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Ele disse, ela disse: Meu bem, meus bens.

Com o número de divórcios crescendo a cada dia que passa, uma “estratégia de saída” passa a ser mais e mais valiosa para qualquer casal planejando juntar seus trapos. Sally e Somir demonstram sua sintonia matrimonial conseguindo discordar até mesmo sobre o regime de divisão de bens. Ele defende a separação total, ela a parcial.

Tem de hoje: Qual é o regime de separação de bens mais justo?

SOMIR

Total. Tenho horror a esse lance “Brangelina” de tratar casal como uma amálgama de duas pessoas. Claro que um casamento presume união, mas não se pode esquecer que são duas pessoas diferentes. São duas vidas que se encontraram em certo ponto, e nada garante que não vão se separar num ponto futuro.

No regime de separação total de bens, não existe bem do casal. Ou é de um, ou é de outro, sem dividir só porque a pessoa estava casada quando comprou. Se não tascou o nome na certidão ou recibo, azar. É um modelo que pune quem entrega todo o poder para a outra parte ao mesmo tempo que recompensa quem entende que a vida não para e nada é para sempre.

Eu sei, parece e é meio “lei da selva”, mas é o sistema mais justo porque não limpa a bunda de quem não aprendeu a se manter limpo. Antes mesmo de falar de exemplos de como comunhão comunista… opa, parcial… de bens pode gerar injustiças das grandes, já dá para trabalhar só com o lado ideológico de fazer as pessoas prestarem atenção no patrimônio que estão adquirindo e aprenderem a proteger seus interesses.

Casamentos, casamentos, negócios à parte. Um casal pode viver um relacionamento muito saudável sem essas chatices de contas conjuntas e “tudo o que é seu é meu”. Casamento só é negócio MESMO se você precisa de um apoio externo para fazer sua própria vida, à lá “sai da casa do papai para a casa do marido”. Gente capaz que escolhe não casar acaba chegando num patamar de vida maior que os casados, até porque a chance de filhos diminui. O casamento tem seus benefícios financeiros, mas não é garantia de melhora de vida por si só. SPOILER: Ela gasta muito mais que você para viver num padrão de vida aparentemente idêntico.

Se quando chega a hora do divórcio o casal demonstra que tomou conta das finanças e garantiu o patrimônio de cada um, cada um pega o seu boné e problema resolvido. É mais justo confirmar no divórcio o modo como o casal geriu seu patrimônio.

Comunhão parcial pega a situação que um casal desenvolveu por anos e reduz tudo a um “metade pra cá, metade pra lá”. Meritocracia zero! Se estivéssemos falando de algumas décadas atrás, seria mais razoável considerar que uma esposa, mesmo querendo participar da posse do patrimônio, havia sido impedida pelo marido e/ou sociedade. Mas o tempo passa… Se nos dias atuais levar uma volta dessas e acabar sem nada no seu nome depois de anos de casamento, é porque não se importou ou efetivamente não contribuiu tanto assim.

É bonitinho falar que a abnegação doméstica de uma Amélia da vida contribui para o sucesso do marido, mas porra, sejamos realistas: Quanto recebe uma empregada? Domésticas são contratadas para gerenciar grandes empresas? Não é fazer pouco do trabalho da pessoa, é perceber que vivemos numa sociedade onde a remuneração financeira do trabalho doméstico não é nem um pouco impressionante.

Uma pessoa que abdica de trabalhar por conta própria (nem sempre é devoção ao companheiro, às vezes é acomodação ou “diproma” mesmo…) para ser a “grande mulher por trás de um homem” e se resume a funcionar como uma empregada que faz sexo com o patrão poderia ser substituída por um modelo mais novo sem impactar na capacidade de acúmulo de riquezas do marido.

Atribuir ao relacionamento o patrimônio alcançado é superestimar o impacto financeiro de uma função que efetivamente não gera essa riqueza. Mas não fiquemos neste exemplo de mil novecentos e guaraná de rolha, vamos considerar um casal moderno, onde ambos trabalham.

Alguns trabalhos rendem mais, outros são mais requisitados. Se o marido era CEO de uma grande empresa e a esposa vendia cosméticos no condomínio uma vez por semana, não é razoável dizer que a mansão do casal não existiria se fosse só o trabalho dela? Dividir meio a meio seria beneficiar quem menos trabalhou e menos se preparou para ter esse patrimônio. Isso é justo como? Em troca do padrão de vida, o relacionamento. Mas se o relacionamento acaba…

A vida não é tão simples como “casamento é meio a meio”. Tem gente que investe mais emocionalmente, tem gente que investe mais tempo, tem gente que investe mais dinheiro. E tem quem torre dinheiro com bobagens, investimentos errados e todo o tipo de coisa que não deixa patrimônio (ou que perde muito valor com o tempo). A composição dos bens conjuntos pode ser basicamente o que um dos dois conseguiu salvar das garras do outro. É justo dividir ainda mais isso?

E não vamos nos esquecer de gente que simplesmente resolve se separar para pegar metade do dinheiro do cônjuge e torrar com amantes interesseiros. Imagina alguém levar chifre, perder a pessoa que julgava ser seu par… e ainda por cima ver seu trabalho pilhado no processo?

E como definir se o bem comprado durante o casamento foi realmente um esforço coletivo? Uma composição REAL de 100% de dinheiro de um, que já estava guardado, vira 50% só por causa do casamento. E quem se prepara a vida toda para uma oportunidade e calha de alcançá-la depois de casado? Como garantir que o matrimônio influenciou?

A questão aqui é que comunhão parcial ignora as inúmeras possibilidade da composição do patrimônio a ser dividido. E pode premiar quem nunca sequer se interessou por contribuir nesse sentido. Apoio emocional e dedicação pessoal contam? Claro. Mas isso não é nenhuma garantia de fazer dinheiro. Muita gente feliz e bem casada passa apertada no final do mês…

As pessoas tem que ser incentivadas a prestar atenção na própria vida e compreender o valor de suas contribuições. Isso é bem mais justo.

Para perguntar quem fica com os leitores se eu e Sally nos separarmos, para se ofender por eu dizer que lavar louça não compra mansões, para dizer que o texto da Sally é do baú!: somir@desfavor.com

SALLY

Atenção para a pergunta: qual é o regime de bens MAIS JUSTO? Não perguntei qual é o que você mais gosta, qual foi o que você escolheu ou qual é o que você queria ter escolhido. Vamos parar com essa merda de EU, EU, EU… Aqui falamos de uma hipótese em abstrato. Em um casamento decente, com pessoas que se gostam e se respeitam, qual seria o regime jurídico mais justo? Comunhão parcial de bens!

Na comunhão parcial de bens, os bens que cada um tinha antes do relacionamento continuam sendo de cada um, mas os bens adquiridos depois são de ambos, não importa no nome de quem estejam. Isto porque se presume que duas pessoas casadas se empenham em conjunto para obter um bem. Não que necessariamente ambos contribuam em dinheiro, mas contribuem como podem.

Procurem se lembrar de cada Siago Tomir que vocês leram. Alguém tem dúvidas que se eu não estivesse presente em muitos daqueles momentos Siago Tomir estaria muito fodido da vida? Cada vez que eu arrisquei a minha pele ou que me desdobrei para socorrê-lo, salvá-lo ou ajudá-lo eu contribuí para a aquisição de patrimônio. Cada vez que eu comi pão com ovo para ele pagar uma prestação de carro acima do seu salário eu contribuí para aquisição de patrimônio. Da mesma forma que cada vez que uma mulher cozinha uma marmita e dá para o marido levar para o trabalho, para que este não gaste dinheiro com almoço na rua, ela está contribuindo para que no final do mês ele possa pagar a prestação do apartamento.

“Mas Sally, tem mulher que não faz nada, só gasta o dinheiro do marido e no final quer ficar com metade de tudo!”. Sim, Meu Querido, tem de tudo no mundo. Tem gente que come cocô, tem gente que vota no Tiririca e tem gente que é acomodada e interesseira. Mas a regra geral é: em um casamento há mútua assistência, ambos se ajudam, se não com dinheiro, com apoio, conselhos e cumplicidade. A regra geral é essa, se houver uma exceção, busca-se uma solução excepcional. Se a pessoa casou com uma mulher que não a ajuda em nada, sinceramente, foda-se. Quem mandou escolher mal e continuar casado com uma pessoa assim? Não é por isso que vamos cometer uma injustiça com todas as outras mulheres do mundo, né?

Cada vez que um homem chega em casa de cabeça quente dizendo que vai dar uma porrada no seu chefe e uma mulher escuta seu desabafo, o acalma e o aconselha sobre como conduzir a situação, ela está contribuindo com as finanças do casal. Cada vez que uma mulher arruma uma casa, lava roupa, cozinha e etc, ela está contribuindo com as finanças do casal, já que se ela não o fizesse seria necessário pagar para que alguém o faça. Cada vez que uma mulher dá uma ideia ou uma sugestão profissional ao seu marido ela contribui para a aquisição de bens.

Não me entendam mal, eu sou fã da separação total de bens. Facilita as coisas: o que é de cada um é de cada um, não tem polêmica, não tem disputa, não tem barraco no divórcio. Mas não é o meio mais justo, é apenas o meio mais prático. A grande injustiça da separação total de bens é que quase nunca o proprietário oficial adquiriu aquele bem sem auxílio do parceiro, só é justo em situações excepcionais de pessoas muito ricas. Nós, reles mortais somos injustiçados.
Muitas vezes o parceiro chegou até a contribuir com dinheiro, ainda que indiretamente: Esposa paga sozinha as contas da casa que normalmente são divididas porque naqueles meses o marido teve poucos clientes e não conseguiu arcar com o financiamento do carro e as contas, ou seja, ela contribuiu financeiramente para que fosse viável adquirir aquele bem, mas no fim das contas o carro fica só no nome dele.

Sempre existe algum esforço em comum, nem que seja o da mulher de aturar os peidos noturnos do marido. Senhoras e Senhores, sejam honestos… dificilmente não existe uma mulher por trás de um grande homem. Só o conforto de ter uma parceira para dividir os problemas, para buscar consolo, para ser acolhido já bastaria para justificar a comunhão parcial de bens. Muito mais hoje, onde a maior parte das mulheres trabalha e ainda tem que dar conta de engravidar, criar filho e estar sempre bonita, depilada, arrumada e ser inteligente.

Ao casar com separação total de bens se despreza todo esse esforço em conjunto, todo o apoio financeiro e moral recebido por anos e todos os malabarismos feitos para que a aquisição daquele bem fosse possível. É uma propriedade falsa, que não retrata a realidade da aquisição daquele bem e certamente não faz justiça. Foda-se se o marido só comprou o apartamento porque o sogro emprestou o dinheiro e a mulher fez marmita para ele durante 15 anos, se ele quiser pode dar um chute na mulher e colocar a secretária, 30 anos mais nova, neste mesmo apartamento que o pai dela ajudou a pagar.

É uma visão muito limitada: é proprietário aquele que consta na documentação. Não! Tem que atentar para como o bem foi adquirido. Muitas vezes a outra pessoa também pagou por ele, de forma direta ou indireta. E se no meio do caminho o marido perdeu o emprego e a mulher ficou um ano bancando todas as despesas da casa e pagando a prestação do carro até ele arrumar um novo emprego, é justo que no final das contas ele seja o proprietário? Não me parece justo. Me parece prático, me parece eficiente e eu até casaria em separação total de bens dependendo do caso, mas JUSTO não é. Eu é que pago para não me aborrecer mesmo.

E falo em favor da mulher porque geralmente são elas que saem prejudicadas, mas o inverso também é admissível. Vale tanto para homens como para mulheres. Geralmente as pessoas são mais fortes (no sentido amplo) quando estão em casal, em um relacionamento bem sucedido (se não for bem sucedido, nem case!). Todos se beneficiam. O investimento mútuo é tanto que o dinheiro passa a ser do casal, e não de um ou de outro. Não é a toa que hoje em dia esse é o regime considerado como regra pela lei. Se as pessoas não estipulam o contrário, o casamento é celebrado em comunhão parcial de bens.

Essa coisa de contar até a última moedinha e ficar de mesquinharia com “Isto é MEU porque está em MEU nome” é coisa de gente babaca. Até porque, vamos combinar, hoje em dia poucas pessoas podem comprar um bem de grande porte sozinhas, geralmente despesas grandes só se tornam viáveis (ou ao menos se tornam mais fáceis) quando feitas em casal. Eu não esperava outra postura do Somir, egoísta/individualista/egocêntrico master, mas de vocês eu espero.

Em tempo: quem quer dar golpe não usa regime de bens para isso, quem quer dar golpe faz filho e com isso toma metade dos bens do outro independente de regime de bens.

Para cagar pela boca e dizer que eu sou interesseira, para dizer que o regime ideal é comunhão para os bens do seu parceiro e separação para os seus bens ou ainda para dizer que bom mesmo é não casar: sally@desfavor.com

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