar por você não quer dizer que todas se interessarão e serão compatíveis e te despertarão interesse. Para um trabalho dar certo basta você fazer suas tarefas bem feitas, para um relacionamento dar certo precisa de uma infinidade de fatores, muitos deles fora do seu controle. Vai contar com a sorte?

Para concordar com o Alicate e dizer que dinheiro compra o amor das pessoas, para dizer que você até prefere não estar em um relacionamento ou ainda para tentar me ofender me chamando de romântica: sally@desfavor.com


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